O Ciclo de Estudos Decálogo sobre o fim do mundo discutiu, de modo transdisciplinar ao longo do primeiro semestre deste ano, os desafios que o Novo Regime Climático do planeta impõe às nossas formas de pensar, conceber e habitar o mundo. A programação do ciclo retomou e ampliou questões políticas, filosóficas e teológicas sobre a vida no antropoceno, considerando o ocaso e, em certo sentido, o fim/esgotamento da Modernidade.
No centro da crise, o sentido e a autorreferencialidade do ser humano em um mundo em que cada vez mais somos governados pelo que nos habituamos chamar de natureza. Trata-se, portanto, de um debate que leva em conta o deslocamento da política para a dimensão cosmopolítica. Repensar a condição humana diante do novo regime climático e a ameaça da sexta extinção em massa, justamente da espécie humana, foram os pontos iniciais da discussão aqui proposta.
O conjunto de conferências realizadas neste ciclo de estudos nos levou a concluir que o Antropoceno, este “fim do mundo”, demanda sobretudo um olhar multifocal, caleidoscópico, multi-inter-transdisciplinar e democrático. A “pegada antrópica” no planeta Terra tomou tal proporção que transbordou os sistemas subjacentes à tecnosfera e à antroposfera (sistemas políticos, econômicos, religiosos, culturais, etc.) e passou a reverberar intensamente pelas mais sutis redes de organismos e elementos pertencentes à geosfera e à biosfera.
As consequências da marcha da modernização, em especial do progresso técnico-científico ocidental(izante) urbe et orbis acachapou a humanidade em uma espiral de crises e as falas dos conferencistas não só diagnosticaram as possíveis causas destes ocasos como também se propuseram a encontrar alternativas para as adversidades socioambientais que se avultam no cotidiano.
A exposição do professor José Ángel Quintero Weir, membro do povo Añuu e professor na Universidade Autônoma Indígena UAIN – Wainjirawa, ilustra, por meio do perspectivismo ameríndio e sua história dos povos que habitam as redondezas do Lago Maracaibo, como a construção das sociedades ocidentais, especificamente aquelas de matriz eurocêntrica, é indissociável das pulsões de morte e obliteração de sistemas naturais e culturais alheios aos seus ideais.
Nas palavras de Weir, “o homem branco decide que a Terra é apenas uma coisa apropriável para seu benefício exclusivo, um piso onde ele pode elevar seu poder sobre todas as outras comunidades e sobre a própria Terra e, por isso, ele é capaz de intervir e violá-la, quebrando o território de todas as comunidades”. Este comportamento sintomático só pode ser combatido com um grande esforço axiológico, uma reestrutura e até substituição de valores ligados ao crescimento econômico, ao que se entende sobre civilização e ao progresso e prosperidade de uma sociedade/comunidade.
Segundo Weir, precisamos lutar no sentido de redefinir o nosso “estar-no-mundo” e fazer dele uma “busca permanente de um horizonte ético sobre o qual precisamos nos construir e, por isso, devemos encorajar dia a dia a cada um dos membros e a comunidade em geral em virtude de e em função de poder andar como a Terra anda e nunca contra ela”.
O texto preparado pelo professor para a conferência foi integralmente traduzido e publicado no formato dos Cadernos IHU Ideias:
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Dentro do debate sobre perspectivismos surgem novas questões: como podemos conciliar tantos ideais de mundo, tantas ideações sobre a Terra e como devemos conduzir nossas sociedades? Para o antropólogo Mauro Almeida, “a coexistência de múltiplos mundos depende da reabilitação das noções de verdade e razão”. Segundo ele, “é possível adotar uma visão antropológica da existência de múltiplos mundos em que habitamos e múltiplos modos de conhecer e, ao mesmo tempo, estar em acordo sobre verdades pragmáticas, que são verdades em um sentido pragmático". E estas verdades hoje estão na imposição dos efeitos socioambientais do Antropoceno em nossas vidas. A mutação climática, os desastres ambientais que surgem dela, o aumento da insegurança alimentar e a insustentabilidade de sistemas produtivos e consumistas baseados na extração, exploração e desmatamento da biosfera são manifestações pragmáticas de que é preciso rever nossos modos de (con)viver no planeta.
