A história do “Dia do Trabalho” aponta o desafio de atos celebrativos para além de “sorteios, brindes e shows artísticos”. Não que a dimensão festiva não faça parte da vida dos trabalhadores, mas a memória desta data evoca lutas e resistências, movimentos organizados, greves e reivindicações por melhores condições de trabalho, redução de jornada e outros direitos.
Nesta semana, quando se comemora mais um Dia do Trabalho, o ObservaSinos volta-se para as realidades que envolvem o mundo do trabalho e a vida dos trabalhadores e trabalhadoras. O desafio posto está em aproximar e debater esta realidade do trabalho com as questões sociais relacionadas e a pertinência das mesmas com as políticas públicas sobretudo em âmbito regional.
Os indicadores socioeconômicos além de subsidiar o debate tornam-se importantes ferramentas de diálogo com os setores da Administração Pública, com as organizações de trabalhadores e da sociedade civil em vista do desvelamento da realidade que se tem e da realidade que se quer alcançar.
Numa perspectiva mais geral, na semana que passou, foram divulgados os dados da Conferência das Nações Unidas sobre o Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD) mostrando que o crescimento da força de trabalho desacelera no Brasil, em virtude de uma menor taxa de fecundidade.
Esta realidade desvela-se também no Rio Grande do Sul que aponta um baixo crescimento da população e a migração como tendências inibidoras do crescimento no estado. O último censo do IBGE apontou o Rio Grande do Sul como aquele que possui a menor taxa de crescimento populacional no país. A média nacional na última década estava em 1,17% ao ano, enquanto que o crescimento no Estado é bem inferior, ficando em 0,49% ao ano no mesmo período. Isto influencia diretamente na força de trabalho, sobretudo nas demandas por qualificação de mão-de-obra, na questão da produtividade e na participação feminina na força de trabalho. Para Denise Delboni, Professora de Relações trabalhistas da Faculdade de Economia da FAAP, a participação das mulheres na força de trabalho do Brasil deve chegar a 45% ao fim desta década, sendo que em 1980, essa presença era de apenas 31,3%.
Se a questão demográfica desafia a um novo olhar sobre a realidade do trabalho e as políticas públicas envolvidas, isso reflete também na questão da qualificação da mão-de-obra.
Em geral, a ideia de proteção social ao trabalho está vinculada aos trabalhadores com carteira assinada, ou seja, diz respeito ao trabalho formal, sem interferir no trabalho informal. Uma das ações mais significativa para a efetivação da política do trabalho tem sido a qualificação profissional. No entanto, quando é ditada a “ordem” da qualificação, são os trabalhadores com mais de 45 anos, que não concluíram o ensino fundamental que encontram maior dificuldade para acessar e viabilizar esta ação política. Com isso, a grande maioria deste segmento populacional identifica a informalidade como caminho e possibilidade para este segmento da população.
Os pressupostos, metodologia e perspectivas da qualificação profissional, ao mesmo tempo, não são suficientes para promover o debate profundo sobre o mundo do trabalho que se tem e o mundo do trabalho que se quer, assim como sua materialização a partir das relações. “A transmissão de um saber sob uma forma pragmática desapareceu”, reflete Alfredo Jerusalinski, na obra “O Valor Simbólico do Trabalho”. Se antes o ensino era transmitido de pai para filho, hoje predomina o ensino das coisas, das técnicas de domínio sobre o objeto. O objeto escolhido define o que é para saber, sustenta Jerusalinski. Assim, é o senso comum da economia de mercado quem dita o aprendizado, a qualificação. É esta lógica que produz os deslocamentos no mundo do trabalho. Seja o deslocamento para a informalidade seja para a necessidade de migrar em busca de novas oportunidades.
Nesta semana foram divulgados pelo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados – CAGED, as informações que registram um crescimento do emprego em 20,6%, superior a março de 2011. Os indicadores revelam que o maior responsável pelo saldo é o setor de serviços, com 83.182 vagas criadas (0,53%) das vagas formais, segundo o CAGED. O Rio Grande do Sul foi o 3º estado que registrou o maior número de empregos, com 16.875, conforme o Cadastro.
No primeiro trimestre de 2011 o número de admitidos foi de 57.342, no mesmo período em 2012 este número chegou em 58.504 na região do Vale do Rio dos Sinos. Apesar desta alta, no trimestre, o IBGE divulgou nesta semana que a taxa de desemprego subiu para 6,2% no mês de março de 2012 depois de ficar em 5,7% em fevereiro.
O setor que mais admitiu foi o da Indústria de transformação (24.036), em segundo lugar, o Setor de Serviços (16.368) e o Setor do Comércio em terceiro (12.081). O que revela, numa primeira vista é que, no Vale do Sinos ocorreu uma inversão de tendência. Enquanto no cenário nacional, o setor de serviços foi o que, no período, mais contribuiu para o saldo positivo, ficando a construção civil em segundo lugar, na região foi justamente a Indústria de Transformação a maior responsável pela contratação formal dos trabalhadores, ficando o Setor de Serviços em segundo lugar e o Setor do Comércio em terceiro.
