10 Outubro 2023
"A perspectiva política de uma solução palestina contribuiria para isolar o Irã e a construir novas relações com o mundo árabe", escreve Francesco Sisci, sinólogo italiano, professor da Universidade Renmin da China, em artigo publicado por Settimana News, 09-10-2023. A tradução é de Luisa Rabolini.
A guerra já em curso contra o Hamas precisa de uma estratégia e de um horizonte político antes mesmo que militar. Qual é o futuro de Israel: um Estado integrado dentro dele e na região ou sitiado?
Houve claramente um fracasso de inteligência no ataque do Hamas a Israel, mas mais profundamente houve um fracasso estratégico. [1] Desvaneceu a ideia de que o Hamas ficaria tranquilo na Faixa de Gaza enquanto Israel se concentrava na aquisição de territórios na Cisjordânia. Esse fracasso estratégico transformou mais uma vez o problema palestino de uma questão interna para uma questão internacional.
De fato, ao longo dos últimos vinte anos, o mundo árabe distanciou-se gradualmente da questão palestina e isso lançou as bases para uma série de normalizações de relações diplomáticas de Israel na região. Mas a premissa de tudo isso era que a instabilidade causada pelos palestinos não ultrapassasse um certo limite.
O ataque de sábado não foi um ataque terrorista, mas uma verdadeira ofensiva militar coordenada. O Hamas conseguiu iniciar uma guerra contra Israel e isso está levando os países árabes a ter que reconsiderar as suas posições.
Além disso, isso se insere num contexto extremamente volátil. Uma guerra entre Israel e o Hamas ajuda a Rússia no seu conflito na Ucrânia, pois distrai o Ocidente do seu apoio a Kiev. Também dá centralidade ao Irã que, por um lado, apoiou e organizou o ataque do Hamas e, por outro lado, é um dos principais fornecedores de armas à Rússia contra a Ucrânia.
A perspectiva de Moscou poderia reservar algumas surpresas. O primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, havia apostado numa relação especial com o presidente russo, Vladimir Putin, que poderia contribuir para garantir as ações do Hamas pelas pressões exercidas pela Síria.
Esse elaborado jogo de relações ruiu totalmente. Não está claro se Putin sabia do ataque e decidiu não avisar Netanyahu e, como resultado, não se sabe o que acontecerá com os laços estreitos de Israel com Moscou, que também apoia uma comunidade considerável e ativa que recentemente emigrou da Rússia para Israel.
Israel está preparando uma força de intervenção que pode manter Gaza completamente sob controle. As tropas posicionadas na fronteira têm de fato a antiga proporção napoleônica para a ocupação, um soldado para 20 habitantes, cem mil homens do exército contra dois milhões de habitantes de Gaza.
Contudo, é difícil imaginar que Israel possa permanecer em Gaza por muito tempo. Os custos e as dificuldades de todos os tipos de uma ocupação do território a longo prazo poderiam ser enormes.
Israel necessita, portanto, de uma nova estratégia geral em relação aos países árabes e aos palestinos. É necessário um horizonte claro para evitar a ligação entre as duas guerras em Israel e na Ucrânia e para evitar ou limitar a expansão do conflito que poderia sair do controle e já imediatamente impactar os mercados com efeitos imponderáveis.
Só assim o papel político de Teerã seria limitado, uma vez que está evidentemente tecendo uma teia política complexa em toda a região, exportando os seus problemas políticos internos para o exterior.
Embora não haja nenhum desejo na região de isolar o Irã, mas sim de tentar integrá-lo nas dinâmicas locais, também não há nenhum desejo de cair sob uma liderança política iraniana que passa por alimentar guerras à sua volta. Israel tem, portanto, uma oportunidade de desenvolver uma sua nova política e papel regional que, ao abraçar uma integração regional, isole os extremistas no Irã e assim coloque o regime em dificuldades.
Os palestinos em Gaza e na Cisjordânia não podem simplesmente desaparecer. Devem de alguma forma ser considerados e integrados no desenvolvimento futuro de Israel e devem ser afastados da nefasta influência política do Hamas ou de outros extremistas islâmicos. Esse é o principal ponto político que deve ser declarado e definido o mais rapidamente possível para conter os extremistas que atiçam as chamas de uma expansão do conflito.
Esta guerra deve ser um sucesso político e não apenas militar para Israel. Se o conflito em Israel se ampliasse e acabasse fora de controle e se ligasse estruturalmente à guerra na Ucrânia, não seria impossível pensar num conflito que envolvesse também a Europa e talvez chegasse até a China.
O que isso significa em termos políticos e sociais internos para Israel deve ser compreendido pela sociedade israelense em prol do seu futuro e bem-estar. A questão deve ser transferida de uma esfera religiosa para uma esfera prática e política.
Se ficar presa no âmbito religioso, faz o jogo do Hamas, que coloca a questão precisamente em termos religiosos. A perspectiva política de uma solução palestina contribuiria para isolar o Irã e a construir novas relações com o mundo árabe. Nessa fase, além disso, a coordenação de Israel com cada ator político torna-se essencial.
[1] Ver entrevista com Ely Karmon.
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Qual futuro para Israel. Artigo de Francesco Sisci - Instituto Humanitas Unisinos - IHU