30 Abril 2025
"Assim, esse novo papa, em nome da verdade (...) estabeleceria novas leis e regras. Motivados por essa coragem do papa, muitos poderiam ir adiante e pedir a ordenação de pessoas transexuais como presbítero ou presbítera, como existe em algumas igrejas protestantes", escreve Jung Mo Sung, teólogo e cientista da religião.
Imaginemos que algo inimaginável ocorreu no Conclave e o novo papa determina a ordenação das mulheres e que casais homossexuais e transexuais podem receber a benção do sacramento de matrimônio nas comunidades e nas paróquias do mundo inteiro. Os cristãos e os não cristãos progressistas do mundo iriam aclamar a coragem desse novo papa e as comunidades teológicas progressistas afirmariam e justificariam essas novas doutrinas em nome de uma verdade bem antiga, de que Deus não faz distinção entre os homens e mulheres, livres e escravos, gentios e judeus (Gal 3,28).
Frente ao estranhamento de muitos, teólogos e teólogas iriam explicar que as teologias ou leis canônicas da Igreja Católica que proibiam essas ordenações e matrimônios eram frutos de culturas patriarcais, machistas e heterossexuais que foram tornadas sagradas ou vistas como naturais. Assim, a Igreja Católica deveria também acompanhar o progresso cultural, científico e teológico e reconhecer que todos seres humanos são iguais e têm direitos fundamentais.
Assim, esse novo papa, em nome da verdade – seja ela encontrada na Bíblia, nas novas reflexões teológicas ou das ciências sociais e antropológicas –, estabeleceria novas leis e regras. Motivados por essa coragem do papa, muitos poderiam ir adiante e pedir a ordenação de pessoas transexuais como presbítero ou presbítera, como existe em algumas igrejas protestantes.
Mas, como nos ensina as ciências naturais e humano-sociais, toda ação gera reação ou reações e uma cadeia de efeitos não intencionais e também não previstas. Um efeito ou resultado (parcialmente) previsto seria a reação do chamado setor conservador da Igreja. Imagine, quando o Papa Francisco colocou os pobres e os imigrantes como um dos eixos centrais da sua preocupação pastoral já foi uma “confusão” na Igreja, o que aconteceria com essas ordenações e matrimônios nas paróquias.
De um lado, teríamos a luta contra esse novo papa herege; de outro, o apoio ao papa pelo caráter “revolucionário” ou “libertador” do seu anúncio e testemunho do Reino de Deus no mundo. Essa luta entre os “conservadores” e os “progressistas” significaria, com (quase) certeza um cisma na Igreja Católica.
Diante desse cenário imaginado, temos uma pergunta: Qual é a importância da Igreja Católica na vida do povo e no mundo geocultural-político atual? Podemos e devemos em nome de testemunhar o Reino de Deus romper o frágil “equilíbrio” no interior da Igreja ou esse testemunho justificaria o cisma?
Além dessa questão mais estratégica, temos um problema pedagógico. Podemos, em nome da “verdade” revelada na Bíblia de que Deus não faz distinção, impor ao povo de forma de “pedagogia bancária” (Paulo Freire) uma informação nova, uma nova lei? Sem levar em consideração como mudar uma cultura de centenas de anos?
A liberdade das igrejas evangélicas e pentecostais congregacionais pode atrair cristãos de igrejas historicamente mais antigas. Mas, ao mesmo tempo, essa liberdade significa menor força social e política no mundo. Por exemplo, um documento do Papa, A alegria do evangelho, que critica o capitalismo como uma economia que mata, tem o peso que tem na sociedade porque é de uma igreja tradicional e grande. Duas características que dificultam a renovação dela.
Pessoas que não dependem muito de uma comunidade da igreja para se expressar e se sentir pertencente a um grupo socialmente significativo não se importariam tanto com o cisma. Mas isso não é o caso das pessoas pobres ou que vivem em situação de marginalização ou de vulnerabilidade.
Com essas reflexões sobre o cisma, eu não estou propondo ou imaginando que teremos um cisma em nome dos valores do reino de Deus. Eu só quis usar essa imaginação para pensarmos sobre os limites das possibilidades ou, como diria um pensador dialético, as condições objetivas da realidade e as práxis possíveis.