Pautas de brasilidade: Praça Onze, do carnaval à própria vida

Edição: Marcelo Zanotti | IHU

Por: Marcelo Zanotti | 02 Mai 2023

A Praça Onze, situada no bairro Cidade Nova, no Rio de Janeiro, foi um marco histórico e cultural da cidade, tanto por sua simbologia quanto por sua importância para o carnaval carioca. O nome da praça é uma homenagem à Batalha do Riachuelo, uma das mais importantes batalhas navais da história do Brasil, ocorrida em 11 de junho de 1865. No Pautas de brasilidade dessa semana abordaremos a trajetória da Praça Onze, desde sua criação até sua demolição para a construção da Avenida Presidente Vargas.

O artigo é de Marcelo Zanotti, historiador e membro da equipe do IHU.

Eis o artigo.

A Praça Onze foi criada no início do século XX, em uma área onde já existia um pequeno largo. Com o passar do tempo, a praça foi se consolidando como um importante centro de encontro, onde as classes populares e imigrantes de diversas etnias, como negros, judeus e portugueses, se reuniam para celebrar a vida e as tradições culturais.

Praça Onze, em 1939 (Foto: Biblioteca Nacional)

O carnaval do Rio de Janeiro começou a ganhar forma na Praça Onze, que, desde a década de 1910, era palco de animadas festas populares. Com o tempo, a praça tornou-se um local onde as escolas de samba, como a Estação Primeira de Mangueira e a Deixa Falar, ensaiavam seus sambas e realizavam seus desfiles, tornando-se o coração do samba carioca.

As rodas de samba na Praça Onze atraíam um grande público e, com isso, importantes personalidades da música brasileira, como Donga, Pixinguinha e João da Baiana, começaram a se apresentar no local, contribuindo para a consolidação do samba como um gênero musical tipicamente brasileiro.

Processo de demolição da Praça Onze para a construção da Avenida Presidente Vargas (Foto: Biblioteca Nacional)

Infelizmente, a história da Praça Onze teve um fim melancólico. Em 1941, durante o governo de Getúlio Vargas, a praça foi demolida para dar lugar à construção da Avenida Presidente Vargas, uma das principais vias da cidade do Rio de Janeiro.

A demolição da Praça Onze foi uma grande perda para a cultura carioca e brasileira, já que o local era o coração do samba e do carnaval da cidade. Além disso, a destruição da praça desalojou milhares de moradores e comerciantes, que foram forçados a se mudar para outras regiões da cidade, levando a um processo de fragmentação e dispersão das comunidades que ali viviam.

Atual Avenida Presidente Vargas, na altura onde antes ficava a antiga Praça Onze (Foto: Google Maps)

Para que possamos passar detalhadamente pela história da Praça Onze, é impossível fazer isso sem citar as 3 principais músicas que contam sua história:

A música "Praça Onze" é uma das mais conhecidas composições que homenageiam esse histórico local. Lançada em 1942, a canção foi composta por Grande Otelo e Herivelto Martins, dois grandes nomes da música popular brasileira. A letra saudosa descreve o desaparecimento da praça original, que foi demolida para a construção da Avenida Presidente Vargas, e como os moradores e frequentadores da época se sentiram com essa perda. Além disso, a música também faz referências às escolas de samba que tiveram origem no local, como a Estação Primeira de Mangueira e o Estácio de Sá.

"Laurindo" é outra música emblemática que retrata a Praça Onze e seu contexto cultural. Composta por Herivelto Martins, a canção foi lançada em 1951 e é uma homenagem ao sambista Laurindo Almeida, um dos expoentes do movimento musical carioca nas décadas de 1930 e 1940. A letra da música destaca a importância de Laurindo como um personagem icônico da Praça Onze, exaltando sua contribuição para a história do samba e a cultura popular brasileira. Além disso, a canção também faz menção às tradicionais rodas de samba que aconteciam no local, um dos principais marcos da praça.

Por fim, a música "Rancho da Praça Onze", composta por Chico Anysio e João Roberto Kelly em 1965, também retrata a efervescência cultural da Praça Onze, focando em um dos principais eventos do local: o Carnaval. A letra celebra a alegria e a tradição dos ranchos carnavalescos da Praça Onze, destacando a união e a diversidade das pessoas que se reuniam para festejar. A canção imortaliza a importância do local como palco das manifestações culturais e populares do Rio de Janeiro e do Brasil.

E chegando nos finalmentes...

A Praça Onze é um capítulo essencial na história do carnaval carioca e do samba brasileiro. Sua trajetória, desde a criação até a demolição, revela o dinamismo e a diversidade cultural da cidade do Rio de Janeiro. Apesar de sua desaparição, a Praça Onze permanece viva na memória do povo carioca, que a celebra como um marco histórico e um símbolo da resistência cultural.

Atualmente, a região que antes abrigava a Praça Onze há uma série de monumentos e marcos que lembram a presença do local e sua importância para a cultura afro-brasileira, como por exemplo o monumento de Zumbi dos Palmares. O legado da Praça Onze ainda pode ser sentido nas rodas de samba, nos desfiles das escolas de samba e na celebração do carnaval carioca, que mantém viva a essência do samba e a memória de um espaço que foi fundamental para o desenvolvimento dessa expressão artística.

A história da Praça Onze nos ensina sobre a importância da preservação do patrimônio cultural e histórico, e nos lembra de valorizar e proteger os espaços públicos que são fundamentais para a construção da identidade e da memória de uma cidade e seu povo. Ainda que a praça tenha sofrido mudanças ao longo das décadas, sua essência e seu legado permanecem vivos nas canções, nas escolas de samba e na memória do povo carioca. Ao revisitarmos essas músicas, somos transportados para um tempo em que a Praça Onze fervilhava de vida, alegria e arte, lembrando-nos do valor inestimável dessas expressões culturais para a construção da nossa identidade como nação.

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