É tempo de Natal, é tempo de renovar a esperança no porvir. Hoje, os Destaques da Semana do IHU vão falar da possibilidade de um futuro melhor, além de trazer aquilo que foi notícia. Queremos assinalar que a chegada do Menino Deus é um lembrete da esperança que renasce, um farol para nunca esquecermos: mesmo nas noites mais escuras, há sempre uma estrela que guia o caminho.
Confira os destaques na versão em áudio.
Mas como falar de esperança em tempos tão sombrios, especialmente pelas guerras que devastam muitas vidas e a crise climática? Leonardo Boff nos ajuda a enxergar que podemos viver em um mundo diferente. “Como nunca na história, o destino está em nossas mãos”, lembrou o teólogo. Para ele, a saída está na fraternidade universal, construída de baixo para cima, como todos os “irmãos e irmãs junto com os da natureza e no meio dela, cuidando-a e garantindo sua regeneração [...] e garantindo algo novo e alternativo ao sistema dominante”. Por fim, pontua que “a vida nos dá duas lições: uma severa, do sofrimento e outra agraciada, do amor que nos leva fazer atos criativos e inusitados. Provavelmente iremos aprender do sofrimento que virá, mas muito mais do amor que ‘move o céu e todas as estrelas’ (Dante Alighieri) e nossos corações. A esperança não nos defraudará assim nos prometeu São Paulo (Rom 5,5)”.
Ao relembrar os sonhos de Ricardo Reis, pseudônimo de Fernando Pessoa, Faustino Teixeira fala da criança que chega e vive entre nós, inspirado pelo presépio do Vaticano. “O menino Jesus que habita em nossa aldeia e que nos traz uma esperança renovadora em favor de um mundo distinto, regado por paz, alegria, ternura e serenidade”. Este Jesus, segue o teólogo “põe-se do lado das vítimas e as protege/defende, questiona o agressor, sem fazer violência aos que as executam, em definitivo”. Ele ainda destaca que precisamos estar atentos aos sinais, aos pequenos gestos que irrompem em nosso dia a dia. “Viver com atenção dedicada aos pequenos sinais do cotidiano, a se alegrar com os recursos miúdos que encontramos pelo caminho, a saber sorrir reiteradamente com o espetáculo da vida”, complementa.
🇵🇸 Papa Francisco apresenta presépio de Natal com Jesus envolto em Kufiya, o emblemático lenço palestino.
— FEPAL - Federação Árabe Palestina do Brasil (@FepalB) December 8, 2024
Com quase 3 metros de altura, o presépio no Vaticano foi esculpido em madeira de oliveira, igualmente um símbolo do povo palestino, e é assinado por artesãos palestinos de… pic.twitter.com/slJ1YbmQI5
“Apesar de tudo, na contramão dessa velocidade frenética e dessa agitação febril, será possível entrever sinais divinos no tecido esgarçado da história humana e urbana. Nos becos, porões e periferias da metrópole, por mais sórdidos e solitários que sejam, o Menino Deus renasce em gestos imprevistos de entrega, de dedicação e de solidariedade. Como outrora na cidade de Belém, Ele não vem dos tronos, palácios e mansões luxuosas; vem dos lugares mais frios, inóspitos e inesperados, pois ‘não havia lugar para eles na casa’, como nos relata o evangelista Lucas (Lc 2, 7). Por outro lado, os sinais humano-divinos do encontro, da partilha e do diálogo também nos revelam que ‘Deus habita esta cidade’, para usar a expressão do salmista (Sl 47, 9). São poucos, são raros, são extraordinários, mas sempre haverá alguém capaz de sair de si mesmo e ir ao encontro daquele que sofre maior abandono e vulnerabilidade”. E o Deus presente na metrópole “irrompe de novo para reorientar os rumos da história humano-divina. Aí está a mensagem do Natal!”, salienta o padre Alfredinho Gonçalves.
“Pela recuperação da esperança diante à mais completa tirania”, é o Deus que se faz homem. “É preciso partir da dimensão da esperança para imaginar que em pouco tempo iremos comemorar mais um Natal. Cearemos com alguns familiares, enviaremos algumas mensagens e até trocaremos alguns presentes. Tudo isso é muito importante, afinal ‘não é natal apesar de tudo, mas apesar de tudo é natal!’”. E na iminência da festa que se aproxima, o sociólogo Rafael dos Santos da Silva recorda aquilo que precisamos perceber agora: “é urgente indignar-se diante da fome coletiva no Iêmen, das vítimas da guerra na Palestina ou dos atingidos pelas mudanças climáticas no Brasil”.
Das periferias do mundo, soam “ecos de resistência frente à tirania”, como destacou o colega Gabriel Vilardi. A esperança surge dos povos indígenas, das mulheres indígenas, que mesmo massacrados seguem firmes na sua luta contra a tirania dos poderosos. Do campo, “homens e mulheres que não se furtaram à luta”, continuam bradando por uma reforma agrária justa. Dos escândalos de abusos na igreja anglicana vêm os ventos que mudar também a igreja católica, que após muitos anos de escândalos sucessivos não consegue pôr fim a questão. Dos territórios de resistência permanece o povo que nunca desiste, por mais dura e desafiadora que seja a realidade que se impõe. Contra toda a desesperança, a esperança nunca engana. E agora “impõe-se, mais que nunca, a todos nós, denunciar a demência dos que veem a guerra como um caminho para a paz e afirmar a rebeldia civil contra essa matriz civilizacional belicista, genocida, ecocida e suicida. Superar essa matriz supõe recusar a arrogância e a estupidez dos que negam a agonia de nossa biosfera”, bradou Luiz Marques.
