Faixa de Gaza: massacre no hospital anglicano Al-Ahli Arabi. Conselho Mundial de Igrejas: “Crime de guerra. Ataque de punição coletiva”

Foto: Reprodução | Youtube

18 Outubro 2023

Centenas de mortos no hospital anglicano em Gaza devido a um ataque atribuído a Israel e ao Hamas. As vítimas são, na sua maioria, pessoas deslocadas que encontraram refúgio no hospital, que sofreu um ataque no último sábado. O massacre provocou forte indignação e duras condenações. As palavras do arcebispo de Canterbury Justin Welby e do Conselho Mundial de Igrejas – CMI.

A reportagem é de Maria Chiara Biagioni e Daniele Rocchi, publicada por SIR, 17-10-2023. 

Seriam cerca de 300, mas algumas fontes falam de 500, vítimas de um ataque que, segundo um porta-voz do Ministério da Saúde do Hamas, atingiu esta noite o hospital batista Al-Ahli Arabi, no centro da cidade de Gaza. Ainda há muitas pessoas sob os escombros, relata a Al Jazeera através de repórteres no terreno. O hospital abrigava mil pessoas deslocadas, explicou à BBC o padre Richard Sewell, um dos principais expoentes da Igreja Anglicana em Jerusalém, que financia o hospital, totalmente independente de qualquer facção em Gaza. No fim da semana passada, diz, cerca de seis mil habitantes de Gaza, quase todos famílias, refugiaram-se no pátio do hospital que foi atingido pela primeira vez no dia 14 de outubro, ferindo quatro pessoas. Após este ataque aéreo, a maioria dos deslocados deixou o hospital, mas mil pessoas permaneceram. Muitos dos feridos são mulheres e crianças.

A versão de Israel

O Exército Israelense (IDF) está pronto para negar as acusações levantadas contra ele pelo Hamas, relatadas pela BBC: “O hospital não era um edifício sensível e não era um alvo do exército. O IDF está investigando a origem da explosão e, como sempre, dá prioridade à precisão e confiabilidade. Pedimos a todos que procedam com cautela ao relatar alegações não verificadas de uma organização terrorista." Esta primeira declaração foi seguida por outra que atribuiu a responsabilidade total pelo massacre a um foguete da Jihad Islâmica. Com base em “informações de inteligência, a causa da explosão no hospital em Gaza é um lançamento fracassado de um foguete da Jihad Islâmica”, afirma a IDF que especifica: “A análise dos sistemas operacionais da IDF mostra que uma barragem de foguetes inimigos foi lançada em direção a Israel, passando perto de um hospital, que foi atingido. De acordo com informações de inteligência de várias fontes, a Jihad Islâmica Palestina é responsável pelo lançamento fracassado que atingiu o hospital."

Reações

O massacre no hospital Al-Ahli Arabi ocorre poucas horas depois da chegada do presidente dos EUA, Joe Biden, a Israel. Uma viagem que o levará, depois de apenas algumas horas, a Amã para conversações com o rei da Jordânia, Abdullah, o presidente egípcio Abdel Fatah al-Sisi e o presidente da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas.

Este último teria cancelado o encontro com Biden após a notícia do ataque ao hospital em Gaza e convocado três dias de luto nacional. O foco das visitas foi o acordo com o governo de Benjamin Netanyahu sobre o fornecimento de ajuda humanitária e áreas seguras aos mais de 2 milhões de pessoas em Gaza que estão sob fogo inimigo e que necessitam urgentemente de água, alimentos e assistência médica.

Os protestos eclodiram em Amã, em frente à embaixada israelense, e em Ramallah, contra o presidente palestino, Abu Mazen. As reações internacionais ao massacre do hospital são fortes: o Ministério dos Negócios Estrangeiros turco fala de um “ataque bárbaro”.

O comentário iraniano é do mesmo tom, estigmatizante: “um crime de guerra feroz”.

(Foto: Caliber.az)

O Ministério dos Negócios Estrangeiros do Qatar afirma: “A expansão dos ataques israelitas à Faixa de Gaza para incluir hospitais, escolas e outros centros populacionais é uma escalada perigosa”.

Para o primeiro-ministro canadense, Justin Trudeau, "as notícias que chegam de Gaza são horríveis e absolutamente inaceitáveis… o direito internacional deve ser respeitado neste e em todos os casos. Existem regras sobre guerras e não é aceitável atingir um hospital".

O Egito e a Jordânia condenaram o ataque "nos termos mais fortes possíveis".

A Rússia e os Emirados Árabes Unidos convocaram uma reunião urgente e aberta do Conselho de Segurança da ONU para a manhã de 18 de outubro. Segundo o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, a operação “não está em conformidade com o direito internacional”. Questionada sobre o mesmo tema, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, recusou qualquer comentário enquanto aguarda confirmação.

A reação das Igrejas

“Esta é uma perda terrível e devastadora de vidas inocentes.” Assim comenta o Arcebispo de Cantuária, Justin Welby, de Londres, sobre o massacre ocorrido esta noite em Gaza, no Hospital Árabe al-Ahli. Em uma declaração, afirma: "Choro com nossos irmãos e irmãs: por favor, reze por eles. Renovo o meu apelo para que os civis sejam protegidos nesta guerra devastadora. Que o Senhor Deus tenha misericórdia."

A mídia local e inglesa fala de centenas de mortos e feridos. Ainda hoje, no Palácio de Lambeth – o coração da Comunhão Anglicana – o imã de Leicester, Xeque Ibrahim Mogra e o rabino da Nova Sinagoga do Norte de Londres, Jonathan Wittenberg, juntaram-se ao arcebispo de Canterbury para a oração pela paz. “Não podemos permitir que as sementes do ódio e do preconceito sejam semeadas novamente nas nossas comunidades”, disse Welby.

Forte condenação do Conselho Mundial de Igrejas (CMI), que expressou “indignação e choque” com a notícia do ataque ao hospital Al-Ahli em Gaza. “Milhares de palestinos que já tinham perdido as suas casas refugiavam-se no hospital, gerido pela Igreja Anglicana”, afirma o secretário-geral do CMI, Jerry Pillay. “O ataque equivale a uma punição coletiva, que é um crime de guerra segundo o direito internacional.”

Num comunicado enviado ao SIR, Pillay acrescentou que “a comunidade internacional deve responsabilizar Israel pelos crimes cometidos contra civis”. “O ataque – continua o secretário-geral – também é contrário a tudo o que os nossos valores monoteístas exigem de nós; isto é, a defesa da justiça, a promoção da paz e da dignidade humana de todos aqueles criados por Deus e à Sua imagem. O ataque não faz sentido, uma vez que foi dirigido contra um hospital, propriedade de uma igreja, contra pacientes e familiares que buscavam refúgio do incessante bombardeio de Israel”.

Pillay lembra também que o ataque ocorreu no mesmo dia em que os líderes das igrejas de Jerusalém organizaram um dia de oração pela paz. “Como o presidente dos EUA, Joe Biden, está programado para visitar Israel, instamo-lo a condenar este hediondo ataque ao hospital e apelamos ao governo israelita para parar o violento bombardeamento de Gaza e abrir um corredor humanitário”, diz Pillay. “Neste momento de dor, rezamos – conclui Pillay – para que as pessoas mortas no hospital Al-Ahli e todos aqueles que perderam a vida neste conflito possam descansar em paz. Enviamos nossas condolências às famílias enlutadas e votos de rápida recuperação aos feridos."

(Foto: caliber.az)

Os cristãos de Gaza

A notícia do massacre no hospital anglicano causou consternação na pequena comunidade cristã de Gaza, refugiada em grande parte na paróquia latina da Sagrada Família. A Irmã Nabila Saleh resumiu ao SIR o estado de espírito dos cristãos locais: “Neste momento não posso deixar de pensar no sofrimento das pessoas afetadas. Bilhões são gastos em mísseis e armas enquanto no mundo há pessoas morrendo de fome e sede. As chamadas democracias falam de direitos humanos, mas estes só existem no papel. Nossa terra está pingando sangue. Não temos para onde ir pedir paz. Não temos ninguém, só você. Em Ti colocamos esperança e justiça".

Leia mais