30 Abril 2025
Os cardeais buscam transmitir uma imagem de unidade diante da eleição mais universal da história – na qual há tantos desconhecidos que é preciso usar credenciais – e se empenham nos dias que antecedem o conclave para chegar à Capela Sistina com o trabalho bem encaminhado, como aconteceu na eleição de Bergoglio, em apenas 36 horas.
A reportagem é de Natalia Chientaroli e Jesús Bastante, publicada por El Salto, 30-04-2025.
Como em um congresso médico ou no encontro de uma multinacional, os cardeais exibem sobre a batina preta e a faixa púrpura uma espécie de credencial com seu nome e sua origem. No conclave mais internacional da história da Igreja Católica, há tantos novos e vindos de territórios remotos que é preciso alguma ajuda para saber quem está dizendo o quê nas conversas informais ou, no caso dos "fazedores de reis" que já colocaram sua máquina eleitoral em pleno funcionamento, para identificar eleitores a serem aproximados de seu candidato ou bloco.
Por isso, era necessário um pré-conclave longo, para chegar à Capela Sistina com o trabalho bem encaminhado. Pré-conclave longo, conclave curto. Essa é a tese dos cardeais presentes nas congregações gerais desta semana, que definiram a data de entrada dos cardeais menores de 80 anos para o dia 7 de maio, 17 dias após a morte de Francisco. Duas semanas e meia antes do Extra Omnes, parecem ser tempo mais que suficiente para traçar um perfil – e um candidato – que saia para o balcão central da Loggia de São Pedro na tarde de 8 de maio ou, no máximo, no dia 9.
“Será breve, dois ou três dias. Tenho as ideias claras e sei em quem votar. Há um clima de responsabilidade. Não se pode voltar atrás”, explicava o cardeal iraquiano Raphael Sako antes de entrar na reunião desta manhã. Outros ofereciam uma visão semelhante. “Não podemos esperar muito mais tempo. Nem a Igreja nem a sociedade entenderiam isso”, afirma outro cardeal que não pode dar seu nome ao elDiario.es.
À medida que o pré-conclave se alonga, o jogo das intrigas se estende e se exibe pelas ruas vaticanas, onde os cardeais passeiam após as reuniões diárias, às nove da manhã. Muitos fazem isso vestidos de forma que não evidencie sua condição, mas os rostos conhecidos acabam sendo retratados pela imprensa em cafés e restaurantes onde, após uma taça de vinho e um prato de massa, falam sobre o que acontecerá quando não puderem mais sair para a rua até a fumaça branca. Esses dias, por exemplo, foram vistos Sean Patrick O'Malley, ex-arcebispo de Boston, e outro norte-americano, Donald William Wuerl, no Al Passetto di Borgo, um pequeno restaurante onde, segundo os vaticanistas, foi decidido que Ratzinger seria Papa.
Esse conclave, de fato, foi muito rápido. Bento XVI foi eleito depois de dois dias e quatro escrutínios. A eleição de Bergoglio durou 36 horas, com cinco votações. O recorde pertence a um conclave que durou apenas dez horas, entre 31 de outubro e 1 de novembro de 1503, e elegeu Júlio II (1443-1513). O mais longo – dois anos e nove meses, entre 1268 e 1271 – levou à cadeira de Pedro Gregório X. Seu papado durou apenas um pouco mais que sua eleição: morreu em 1276.
As eleições modernas não superaram, em quase nenhum caso, os quatro dias, com exceção da de Bento XV, o papa da I Guerra Mundial, cuja fumata branca demorou cinco. O de Pio XII, durante a segunda Grande Guerra, ficou na média: obteve a maioria em três dias.
Também João XXIII e Paulo VI foram eleitos em três dias, enquanto o papado expresso de João Paulo I (que ficou no cargo por apenas 33 dias) foi alcançado em apenas dois. O mais longo foi o conclave que elegeu João Paulo II, o primeiro Papa não italiano desde Adriano de Utrecht (1522), que se resolveu em quatro dias e oito votações.