A rebeldia é também esperança. Na Europa, João Pedro Stédile desafiou o parlamento: “tenham coragem de colocar freio na ganância das empresas europeias, que são os grandes produtores de agrotóxicos que estão envenenando a América Latina. Eu me refiro à Syngenta, Bayer, Basf e a DuPont”, frisou. O presidente do MST continuou explicando o modelo do agronegócio brasileiro aos europeus. “O agronegócio, cantado como moderno, porque usa sementes transgênicas e mecanização extensiva, mas esse modelo monocultor, que no Brasil só produz cinco commodities agrícolas, soja, milho, cana-de-açúcar, algodão e pecuária bovina. Ele não produz alimentos e só consegue produzir porque faz uso intensivo de agrotóxicos”, assinalou.
Enquanto o mundo volta seus olhos para a Síria e Israel se aproveita para avançar com seu projeto colonial, os negociadores correm contra o tempo para negociar um cessar-fogo em Gaza, antevendo que a chegada de Trump à Casa Branca deve insuflar o projeto bélico de Netanyahu. O problema é que 45 mil mortes depois, o governo israelense não recua e continua agravando a crise humanitária na Palestina. Agora, o crime de guerra é a privação de água. Mas os negociadores buscam um denominador comum para colocar fim à barbárie em Gaza. Esperamos que o tempo de Natal ponha um ponto final à terceira guerra mundial em pedaços.
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— BBC News Brasil (@bbcbrasil) December 13, 2024
“Passem apenas 5 minutos em um hospital lá e ficará dolorosamente claro para vocês que os palestinos estão sendo intencionalmente massacrados, mortos de fome e privados de tudo o que é necessário para sustentar a vida": https://t.co/3GAY47hHou pic.twitter.com/ykGtFgRvis
A sabedoria sumiu e levou junto a paz. Para recuperá-las, precisamos voltar à mente, explica o filósofo Vito Mancuso. "A paz começa na mente que estuda. Não pode haver paz sem estudo. E a partir do estudo da situação aparecerá a oportunidade de agir num momento e não agir em outro; uma vez será certo ceder, outra vez será correto resistir. A sabedoria, exercício prático de conhecimento, é a arte do discernimento", coloca o pensador, que ao citar a jovem judia morta no campo de concentração, Etty Hillesum, evidencia que "ensinam-nos ainda hoje que o primeiro ato a favor da paz se realiza na mente: para libertá-la do ódio e estudar com equanimidade, recolhendo a sabedoria que daí advém. Quem o faz entende que se é bom manifestar-se pela paz, é ainda mais importante 'ser paz'”. O papa Francisco, em sua tradicional mensagem para a Jornada Mundial pela Paz, conclamou a todos a quebrar as correntes da injustiça em busca da paz. "No início deste ano, portanto, queremos escutar este grito da humanidade para nos sentirmos chamados, todos nós, juntos e de modo pessoal, a quebrar as correntes da injustiça para proclamar a justiça de Deus. Alguns atos esporádicos de filantropia não serão suficientes. Em vez disso, são necessárias transformações culturais e estruturais, para que possa haver também uma mudança duradoura", convoca.
As notícias da semana não são nada animadoras para o mundo do trabalho. Mais trabalhadores foram resgatados em situações de trabalho análogo à escravidão, desde o famoso festival Rock in Rio, no Rio de Janeiro, ao interior do Rio Grande do Sul, em uma granja em Arvorezinha. E surgiram novas denúncias envolvendo a Companhia Zaffari e as condições degradantes da famigerada escala 10x1. Para frear a precarização do trabalho, o Movimento Vida Além do Trabalho – VAT convocou as ruas para um protesto nacional no dia 20 de dezembro, cujo tema é “Feliz Natal para quem?”. A adesão dos jovens ao mercado de trabalho formal foi na contramão das demais notícias, assim como a possível redução da jornada de trabalho faz o trabalhador esperançar no próximo ano.
Para lembrar que está chegando ao fim de um 2024 marcado pela água e pelo fogo, mas também pelo recorde de temperatura, o Observatório do Clima elencou os dez principais acontecimentos climáticos do ano. Enquanto lembramos os fatos, continuamos a esperar os desdobramentos que vão nos levar à COP30. A COP da Floresta é o principal evento da agenda climática no ano que vem. A COP29 deixou uma lacuna, principalmente no que tange ao financiamento climático. O portal InfoAmazonia desenhou seis pontos para os quais devemos ficar de olho em 2025. Na semana em que comemoramos o Dia do Pampa, em 17 de dezembro, mais um dado colocou a sobrevivência do bioma à prova: degradado, o Pampa perdeu 28% da sua vegetação nativa entre 1985 e 2023. Em contraponto, pesquisadores da UFRGS apresentaram uma nova informação: metro quadrado mais rico em plantas do Brasil fica no Pampa. Para trazer um panorama do que nos espera no ano vindouro, Luiz Marques proferiu uma conferência sobre a agenda ambiental nessa quinta-feira.
Por fim, a nossa lista de pedidos para este Natal é assinada por Frei Betto, com quem partilhamos os mesmos desejos. Em um mundo em que o Jesus aparece como uma nostalgia, como uma imagem desbotada daquilo que poderia ser um tempo de paz, pedimos licença para abdicar do velho Noel, como propõe o religioso, e transcrever nesta página suas súplicas: