24 Abril 2025
O artigo é de David Assael, judeu italiano, fundador e presidente da associação lech lechà, professor de filosofia e escritor, publicado por Domani, 23-04-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
A relação entre o papa Francisco e o mundo judaico foi marcada pela contradição, um teste decisivo para medir a coerência da Igreja Católica com os princípios reformistas estabelecidos pelo Concílio Vaticano II. Por um lado, a viagem de 2014 à Terra Santa, que foi seguida pela oração pela paz nos jardins do Vaticano com Abu Mazen e o então presidente israelense Shimon Peres, signatário dos Acordos de Oslo. Uma viagem na qual Bergoglio rezou no Muro das Lamentações e, primeiro papa da história, depositou uma coroa de flores no túmulo de Theodor Herzl.
E, novamente, a viagem a Auschwitz em 2016, onde Bergoglio pediu a Deus a graça de fazê-lo chorar diante daquele abismo de horror. Depois, em 2020, a abertura dos arquivos do Vaticano relativos ao Papa Pio XII, sobre cujo comportamento durante o Holocausto ainda pairam muitas sombras. Tudo isso acompanhado por gestos de proximidade e amizade para com as comunidades judaicas, começando com o desejo pelo feriado de Pessach dirigido à comunidade judaica romana durante um de seus primeiros angelus.
Comportamentos que pareceram em continuidade com o compromisso dialógico de Bergoglio durante seu mandato como cardeal em Buenos Aires, onde firmou uma profunda amizade com o rabino Abraham Skorka, com quem também escreveu um livro, In cielo e in terra, por ocasião do décimo aniversário de seu pontificado.
Ao lado de tudo isso, no entanto, estava a retomada de um vocabulário diretamente extraído da tradição cristã antijudaica mais reacionária: do legalismo dos fariseus ao Deus vingativo de Moisés, contraposto ao Deus amoroso e compassivo dos Evangelhos, passando pela reintrodução de termos considerados tabus naquela Europa marcada precisamente pela experiência conciliar, como a definição de Antigo Testamento, que ainda remete à imagem do judaísmo como uma velha ferramenta da qual é preciso se desfazer.
Embora suscitando perplexidade e tomadas de posição do lado judaico, a exumação dessas expressões nunca levou à suspensão das iniciativas de diálogo, como aconteceu no caso de Bento XVI, quando reintroduziu o missal retirado por Paulo VI, no qual se pedia esclarecimento para os judeus.
O verdadeiro ponto de ruptura entre o pontificado de Francisco e as comunidades judaicas foi 7 de outubro de 2023, o dia, como se sabe, do hediondo ataque do Hamas ao sul de Israel, que deu início à atual guerra de Gaza. Não se trata apenas de um apelo abstrato à paz traduzido em uma política inaceitável de equidistância para aqueles que sofreram um ataque daquela magnitude que chocou a consciência judaica.
Acima de tudo, certos gestos, como o contínuo adiamento do encontro com as famílias dos reféns, não foram compreendidos. Mais ainda, sentiu-se a falta de diplomacia do Vaticano em exercer pressão sobre o Hamas, uma tarefa deixada inteiramente para o mundo árabe, liderado pelo tão questionado Catar.
Certamente terá incidido a pressão exercida pelos bispos do Oriente Médio, cujos fiéis muitas vezes percebem uma comunidade de destino com as comunidades muçulmanas, com as quais compartilham a identidade árabe. Nessas atitudes, no entanto, parecem ter despontado preconceitos da formação terceiro-mundista de Bergoglio, que têm como corolário a imagem do sionismo como forma de imperialismo, quando, no mundo judaico, ele é percebido como expressão daquele princípio de autodeterminação dos povos, que, como lembrava Golda Meir, é invocado para todos, palestinos in primis, mas negado aos judeus.
Uma abordagem que acabou reforçando aquela teologia da substituição que, ao longo dos séculos, permitiu que a Igreja se definisse de Verus Israel, por ser capaz de realizar os ideais igualitários bíblicos negados pela perfídia judaica. Justamente aqui reside o verdadeiro desafio para a Igreja do futuro: ser capaz de encontrar aquela alternativa à teologia da substituição tão procurada pelo Concílio, que abriu caminho para uma redefinição das relações com a própria origem judaica após o trauma do Holocausto.
A julgar pela forma como o Corriere della Sera, o principal jornal diário da Itália, retomou ontem de um post Facebook, atribuído inclusive ao falecido rabino Elio Toaff, a flagrante fake news segundo a qual az lideranças do judaísmo romano não teriam participado do luto.