No entendimento de Almeida, “o fenômeno do antropoceno seria um exemplo de uma situação global, mundial, descrita por um consenso científico – entendido aqui como uma maioria e não uma unanimidade porque há várias variantes dentro disso – que é a base para um projeto de aliança política, convocando todos os povos do planeta a uma luta contra os efeitos catastróficos do antropoceno, em particular às mudanças climáticas associadas ao antropoceno".
Mauro Almeida é doutor em Antropologia Social (Universidade de Cambridge, 1993), mestre em Ciência Política (1979) e graduado em Ciências Sociais pela Universidade de São Paulo – USP. Membro permanente do Departamento de Antropologia da Universidade Estadual de Campinas. Áreas de pesquisa: Amazônia, reservas extrativistas, comunidades tradicionais, e teoria antropológica. Participou da criação da reserva extrativista do Alto Juruá, e do planejamento da Universidade da Floresta (Universidade Federal do Acre). Publicou artigos em Current Anthropology, Journal for Latin-American Anthropology e outras revistas especializadas. É coautor do livro "A enciclopédia da floresta. O Alto Juruá: prática e conhecimentos das populações, em com Manuela Carneiro da Cunha".
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Um dos efeitos mais significativos desta “era antropocêntrica” foi a eclosão, poucos anos atrás, da pandemia de Covid-19. A velocidade e intensidade de contaminação e a quantidade de pessoas afetadas por esta zoonose levantou questionamentos importantes sobre a destruição humana das barreiras geográficas naturais, sistemas econômicos extrativos e hiperglobalizados, a relegação e subfinanciamento de direitos (humanos e sociais) básicos como a saúde e a educação e a incapacidade, prevaricação ou morosidade dos sistemas políticos frente aos novos desafios sanitários e socioambientais.
Entretanto, os efeitos da pandemia não represaram apenas nos sistemas socioeconômicos e ambientais, mas também transpassaram para as dimensões psicossociais. A biofobia, o medo do mundo biológico, em especial destes organismos invisíveis prejudiciais à saúde humana, disparou no comportamento das pessoas e, por um lado, dificultou o entendimento da população sobre questões "ecológicas" e um possível caminho de reconciliação entre o “homem e a natureza”.
O professor Eben Kirksey buscou contornar esta situação ao apresentar a importância da virosfera (a esfera dos vírus) na manutenção da nossa própria vida. Segundo ele, temos uma relação muito íntima e constante com vários tipos de vírus e microrganismos que ajudam na manutenção do funcionamento saudável do nosso corpo. “Habitar a virosfera significa viver com mistérios multiespécies. Simbiose significa, literalmente, ‘viver junto’, e parceiros simbióticos podem ter efeitos bons, ruins, pluripotentes sobre os hospedeiros”, comenta Kirksey. O mais importante, segundo ele, é entender que a natureza humana é o produto de relações interespécie e que, por isso mesmo, é preciso incentivar na população a biofilia, o amor pelo mundo biológico.
A palestra completa pode ser acessada nos Cadernos IHU Ideias edição 333:
Eben Kirksey é um antropólogo americano que escreve sobre ciência e justiça. Ele é mais conhecido por seu trabalho pioneiro em "etnografia multiespécies" – uma abordagem para estudar as interações humanas com animais, plantas, fungos e micróbios. Eben tem uma curiosidade insaciável sobre natureza e cultura. Investigar algumas das histórias mais importantes do nosso tempo – relacionadas à biotecnologia, meio ambiente e justiça social – o levou à Ásia, ao Pacífico e às Américas. Quando estourou a controvérsia sobre os primeiros bebês geneticamente modificados do mundo, Eben falou sobre ética no palco principal da Cúpula Internacional sobre Edição do Genoma Humano, em Hong Kong. Mais tarde, ele viajou para a China continental, onde aprendeu sobre as esperanças queer e os desejos impuros que animaram esse experimento com o CRISPR-Cas9. Atualmente é professor no Alfred Deakin Institute, em Melbourne, onde estuda a virada química nas humanidades e a circulação de vírus em mundos multiespécies.
