14 Março 2025
"A ideia em si é correta, mas há dúvidas que devemos abordar", afirmou Putin, que expressou seu temor de que a Ucrânia aproveite a pausa para conseguir mais soldados e armamento.
A reportagem é publicada por Página|12, 14-03-2025.
O presidente russo, Vladimir Putin, apoiou nesta quinta-feira "a ideia de uma trégua" de 30 dias na Ucrânia, embora com muitas condições que se mostrou disposto a tratar em breve com seu homólogo norte-americano, Donald Trump.
De acordo com Putin, o acordo de cessar-fogo deve estar voltado também para uma paz duradoura entre os dois países, mas ressaltou que a situação na região russa de Kursk, onde a Ucrânia lançou uma ofensiva militar que, meio ano depois, foi finalmente derrotada por Moscou, representa um fator a ser considerado.
"A ideia em si é correta. E nós, naturalmente, a apoiamos, mas há dúvidas que devemos abordar", disse Putin em coletiva de imprensa após se reunir com o presidente bielorrusso, Alexander Lukashenko.
Agora, os emissários de Washington devem apresentar em breve aos dirigentes russos a proposta de Trump. O presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, aceitou essa iniciativa após seu tenso encontro com Trump em fevereiro, no Salão Oval.
Tras una pregunta a Vladímir Putin sobre la propuesta de tregua, el presidente de Rusia detalló su posicionamiento.
— RT en Español (@ActualidadRT) March 13, 2025
Comenzó agradeciendo a Trump y a los líderes de otros países que han hecho esfuerzos para lograr una solución al conflicto. https://t.co/MSbbtinnGP pic.twitter.com/WFZi6hYFGW
Tanto Putin quanto seu assessor diplomático, Yuri Ushakov, expressaram temor de que a Ucrânia aproveite a pausa para recrutar mais soldados e receber novas armas ocidentais. "Concordamos com as propostas para encerrar as hostilidades, mas partimos do princípio de que essa trégua deve levar a uma paz duradoura e abordar as causas profundas desta crise", declarou Putin.
Putin referia-se à necessidade de garantir que a Ucrânia nunca será membro da OTAN, algo em que o líder russo concorda plenamente com a nova administração dos Estados Unidos. "Somos a favor, mas há inconvenientes", insistiu o presidente russo, referindo-se à proposta de trégua. Ao falar dos obstáculos, questionou principalmente o que acontecerá com os soldados ucranianos que ainda combatem na região russa de Kursk.
"A situação está completamente sob nosso controle. O contingente que invadiu nosso território está isolado. Eles têm apenas duas opções: ou se rendem ou morrem", disse Putin.
Na quarta-feira, pela primeira vez, o presidente russo vestiu roupa camuflada e inspecionou as tropas em Kursk, onde os russos reconquistaram mais de 200 quilômetros quadrados, coincidindo com a suspensão da ajuda militar dos Estados Unidos à Ucrânia.
“Sólo habrá dos opciones: rendirse o morir”.
— RT en Español (@ActualidadRT) March 13, 2025
El presidente Vladímir Putin afirmó que la situación en la provincia de Kursk está bajo control y que las tropas ucranianas intentan evacuar la zona. pic.twitter.com/t7JIKKjRRx
Putin levantou várias questões que os Estados Unidos precisarão responder nos próximos dias, começando pela situação em Kursk. "Todos os que estão lá sairão sem combater? Devemos deixá-los partir depois de cometerem inúmeros crimes contra a população civil? Ou os líderes ucranianos lhes ordenarão que deporem as armas e se rendam? Como faremos isso? Não está claro", disse ele.
O líder russo expressou a mesma preocupação em relação à linha de frente em território ucraniano, onde as tropas russas avançam em quase todos os setores e têm chances de cercar grandes unidades inimigas. "Como esses 30 dias serão utilizados? Para que a Ucrânia continue a mobilização forçada? Para que armas sejam enviadas para lá?", questionou Putin, acrescentando que não está claro quem será responsável pelo controle e verificação do cessar-fogo e por impedir que o inimigo aproveite a pausa para se reagrupar.
