Posso ajudá-lo? Sobre os motivos que nos levam a ajudar os outros

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19 Março 2020

O teólogo italiano Roberto Mela, professor da Faculdade Teológica da Sicília, em artigo publicado por Settimana News, 18-03-2020, comenta o livro do teólogo Piero Stefani, intitulado Posso darti una mano? Sui motivi che ci spingono ad aiutare gli altri (Posso dar-te uma mão? Sobre os motivos que nos levam a ajudar os outros). A tradução é de Luisa Rabolini.

"Um forte motivo para não ajudar é hoje aquele do medo. Para Hanna Arendt, o máximo imperativo ético é: tentar entender. Se saber é poder (Bacon), para Stefani, o conhecimento do outro "é um dos antídotos mais eficazes para o medo, especialmente quando ocorre bilateralmente e, portanto, intrinsecamente respeitoso da subjetividade alheia".

Eis o artigo.

Escrito evidentemente antes da eclosão da pandemia por Covid19, o professor de Filosofia e Teologia na Faculdade Teológica da Itália Setentrional e na Universidade Estatal – bem como presidente da Secretaria de Atividades Ecumênicas, redator de Il Regno e grande especialista em judaísmo – investiga neste pequeno ensaio as várias razões que nos levam a nos colocar à disposição dos outros, com delicadeza e na ponta dos pés.

Ele inicialmente estuda o "como" e o "porquê" da vontade de ajudar os outros. Os dois comportamentos caminham juntos, já que a vida moderna não inclui apenas as relações interpessoais, mas também aquelas de dimensão mais ampla, que exigem competências e especializações para evitar confusão, danos e ineficiências.

Percorrendo a história do pensamento filosófico, Stefani identifica cinco razões que nos levam a ajudar os outros.

A primeira é "porque é conveniente", tanto no nível econômico quanto relacional. Passa-se da doutrina filosófica do utilitarismo até a concepção de que, cuidando de si mesmos, também se cuida dos outros. Todos nós dependemos dos outros e existimos apenas porque outros cuidaram de nós. Eu ajudo porque, se o outro estiver bem, eu também ganho (por exemplo, cliente-lojista ...).

A segunda razão é porque é evidente que há um movimento de compaixão ou de solidariedade que está presente no espírito humano. Varia do utilitarismo filosófico e prático à compaixão da filha de Faraó, que salva Moisés das águas, infringindo as normas emitidas pelo pai, até terminar com a compaixão sentida por Jesus e ensinada em suas esplêndidas parábolas.

A terceira razão para a possibilidade de ajudar os outros é dada pelo fato de que pode ser comandado pelos preceitos bíblicos ou pelos princípios jurídicos expressos nos primeiros artigos das melhores Constituições do mundo. Aquela italiana fala de "solidariedade" no art. 1. A Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, além da liberdade, lembra a igualdade "na dignidade" e direitos. Lembra a igual dignidade dos homens após as terríveis sequências de aberração humana expressas nas duas guerras mundiais e no Holocausto Stefani aborda as esplêndidas normas contidas no livro de Levítico 19,18.33-34, relativas ao estrangeiro no mandamento de amar os inimigos transmitido por Jesus.

Amar é operativo, não um sentimento. Amar é levar amor, realizar ações positivas que quebram a espiral de vingança, da aversão e do rancor, deixando o juízo para Deus. A realidade pode induzir a reconhecer a presença de disparidade entre os homens, o direito leva a trabalhar pela igualdade.

A quarta razão para ajudar os outros é dada pela radical e comum não autossuficiência da condição humana. Ninguém escolhe nascer, mas todos precisam de tudo e de todos para continuar vivendo.

A última razão é assim formulada por Stefani: "Para não expandir o mal presente no mundo". Ele afirma que isso também pode estar no coração do pessimista. O homem de fé Gino Girolomoni, um dos pais do cultivo orgânico, afirmava por sua vez: "Eu não penso que a agricultura orgânica salve o mundo, mas a pratico para não ficar do lado daqueles que destroem o mundo" (cit. na p. 100).

Minhas mãos tremem ao escrever isso. É o que é solicitado a todos nestas últimas semanas. Posso ajudar a mim e aos outros ficando em casa, distanciando-me as relações sociais, entrando em quarentena. Eu amo os outros ficando longe para não expandir o contágio. A vida de todos depende de mim, do meu comportamento.

Se - como Stefani observa na conclusão - hoje é difícil ajudar, pois são necessárias competências e especializações e pela repetitividade de situações de necessidade (uma pessoa pobre a cada vinte metros na rua ...), isso não deve induzir, “mais ou menos sutilmente, a esmaecer o âmbito que cabe ao envolvimento ético pessoal e tornar cada vez mais raro o encontro profundo entre as pessoas com base no componente espiritual" (p. 105-106), com o perigo de cair na acídia (expressão moral viciosa da doença da depressão) e na desresponsabilização moral e espiritual (cf. I. Illich, Pervertimento del Cristianesimo).

Um forte motivo para não ajudar é hoje aquele do medo. Para Hanna Arendt, o máximo imperativo ético é: tentar entender. Se saber é poder (Bacon), para Stefani, o conhecimento do outro "é um dos antídotos mais eficazes para o medo, especialmente quando ocorre bilateralmente e, portanto, intrinsecamente respeitoso da subjetividade alheia" (p. 111).

Sempre existe a possibilidade de oferecer com delicadeza ("Posso?") a própria disposição para ajudar ("dar-lhe uma mão"). Segundo o autor, "em sua dimensão profunda, o respeito contido naquele ‘posso’ constitui uma ajuda maior do que a operatividade expressa no ‘dar-lhe uma mão’" (ibid).

Podemos "dar uma mão". Nós e outros temos uma necessidade vital disso.

É com satisfação que damos uma mão com responsabilidade moral e social.

Às vezes na trincheira, às vezes apenas ficando em casa.

Distantes, mas próximos.

Piero Stefani, Posso darti una mano? Sui motivi che ci spingono ad aiutare gli altri (Lampi sn), EDB, Bolonha 2020, p. 120, 10,00 €, ISBN 978-88-10-56795-1.

 

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