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Anna Tsing é professora de antropologia na Universidade da Califórnia, Santa Cruz. Estudou na Yale Universidade (bacharel, 1973) e na Universidade de Stanford (mestrado, 1976; doutorado, 1984). Ao receber seu doutorado, atuou como professora assistente visitante na Universidade do Colorado (1984-86) e como professora assistente na Universidade de Massachusetts, Amherst (1986-89), antes de ingressar no corpo docente da Universidade Católica de Santa Cruz. Ela também foi professora visitante na Universidade de Chicago, na Universidade de Harvard e na Universidade de Aarhus, na Dinamarca. Em 1994-1995, foi membro do Instituto de Estudos Avançados, em Princeton. É membro da American Anthropological Association, da American Ethnological Society e da Association for Asian Studies.
Além de mais de quarenta artigos, publicados em revistas como Cultural Anthropology e Southeast Asian Studies Bulletin e em inúmeras antologias, Anna Tsing é autora de dois livros, ambos publicados pela Princeton University Press, intitulados: In the Realm of the Diamond Queen (1994), que ganhou o Prêmio Henry J. Benda em Estudos do Sudeste Asiático, e Friction: An Ethnography of Global Connection (2005), que a Sociedade Etnológica Americana homenageou com o Prêmio de Livro Sênior. Friction tornou-se um texto padrão em seminários de pós-graduação em geografia, sociologia, teoria crítica, estudos feministas, estudos ambientais e economia política, entre outras áreas.
Ela também coeditou cinco antologias, incluindo Communities and Conservation: Histories and Politics of Community-Based Natural Resource Management (com J. Peter Brosius e Charles Zerner) (Altamira Press, 2005) e, mais recentemente, Words in Motion: Towards a Global Lexicon (com Carol Gluck) (Duke UP, 2009). Entre seus livros mais conhecidos, destacam-se: The Mushroom at the End of the World (Princeton University Press, 2015), O bem viver: uma oportunidade para imaginar outros mundos (Autonomia literária, 2016) e Arts of Living on a Damaged Planet: Ghosts and Monsters of the Anthropocene (University of Minnesota Press, 2017).
As relações interspécie também foram expostas na fala da antropóloga Anna Tsing. Com seu projeto intitulado “Atlas selvagem”, esta pesquisadora busca ilustrar como a vida não humana se adapta, convive e reage/responde aos projetos humanos de infraestrutura (artificialização de paisagens).
“O projeto digital colaborativo Atlas Selvagem: O Antropoceno-Mais-do-que-Humano reúne 79 relatórios de campo sobre os efeitos selvagens da construção de infraestrutura, ou seja, sobre projetos que mudaram as paisagens terrestres, aquáticas e aéreas. Oferecemos vários eixos com os quais é possível explicar a proliferação de ecologias selvagens perigosas junto com infraestruturas do antropoceno. Esses relatórios são a entrada de uma “ciência do fracasso” para o antropoceno. O nosso projeto não é apenas uma coletânea; é uma estrutura analítica que vocês poderão usar para pensar nos seus próprios projetos de design”, comenta Tsing.
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O diálogo e construção coletiva entre os saberes da engenharia (as ciências duras), as quais se utilizam majoritariamente de métodos positivistas, matemáticos e estatísticos (com certa previsibilidade); as ciências naturais; e os conhecimentos dialéticos das humanidades é um esforço empreendido no projeto de Anna Tsing que coaduna com a proposta epistemológica das ciências do Sistema Terra, apresentada pelo pesquisador José Corrêa Leite.
José Correa Leite é graduado em História pela Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (1979), mestrado em Ciências Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (1998), doutorado em Ciências Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (2005) e pós-doutorado em Filosofia pela Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (2015). É, desde 1998, professor da Faculdade de Comunicação da Fundação Armando Álvares Penteado – FAAP. Suas principais linhas de trabalho são: filosofia da ciência, sociologia da comunicação, ecologia e política. Integra o Coletivo 660, constituído pelos animadores do Fórum Social Mundial. Impulsiona a Assembleia Mundial pela Amazônia e também o Diálogo Global por Alternativas Sistêmicas.
