26 Abril 2025
A missão do Papa Bergoglio já estava escrita no nome que ele escolheu na noite de 13-03-2013, quando o conclave o elegeu. O filósofo Massimo Cacciari parte daí, dessa referência ao santo poverello de Assis, para refletir sobre o papel e o legado do pontífice que acaba de falecer “É único: nenhum papa havia se referido diretamente a Francisco antes. Certamente não foi uma escolha aleatória”.
A entrevista é de Francesca Schianchi, publicada por La Stampa, 23-04-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
O que queria significar?
Ele queria se referir ao gesto mais revolucionário da história da Igreja: feito não por um herege, mas precisamente por uma pessoa dentro da Igreja. O gesto daquele que, como Giotto retratou, sustenta o Latrão, que está desmoronando.
O que também acabou acontecendo com o Papa Francisco?
É como dizer: estou ciente de que a Igreja está desmoronando e é necessário um Francisco: não uma restauração, mas uma reforma radical. Isso é implícito.
Está se referindo ao fato de que ele foi eleito num momento de escândalos e corvos, após a amarga renúncia de Bento XVI?
Havia escândalos, é claro, mas havia infinitamente mais: a incapacidade da Igreja de pregar o Verbum no mundo. Não apenas um problema de costumes, mas da missão da Igreja no mundo, que estava e está em evidente crise.
Se você diz que ainda está em crise, isso significa que a tentativa de reforma do Papa Francisco fracassou?
O Papa Francisco iniciou uma revolução, com gestos decisivos e precisos, começando pela escolha dos prelados, bispos e cardeais. Mas tudo está em andamento, não há certeza de que será bem-sucedido. E, enquanto isso, o processo de descristianização do mundo ocidental continua.
O que entende por descristianização do mundo ocidental?
Vivemos em um mundo que se esqueceu de Cristo, e digo isso como um não crente. Não há mais nem mesmo uma referência hipócrita à tradição cristã: isso fica evidente em personagens como Trump, mas também na vida cotidiana. Nossa religião é o progresso que se torna desenvolvimento, e tudo é medido por esse critério. O grande sinal do que estamos vivendo foi o incêndio de Notre-Dame em Paris.
Ou seja?
Todos os verdadeiros cristãos que conheço consideraram aquele incêndio como um símbolo da descristianização. Isso é evidente em todos os líderes políticos ocidentais: os últimos com inspiração cristã foram os pais fundadores da Europa, Schuman, De Gasperi e Adenauer.
Se o incêndio foi um sinal, a reconstrução em tempo recorde foi um sinal de que algo está mudando?
Beh, é como o teatro Fenice de Veneza: nada mais do que um monumento em um centro histórico.
E o Papa Francisco tentou se opor a essa descristianização?
O Papa Francisco tem denunciado isso desde seu primeiro documento oficial com ênfases duríssimas.
Até que ponto o fato de ser jesuíta influenciou sua mensagem?
Assim como Francisco, no século XIII, em um momento decisivo para a sobrevivência da Igreja, em conflito com os poderes políticos, por um lado, e as grandes heresias, por outro, entendeu que era necessária uma grande reforma, também no século XVI Inácio de Loyola e a ordem dos jesuítas são aqueles que resistem, que estão no centro do processo de reforma católica. Esse é o legado da ordem de Santo Inácio que Francisco trouxe com ele.
A herança jesuíta e franciscana juntas?
Que não estão em contradição, porque têm uma maneira semelhante de viver as grandes crises. Quando se fala de personagens como esses, capazes de ler os fatos segundo ondas longas e não segundo a crônica ou as ocasiões, compreende-se a distância em relação aos políticos de hoje, a desproporção entre o Papa Francisco e qualquer figura política da face da terra.
O que o Papa Francisco representou para os não crentes?
Muitas coisas. Porque não ser crente não significa considerar, com realismo cínico, que o que vale é o direito do mais forte, a prepotência, querer que os imigrantes sejam rejeitados, ou as desigualdades que se disseminam no mundo... Na medida em que o Papa Francisco era a única voz com autoridade também no mundo político a denunciar esses crimes, ele foi uma figura de referência também para os não crentes. E, além disso, do ponto de vista histórico, há uma reflexão mais geral a ser feita.
Diga.
Em todos os seus atos, ele declarou, às vezes até diretamente, o fim irreversível de qualquer centralidade europeia. Isso diz respeito à reflexão histórico-filosófica, mas é verdade de todos os pontos de vista: demográfico, econômico, político.
O fim da centralidade europeia ou ocidental?
Do ponto de vista do Ocidente em geral, é possível discutir isso, porque os Estados Unidos mantêm uma sua grandeza. Mas para a Europa as coisas parecem postas.
Ele era um papa de esquerda, como era frequentemente definido?
Bobagem. Ele tentou pregar a Verbum em um sistema planetário para um Ocidente incapaz de ouvi-lo.
A política o amou ou suportou mais?
Ela o instrumentalizou onde pôde. Há décadas, a política tem uma visão instrumental dessas grandes questões que a Igreja levanta: se vê uma vantagem no que o Papa diz, então o apoia. Caso contrário, ela o critica de forma mais ou menos velada. Uma grande parte da política italiana tomou partido contra, como nunca havia acontecido com os papas anteriores.
Por que, em sua opinião?
Porque ele se intrometeu sem meias palavras, mas denunciando o massacre em Gaza, ou pregando a necessidade de negociação na guerra na Ucrânia. Ele se colocou contra setores muito grandes de lideranças políticas.
O que espera agora do conclave?
Precisamos ter mais visão das relações internas para entender se conseguirá se determinar uma maioria que deseja a continuidade do caminho tomado pelo Papa Francisco. Acho que ninguém sabe como vai terminar.
O que você espera?
O grande risco para mim é que prevaleça o lado representado por um amplo setor do clero anglo-saxão, que nos últimos anos criticou o Papa Francisco em questões políticas e de direitos humanos e civis.
O legado do Papa Francisco é essa revolução em andamento na Igreja ou há algo mais? “Há também a tentativa de construir uma paz que tem a ver com a mensagem do Evangelho. Não armistícios, mas verdadeiros tratados de paz.