Segundo os especialistas, é a quinta votação que marca um conclave curto de outro um pouco mais longo, e nela alguns cardeais com opções, mas que não conseguem um número elevado de votos (mais de 40), costumam retirar sua candidatura ou pedir o voto para outro cardeal. Considerando que os conclaves têm quatro votações por dia, e que o atual terá a primeira no dia 7 de maio à tarde (depois serão duas pela manhã e duas à tarde), a famosa quinta votação chave nos levaria a três dias de conclave.
Nos casos de Bento e Francisco, soube-se depois que tanto Ratzinger quanto Bergoglio chegaram à Capela Sistina como candidatos fortes. O discurso de apenas alguns minutos do argentino em uma das congregações gerais o colocou nas posições iniciais. Mas, neste processo, ao menos por enquanto, não há papáveis muito estabelecidos, exceto o cardeal que presidirá o conclave, Pietro Parolin. Também, explicam os especialistas, porque a tensão entre conservadores e progressistas não é tão evidente como em outras circunstâncias. Por enquanto, as diferenças são mais geográficas, culturais e biográficas do que doutrinárias.
Na reunião desta terça-feira, por exemplo, houve uma vintena de intervenções. O porta-voz vaticano destacou que várias delas falavam sobre as situações vividas nesses territórios dos quais já chegaram 183 cardeais, dos quais mais de 120 são eleitores: “Há cardeais que vêm de territórios em guerra, de países em dificuldade”, explicou Matteo Bruni. Sobre se todos falam em italiano, esclareceu que “cada um fala na língua que preferir, pois há tradução simultânea”. O que não ficou claro é se esse serviço estará disponível uma vez que as portas do conclave se fechem.
A saída de Angelo Becciu enfraqueceu o ânimo das forças conservadoras, que poderiam sofrer uma nova derrota caso se impeça o cardeal Cipriani, também sancionado por Francisco, mas que não entraria no conclave por ter 81 anos, de continuar participando nos encontros prévios. Nestes dias, as mensagens tornadas públicas e as respostas à imprensa apelam à unidade e falam de um candidato que possa refletir o legado de Bergoglio.
Além das diatribes do alemão Müller, do americano Burke ou do influente Anders Arborelius – o cardeal sueco está começando a ser lançado como candidato pelos setores mais ultra –, o ambiente do pré-conclave vai mais na linha de continuar com as bases do papado de Francisco: uma Igreja sinodal, atenta às periferias e que não retroceda na participação dos leigos e das mulheres, e na luta contra os abusos. No entanto, não são poucos os que propõem um maior controle doutrinal em temas sensíveis, e sobretudo uma maior organização da Cúria, o que poderia prejudicar as possibilidades de Pietro Parolin, número dois de Francisco durante todo o seu papado.
Por isso, nada pode ser dado como certo. Ninguém se esquece aqui que o cardeal italiano Angelo Scola parecia o grande candidato no conclave de 2013. De fato, bispos italianos lançaram um tweet parabenizando-o por sua eleição como Papa… minutos antes de o camerlengo anunciar o nome de Bergoglio.
Se a disputa acontece na Capela Sistina, o pré-conclave se dá nos bares próximos. Por isso, jornalistas e fotógrafos se passeiam nestes dias à procura de algum cardeal na via del Borgo Pio, uma das ruas vaticanas onde o mundo divino e o terreno se encontram, como no afresco da Capela Sistina de Michelangelo. Ali, os que decidirão o próximo líder de quase 1.400 milhões de fiéis se camuflam entre centenas de viajantes que vagueiam entre trattorias e cafés. Os primeiros, explica um velho garçom, escolhem mesas discretas no interior e vêm sobretudo à noite. As caras avermelhadas dos turistas sob o sol mostram sua preferência pelas varandas.
A rua é também um passeio de compras para uns e outros. Ao lado das infalíveis lojas de lembranças, brilham as vitrines de lojas especializadas que exibem cálices dourados de todos os tamanhos e preciosas túnicas bordadas, embora não faltem casulas de tecido sintético em oferta a 30 euros, claramente não destinadas aos cardeais entre os quais está o próximo Papa. “Será um conclave breve”, arrisca um magro atendente que prefere não dar seu nome. Ele não esclarece se diz isso por suas conversas com os homens mais poderosos da Igreja ou porque, como no futebol, sobre esse jogo cada um tem uma opinião experiente e a solta diante do primeiro microfone ou gravador que lhe é colocado à frente, sempre com a maior convicção possível.