Se num cenário futuro, os indicadores projetam uma mudança substancial da compreensão da realidade do trabalho, pelas questões acima vistas, torna-se fundamental impulsionar uma discussão sobre as políticas voltadas para o setor do trabalho, assim como discutir os investimentos da administração pública, as obras de infra-estrutura, os planejamentos orçamentários a médio e longo prazo. Nesta compreensão é preciso “oxigenar” as formas de intervenção, para além dos fins eleitoreiros, que quase sempre “vulgarizam” a discussão das políticas públicas. Que tipo de investimentos realmente importam para a população do município? Que perfil se projeta para esta população? Que cenário social se descortina a partir da projeção da população economicamente ativa de determinada região? Tudo isso tem a ver com uma nova proposta de gestão municipal da qual a opinião da população tem de ser considerada. Nota-se que tal discussão ultrapassa a lógica da concorrência dos partidos, mas também se apresenta como um desafio para toda sociedade, na construção de um verdadeiro modelo democrático participativo.
O ObservaSinos, neste sentido busca uma releitura dos indicadores sociais e econômicos para além do referencial estatístico, onde seja levado em conta a vida humana e de todos os seres acima de tudo, como referencial de leitura e contexto, para elaboração de ações e estratégias políticas, que visem o interesse público e o bem coletivo, como prerrogativa. No entanto o impulso desta iniciativa precisa ganhar o campo do debate público, da interação ativa dos Conselhos e fóruns que têm o papel estratégico na deliberação e controle das políticas e de suas implementações – propostas, investimentos, impactos, qualificação, entre outros.
Para melhor compreender, analisar e intervir na realidade que vivemos o ObservaSinos promove oficinas sobre os indicadores. A próxima oficina será sobre os dados censitários e será realizada no dia 16 de maio. As inscrições podem ser feitas no sítio da Unisinos.
Esta análise baseia-se nos números de trabalhadores admitidos e desligados do trabalho formal disponibilizados no sítio do Ministério do Trabalho e Emprego – MTE, dados estes que foram declarados pelas empresas através do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados – CAGED. O ObservaSinos utilizará o termo flutuação do trabalho para esta análise, sendo este termo utilizado para indicar a diferença entre admissões e desligamentos no mercado formal de trabalho num determinado período, evidenciando, assim, a movimentação dos trabalhadores na região do Vale do Rio dos Sinos.
É possível identificar que entre 2007 e 2011 o setor da Indústria permaneceu três anos em flutuação negativa. Ou seja, as indústrias mais desligaram trabalhadores do que admitiram. A Construção Civil tem um número significativo de novas contratações no ano de 2010, logo em 2011 a flutuação torna a ficar mais próxima do número dos outros anos.
Tendo como recorte para análise os cinco Grandes Setores é possível perceber que a Agropecuária, extr. vegetal, caça e pesca foi o setor que menos movimentou o mercado formal de trabalho na região.
Os setores de Serviços, Comércio e Construção Civil foram os que seguiram no ritmo de crescimento, tendo, sido sempre positiva nos últimos cinco anos. Entretanto, no primeiro trimestre de 2012 o único setor que teve flutuação positiva em todos os municípios do Vale foi o de Serviços. O Comércio foi o setor que no início deste ano teve flutuação negativa na região. O município de Nova Santa Rita não teve flutuação negativa somente em um dos cinco setores.
Importante destacar que os dados podem - e devem - ser analisados em diferentes perspectivas. Quando observamos que o Comércio foi o setor que mais desligou trabalhadores neste período na região teremos um saldo negativo de 61 desligamentos, mas quando olharmos este mesmo setor por município o saldo negativo é maior do que da própria região. Isto ocorre devido a soma da região em admitidos se aproximar ao de desligados, o que não ocorre em algumas cidades.
Portanto, os dados podem ser interpretados em diferentes perspectivas. Mas, para que possam ser interpretados nestas diferentes perspectivas o ObservaSinos vem publicizando estas informações, de bases de dados públicas, para que possam apropriados pelos diferentes sujeitos da sociedade civil a fim de promover o debate.
A Oficina sobre indicadores socioeconômicos e proteção social compõe o conjunto de ações do Observatório, que tem como propósito analisar, sistematizar e publicizar indicadores socioeconômicos, assim como promover o debate sobre a realidade e as políticas públicas da região do Vale do Rio dos Sinos, em vista da afirmação da sociedade includente e sustentável.
Objetivos
Promover a capacitação para o conhecimento dos indicadores socioeconômicos e instrumentalização das ações nos cenários sociais e, em especial, em relação à proteção social e aos cenários de gestão em rede
Ministrantes: Assistente Social Renato Oliveira Teixeira – CRAS Esteio.
Grégori Soranso – Diretor do Cadastro Único - São Leopoldo.
O ObservaSinos, neste mês de maio busca manter-se em sintonia com os grandes debates acerca do mundo do trabalho buscando compreender, a partir da realidade do Vale do Sinos, suas expressões, mudanças, desafios e possibilidades.
O mundo e o Brasil vivem ainda o impacto de grandes mudanças no trabalho, sobretudo a partir da década de 90. Não só mudaram as estruturas produtivas, pelo fato das novas demandas de consumo, como também o país ficou exposto, e de maneira não muito planejada, à economia internacional, ficando cada vez mais dependente e influenciado pela lógica própria do mercado externo.
O impacto das mudanças mostram uma realidade cada vez mais interligada. Não somente se alteram as estruturas de produção frente à demanda de novos empreendimentos industriais ou tecnológicos, como também a própria produtividade se expõe frente ao fenômeno do mercado global, suas crises e seus efeitos, moldados por novos padrões de consumo. Assim, em âmbito nacional, chegamos a um pico de produtividade em 2010 e a partir de então, inicia-se um ciclo de redução no ritmo de crescimento, um período de estagnação que afeta em muito a realidade do trabalho.
