16 Dezembro 2025
Há alguns dias, junto com um numeroso grupo de outros teólogos e teólogas (já somos mais de quinhentos), assinei um apelo em favor de uma colega (aqui), alvo de um ataque em um site que todos consideramos injustificado, ofensivo e pessoal, muito além dos tons de um confronto acadêmico.
O artigo é de Roberto Maier, teólogo, publicado por Settimana News, 14-12-2025.
Eis o artigo.
Não conheço pessoalmente essa colega, mas muitas vezes apreciei seu trabalho porque é lúcido e provoca reflexão, exatamente como uma teologia deveria fazer; ainda que eu não o tivesse apreciado, teria assinado do mesmo modo, porque pensar bem é um direito.
Como chegamos até aqui
Mobilizar-se nunca é, para mim, uma operação isenta de sofrimento, porque envolve — em todo caso — uma certa dose de violência, ainda que defensiva. Ao texto que subscrevemos seguiu-se uma reação de brutalidade incomum contra um dos primeiros signatários, com direito a assassinato de reputação e com a explícita proposta de eliminá-lo academicamente.
Antes de qualquer outra resposta, a pergunta de fundo é esta: como chegamos até aqui? Como aconteceu que um ambiente acadêmico, de estudo e reflexão, tenha chegado à militarização do discurso?
Trata-se, além disso, de um discurso de nicho, cujas oscilações interessam, no fim das contas, a poucos, e que é articulado em um ambiente composto por estudiosos e estudiosas que, ao menos na Itália, recebem menos do que um operador de call center (a publicação do salário bruto do referido teólogo, extremamente incorreta, mais do que provocar indignação, dá vontade de desistir).
A teologia é uma disciplina cuja história milenar nos impede de fantasiar tempos em que os teólogos estavam de acordo, em harmonia doutrinal e ideal: ela — como qualquer outra disciplina — nunca foi um lago tranquilo de montanha, mas sempre um mar revolto.
Desde quando o dissenso do pensamento se tornou uma vergonha? Se a teologia cristã atravessou a história, não foi porque detinha a chave, mas porque sempre soube interrogá-la: desde quando até mesmo as perguntas são uma afronta à verdade de Deus?
Minha pergunta é sincera porque, neste episódio, a verdadeira questão não é o tema de que se fala — o acesso das mulheres ao diaconato — que tem outra importância. Não tem nada a ver tampouco a tensão ancestral entre o magistério e a liberdade de pensamento. A essa tensão, que na história assumiu formas diferentes, o teólogo está acostumado: ele sabe bem que a referência ao ensinamento da Igreja e à sua tradição não é um acidente de percurso, mas parte integrante da epistemologia da teologia católica.
É nessa tensão que, há séculos, se geram pensamentos novos: graças à resistência e aos limites impostos à sua pesquisa, a teologia aprende a lidar com a história, com seus dramas, com a vida real. O teólogo sabe também que, descontados recorrentes (e odiosos) acidentes de percurso, a instituição possui uma capacidade de escuta de seu trabalho e de suas demandas, tanto mais eficaz quanto mais ele souber demonstrar sua pertença à comunidade daqueles que se colocaram na escola do Evangelho.
O dogma irrelevante
O episódio em questão, porém, configura um cenário novo — ao qual temo que teremos de nos acostumar — no qual os dogmas e as questões teológicas são totalmente secundários. Um cenário no qual a própria instituição eclesiástica — duramente criticada quando convém — é forçada a servir a segundos fins, é convocada para uma contenda que provavelmente tem dificuldade de reconhecer como sua e em relação à qual, em todo caso, não teve nenhuma intenção de usar artilharia pesada.
Quem se interessa seriamente pela história do magistério católico não pode deixar de reconhecer nisso uma orientação, não um descuido. Então, que mundo é esse (porque de um mundo se trata, e não de autores isolados ou sites da internet) que produz ataques violentos, apresenta exigências de censura e quer transformar a teologia em um campo de batalha?
Se olhássemos um pouco para fora do nosso quintal tranquilizador — que de repente se tornou inóspito — perceberíamos que esse cenário é comum a muitos outros vizinhos. Muitas disciplinas hoje são presas de mecanismos semelhantes: posições anticientíficas, teorias conspiratórias, acusações pessoais que geraram excomunhões cruzadas, exibição de armas e recrutamento de massas.
