05 Setembro 2020
“Assim como Adolf Hitler se apropriou da noção de socialismo para formar uma ideologia de supremacia branca de caráter nacional-socialista de estado, agora esses setores nacional-libertários fazem exatamente o mesmo, só que a partir de um patriotismo de mercado”, escreve Andrés Kogan Valderrama, sociólogo, em artigo publicado por OPLAS, 03-09-2020. A tradução é do Cepat.
Eis o artigo.
Em relação aos diversos protestos no mundo contra a obrigatoriedade do uso de máscaras, será realizada uma leitura política de um processo que vai além da ação de um grupo de crentes em teorias da conspiração, sendo muito mais uma ideologia negacionista de determinados setores da extrema direita cada vez mais presente na Europa, Estados Unidos e América Latina, que propõem um discurso fundamentalista de caráter nacional-libertário.
Um discurso nacional-libertário que coloca a família tradicional, a pátria, a propriedade privada e a liberdade de consumo como âmbitos da civilização ocidental que, desse ponto de vista, estariam em perigo, frente a uma agenda global imposta por grandes organismos internacionais, que estariam subordinados à China.
É o que foi levantado por pessoas como Donald Trump, Jordan Peterson, Ben Shapiro, Milo Yiannopoulos, Hans-Hermann Hoppe, Richard Spencer e Steve Bannon, que apontam que estamos em um mundo ameaçado pelo globalismo e pelo marxismo cultural, que estariam obrigando os governos a aprovar acordos e tratados internacionais em diferentes áreas (ambiental, trabalhista, migratória, diversidade sexual, gênero, étnica).
Por isso, essa ultradireita está em uma verdadeira cruzada contra tudo o que está associado a visões mais progressistas, como apoiar a igualdade de gênero, reduzir as emissões de CO2, reconhecer os povos indígenas, a descriminalização do aborto, a descriminalização da maconha, o casamento igualitário, a lei de identidade de gênero, etc.
Em outras palavras, para esta ideologia, só é desejável um Estado-nação mínimo e com fronteiras fechadas para a imigração, que somente deve se dedicar a garantir a igualdade perante a lei meramente formal e que seu centro esteja na defesa dos direitos de propriedade, negando assim qualquer outro tipo de direito às pessoas e comunidades.
Consequentemente, para esse discurso nacional-libertário, tudo que questiona minimamente a ordem patriarcal, colonial e capitalista, por meio de certas políticas públicas (impostos, aumento do gasto público), é considerado de esquerda e comunista, mesmo que seja na prática um mero reformismo liberal.
Assim são rotulados de esquerdistas tanto a CNN, o Banco Mundial, a Organização das Nações Unidas e até governos de direita em todo o mundo, pelo simples fato de promover políticas mínimas de inclusão e não discriminação. A ideia de questionar o discurso politicamente correto levou esses grupos de ultradireita a instalar a ideia de que megaempresários e governantes como Bill Gates, George Soros, Emmanuel Macron, Mauricio Macri e Sebastián Piñera são meros agentes do globalismo.
Logo, são fervorosos negadores do classismo, racismo, androcentrismo e ecocídio imperante, que neste contexto de pandemia evidencia um novo negacionismo de segmento sanitário, ao chamar de globalistas organizações como a OMS, por serem supostamente parte de um plano para destruir o ocidente, por meio das medidas que diferentes governos estão implementando para reduzir as mortes e infecções por Covid-19.
No entanto, o que mais chama a atenção nesse discurso de ultradireita é a colonização da própria noção de libertário. Assim como Adolf Hitler se apropriou da noção de socialismo para formar uma ideologia de supremacia branca de caráter nacional-socialista de estado, agora esses setores nacional-libertários fazem exatamente o mesmo, só que a partir de um patriotismo de mercado.
A ideia do anarcocapitalismo, por exemplo, é uma mostra de como a atual ultradireita instrumentaliza visões que originalmente buscam questionar o autoritarismo estatal e construir mundos alternativos, e não os negar como ela faz. É como levantar a absurda ideia de um anarcocolonialismo ou um anarcosexismo, já que o que acaba fazendo é confundir e aprofundar visões racistas e machistas.
A necessidade, portanto, de continuar desarmando este discurso nacional-libertário se torna importante, especialmente na América Latina, onde vários expoentes dele surgiram a nível político e intelectual (Jair Bolsonaro, José Antonio Kast, Axel Kaiser, Alfredo Olmedo, Agustín Laje, Javier Milei, Nicolás Márquez, Vannesa Vallejo, Gloria Álvarez, Sara Winter, Jesús Huerta de Soto), aproveitando a atual incerteza com a pandemia para introduzir um discurso de ódio que não deveria ser menosprezado.
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A liberdade negacionista da direita nacional-libertária - Instituto Humanitas Unisinos - IHU