Loricardo de Oliveira, sindicalista atuante no Vale do Sinos e Tesoureiro CUT/RS, relaciona que o debate atual sobre a realidade do trabalho e o fenômeno da desindustrialização, também aqui no Vale , precisa ser ligado com a discussão sobre as estratégias para o futuro e isso supõe atenção e cuidado. “O debate sobre a desindustrialização pode correr riscos de haver somente benefícios aos empresários e as contrapartidas aos trabalhadores ficarem a segundo plano”.
Temos, em perspectiva econômica mais ampla, um conjunto de medidas e de políticas, que, no cenário regional são traduzidas com características próprias. No Vale, entre as características da realidade do trabalho, constata-se o fenômeno da terceirização e da rotatividade da mão-de-obra, entre outros. Quanto à questão da terceirização, ocorre, sobretudo, a possibilidade de muitos empregos virem a ser contratados sem acompanhamento dos sindicatos, inclusive sob um regime de péssimas condições de trabalho. Afirma Loricardo de Oliveira. “Empregos na economia de serviços vem aumentando, a média salarial ainda pequena, as contrapartidas sociais limitadas aos interesses das empresas e a alta rotatividade da mão de obra, especialmente onde predomina o setor do calçado” (Campo Bom e Sapiranga. Neste quadro, completa o sindicalista, há de se inserir a questão da sazonalidade do comércio, traduzida principalmente na realidade do emprego temporário, como outro fator de rotatividade.
A constatação desta realidade de mudanças pode ser percebida pela visualização dos dados indicadores, ao retratarem a flutuação negativa (Indústria), estagnada (agropecuária) ou positiva (serviços, comércio e construção civil), divulgados na semana passada pelo ObservaSinos. De igual forma, a publicização e análise dos dados, apontam para a inter-relação existente entre a questão do trabalho, a desaceleração do crescimento, as questões demográficas e a reflexão sobre as políticas para o setor, assunto também debatido pelo ObservaSinos, como introdução a toda esta série de debates sobre o trabalho (A realidade do trabalho no Vale do Sinos e o cenário de mudanças e crise, 30.04.2012).
Portanto, quando o Ministério do Trabalho e Emprego divulga a relação entre admitidos e desligados no período 2012/2011, primeiro trimestre, percebe-se as tendências que caracterizam a realidade do trabalho na região. Apesar de uma flutuação positiva (Indústria de transformação e Serviços) e equiparada (comércio), na comparação com o primeiro trimestre de 2011, o número de desligados (7%) foi superior ao número de admitidos (2,1%). Assim, torna-se possível, visualizar, pela tabela abaixo, a flutuação havida nos três setores que mais contribuíram nesta relação entre admitidos e desligados.
A realidade dos dados, como se sabe, reflete uma tendência característica na região, onde interagem diversos e distintos elementos: reestruturação do setor produtivo, sazonalidade, mobilidade, demandas por qualificação, etc. Neste sentido, Carlos Finck, Secretário de Desenvolvimento Econômico, Trabalho, Tecnologia e Turismo (SEDETUR) de Novo Hamburgo, opina sobre a relação entre admitidos e demitidos e seus efeitos, afirmando haver uma relação entre a oferta, a procura e a mobilidade: “as pessoas migram pela oferta de maiores salários”, analisa o Secretário.
Quanto à realidade da indústria e sua configuração regional, considera Finck que, “as empresas tiveram um crescimento negativo de 5% no primeiro trimestre do ano. Novo Hamburgo registrou um pequeno crescimento na indústria de transformação, nos serviços e na construção civil. O alto número de oferta de vagas deve-se ainda a falta de melhor qualificação para determinadas áreas”, conclui o Secretário.
De todo modo, o que se percebe, e os dados indicadores ilustram, é que a realidade do trabalho precisa ser repensada sob outros enfoques. Faz-se urgente a organização de uma agenda onde os atores, trabalhadores, empresários e governo, possam perceber os desafios do presente e as perspectivas de um futuro próximo, de transformações radicais nesta realidade. Metas de empregos, condições de trabalho, contratos coletivos nacionais, investimento em qualificação com metas de gratuidade para famílias de baixa renda, política de controle de sonegação da previdência social, são algumas das propostas a serem inseridas nesta agenda, defende o sindicalista Loricardo de Oliveira.
Neste processo de debate e formação, o ObservaSinos procura dar sua contribuição e oportuniza para esta semana (16.05) a “Oficina sobre os dados censitários da amostra da Região do Vale do Sinos - Censo 2010". Os/as interessados/as poderão fazer suas inscrições pelo sítio eletrônico da Unisinos.
Ao longo do mês de maio o ObservaSinos deu vistas a uma série de indicadores do trabalho, como uma forma de despertar para o debate sobre a realidade que temos e a realidade do mundo do trabalho que queremos na região. A análise publicada no dia 21 de maio tematizou o mercado de trabalho dos jovens no Vale do Sinos intitulado “Mercado de trabalho dos jovens no Vale dos Sinos durante o governo Lula”. Foram comparados os dados do emprego e desemprego entre os anos 2003 e 2010, apontando uma sensível redução na quantidade de jovens no mercado de trabalho junto ao setor da indústria, em contraposição a um aumento da ocupação no setor de serviços e comércio, no Vale do Sinos. No entanto, ao comparar no mesmo período o item remuneração dos jovens, a média que era 2,18 salários mínimos, em 2003 cai para 1,63 salário mínimo em 2010, uma redução em 25,10%.
