19 Outubro 2024
"Para os ucranianos, há 19.000 menores sequestrados pelos russos que devem voltar para casa, além das centenas de prisioneiros que os dois lados poderiam trocar, objetos de violências e torturas (especialmente do lado russo)", escreve Lorenzo Prezzi, teólogo italiano e padre dehoniano, em artigo publicado por Settimana News, 17-10-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.
Desde 14 de outubro o Cardeal Matteo Zuppi, arcebispo de Bolonha e presidente da Conferência Episcopal Italiana, está novamente em Moscou para honrar seu papel como enviado especial do papa para a questão ucraniana. Primeiro, ele se reuniu com o ministro das Relações Exteriores, Sergij Lavrov (sobre “cooperação na esfera humanitária no contexto do conflito na Ucrânia”) e, em seguida, viu o Metropolita Antônio de Volokolamsk, presidente do departamento de relações eclesiásticas externas do Patriarcado de Moscou (eles discutiram “problemas humanitários relacionados ao conflito na Ucrânia, bem como outras questões de interesse mútuo”); e, finalmente, Maria Llova-Belova, comissária da presidência russa para os direitos das crianças (“Discutimos os resultados e a interação futura no interesse das famílias e das crianças, incluindo a reunificação de famílias vindas da Rússia e da Ucrânia”).
Como reiterou o diretor da sala de imprensa do Vaticano, Matteo Bruni, a viagem à capital russa tinha como objetivo “reunir-se com as autoridades e avaliar mais esforços para facilitar a reunificação familiar das crianças ucranianas e a troca de prisioneiros, a fim de alcançar a tão esperada paz”.
Trata-se, portanto, de uma operação humanitária e não diretamente diplomática, embora o cardeal estivesse acompanhado por um oficial da Secretaria de Estado do Vaticano. Uma intenção e um espaço valiosos em um momento em que as partes em conflito não têm canais de diálogo.
Para os ucranianos, há 19.000 menores sequestrados pelos russos que devem voltar para casa, além das centenas de prisioneiros que os dois lados poderiam trocar, objetos de violências e torturas (especialmente do lado russo). A visita do cardeal segue as anteriores que, em 2023, o levaram a Kiev (5-6 de junho), Moscou (28-29 de junho), Washington (17-19 de julho) e Pequim (13-15 de setembro). Os encontros do ano passado em Moscou incluíram também uma conversa direta com o Patriarca Kirill e com o assistente do presidente para assuntos de política externa.
Em Kiev, ele se reuniu com o presidente Zelensky, em Washington, com o presidente Biden e, em Pequim, com o representante especial do presidente para assuntos euroasiáticos, Li Hui. Depois disso, ele entrou em contato com ele por telefone. Um reconhecimento por sua ação humanitária foi feito por Olena Kondratiuk, vice-presidente do parlamento ucraniano, em um encontro em Roma.
A diplomacia vaticana apoiou o trabalho de Zuppi, mas continuou seu percurso dando continuidade ao diálogo com o governo chinês (a comissão esteve na China no final de setembro) em relação à renovação do Acordo Sino-Vaticano sobre a nomeação dos bispos. O secretário de Estado, Card. Pietro Parolin, esteve na Ucrânia (19-23 de julho), acompanhado com grande interesse pelo mundo político e eclesial: “O papa quer ajudar a abrir caminhos de paz que levem a uma solução para esta guerra. Espero que minha presença também possa oferecer uma pequena contribuição por meio de conversações políticas”. E à Comissária russa para os Direitos Humanos, Tatiana Moskalkova, ele lembrou a necessidade de salvaguardar, no contexto do conflito, os direitos humanos fundamentais consagrados nas convenções internacionais.
Em 11 de outubro, houve o quarto encontro direto entre o Papa e o presidente ucraniano Zelensky. Os dois, que certamente têm grande estima um pelo outro, não demonstram grande sintonia. Para o presidente ucraniano, que em um encontro anterior havia complementado e corrigido parcialmente o comunicado final (13 de maio), declinando o possível papel mediador do Vaticano, o breve encontro (35 minutos) serviu para esclarecer os possíveis caminhos para uma paz justa e duradoura e para explicar a recente lei que censura a presença no país de Igrejas ou religiões que têm sua referência central na Rússia.
Para o presidente, mas também para os fiéis greco-católicos e seu arcebispo maior, mons. S. Shevchuk, a posição do papa (com o qual o bispo teve um encontro em 10 de outubro) não é totalmente convincente. Ela é considerada demasiado próxima à Rússia, demasiado “equilibrada”, como se não houvesse um agressor e um agredido.
Lembram a visita do papa à embaixada russa no início da guerra e sua não presença na oração dos ucranianos em Roma, sua posição prudente em relação ao fornecimento de armas, sua denúncia do expansionismo da OTAN, seu convite para não demonizar a “bandeira branca”, sua relutância em falar de guerra de agressão russa, seus gestos de oração excessivamente “paralelos”, etc.
Talvez seja por isso que o post do papa no X em 11 de outubro diz: “Todas as nações têm o direito de existir em paz e segurança. Seus territórios não devem ser atacados e sua soberania deve ser respeitada e garantida por meio da paz e do diálogo. A guerra e o ódio só trazem morte e destruição para todos”.
De alguma forma, o card. Zuppi é visto na mesma perspectiva. Nos comunicados finais dos encontros de Mons. S. Shevchuk e de Zelensky não há nenhuma menção à sua obra. Um pequeno episódio confirma isso.
No grande encontro internacional organizado pela Comunidade de Santo Egídio em Paris (“Imaginer la Paix”, 22-24 de setembro), que contou com a presença de 3.000 delegados, alguns cardeais, uma dúzia de bispos, embaixadores e funcionários do governo de vários países e do presidente francês E. Macron, foi frisada a ausência, entre os 21 fóruns temáticos, de um fórum específico dedicado à guerra russo-ucraniana e o convite tardio ao Arcebispo Maior e à Igreja Ucraniana Autocéfala.
O delegado dos greco-católicos, Yuris Pidlisnyy, lamentou que sua intervenção não tenha sido valorizada pelo moderador do fórum e listou os elementos problemáticos, em sua opinião, da posição de Santo Egídio sobre a guerra. Ele considera ingênuo um “cessar-fogo” que permitiria que as tropas russas se reorganizassem e retomassem a iniciativa armada. Não compartilha a proposta de Kiev como “cidade aberta”, porque uma eventual presença russa significaria a inevitável designação de um presidente fantoche. Por esse motivo, a ausência de um fórum dedicado indica, em sua opinião, uma compreensão inadequada da importância da resistência ucraniana para a salvaguarda da democracia ocidental.
O Card. Zuppi é comparado a Santo Egídio e o convite que ele fez em Paris (“A paz é sempre feita a três; envolvendo as duas partes em conflito que se encontram graças a um ou mais mediadores”) foi lido na mesma linha de interpretação. Isso foi divulgado pela agência de notícias católica polonesa (KAI), que não se esquivou de uma animada discussão com a assessoria de imprensa da comunidade.