23 Mai 2025
As manchetes das principais publicações dos EUA em 8 de maio anunciaram em alto e bom som que o primeiro papa dos Estados Unidos havia sido eleito, mas os jornais do Peru, onde ele também é cidadão, discordaram.
A informação é de Rhina Guidos, publicada por Global Sisters Reporter, 22-05-2025.
“Leão XIV, o chiclayano”, dizia uma manchete, reivindicando-o como filho de Chiclayo, cidade na costa norte do Peru, onde ele foi bispo de 2015 até 2023. “Habemus Papa peruano”, dizia outra. O Papa Leão é “tão peruano quanto uma batata”, lia-se em um encarte com sua foto na capa.
O futuro Papa Leão XIV visita irmãs agostinianas no Peru nesta foto sem data. Como sacerdote agostiniano, o então padre Robert F. Prevost passou muitos anos como missionário no Peru e também atuou como bispo da Diocese de Chiclayo, naquele país. (OSV News/Cortesia da irmã agostiniana Carmen Toledano)
Chicago entrou na celebração, marcando o assento no estádio onde ele costumava assistir aos jogos do White Sox e dizendo que estava criando um “canto sagrado”. As pizzarias da Cidade dos Ventos criaram novos sabores para homenagear o papa nascido em seu meio.
“As pessoas dos EUA dizem ‘ele é americano’... os peruanos dizem ‘ele é peruano’ e agora a Espanha diz que seu DNA é espanhol por causa do seu [segundo] sobrenome, que é Martinez, e os franceses dizem que ele é francês por causa do seu [primeiro] sobrenome, Prevost”, disse dom Oswaldo Escobar, bispo de Chalatenango, El Salvador, durante uma missa de ação de graças em 19 de maio por Leão XIV. “Agora todo mundo está brigando para reivindicá-lo. Só estamos esperando El Salvador dizer que ele é salvadorenho”.
Ao sair para a varanda principal da Basílica de São Pedro como Papa Leão XIV, ele não mencionou nacionalidade alguma e, em vez disso, se identificou como “um filho de Santo Agostinho, um agostiniano”.
Mais do que qualquer país onde ele tenha passado muito tempo — seja o Peru, os EUA ou a Itália —, é sua identidade agostiniana que mais se destaca, disse a teóloga colombiana Consuelo Vélez.
“O papa tem uma nacionalidade latino-americana e trabalhou na América Latina, compartilhou as duras realidades com o povo, partilhou o pão com eles”, mas seria um exagero, como muitos têm feito, chamá-lo de segundo papa latino-americano depois de Francisco, disse ela.
“Ele é um agostiniano que viveu o Peru como missionário, e isso é uma experiência rica. Mas eu diria que ele é latino-americano? Não”.
Ele é discreto. Procura seguir o roteiro. Mede suas palavras, disse ela. Ele não tem o mesmo estilo “espontâneo, improvisado, ou como quiserem chamar” de Francisco, afirmou.
A irmã da Misericórdia Patricia Mulderick, que trabalhou com Leão em seus primeiros anos em Chulucanas, no Peru, disse que ele foi, no entanto, moldado pelas mesmas preocupações vividas pelos membros da vida consagrada — incluindo Francisco — que serviram na América Latina e enfrentaram um contexto semelhante.
“Ele se importa profundamente com as mesmas questões, especialmente com os pobres, com a comunidade migrante, com esse tipo de gente”, disse Mulderick, que ainda tem dificuldade em chamá-lo de Papa Leão e continua a se referir a ele como Robert.
A vida consagrada e o carisma de sua ordem, assim como moldaram Francisco como jesuíta, também moldaram o novo papa.
“Robert era um agostiniano para os agostinianos”, disse ela. “Ele é profundamente enraizado na vida consagrada. Está imerso em todo o sentido de comunidade dos agostinianos, essa comunidade de amigos. Eles realmente levam isso a sério”.
A irmã agostiniana Marlene Quispe, que conhece o papa desde seus primeiros anos no Peru, disse que o carisma da ordem é centrado na unidade, na busca pela verdade e na vida interior, para ajudar seus membros a servirem tanto à comunidade religiosa quanto aos outros. Como irmão religioso, Leão era alguém que encarnava todos esses valores, afirmou, o que o ajudava a transformar suas orações em ações quando outros — dentro e fora da comunidade — precisavam de ajuda.
“Quando tivemos as grandes enchentes, ele estava lá com seu povo tentando ajudar”, disse Mulderick, lembrando como, já como bispo, ele calçou botas de borracha e atravessou áreas alagadas para levar comida e suprimentos aos peruanos em 2023, quando chuvas torrenciais atingiram Chiclayo.
Em 2020, quando a Covid-19 chegou, ele conseguiu cilindros de oxigênio para os pobres.
O Peru, em meio às suas dificuldades, lhe deu a oportunidade de colocar o Evangelho no centro da vida e em prática, disse o bispo auxiliar de Cuzco, Lizardo Estrada Herrera, que também é agostiniano.
Estrada, agora secretário-geral do Conselho Episcopal Latino-Americano (CELAM), conheceu o futuro papa nos anos 1980. Naquela época, Estrada era um dos 70 jovens iniciando a vida religiosa com os agostinianos em Trujillo, no Peru, e Prevost era seu formador religioso.
Prevost, natural de Chicago, havia chegado ao Peru em 1985. Ele partiu em algumas ocasiões para longos períodos nos Estados Unidos e em Roma. Mas sempre retornava para ajudar nas vocações como a de Estrada, para viver e servir como sacerdote missionário em meio ao aumento da pobreza e da violência no país.
Foi ao Peru que Leão dirigiu algumas de suas primeiras palavras como pontífice, desviando do italiano para falar em espanhol, agradecendo a Chiclayo por tê-lo acompanhado como bispo.
“Ele ama o Peru e o Peru o ama”, e não há dúvida de que a vida como missionário agostiniano ali o transformou, acrescenta Estrada.
E embora muitos recordem os tempos idílicos de seus anos como missionário no país, pouco se falou sobre como ele foi afetado por viver em um lugar devastado pela violência do grupo comunista Sendero Luminoso, que começou a aterrorizar o país nos anos 1980, ou pela corrupção que gerou crises econômicas e forçou a migração em massa de peruanos.