Para aprofundar e debater esta realidade foi convidada a mestranda em Saúde Coletiva pela Unisinos, Assistente Social e Coordenadora da ONG Trilha Cidadã, Fabiane Asquidamini. Seu enfoque analítico deu-se a partir do contexto da juventude. Antes de mais nada, Fabiane destacou que é preciso ter presente que falamos de “juventudes” que enfrentam esses dilemas próprios de uma sociedade capitalista, onde “não ter educação e trabalho é não ter acesso à vida com dignidade”.
Um dos principais desafios que se coloca, portanto, é a questão da precarização do mundo trabalho, que acaba tendo significado especial para as “juventudes”. Para a Coordenadora da “Trilha Cidadã”, essa realidade “tem sido uma constância na vida dos jovens... a inserção tem se mostrado cada vez mais precária, as ocupações que são destinadas aos jovens onde em sua maioria, são posições ocupacionais de baixa qualidade, com vínculos empregatícios precários, com baixa remuneração, e, muitas vezes pertencentes ao setor informal, realidade essa confirmada pelos dados acima mencionados.”
Não se pode, pois considerar o problema apenas mediante os desafios imediatos. Faz-se necessário problematizar a realidade do trabalho para além da falta de qualificação, conforme Fabiane. Assim “precisamos repensar o modelo de desenvolvimento e de produção do nosso País. Produzimos para quem? Para que tipo de desenvolvimento? Ampliar a discussão do trabalho e da renda para a juventude exige integrar outras dimensões nesta discussão, precisamos romper a soberania do olhar econômico e do mercado”, completa a Assistente Social.
Repensar a realidade do trabalho sob o foco do binômio educação/emprego apenas sob o olhar referencial do mercado pode significar uma armadilha, uma vez que para o mercado a resposta final sempre incidirá no aumento do consumo. Neste sentido, Asquidamini problematiza: “Precisamos pensar em profissionalização ou em cidadania? Em inserção no consumo ou em direitos de participação?”.
Não há, portanto, como compreender tal questão sem pensar nas suas implicações principalmente em relação à necessidade de ‘implementar e desenvolver políticas públicas de geração de trabalho, emprego e renda para a juventude da nossa região”, conforme Fabiane. No entanto, tais políticas precisam estar ligadas ao “acesso à educação de qualidade, tempo livre, lazer, convívio social”, pois são estas condições indispensáveis para “qualquer ser humano se desenvolver e viver em sociedade”, complementa a Coordenadora da “Trilha Cidadã”.
Em sintonia com estas reflexões o ObervaSinos mantém a convicção de que os fatores se entrecruzam e se complementam. Por isso, a discussão sobre a realidade do trabalho instiga também a análise e compreensão da realidade da educação, suas finalidades e significados. Neste sentido, para instrumentalizar os profissionais e a sociedade em geral na compreensão da realidade o “Programa ObservaSinos” estará promovendo a Oficina de Indicadores educacionais no dia 06.06.2012 (primeira etapa) e dia 20.06.2012 (segunda etapa). As inscrições são gratuitas e poderão ser feitas na página de eventos do IHU.
O ObservaSinos, programa do Instituto Humanitas Unisinos – IHU, tem o objetivo de reunir e publicizar indicadores de base de dados públicas, assim como promover o debate e análise destes dados em confronto com as políticas públicas.
Esta semana Anderson Bonetto Carraro, economista pelo Curso de Ciências Econômicas da Universidade do Vale do Rio dos Sinos - UNISINOS e orientando da Profa. Dra. Angélica Massuquetti, utiliza as informações destas bases de dados analisando o mercado de trabalho para jovens durante o governo Lula (2003-2010).
Eis a análise
O Vale do Rio dos Sinos é uma das regiões com maior potencial econômico do Rio Grande do Sul e com algumas das maiores empresas do estado e do Brasil instaladas em seu território. A região tem uma forte tradição no setor calçadista, sendo o quarto polo da área no país, e representa, atualmente, cerca de 20% de todo o Produto Interno Bruto (PIB) gaúcho.
Forte demandante de mão de obra, o setor calçadista vem passando por várias crises nos últimos anos. Esta situação acaba afetando todos os trabalhadores da região, em especial os jovens, público que, segundo Raul Luís Assumpção Bastos (2007), tem sua entrada no mercado de trabalho geralmente de forma difícil, se caracterizando por elevadas taxas de desemprego e de informalidade, bem como por baixos níveis de rendimento e de proteção social. Conforme afirma Rogério Nagamine Constanzi (2009), embora os setores do mercado de trabalho nos quais os jovens estão inseridos estejam sujeitos às flutuações da economia, em geral, a juventude é atingida mais severamente em momentos de retração e menos beneficiada em períodos de melhoria e de recuperação econômica. De acordo com a OIT (2009), jovem é o indivíduo com idade entre 15 e 24 anos de idade. Porém, neste estudo, optou-se por utilizar a faixa etária de 16 a 24 anos, pois, no Brasil, a idade mínima de ingresso legal no mercado de trabalho é de 16 anos, conforme emenda de 1998 à Constituição Federal. Cabe destacar que alguns estudos consideram, como jovens, as pessoas que tem entre 15 e 29 anos de idade.
