12 Junho 2025
"A narrativa de Vian-Vecchi parte, no entanto, do contexto dos séculos anteriores para possibilitar uma melhor compreensão da complexidade da questão que estava no centro de Niceia, que se tornou o estuário de um percurso, ou melhor, "o divisor de águas" da história do cristianismo, não apenas em nível dogmático, mas também epistemológico", escreve Gianfranco Ravasi, ex-prefeito do Pontifício Conselho para a Cultura, em artigo publicado por em Il Sole 24 Ore, 08-06-2025. A tradução de Luisa Rabolini.
Além de Ário. Giovanni Maria Vian e Gian Guido Vecchi oferecem uma narrativa envolvente do Concílio de 325, partindo do contexto dos séculos anteriores para melhor compreender a complexidade da questão que estava no centro de Niceia.
Ao ouvir a palavra "ariano", a reação espontânea de muitos remete ao programa racista nazista e fascista que expurgava desse brasão de nobreza os judeus e as etnias considerados inferiores à tipologia pura europeia, caracterizada também fisicamente por pele branca, olhos azuis e cabelos loiros. Esse termo, de fato, deriva do sânscrito ariyà, "senhor", e era aplicado à identidade indo-europeia.
"Ariano", no entanto, em um nível cristão histórico, refere-se a um sacerdote líbio, Ário, que havia sido o porta-estandarte de uma "heresia" cristológica, como atesta a maldição manzoniana: "São demônios, são arianos, são anticristos" (Os Noivos, XXIX).
A arena onde se travou a batalha teológica que levou à condenação das teses desse personagem, aliás apoiado por 17 bispos, foi uma cidade da atual Turquia, Iznik, a cerca de cem quilômetros de Istambul, mas conhecida pelo antigo nome de Niceia, topônimo que faz vibrar os teólogos e que foi celebrado este ano por ocasião do aniversário de um concílio ocorrido há 17 séculos. No passado, também eu me propus a visitar essa memória cristã, parando na igreja de Santa Sofia (hoje um museu) em frente às pinturas murais da abside: a lembrança, porém, ia para um concílio posterior, o de Niceia II, celebrado naquele templo em 787, particularmente importante para mim por sua condenação ao iconoclasmo e, portanto, pela restauração da legitimidade da arte cristã figurativa.
Deixemos, no entanto, a atual Iznik, localizada nas margens de um lago, com seu duplo anel de muralhas e as antigas casas otomanas de madeira projetando-se para fora, para retornar àquele concílio, fundamental na história da fé eclesial, convocado pelo imperador Constantino, que assumia – como no classicismo pagão – também o manto sagrado de pontifex maximus. Ele havia aparecido como o salvador do cristianismo após a terrível perseguição de Diocleciano e Galério e com sua supremacia sobre Maxêncio na agora famosa batalha da Ponte Mílvia, em Roma, em 28 de outubro de 312. Ele teria contado também com um ideal cantor de suas façanhas, o maior intelectual da época, o historiador Eusébio, bispo de Cesareia. Seria ele a compor aquela Vida de Constantino que nos permite idealmente entrar no Concílio de Niceia, onde, segundo Hilário de Poitiers, nada menos que 318 bispos se reuniriam, mas sem o bispo de Roma, o Papa Silvestre. Na verdade, a nos guiar agora para participar desse evento é – entre os muitos ensaios do passado – um sugestivo livro escrito em parceria, com o objetivo de demonstrar “como o Concílio de Niceia mudou a história”. O texto não é apenas significativo, mas também muito agradável de ler.
De fato, o rigor da documentação histórico-teológica é garantido por um refinado estudioso do cristianismo primitivo, Giovanni Maria Vian, que também foi diretor do Osservatore Romano de 2007 a 2018; mas na redação teve como coautor um jornalista de alto nível como Gian Guido Vecchi, vaticanista para o “Corriere della Sera”, de modo a tornar essas páginas quase uma narrativa empolgante. Cria-se, assim, a possibilidade de o leitor sentir-se quase no auditório daquele concílio, inaugurado em 20 de maio de 325 e encerrado possivelmente em 19 de junho, após a aprovação de vinte cânones.
Houve duas etapas: na primeira, a doutrina de Ário foi declarada heterodoxa e, na segunda, foi aprovado o Credo, que ainda hoje é professado todos os domingos na liturgia (a tentativa de chegar a um acordo sobre a data comum da Páscoa, no entanto, fracassou).
A narrativa de Vian-Vecchi parte, no entanto, do contexto dos séculos anteriores para possibilitar uma melhor compreensão da complexidade da questão que estava no centro de Niceia, que se tornou o estuário de um percurso, ou melhor, "o divisor de águas" da história do cristianismo, não apenas em nível dogmático, mas também epistemológico. De fato, a formulação teológica recorreu à instrumentação linguística da cultura grega helenística. Por essa razão, o capítulo intitulado justamente "divisor de águas" é fundamental para o enredo do ensaio e se vale de um esquema hermenêutico duplo de matriz "laica", utilizado em outros ambientes.
Por um lado, há a tese de Thomas Kuhn, filósofo da ciência, segundo a qual o conhecimento avança por meio de paradigmas que podem ser descontínuos entre si. Esta, em relação a Niceia, era a tese do famoso teólogo Hans Küng em seu Cristianismo (BUR 1999): ele via naquele concílio uma inversão de viés helenístico em relação à doutrina cristã anterior de abordagem bíblica e judaica. Por outro lado, os nossos autores recorrem a Karl Popper, que considera o processo de conhecimento tendencialmente em continuidade, ainda que por meio de conjecturas e refutações sucessivas. Vian e Vecchi optam justamente por essa segunda interpretação da doutrina de Niceia, na linha evolutiva da doutrina tradicional. À margem, lembramos que essas duas visões em contraponto também foram adotadas para julgar o legado do Concílio Vaticano II; portanto, será interessante acompanhar também o capítulo “Niceia depois de Niceia”.
Neste ponto, porém, devemos, em síntese extrema (e resumida), expor a tese de Ário, objeto da disputa. Para salvaguardar a unicidade e a transcendência de Deus, ele havia excluído Cristo da divindade, rebaixando-o a criatura, ainda que com um status e uma primazia exclusivos. Muito diferente será a ortodoxia cristológica nicena que – como professa o Credo em sua formulação mais ampla – reconhece “Jesus Cristo, Filho unigênito de Deus, nascido do Pai antes de todos os séculos, Deus de Deus, luz da luz, Deus verdadeiro de Deus verdadeiro, gerado, não criado, consubstancial ao Pai”. É a norma que ainda hoje, após 1.700 anos, regula a fé do cristianismo.