Para superarmos o modo como o desenvolvimento tecnocientífico foi concebido nos últimos três séculos, Leite propõe o exercício de “entender o mundo de outra maneira. Os múltiplos conhecimentos são todos importantes, mas a forma de conhecimento legitimada ao longo dos últimos séculos, que chamamos de ciência, tem que ser redefinida. Isso não se faz do zero, mas a partir de potencialidades que estavam colocadas desde sua formação. A ciência foi portadora de uma revolução, mas temos que demarcá-la: a ciência experimental que surgiu no século XVII é uma construção eurocêntrica, vinculada a um sistema econômico, social e político originário da Europa e que se impôs sobre o mundo. O pensamento decolonial é fundamental, mas precisamos lidar com a dinâmica de conjunto estabelecida no planeta: há uma multiplicidade de saberes alternativos e há um saber dominante que tem contradições com as quais precisamos saber lidar. Isso é fundamental para qualquer projeto de alternativa social e política".
A finitude do planeta e seus elementos essenciais para a reprodução da vida humana e a infinidade do projeto crescimentista capitalista é “uma armadilha civilizacional que vai explodir de alguma maneira em algum momento. As ciências do Sistema Terra foram, de certa maneira, o conhecimento que permitiu diagnosticar a grande crise civilizacional na qual estamos metidos”.
Saiba mais sobre o papel do desenvolvimento técnico-científico, sua relação com o modo de produção capitalista e os desafios a serem enfrentados no contexto de mutação climática:
Algumas causas no diagnóstico desta “armadilha civilizacional” foram apontadas nas conferências dos pesquisadores Dr. Anselm Jappe e Dr. Antonio Turiel. Em sua análise, Jappe assevera que “as críticas ao sistema capitalista não podem se limitar a chamar a atenção para o fato de que este sistema econômico gera uma injustiça social enorme porque joga a maior parte da população na miséria e favorece apenas um seleto grupo de indivíduos. Neste aspecto, as sociedades anteriores, escravagistas ou feudais, eram sociedades que, do ponto de vista da distribuição injusta e desigual da atividade social, não deviam nada ao capitalismo.
O ponto essencial da crítica, disse, deve concentrar-se no aspecto "destrutivo e autodestrutivo do capitalismo”. E elucida ao comentar que “os aspectos mais visíveis da autodestruição do capitalismo são o aquecimento global, a nova extinção dos seres humanos ou o esgotamento dos recursos naturais da vida". Na interpretação dele, o fenômeno que está por trás da mudança climática e da crise ecológica não é o antropoceno, mas, sim, o "capitaloceno". "Não é o homem enquanto tal que é um destrutor natural das sociedades, ou seja, é preciso falar de um capitaloceno: é depois que a humanidade entrou na sua fase capitalista que houve uma desregulação e um desequilíbrio irreversível da estrutura biológica e mesmo geológica da Terra".
Anselm Jappe é um filósofo e ensaísta nascido na Alemanha. Fez seus estudos na Itália e na França, onde vive atualmente. Além de inúmeros artigos nas revista alemã Krisis, é autor do livro Guy Debord sobre a vida e a obra do pensador e ativista francês (publicado no Brasil pela Vozes).
Recentemente, Jappe publicou os livros A sociedade autofágica (Elefante) e Betão (Antígona). Também escreveu As aventuras da mercadoria (Lisboa: Antígona) que reconstrói a trajetória filosófica e política da crítica do valor. Outras publicações de Jappe são os títulos "Violência, mas pra quê?" e "Crédito à morte", ambos construídos com ensaios publicados por ele em revistas francesas. Esses títulos foram publicados em português, no Brasil, pela editora Hedra.
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Na esteira dos sintomas do antropoceno/capitaloceno, Antonio Turiel rabisca um futuro distópico e não muito distante onde a questão energética passará a ser o centro de toda a agenda geopolítica e econômica. Segundo Turiel, "estamos em uma situação de descenso energético incomparável e inevitável; é um problema fundamentalmente termodinâmico e geológico e vai seguir se estendendo."