A entrada ao mercado de trabalho por necessidades econômicas, geralmente, afasta o jovem de baixa renda do aumento da escolaridade e da qualificação profissional. Como, atualmente, o sistema educacional brasileiro, na sua quase totalidade, é frágil, tendo em vista que o país está sempre nos últimos lugares em leitura, matemática e ciências, dentre as 65 nações pesquisadas pelo Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (PISA), organizado pela Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Econômico (OCDE), esta característica vem a ser uma forte variável da inserção juvenil ao mercado de trabalho. Esta disparidade ocorre pela baixa qualidade, na média, do ensino, principalmente nas escolas públicas brasileiras. Tal situação influencia os parâmetros de emprego dos jovens do Vale do Rio dos Sinos, assim como no resto do país.
Mas qual a população de jovens que se inseriram no mercado de trabalho da região na última década, durante o governo do presidente Lula e qual a remuneração média recebida por eles neste período? Este questionamento visa analisar a inserção dos jovens no mercado de trabalho do Vale do Rio dos Sinos durante o governo Lula, ou seja, de 2003 a 2010, durante a primeira década e o primeiro governo federal eleito deste século.
Formada por 14 municípios, a região tem algumas disparidades, tais como número de habitantes e setores econômicos predominantes em cada cidade. A seguir, apresenta-se a tabela 1 com o número de trabalhadores jovens do Vale do Rio dos Sinos, por setor, em 2003 e 2010.
Verifica-se que mais de 50% dos trabalhadores jovens da região concentram-se em apenas três municípios (Canoas, Novo Hamburgo e São Leopoldo) e que todos os setores econômicos cresceram em número de empregados nesta faixa etária, com exceção do industrial, influenciado pelo período de forte recessão pelo qual passou o setor calçadista. Nota-se, ainda, uma crescente transferência da empregabilidade do setor industrial para os setores do comércio e de serviços, em especial este último.
Já na tabela 2 expõe-se a remuneração deste público jovem na região, sendo medida em salários mínimos. Verifica-se uma forte retração na renda recebida por eles em 2010 em comparação com 2003, isto em todos os municípios.
Mais uma vez percebe-se a forte influência negativa que o setor calçadista teve sobre o emprego dos jovens na região. Os três municípios (Araricá, Portão e Sapiranga) com maior queda nos rendimentos juvenis são predominantemente calçadistas, além de serem pequenos, o que revela uma maior dificuldade destes em lidar com uma maior mobilidade de mão de obra entre setores econômicos, como ocorreu nos maiores municípios.
Na tabela 3, contempla-se uma exposição dos valores dos salários mínimos vigentes em cada ano do governo do presidente Lula. Adicionalmente, analisa-se o percentual de reajuste do salário, bem como o nível de inflação que vigorava na época.
Uma possível explicação para a queda nos níveis de remuneração, em salários mínimos, no período, pode ser observada: percebe-se que o salário mínimo teve um aumento real maior do que 53% durante os mandatos do último governo. Este índice é muito maior do que o crescimento do número de trabalhadores jovens na região (7,15%), durante o mesmo espaço de tempo.
Conclui-se, portanto, que durante os últimos dois mandatos presidenciais, de 2003 a 2010, o mercado de trabalho juvenil no Vale do Rio dos Sinos cresceu pouco, tendo sido influenciado pela crise no setor calçadista. Durante o período, o jovem da região teve uma sensível queda da renda recebida, quando medida em salários mínimos, mas esta situação se explica pelo elevado acréscimo real que teve o principal balizador de remuneração do Brasil. Há, por outro lado, uma evidente tendência de mobilidade de mão de obra juvenil do setor industrial para o comércio e serviços, em especial nos maiores municípios da região.
O ObservaSinos, programa do Instituto Humanitas Unisinos – IHU, referencia sua atuação na região do Vale do Sinos, entendendo a importância de, com o olhar neste contexto, suscitar o debate sobre e a intervenção na realidade econômica e social da região. Desta forma questões como emprego, saúde, meio ambiente, pobreza, entre outros, integram o cenário de observação e análise, como também suscitam e estimulam o debate como ferramenta de participação social e cidadã, sobretudo para a definição dos rumos das cidades e região que queremos.
Iniciando um novo debate, o ObservaSinos propõe um olhar direcionado à realidade da pobreza que se configura na região, sobretudo naquilo que possa estimular um debate sobre os resultados atingidos, revisão das perspectivas e alcance das políticas e programas aplicados.
O primeiro objetivo do milênio (ODM) propõe a erradicação da extrema pobreza e da fome com uma meta de, até 2015, reduzir pela metade a proporção da população que vive abaixo da linha da pobreza. No entanto, a redução numérica sugerida não pode ofuscar as múltiplas dimensões da pobreza e no que compreende: acesso a direitos básicos, igualdade de gênero, moradia, saúde, educação, condições ambientais para o bem viver, etc. Implica, pois, pensar que para além de distribuição de renda a necessidade de geração de oportunidades, como enfatiza Amartya Sen (Desenvolvimento como liberdade, 2000).
Um dos focos de atuação do Estado brasileiro tem sido o Programa Bolsa Família, que institui o Cadastro Único como uma ferramenta para indicar e caracterizar as famílias de baixa renda, ou seja, famílias com renda mensal de até meio salário mínimo por pessoa ou renda mensal total de até três salários mínimos.
