01 Mai 2025
Um núcleo duro que tem esse objetivo exclusivo e, para alcançá-lo, às vezes se alia à democracia e à paz, outras vezes aos autoritarismos e às guerras, apenas para aumentar os rendimentos de suas ações, porque não quer outra coisa.
O artigo é de Luigino Bruni, Professor Titular de Economia Política na Lumsa de Roma e Diretor Científico da Economia de Francisco, em L'Osservatore Romano, de 28-04-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Um dos legados mais significativos do Papa Francisco diz respeito diretamente à economia, e não apenas à pobreza, onde isso é imediatamente evidente. Porque a pobreza de Jorge Bergoglio, assim como a de Francisco de Assis, é uma perspectiva sobre toda a economia, não apenas um aspecto específico dela.
Em ambos os Franciscos, a pobreza é também a escolha de lugares onde dirigir o olhar para observar o mundo, a Igreja, a economia, o capitalismo. Não é coincidência que o movimento franciscano tenha dado origem a uma escola de pensamento econômico já no século XVIII e inspirado os primeiros bancos populares modernos, os Montes da piedade e depois os Monti de grãos, instituições que foram fundamentais para o nascimento da economia italiana moderna, mesmo que tenham sido negligenciadas até mesmo pela Doutrina Social da Igreja. Na linguagem escolástica, a pobreza não era apenas um “objeto material” para Francisco, era também, e acima de tudo, um “objeto formal”, um ponto de vista para entender, avaliar, discernir.
De fato, o Papa Francisco deve ser incluído entre os poucos críticos do capitalismo do século XXI, entre aqueles que o avaliaram, o examinaram, o julgaram e tentaram mudá-lo. No início, denunciando a economia que mata (EG), mas depois, cada vez mais, apontando também para economias boas e positivas (basta pensar em sua Economia de Francisco), sem nunca esquecer que no capitalismo há um núcleo duro feito apenas de maximização dos lucros e cada vez mais rendas.
Um núcleo duro que tem esse objetivo exclusivo e, para alcançá-lo, às vezes se alia à democracia e à paz, outras vezes aos autoritarismos e às guerras, apenas para aumentar os rendimentos de suas ações, porque não quer outra coisa.
O Papa Francisco enxergava bem esse capitalismo “duro”, falou dele várias vezes nos encontros particulares que me propiciou. Ele se interessava pelas pessoas concretas, como sabemos, mas também era capaz de ver e avaliar as instituições, as estruturas de vida e morte da economia - ele não tinha nenhuma simpatia pelas finanças especulativas: “O problema são as finanças”, ele me repetiu várias vezes. E, embora também olhasse e se preocupasse pessoalmente pelos resíduos e pelas vítimas, ele sabia muito bem que, por trás das vítimas, há máquinas produtoras de vítimas e que, portanto, nenhum cuidado com os resíduos será realmente eficaz enquanto houver mecanismos, estruturas, lógicas e incentivos na Terra que produzam vítimas todos os dias como seu primeiro e intencional objetivo.
A Igreja é um “hospital de campanha”, ele gostava de dizer; mas ele estava bem ciente, no entanto, de que a Igreja deve fazer o possível e o impossível para que as guerras sejam reduzidas, porque o único hospital de campanha realmente civilizado e humano é um hospital vazio por falta de feridos e mutilados. Falando em fevereiro de 2017 aos empresários da Economia de Comunhão sobre a sua tão amada parábola do Bom Samaritano, ele concluía: “Devemos ter como objetivo mudar as regras do jogo do sistema socioeconômico. Certamente, quando o empresário ou qualquer pessoa se depara com uma vítima, ele é chamado a cuidar dela e, talvez, como o Bom Samaritano, também associar o mercado (o albergueiro) à sua ação de fraternidade. Mas é preciso agir, sobretudo, antes que o homem se depare com os bandidos, combatendo as estruturas de pecado que produzem bandidos e vítimas. Um empresário que é apenas um bom samaritano cumpre metade de seu dever: ele cuida das vítimas de hoje, mas não reduz aquelas de amanhã”.
Sentiremos sua falta, Papa Francisco, sentiremos falta de suas palavras e gestos proféticos. Você fará falta à economia e ao Bem Comum global, pois tiveram em você um representante forte e respeitado, talvez o único e, esperamos, não o último. Esse seu legado não se dispersará: nós prometemos.