“We need you”, responderam climatologistas e virologistas, economistas e médicos, engenheiros e profissionais da informática. “We need you”, gritou ainda mais alto o mundo das conspirações. Que realidade pode empurrar à conflituosidade espaços que antes sabiam administrar o confronto, gerando um exército de homens e mulheres em uma luta sem quartel em torno de questões e temas tão diversos a ponto de serem, às vezes, até opostos, colocando em crise pensadores habituados, por profissão, ao confronto rigoroso?
Ernesto Laclau descreveu assim o fenômeno: a agregação improvável de insatisfações e demandas que “não compartilham nenhum conteúdo positivo, exceto o de permanecerem todas insatisfeitas” [1]. Ele chamou isso de razão populista. Se não esperávamos vê-la nos corredores austeros das faculdades de teologia, é apenas porque, como sublinhou com razão Marcello Neri (aqui), iludimo-nos em habitar lugares fechados e autorreferenciais. Mas a verdade é que nunca se escapa da época, mesmo quando se quer.
A pergunta seguinte — como podemos sair disso — ainda não tem resposta; mas sairemos: a inteligência e a exigência diante da verdade humana já enfrentaram inimigos bem mais perigosos. Podemos, porém, ao menos esboçar algumas sugestões práticas.
A razão populista
A primeira é que recrutar exércitos não é a melhor estratégia: esse tipo de luta simplifica as razões e corre-se o risco de imolar a ela qualquer tema. Assinei com gosto a carta escrita em defesa de Linda e fico feliz que tantos outros colegas o tenham feito, mas trata-se de operações emergenciais excepcionais, não de um método.
A segunda é que, infelizmente, o confronto teórico sobre os temas é totalmente irrelevante: buscar os argumentos mais fortes não serve para nada. Os lugares para pensar o diaconato de mulheres e homens, ou qualquer outra coisa, não são estes. Laclau percebeu bem que as razões da razão populista nunca cedem ao pensamento: como “não existe situação humana em que não haja algo de injusto”, ela, para criar consenso, pronuncia o termo justiça não tanto de modo “abstrato”, mas precisamente “vazio” [2]. Resolvida uma questão (se algum dia conseguíssemos fazê-lo), imediatamente surgiria outra.
A terceira é que o alinhamento só faz o jogo da razão populista. O populismo não é uma ideia, não corresponde a um partido, a um grupo ou a um exército: torna-se a tentação comum de agregar a partir do ressentimento. Por isso acaba se difundindo rapidamente em todos os campos. O sentimento de injustiça sofrida é universal, cada um de nós tem motivos para reclamar. Mas o que se deve negar é precisamente que esse ressentimento seja uma boa razão para construir um povo ou uma comunidade.
A paciência da comunhão
A única resposta à altura desse desagradável episódio (que, temo, não será o último e que talvez seja mais sério do que parece) é uma construção paciente da comunhão, isto é, de alianças fundadas não no vazio, mas em um cheio de pensamentos, encontros, diálogos e conflitos geradores.
A única resposta à altura do desafio, em suma, é a Igreja: aquele lugar em que a comunhão é preservada a todo custo no entrelaçamento complexo de ideias diferentes e de carismas distintos (a profecia e a instituição, por exemplo); talvez seja o momento de redescobrir que autoridades diferentes (como a teologia e o magistério) se fundamentam uma na outra.
Talvez seja o momento de repetir o quanto são necessários, para preservar a instituição, teólogos e teólogas capazes de um pensamento corajoso e o quanto é precioso, para eles, um magistério que saiba exigir do pensamento responsabilidade pela história comum. Não basta o respeito recíproco, é necessária a exigência da ágape e, com ela, aquela ternura que, sem ceder um centímetro na interpretação fiel do Evangelho e da época, saiba perdoar as precauções excessivas e as intuições visionárias, reconhecendo o bem, esse bem que move a ambos.
Há algum tempo, um querido amigo moscovita, hoje exilado há anos, relia o drama de seu país a partir da saga de Harry Potter. Ele me fazia notar que os “bons” (a Ordem da Fênix) não parecem uma falange armada: são lentos, aparentemente inconclusivos, desorganizados; mas resistem até o fim e nunca deixam um companheiro para trás. Os seguidores de Voldemort, ao contrário, estão sempre de acordo, respondem de forma compacta e não se detêm nem mesmo diante de seus mortos.
A retórica populista parece eficaz, é verdade, mas apenas enquanto destrói: a ela só se pode contrapor, sempre e somente, uma obra de comunhão.
Referências
[1] E. Laclau, A razão populista, Laterza, Bari, 2008, p. 91.
[2] Idem, ibidem.
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