Neste Cadastro Único, pensa-se juntar ainda as informações do próprio núcleo familiar, como as características do domicílio, as formas de acesso a serviços públicos essenciais, etc. A partir deste levantamento cadastral é que o poder público pretende formular e implementar as políticas específicas, sobretudo objetivando o combate das vulnerabilidades sociais. Dois critérios têm sido adotados pelo Governo nesta caracterização. O primeiro, a estimativa de famílias pobres com perfil para o atendimento do Programa Bolsa Família, tendo em consideração a renda familiar de até R$ 140,00 por pessoa. E segundo, a caracterização “famílias pobres” tendo em consideração a renda familiar per capita de até meio salário mínimo. No entanto há de se considerar que conforme a previsão legal (Lei n. 10.836, de 9 de janeiro de 2004), as famílias com renda familiar até R$ 140,00 só terão direito ao benefício do Programa Bolsa Família caso tenham filhos com idade entre 0 e 17 anos.
Neste sentido apresenta-se conforme os indicadores do Cadastro Único, na região do Vale do Sinos o quadro comparativo que vai do ano 2010 a março de 2012.
A visualização dos dados apresenta duas considerações iniciais. Uma delas diz respeito ao número de famílias cadastradas, que aumentou entre 2011 e março de 2012 em todos os 14 municípios da região. A segunda consideração diz respeito à variação das famílias em condição de pobreza, que teve confirmado o aumento do número de famílias identificadas pela renda per capita mensal de até ½ salário mínimo entre 2010 e março de 2012 e uma pequena diminuição do número de famílias com renda mensal per capita mensal de até 140 reais.
Estes dados podem sugerir diversos elementos para o debate. Certamente o reconhecimento do aumento do número de famílias cadastradas e, consequentemente, o aumento de famílias reconhecidas na situação de pobreza, foi alcançado pelo empenho dos governos na busca ativa das famílias neste condição, que foi promovido há um ano pela Presidência da República. Será que este número revela de fato a situação de pobreza e o número de famílias nesta situação nos municípios e região?
Neste sentido, apresentam-se a seguir os dados da pobreza por município. Esta informação pode constituir-se em importante subsídio para o debate pela sociedade com governos municipais e, também, os candidatos aos novos governos, em vista de melhor reconhecer a realidade que se vive e a realidade que se quer alcançar em cada unidade da federação da região do Vale do Sinos.
Este debate pode ser ampliado com outras indagações. Será que o efetivo combate à miséria e a fome (ODM) passa somente pela condição da renda, uma vez que muitas das famílias estariam isoladas de outras urgências como serviços públicos, da oferta de empregos, políticas inclusivas? Como combinar, portanto, o enfrentamento à realidade de pobreza com o aumento dos benefícios com criação de oportunidades? Como potencializar as condicionalidades (contra-prestação das famílias) nas áreas de saúde, educação e assistência social revendo o caráter compensatório ou assistencialista de tais programas em vista de uma dimensão realmente emancipatória e fomentadora de possibilidades?
Neste sentido, a ampliação de recursos para os programas sociais, principalmente programas de combate e erradicação da fome e da miséria podem ser celebrados sim, mas também há um lado reverso a ser analisado. Se há necessidade de ampliar recursos para o combate é sintoma de que os objetivos de redução e erradicação não estão sendo atingidos. O aumento do número de famílias na linha da pobreza ou abaixo dela indica menos um crescimento populacional do que crescimento da desigualdade. Apresenta-se a sinalização que o crescimento da economia não corresponde o decrescimento das injustiças e desigualdades sociais, sugerindo ao contrário, o aumento dos “deserdados do progresso econômico”.
Estabelece-se, portanto a necessidade de reflexão sobre esta realidade, do como a mesma atinge a configuração em cada município e principalmente de como as medidas de mitigação ou solução dos problemas têm sido efetivadas. Por parte da sociedade civil em vista da participação cidadã, cada vez mais impõe-se a tarefa de empoderar-se das informações e dos meios em função de uma participação realmente efetiva nos destinos de cada realidade.
O Programa ObservaSinos entende essa percepção dos indicadores como uma ferramenta estratégica, tanto para alimentar o debate quanto para articular tal conhecimento com a intervenção na realidade que é contextualizada. É um desafio estar atento aos indicadores, que fazem referência aos 14 municípios da região do Vale do Sinos e à sua totalidade, em vista da construção de outras práticas e políticas afirmadoras do desenvolvimento local e regional para toda a população do Vale do Sinos.
A Oficina sobre indicadores socioeconômicos e proteção social compõe o conjunto de ações do Observatório, que tem como propósito analisar, sistematizar e publicizar indicadores socioeconômicos, assim como promover o debate sobre a realidade e as políticas públicas da região do Vale do Rio dos Sinos, em vista da afirmação da sociedade includente e sustentável.
Objetivos
Promover a capacitação para o conhecimento dos indicadores socioeconômicos e instrumentalização das ações nos cenários sociais e, em especial, em relação à proteção social e aos cenários de gestão em rede
CadÚnico: conhecer para Incluir. Caso São Leopoldo por Grégori Soranso. Anexo
Proteção Social e os Programas de Transferência de Renda, Assistente Social Renato Oliveira Teixeira. Anexo
Este II Seminário objetiva dar continuidade ao aprofundamento do debate sobre as experiências dos Observatórios Sociais, identificando os limites e potencialidades dessas instancia que vem se constituindo amplamente nos últimos anos, em meio às demandas da democratização do Estado e da Sociedade brasileira. Pretende-se adensar a avaliação sobre as metodologias e os impactos da ação dos Observatórios em relação às políticas públicas locais, regionais, estaduais e nacional.
