22 Abril 2025
"A fidelidade ao Evangelho e a perspicácia histórica legitimam a indicação de Francisco como dom do Espírito"
Publicamos aqui o editorial de Settimana News, 21-04-2025.
Quando recebemos a dramática, mas tão esperada, notícia da morte do Papa Francisco, rapidamente consultamos a redação. Enquanto aguardávamos um julgamento mais ponderado e completo, pareceu-nos importante estabelecer alguns pontos decisivos e algumas diretrizes que marcaram seu serviço petrino. Trata-se de olhar para Francisco através dos olhos de Francisco. A partir do que se pode compreender de seus escritos, de seus gestos, de sua vida e de suas orientações de governo, podemos indicar as orientações mais contundentes que ele pretendeu propor e sustentar. Dentre estes, há alguns que, em nossa opinião, são particularmente reconhecíveis.
Pode-se dizer que todos os pontificados pós-conciliares o afirmaram, mas com tentativas de correção e contenção. Francisco abriu portas e janelas, assumindo o impulso inovador da assembleia conciliar dos bispos católicos. Em particular, em suas relações com a modernidade, arquivou toda declinação do neocristianismo. A Igreja, sacramento de salvação, participa com todos os homens do processo histórico, dando sua contribuição de testemunho, luz e significado evangélico, sem pretender fazer parte do poder político ou influenciar assembleias legislativas.
Sem ignorar a centralidade do depósito da fé, a tarefa da Igreja hoje, na sensibilidade de Francisco, é retornar ao anúncio do Evangelho a toda criatura, ir além dos clausuras habituais, transformar as próprias linguagens, sujar as mãos com as experiências de todos. A escolha dos pobres perde todo traço ideológico para retornar ao Evangelho sine glossa. O protagonista do empreendimento é todo o povo de Deus.
O esforço dos últimos anos para esclarecer, estabelecer e praticar a sinodalidade é indicativo de uma Igreja que, continuando seu esforço para compreender cada vez melhor a manifestação fundadora do Abba de Jesus e a revelação trinitária, está comprometida em traduzi-las em uma prática concreta e compartilhada no tempo presente. Ainda estamos no começo. O processo e o investimento devem ser duradouros.
Diante do desafio da violência com pretensões religiosas, Francisco aprofundou a intuição de Assis (João Paulo II), abrindo diálogos e comparações, em particular com o islamismo e as religiões não monoteístas. Ao mesmo tempo, ele reconheceu que precisava assumir uma nova centralidade da Igreja Católica para lidar com a urgência da unidade dos cristãos e do diálogo com outras confissões. A credibilidade do cristianismo e de sua profecia em um mundo cada vez mais dividido e fragmentado está em jogo.
Vindo — como ele disse na noite de sua eleição — do "fim do mundo", de um país na periferia da civilização atlântica, Francisco personificou e encorajou o crescimento de comunidades católicas em continentes como a África e a Ásia. Uma mudança no centro de gravidade eclesial que traz consigo profundas mudanças na autoconsciência da Igreja, muito além do crescimento do número de cardeais não ocidentais.
Se há uma queixa persistente em seus discursos, é contra o clericalismo, contra uma centralidade indevida de bispos e padres. Não para diminuir a importância do ministério ordenado, mas para dar espaço efetivo ao sensus fidei fidelium e aos inúmeros carismas que o Espírito suscita nas comunidades católicas. Às vezes, ele é acusado de abordar a questão das mulheres em termos retóricos, mas mesmo a simples observação dos papéis eclesiais reconhecidos às mulheres hoje, em comparação com o passado recente, indica a substância das medidas tomadas.
Em fidelidade às orientações iniciadas por Bento XVI, e na esteira dos escândalos revelados e explorados pela mídia de muitos países ocidentais, Francisco definiu a resposta canônica, teológica e espiritual à natureza "intolerável" da violência contra os pequenos e os indefesos. Certamente, também se podem notar incertezas e atrasos, especialmente em alguns casos que o envolveram tangencialmente, mas é difícil negar sua vontade coerente de abordar o problema, mesmo quando envolveu eclesiásticos de alto nível e episcopados inteiros.
Somente quem não conheceu o sentido libertador do Concílio e as consequentes restrições ao pensamento teológico (da teologia da libertação à pesquisa moral e à eclesiologia) pode ignorar a riqueza de debates e hipóteses teológicas que retomaram seu curso no seio da Igreja com o atual pontificado. Suas limitações e fragilidades não podem hoje ser atribuídas à censura das autoridades do Vaticano, exceto em pequena medida. Paradoxalmente, as numerosas críticas – por vezes inapropriadas – ao seu ensino confirmam isso.
Deslocar o eixo de rotação da doutrina para a proclamação do Evangelho, impedir concretizações indevidas de poder, dissolver grupos servis, internacionalizar presenças, renovar responsáveis, facilitar as relações com as conferências episcopais e os bispos: estas são algumas das intenções importantes que sustentam a reforma. Suas insuficiências e contradições, que não faltam, não podem desvalorizar os preciosos novos rumos.
Estes são os títulos de alguns dos seus textos fundamentais (encíclicas, exortações, discursos e gestos) sobre emergências sociais e globais. Elas representam o esforço do magistério papal diante de desafios cruciais para a sobrevivência da humanidade. Ciente da "dissonância" com a cultura midiática atual, Francisco não diluiu o brilho de sua doutrina social, abordando a globalização sem ceder ao sistema tecnocrático. Para ele, representa um desenvolvimento coerente da reforma eclesial proposta em seu grande documento programático, a exortação Evangelii gaudium.
Francisco deslegitimou a guerra ao ir além da doutrina da "guerra justa" justamente quando ela está reaparecendo "em pedaços" no mundo e na Europa (Rússia-Ucrânia). Há algo agonizante e dramático nessa vontade de resistir ao fato de que a necessária redefinição da hegemonia mundial deve ocorrer por meio da violência. Daí podemos compreender a simpatia com que Francisco olha para a experiência da União Europeia, para a necessidade de manter os contatos abertos com Moscou e Pequim e para as questões exigentes relativas à democracia americana. Ele fez isso porque percebeu profundamente que há uma vítima predestinada da destruição do multilateralismo e da paz: a democracia.
A fidelidade ao Evangelho e a perspicácia histórica legitimam a indicação de Francisco como dom do Espírito.