A crise do sistema energético baseado em energias fósseis, como petróleo, carvão e urânio entrará na “Era do Descenso Energético”, comenta Turiel, onde “não haverá energia para todos. Não como antes. A Era do Descenso Energético não seria um mar de rosas, e sabíamos disso. Que de repente as fontes de energia não renováveis (petróleo, carvão, gás natural e urânio) que nos fornecem quase 90% da energia primária consumida no mundo comecem a diminuir não é um bom presságio. Falávamos de recessão, de desemprego e até de tumultos. Mas está ficando cada vez mais claro que também se tratará de mais guerras. Guerras para tentar aproveitar os recursos vitais e guerras para ajudar, mas que o outro vá para o inferno”.
Antonio Turiel é doutor em Física Teórica, especialista em oceanografia e pesquisador do Conselho Superior de Investigações Científicas – CSIC. Recentemente publicou o livro El otoño de la civilización (Escritos Contextatarios, 2022).
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O aumento das tensões geopolíticas e o recrudescimento dos sistemas políticos cada vez mais voltados à grupos extremados e autoritários estão provocando o que Andrea Grillo chamou de fratricídio. Este caminho, no entendimento de Grillo, é catastrófico, pois é através da fraternidade que dois grandes valores societários podem ser conciliados: liberdade e igualdade. Nas palavras do professor: “O termo fraternidade introduz uma dinâmica ‘genealógica’ no imediatismo suspeito da liberdade e da igualdade e nos leva a refletir mais profundamente sobre as condições e os destinos fraternos da liberdade e da igualdade. Uma diferença reconciliada: esta é a vocação à fraternidade que visa resolver as inevitáveis tensões que a liberdade e a igualdade introduzem na sociedade. Se cada um é diferente (exatamente por ser reconhecido como livre) e se todos são iguais apenas fraternalmente, a história poderá ser direcionada não para o desastre, mas para a paz”.
Andrea Grillo é filósofo e teólogo italiano, leigo, especialista em liturgia e pastoral. Doutor em teologia pelo Instituto de Liturgia Pastoral, de Pádua, é professor do Pontifício Ateneu Santo Anselmo, de Roma, do Instituto Teológico Marchigiano, de Ancona, e do Instituto de Liturgia Pastoral da Abadia de Santa Giustina, de Pádua. Também é membro da Associação Teológica Italiana e da Associação dos Professores de Liturgia da Itália.
Entrevistas com Andrea Grillo publicadas no IHU
Artigos de Andrea Grillo publicados no IHU
André Wénin é graduado em filologia clássica, é biblista exegeta, teólogo, doutor em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma. Atualmente é professor emérito da Universidade Católica de Louvain, na Bélgica, foi professor visitante em teologia bíblica na Universidade Gregoriana, em Roma, e foi diretor e secretário da Rede de Investigação em Análise Narrativa de Textos Bíblicos – RRENAB.
Na argumentação proposta por Wénin, o debate gira em torno de definir o que é, de um lado, o ser humano e, de outro, a natureza, e qual é a relação existente entre os dois. Enquanto alguns teóricos compreendem a relação entre ser humano e natureza a partir da prevalência de um sobre o outro, e outros propõem uma completa unidade e inseparabilidade entre ambos, o teólogo escolhe uma terceira via a partir da leitura bíblica: "situar os seres humanos em um lugar apropriado na natureza", o que significa "sublinhar a profunda continuidade entre a natureza e eles, ao mesmo tempo em que honram a singularidade que caracteriza os seres humanos na natureza".
Entrevistas realizadas pelo IHU com André Wénin
Artigos de André Wénin reproduzidos no IHU
É buscando alternativas que contornem a catástrofe como destino inevitável que as falas dos professores Dr. Felwine Sarr, Dr. Renato Sztutman, Dr. Mateus Uchôa e Dra. Juliana Fausto se tornaram essenciais para o debate proposto pelo ciclo.
