A configuração da pobreza no Vale do Sinos e o seu debate

  • Segunda, 4 de Junho de 2012

O ObservaSinos, programa do Instituto Humanitas Unisinos – IHU, referencia sua atuação na região do Vale do Sinos, entendendo a importância de, com o olhar neste contexto, suscitar o debate sobre e a intervenção na realidade econômica e social da região. Desta forma questões como emprego, saúde, meio ambiente, pobreza, entre outros, integram o cenário de observação e análise, como também suscitam e estimulam o debate como ferramenta de participação social e cidadã, sobretudo para a definição dos rumos das cidades e região que queremos.

Iniciando um novo debate, o ObservaSinos propõe  um olhar direcionado à realidade da pobreza que se configura na região, sobretudo naquilo que possa estimular um debate sobre os resultados atingidos, revisão das perspectivas e alcance das políticas e programas aplicados.

O primeiro objetivo do milênio (ODM) propõe a erradicação da extrema pobreza e da fome com uma meta de, até 2015, reduzir pela metade a proporção da população que vive abaixo da linha da pobreza. No entanto, a redução numérica sugerida não pode ofuscar as múltiplas dimensões da pobreza e no que compreende: acesso a direitos básicos, igualdade de gênero, moradia, saúde, educação, condições ambientais para o bem viver, etc. Implica, pois, pensar que para além de distribuição de renda a necessidade de geração de oportunidades, como enfatiza Amartya Sen (Desenvolvimento como liberdade, 2000).

Um dos focos de atuação do Estado brasileiro tem sido o Programa Bolsa Família, que institui o Cadastro Único como uma ferramenta para indicar e caracterizar as famílias de baixa renda, ou seja, famílias com renda mensal de até meio salário mínimo por pessoa ou renda mensal total de até três salários mínimos.

Neste Cadastro Único, pensa-se juntar ainda as informações do próprio núcleo familiar, como as características do domicílio, as formas de acesso a serviços públicos essenciais, etc. A partir deste levantamento cadastral é que o poder público pretende formular e implementar as políticas específicas, sobretudo objetivando o combate das vulnerabilidades sociais. Dois critérios têm sido adotados pelo Governo nesta caracterização. O primeiro, a estimativa de famílias pobres com perfil para o atendimento do Programa Bolsa Família, tendo em consideração a renda familiar de até R$ 140,00 por pessoa. E segundo, a caracterização “famílias pobres” tendo em consideração a renda familiar per capita de até meio salário mínimo. No entanto há de se considerar que conforme a previsão legal (Lei n. 10.836, de 9 de janeiro de 2004), as famílias com renda familiar até R$ 140,00 só terão direito ao benefício do Programa Bolsa Família caso tenham filhos com idade entre 0 e 17 anos.

Neste sentido apresenta-se conforme os indicadores do Cadastro Único, na região do Vale do Sinos o quadro comparativo que vai do ano 2010 a março de 2012.


A visualização dos dados apresenta duas considerações iniciais. Uma delas diz respeito ao número de famílias cadastradas, que aumentou entre 2011 e março de 2012 em todos os 14 municípios da região. A segunda consideração diz respeito à variação das famílias em condição de pobreza, que teve confirmado o aumento do número de famílias identificadas pela renda per capita mensal de até ½ salário mínimo entre 2010 e março de 2012 e uma pequena diminuição do número de famílias com renda mensal per capita mensal de até 140 reais.

Estes dados podem sugerir diversos elementos para o debate. Certamente o reconhecimento do aumento do número de famílias cadastradas e, consequentemente, o aumento de famílias reconhecidas na situação de pobreza, foi alcançado pelo empenho dos governos na busca ativa das famílias neste condição, que foi promovido há um ano pela Presidência da República. Será que este número revela de fato a situação de pobreza e o número de famílias nesta situação nos municípios e região?

Neste sentido, apresentam-se a seguir os dados da pobreza por município. Esta informação pode constituir-se em importante subsídio para o debate pela sociedade com governos municipais e, também, os candidatos aos novos governos, em vista de melhor reconhecer a realidade que se vive e a realidade que se quer alcançar em cada unidade da federação da região do Vale do Sinos.

Este debate pode ser ampliado com outras indagações. Será que o efetivo combate à miséria e a fome (ODM) passa somente pela condição da renda, uma vez que muitas das famílias estariam isoladas de outras urgências como serviços públicos, da oferta de empregos, políticas inclusivas? Como combinar, portanto, o enfrentamento à realidade de pobreza com o aumento dos benefícios com criação de oportunidades? Como potencializar as condicionalidades (contra-prestação das famílias) nas áreas de saúde, educação e assistência social revendo o caráter compensatório ou assistencialista de tais programas em vista de uma dimensão realmente emancipatória e fomentadora de possibilidades?

Neste sentido, a ampliação de recursos para os programas sociais, principalmente programas de combate e erradicação da fome e da miséria podem ser celebrados sim, mas também há um lado reverso a ser analisado. Se há necessidade de ampliar recursos para o combate é sintoma de que os objetivos de redução e erradicação não estão sendo atingidos. O aumento do número de famílias na linha da pobreza ou abaixo dela indica menos um crescimento populacional do que crescimento da desigualdade. Apresenta-se a sinalização que o crescimento da economia não corresponde o decrescimento das injustiças e desigualdades sociais, sugerindo ao contrário, o aumento dos “deserdados do progresso econômico”.

Estabelece-se, portanto a necessidade de reflexão sobre esta realidade, do como a mesma atinge a configuração em cada município e principalmente de como as medidas de mitigação ou solução dos problemas têm sido efetivadas. Por parte da sociedade civil em vista da participação cidadã, cada vez mais impõe-se a tarefa de empoderar-se das informações e dos meios em função de uma participação realmente efetiva nos destinos de cada realidade.

O Programa ObservaSinos entende essa percepção dos indicadores como uma ferramenta estratégica, tanto para alimentar o debate quanto para articular tal conhecimento com a intervenção na realidade que é contextualizada. É um desafio estar  atento aos indicadores, que fazem referência aos 14 municípios da região do Vale do Sinos e à sua totalidade, em vista da construção de outras práticas e políticas afirmadoras do desenvolvimento local e regional para toda a população do Vale do Sinos.