Objetivos
Promover o debate, a análise e a qualificação das metodologias dos Observatórios Sociais em relação à sua atuação e impacto junto às políticas públicas, no contexto contemporâneo de afirmação da democratização do Estado e da Sociedade brasileiros.
Objetivos específicos:
1. Promover o aprofundamento teórico e metodológico sobre os desafios e as possibilidades dos Observatórios com atuação junto as políticas públicas;
2. Proporcionar a troca de experiências e análise das metodologias de atuação dos Observatórios, seus gestores e pesquisadores, especialmente em relação ao tratamento dos indicadores socioeconômicos e de suas bases de dados;
3. Estimular o diálogo analítico e propositivo com os gestores das políticas públicas e dos sistemas de informação e das bases de dados federais relacionados às políticas de educação, proteção social, saúde, segurança e trabalho.
4. Subsidiar a qualificação e articulação dos Observatórios Sociais enquanto espaços e processos estratégicos de fortalecimento das políticas públicas.
Um dos temas recorrentes da realidade diz respeito à pobreza e seus enfrentamentos. Que análise pode ser feita dos índices e dos conceitos utilizados para caracterizar a pobreza? Quais as relações entre acréscimo de renda e superação das condições de pobreza? Aumento de poder de consumo necessariamente indica combate às desigualdades? O Programa Bolsa Família (PBF) tem sido uma medida eficaz para uma melhor distribuição de renda? Que outros fatores estariam relacionados a uma perspectiva de superação das desigualdades existentes no país?
O ObservaSinos em sua última análise semanal (A configuração da pobreza no Vale do Sinos e seu debate) relacionou dados do Cadastro Único, que focaliza a realidade da pobreza e sua caracterização no Vale do Sinos. É sob a baliza de tal indicador cadastral que se efetiva o Programa Bolsa Família, um dos principais programas do governo federal de transferência direta de renda e que beneficia famílias em situação de pobreza e de extrema pobreza em todo o País. Tal programa faz parte do Plano Brasil Sem miséria e integrando algumas ações complementares (educação, saúde e assistência social), volta seu foco de atuação para 14 milhões de famílias no Brasil.
Tal programa integra o Plano Brasil Sem Miséria (BSM), que tem como foco de atuação os 16 milhões de brasileiros com renda familiar per capita inferior a R$ 70 mensais, e está baseado na garantia de renda, inclusão produtiva e no acesso aos serviços públicos.
Nesta semana convidamos o professor Aloísio Ruscheinsky, professor do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Unisinos, a quem foram apresentados os dados publicados na última semana, para que nos ajudasse a visualizar melhor estas questão e debatê-la.
Sobre os conceitos utilizados: pobreza, miséria, linha da pobreza
Sobre a pobreza, afirma o professor: “prefiro entende-la como relacional e, enquanto tal, é um fenômeno a ser compreendido dentro da perspectiva comparativa, tendo sempre um contraponto de acumulação ou concentração de capital. A miséria pode também ser compreendida em diversos sentidos, seja como uma imperfeição humana advinda como resultado da moral humana ou da ausência de ética, seja como resultado decorrente do acesso desigual ao que é socialmente produzido. A noção de linha da pobreza surge em decorrência das tratativas de se estabelecer níveis de medição de bem-estar”.
Poderia então se perguntar se apenas o enfoque na renda, como referencial predominante para estabelecer uma linha de corte para os beneficiários do PBF, ou então, a adoção de uma linha que pudesse estar associada ao critério de (in)suficiência de ingressos para o acesso ao consumo, seria suficiente. Acesso ao consumo elementar ou à satisfação das necessidades básicas? Partindo desta consideração, Ruscheinsky analisa:
“A partir de uma visão mais abrangente que compreende a realidade como multifacetada e a múltipla causalidade o foco na renda é visivelmente insuficiente para caracterizar a questão social da pobreza. Entende-se que a pobreza é multidimensional onde a questão da renda é um dos componentes relevantes. Portanto, uma modalidade de averiguação multidimensional implica em uma complexidade, com adoção de vários critérios que são cruzados para identificar e caracterizar níveis de pobreza. De alguma forma os estrategistas do PBF já definiram [talvez na prática isto seja pouco visível] que são seis dimensões a abordar na aferição dos beneficiários: composição familiar, acesso ao conhecimento, ao trabalho, disponibilidade de recursos, desenvolvimento infantil e condições habitacionais”.
Sobre a eficácia do Programa Bolsa Família e suas ações complementares,
como política efetiva de superação e erradicação da fome e da miséria
Aloísio Ruscheinsky analisa que duas questões precisam ser levadas em conta: “Em primeiro lugar, o fato de estabelecer condicionalidades ligadas ao acesso de políticas públicas significa que o seu efetivo acesso não é tido como universal e ao mesmo tempo parece pressupor que os principais resultados são esperados em longo prazo, com melhora dos níveis de escolaridade e saúde das atuais crianças e adolescentes. Em segundo lugar convém distinguir entre proteção social e promoção social. O PBF é de proteção social predominantemente e como tal não é uma política eficaz de promoção social ou para a superação e erradicação da pobreza e da miséria, se avaliarmos pelo aspecto da distribuição monetária. Contudo, pode e tem uma incidência no que diz respeito proteção social com a alteração dos níveis de consumo da população em pobreza extrema”.