Se o mundo no qual vivemos já não tem mais solução – e talvez essa seja uma boa notícia –, cabe a nós pensarmos outros mundos possíveis, tanto melhor será quanto mais inclusivos o construirmos. “As alternativas se apresentam nas comunidades do mundo que ainda conservam uma relação com o mundo material em outros moldes – onde o Estado é até dispensado e a terra é vista como parte integrante da organização social e tida como local de onde emana a autonomia política, econômica e social, a despeito da megamáquina do capitalismo de consumo e produção 24 horas por dia. Sociedades que não se preocupam com a possibilidade de um futuro melhor, mas que se baseiam no presente, e tentam fazer dele o melhor possível”, ressalta o Dr. Alexsandro Elias Arbarotti.
Alexsandro Elias Arbarotti é pós-doutorando no Laboratoire Eau, Environnement et Systèmes Urbains – LEESU, na École des Ponts ParisTech. Doutor pelo Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal de São Carlos com bolsa da FAPESP (2018); bolsista de Estágio de Pesquisa no Exterior (FAPESP) no Laboratoire Dynamiques sociales et recomposition des espaces (França, 2016).
Mestre em Sociologia pelo Programa de Pós Graduação em Sociologia da Universidade Federal de São Carlos (2014); graduado em Ciências Sociais pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (2011); graduado em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arquidiocese de Ribeirão Preto (2004). Pesquisador do Centro de Pesquisa e Estudos Agrários (CPEAA) e membro do Grupo de Pesquisa Ruralidades, Ambiente e Sociedade (RURAS/UFSCar). Tem experiência na área de Sociologia, com ênfase em Sociologia Rural, atuando principalmente nos seguintes temas: movimentos sociais de luta pela terra, questão agrária, questão ambiental, água e recursos hídricos, geração e assentamentos rurais de reforma agrária.
Ao elaborar uma conferência sobre “Afrotopia, Ética e Economia”, Felwine Sarr abre com a seguinte provocação: o que é uma economia para a vida?. Para este pesquisador, como primeiro passo, é preciso alimentar a “necessidade de repensar e reiventar todas as formas de vida e resgatar a consciência utópica em relação ao futuro e ao porvir, não no sentido de simplesmente se limitar à consciência utópica, mas, sim, traduzi-la em mudanças societais".
“A abertura necessária para o futuro depende da elaboração de uma ‘economia do ser vivo’ que tenha como finalidade todas as formas de vida e seja, igualmente, uma resposta à crise ecológica. Como repensar uma economia cuja finalidade inclui não só os humanos, mas toda a ordem do vivente em seu conjunto? Isto é, no mesmo movimento que responder às necessidades do ser humano, responder às necessidades dos seres vivos e favorecer a regeneração dos recursos".
Felwine Sarr possui doutorado em Economia pela Universidade de Orléans (França). Atualmente é professor de Estudos Românicos, na Cátedra Anne-Marie Bryan, na Duke University, na Carolina do Norte. Foi professor na Universidade de Gaston Berger, em Saint Louis (Senegal), na qual, em 2011, ficou responsável pela faculdade de Economia e Gestão e criou o Centro de Investigação em Civilizações, Religião, Arte e Comunicação (CRAC), onde ensina Economia Política, Economia do Desenvolvimento, Econometria, Epistemologia e História das Ideias Religiosas.
Se todos os seres vivos devem ser considerados como agentes dos sistemas político-econômicos, Juliana Fausto ousa em dizer que “sim, bicho faz política”. “Embora a política tenha sido exclusiva daqueles propriamente humanos, ela está no mundo. Há muito mais agentes envolvidos, embora eles estejam excluídos desse pensamento majoritário ou dessas definições”, aponta.
Juliana defende que “a política diz respeito a muito mais agentes, muito mais seres do que se costuma afirmar”. Seu objetivo é “retrabalhar a noção de política, pensando que existem outros humanos e outros seres, prestando atenção aos animais na construção dessas políticas”. Para tanto, sai da ideia deleuziana de devir animal, que é quando algo passa do animal ao humano e/ou do humano ao animal, para a perspectiva da filósofa Vinciane Despret. “O ‘devir com animais’, no conceito da Despret, que é desenvolvido pela Donna Haraway, é a ideia de que você não ‘devém’ de um animal, ou seja, não gera algo a partir dele, mas sim ‘com’ o animal”, explica.
