09 Setembro 2020
Em Roma, o evento dos negacionistas do Covid organizado por Forza Nuova, "abençoado" pelo ex-núncio no EUA Viganò, líder dos opositores ao Papa.
A reportagem é de Salvatore Cernuzio, publicada por Secolo XIX, 06-09-2020. A tradução é de Luisa Rabolini.
Na praça romana dos no-mask, lotada ontem à tarde por negacionistas da ultra-direita que também negam ser negacionistas, onde são disparadas do palco acusações contra o governo "assassino" e os médicos "instrumentos de morte", entre máscaras rasgadas e queimadas, faixas com frases vulgares ou elogiando Donald Trump "que ama a Itália", destaca-se a bandeira branco-amarela da Cidade do Vaticano com o rosto de Bento XVI.
Em vez da imagem do Papa Francisco, uma foto do Pontífice com o cenho franzido e o número do diabo "666" foi incendiada por um manifestante vestido de padre.
Símbolos daquela franja extremista de viés quase cismático que habita a Igreja atual; a mesma que, além da existência do coronavírus, também nega a eleição de Francisco e a renúncia ao pontificado de Bento XVI. Uma pequena, mas ruidosa facção que pretendia garantir a sua presença na manifestação organizada por Forza Nuova para 5 de setembro, na Piazza della Bocca della Verità em Roma, onde justamente "verdade", junto com "liberdade", eram as palavras mais gritadas pelos manifestantes. Entre estes, - também várias famílias com crianças, algumas em carrinhos de bebé - todas rigorosamente sem máscara por se tratar de um “símbolo de escravidão”.
Para aplaudir médicos, cientistas e deputados que falaram, estavam na praça dois supostos padres que, com uma estranha cruz peitoral e uma bandeira amarela, explicaram que pertencem à Igreja Patriótica Ortodoxa para a Itália. E havia também o "porta-bandeira" do grupo do Vaticano com o rosto de Ratzinger: chapéu texano e um santinho do Papa emérito no bolso de sua camiseta, que veio especificamente a Roma da Toscana para apontar as culpas da Igreja e do Vaticano coniventes com as "mentiras" do governo sobre os dados do coronavírus. Interrompido enquanto mostrava a dois transeuntes desavisados o vídeo da "bofetada" do Papa Francisco à mulher chinesa ou da catequese do excomungado padre siciliano Alessandro Maria Minutella, o manifestante responde ao porquê ter trazido à baila Bento XVI em uma manifestação de negacionistas do Covid. “Bento XVI é o verdadeiro Papa, ele nunca renunciou ao munus petrino”, é sua primeira reação espontânea. E a partir daí, mais uns dez minutos com as várias teorias sobre a máfia de San Gallo, a eleição inválida de Jorge Mario Bergoglio e assim por diante.
Insistimos: qual é o nexo entre a existência do coronavírus e Joseph Ratzinger, que nunca se manifestou nos últimos meses sobre a pandemia. O homem, acompanhado por sua esposa que murmura algo contra o Papa, responde com tons agressivos: “Jesus Cristo é a verdade, e a verdade deve ser gritada de cima dos telhados, como ele nos ensinou. O coronavírus é uma gripe, não uma pandemia. E os defensores do complô são aqueles que falam e não demonstram, o que fazem as televisões... Os teóricos da conspiração estão na TV, não nesta praça. Nesta praça, as pessoas demonstram com fatos o que está acontecendo. O que as televisões não fazem”. Sim, mas o que Bento XVI tem a ver com isso? “Porque Bento XVI é a verdade e Bergoglio a mentira. Ele faz parte dos illuminati, do projeto diabólico por trás desse engodo que é o coronavírus, que nada mais é do que uma gripe”.
Em suma, é um pouco o conceito norteador de todos os participantes do encontro, sempre muito atentos em esclarecer: “Não somos fascistas, nem negacionistas, mas despertadores”: o coronavírus é uma farsa preparada pelas grandes potências. Teoria beirando o complô também apoiada pelo arcebispo Carlo Maria Viganò, o ex-núncio nos Estados Unidos que ficou famoso há alguns anos pelo dossiê em que pedia clamorosamente a renúncia do Papa por má gestão de casos de abusos, também autor há alguns meses de um apelo para denunciar o projeto de "governo mundial" escondido atrás das medidas de precaução contra a pandemia.
Viganò, nos últimos tempos arauto de lutas cada vez mais políticas e menos eclesiásticas (exceto a recente contra o Concílio Vaticano II, um conjunto, segundo ele, de "heresias"), nos últimos dias deu sua "bênção" ao evento dos no-mask. De fato, seu nome circulou em sites e blogs como um dos possíveis participantes. "Talvez esteja aqui", disseram alguns dos "organizadores" ontem. "Não, a presença de Sua Excelência nunca foi prevista", explicaram outros.
Pensava-se em um coup de théâtre, como aquele de janeiro em Munique, onde o ex-núncio apareceu incógnito na manifestação contra o percurso sinodal iniciado pelos bispos alemães. Em vez disso, Viganò preferiu ficar no abrigo secreto onde diz ter se retirado após a divulgação de seu dossiê e intervir eletronicamente com um e-mail, datado de 15 de agosto, em resposta a uma carta anterior assinada pelos promotores da manifestação de Roma.
O ex-núncio, aliás, endossou todas as teorias expressas ontem à tarde ao microfone no palco, onde convidados e apresentadores não pouparam beijos e abraços. “A Sanidade mundial, com o papel piloto da OMS, tornou-se uma verdadeira multinacional que tem como objetivo o lucro dos acionistas (empresas farmacêuticas e fundações chamadas de filantrópicas) e como meio de persegui-lo a transformação dos cidadãos em doentes crônicos”, escreveu o ex-representante do Papa nos Estados Unidos. “As empresas farmacêuticas querem ganhar dinheiro com a venda de medicamentos e vacinas; se eliminar doenças e produzir medicamentos eficazes envolve a redução do número dos doentes e, portanto, dos lucros, será lógico esperar que os medicamentos sejam ineficazes e que as vacinas sejam uma ferramenta para disseminar as patologias, em vez de erradicá-las. E é isso que realmente acontece. Como podemos pensar que se promova a busca por curas e terapias se quem a financia lucra desproporcionalmente justamente com a persistência de patologias? ”. Viganò também acrescentou que "um projeto de criptomoeda" foi patenteado para permitir não apenas a identificação sanitária, mas também a identificação pessoal e bancária.
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Coronavírus, na manifestação dos no-mask as bandeiras de Bento XVI foram agitadas e uma foto de Francisco queimada - Instituto Humanitas Unisinos - IHU