No Vale do Sinos, a realidade dos indicadores revelam que o PBF incide mais na diminuição da pobreza do que no enfrentamento às desigualdades. Para Aloísio: “Os dados do Cadastro aponta que no Vale do Sinos a extrema pobreza cedeu em pequena porcentagem nos últimos anos, o que também aponta a fragilidade da transferência monetária como um fator isolado dos demais mecanismos que produzem a pobreza. Por isso. inclusive também se diferencia: o PBF atua de forma mais incisiva da diminuição da pobreza e bem menos no declínio das desigualdades”.
A relação entre renda agregada e exercícios ou concretização de direitos
Sobre este aspecto, argumenta o pesquisador que: “Pelo tempo de vigência e pelos anseios de seus genitores os resultados ainda são exíguos. Creio que se atribui demasiada expectativa a um programa social, embora seja importantíssimo recordar que o programa Fome Zero continha outras dimensões igualmente relevantes para o combate à fome e à pobreza, que têm sido omitidas, ocultadas e com parcial efetivação [reeducação alimentar, conselhos de segurança alimentar, banco de alimentos, etc]”.
Não haveria, conforme o professor Aloísio, no Brasil, um único meio para uma tarefa histórica de tamanha magnitude. O caminho da superação da pobreza ou da miséria e o exercício da cidadania plena, dos direitos enfim, precisa ser dimensionado por um conjunto de fatores. Desta forma torna-se imperativo uma mudança de visão: “O mais usual é uma referencia ao crescimento econômico como condição de possibilidade e muito pouco, quando não uma expressa e explícita intensão de omitir que hoje - do ponto de vista da capacidade de reposição do ecossistema ou da preservação da biodiversidade - trata-se igualmente de redimensionar a divisão do bolo. Interrogar-nos sobre os mecanismos que possa realizar a tarefa hercúlea de redistribuição da riqueza já existente de tal forma que os muito ricos sejam menos prepotentes e tenham que ceder na corresponsabilidade da produção da pobreza”.
Trata-se, portanto de uma abordagem deficiente esta que imagina que superar a pobreza significa elevar o poder de consumo de 14 milhões de famílias brasileiras “desprovidas de determinadas mercadorias abarcadas pela obsolescência planejada”, analisa o professor. Inclusive a própria imagem e linguagem do PBF incorrem neste dilema. “A linguagem refere-se a beneficiários, selecionados de acordo com critérios administrativos, arrolados bem longe do cotidiano dos pobres”, considera Aloísio, e isso indica ainda “um caminho tortuoso para tentar relacionar benefícios do PBF com o exercício de direitos”.
Bolsa Família, renda e poder de consumo
Em tempos em que se torna candente o modelo de desenvolvimento orientado apenas pela demanda de consumo, em que se propugna uma reeducação alimentar, o combate ao desperdício, sobretudo nas relações entre a Vida humana e a Vida do Planeta, é no mínimo questionável focar uma política de superação das desigualdades apenas no aumento da capacidade de consumo. Nesta perspectiva argumenta Ruschenski que: “o incentivo ao consumo pelo atual governo brasileiro pouco se relaciona com metas de combate à pobreza. Em termos práticos, existe uma nítida e larga associação entre renda agregada e poder de consumo. Porém, a que poder e a que consumo se está em questão? Para uns a renda permite um consumo fastio ou tido como supérfluo que serve para fortalecer um sistema alicerçado nas desigualdades”.
No Vale do Sinos
Um olhar mais aproximado da realidade da pobreza na região do Vale do Sinos ,portanto, passa também pela observação de outros fatores. Neste sentido, Aloísio analisa que: “Por onde passa realmente a configuração da pobreza na região do Vale dos Sinos e os mecanismos de sua superação provavelmente é uma questão substantiva que o perfil do PBF não conseguirá responder quando se trata da população adulta nas contingencias da vulnerabilidade, da exclusão, do desemprego estrutural”.
Neste viés a política do PBF, como mecanismo ou instrumento de acúmulo do capital social para a inserção no mercado de trabalho, circulação de mercadorias e mesmo formação ou qualificação profissional, não teria concretude, ou “seria exigência demasiada atribuir tais objetivos” ao Programa. Para o professor, as visões e as políticas devem ser mais ampliadas em relação aos objetivos que se busca de superação das desigualdades e do combate à pobreza extrema. Ruscheinsky: “neste caso, os múltiplos mecanismos, políticas públicas, setores sociais, entre outros, têm corresponsabilidade, além do mais os sem renda não estão propriamente sem ocupação, pois, frequentemente passam muitas horas do dia em busca de sua subsistência. E se existe um desemprego estrutural quais as condições de possibilidade de um contingente tão elevado encontrar um lugar ao sol do mercado de trabalho formal?”
É sob a perspectiva desta visão ampla que o ObservaSinos, programa do Instituto Humanitas Unisinos – IHU, busca o confronto entre os indicadores sociais e a realidade concreta, potencializando um debate em vista de uma democracia participativa e de uma cidadania plena.