Juliana Fausto possui graduação em Filosofia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2001), mestrado em Letras pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (2012) e doutorado em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (2017). Atualmente é pós-doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Filosofia da Universidade Federal do Paraná, com bolsa PNPD/CAPES, onde atua como professora visitante, ministrando disciplinas nos níveis de Graduação e Pós-Graduação em Filosofia. É autora do livro Cosmopolítica dos animais, publicado pela editora N-1, em 2020. Atualmente, a edição está sendo traduzida para o espanhol pela editora argentina Editorial Cactus.
O professor e filósofo Mateus Uchôa contribuiu para este debate ao apresentar os conceitos de multinaturalismo como a abordagem que “não define a vida nos termos exclusivistas da vida social e política humana, mas que, ao mesmo tempo, não toma o que a tradição entende como natureza como um organismo, uma realidade objetiva exterior compartilhada por qualquer cultura ou qualquer organismo”. Segundo ele, em contraposição à metafísica clássica, em que o "acesso específico ao mundo seria somente próprio ao homem", o multinaturalismo advoga que o acesso ao mundo "é democratizado politicamente para as outras espécies, não só atores biológicos, mas abióticos, e o próprio mundo em uma perspectiva geológica ou geontológica. (...) Se trata aqui de nova reflexão metafísica, filosófica, não do ponto de vista do grande fundamento, mas, sim, um pensamento que não se guia pela ideia de substância, mas que vai se modular muito mais em termos éticos do que propriamente ontológicos".
Mateus Uchôa é bacharel e mestre em Filosofia pela Universidade Federal do Ceará (UFC). É também mestre em Artes pelo PpgArtes da UFC. É doutor em Filosofia pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) na linha de Estética e Filosofia da Arte com pesquisa sobre os mundos animais e os limites do anthropos. Tem interesse em Filosofia da Natureza; Pluralismo Ontológico; Pensamento Ameríndio; Multinaturalismo; Estudos Multiespécies; Virada Ontológica na Antropologia; Estética e Pensamento Decolonial; Ecologia e Experiência Sensível; Cosmopolíticas e Questão Ambiental no Antropoceno.
Para tanto, é necessário que a Academia também reflita sobre seu modo de interpretar o planeta, pontuando que “fazer ciência” é, sobretudo, experimentar, especular e imaginar e, nas palavras do professor Renato Sztutman “o pensamento especulativo não é abstração, é alternativa para resistir ao Antropoceno”. Segundo ele, “a própria Isabelle Stengers mostra que o desafio para a antropologia não é pensar simplesmente na ideia de que existem diferentes culturas para uma mesma natureza, mas pensar um esforço diplomático capaz de colocar em conexão formas diferentes de estabelecer o que seria natural”, pontua. E, com isso, coloca em diálogo outros autores e um axioma importante do pensamento moderno: a humanidade. “É a espécie humana tal como tendem a pensar os modernos ou seria uma virtualidade antropomórfica universal, o que, segundo o Viveiros de Castro, pensariam os povos ameríndios?”
Renato Sztutman é professor do Departamento de Antropologia da Universidade de São Paulo. É mestre (2000) e doutor (2005) em Antropologia Social pela USP, área de etnologia indígena. Realizou pós-doutorado, em 2015, no Departamento de Filosofia da Universidade de Paris Ouest Nanterre. É pesquisador do Centro de Estudos Ameríndios (CEstA-USP) e do Laboratório de Imagem e Som em Antropologia (LISA-USP). Foi editor responsável, entre 2013 e 2017, da Revista de Antropologia (Depto. de Antropologia da USP). Foi um dos fundadores e co-editou, entre 1997 e 2007, a revista Sexta-Feira. Seus principais temas de pesquisa são: cosmopolíticas ameríndias, fronteiras entre antropologia e filosofia, antropologia e cinema