Durante a coletiva de imprensa, Putin questionou quem dará as ordens sobre a suspensão das ações militares. "Imagine, são quase dois mil quilômetros. Quem decidirá onde e quem violou o possível acordo de cessar-fogo ao longo desses dois mil quilômetros?", perguntou. Segundo ele, essas questões exigirão um trabalho "árduo" de ambas as partes, e ele se mostrou disposto a discutir o tema com os Estados Unidos, que firmaram o acordo de trégua com a Ucrânia nesta semana na cidade saudita de Jidá.
"Talvez o presidente Trump e eu conversemos por telefone e discutamos isso juntos. Mas apoiamos a ideia de pôr fim ao conflito por meios pacíficos", afirmou Putin, agradecendo ao seu homólogo americano pelos esforços para encerrar a guerra na Ucrânia. "Gostaria de começar expressando minha gratidão ao presidente dos Estados Unidos, senhor Trump, por dar tanta atenção à solução do problema ucraniano", destacou.
Putin também ressaltou o interesse dos principais líderes do grupo BRICS – China, Índia, Brasil e África do Sul – na resolução do conflito. Já o assessor do Kremlin para assuntos internacionais, Yuri Ushakov, foi mais direto ao transmitir o sentimento real dentro do governo russo. "Parece-me que o documento foi feito de maneira precipitada. Precisamos trabalhar, refletir e levar em conta também nossa posição. O texto reflete apenas a perspectiva ucraniana", afirmou Ushakov.
A declaração de Putin foi considerada "muito promissora", mas "incompleta" pelo presidente dos EUA, que assumiu um novo mandato em janeiro. Trump afirmou nesta quinta-feira que seria "muito decepcionante" se a Rússia rejeitasse a trégua, que busca encerrar o conflito iniciado com a invasão russa em fevereiro de 2022. "Muitos dos detalhes de um acordo final já foram discutidos", acrescentou.
O presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, afirmou nesta quinta-feira que seu homólogo russo está se preparando para rejeitar a proposta americana de cessar-fogo na Ucrânia. "É claro que Putin tem medo de dizer diretamente ao presidente Trump que deseja continuar a guerra e seguir matando ucranianos", declarou Zelensky em seu discurso diário à população.
"Por isso, Moscou está cercando a ideia de cessar-fogo com pré-requisitos que ou farão a proposta fracassar ou a adiarão pelo máximo de tempo possível", argumentou Zelensky. Ele reiterou que Kiev aceitou a proposta americana para um cessar-fogo em toda a linha de frente e afirmou que seu cumprimento poderia ser monitorado com as capacidades militares dos Estados Unidos e de países europeus.
Enquanto isso, a situação segue instável na região russa de Kursk, fronteiriça com a Ucrânia, onde as forças de Kiev lançaram uma ofensiva surpresa em agosto passado e chegaram a reivindicar o controle de 1.400 quilômetros quadrados. Kiev pretendia usar esse avanço como moeda de troca em uma negociação com Moscou, que atualmente ocupa 20% do território ucraniano.
Nas últimas semanas, porém, o Kremlin tem recuperado terreno em Kursk e, nesta quinta-feira, reivindicou a tomada da cidade de Sudzha, a principal conquista ucraniana na região. Em resposta, Kiev ordenou a evacuação de oito localidades na região ucraniana de Sumy, localizada em frente a Kursk, devido ao "agravamento da situação operacional na região" e aos "bombardeios constantes".
Desde sua primeira conversa telefônica em 12 de fevereiro, Trump e Putin concordaram em reconstruir as relações bilaterais entre os dois países, após anos de hostilidade devido à ofensiva russa na Ucrânia e às expulsões mútuas de diplomatas. Delegações russas e americanas se reuniram na Arábia Saudita e na Turquia, o que resultou em uma mudança na posição dos EUA, desagradando Kiev e seus aliados europeus.
Trump e seu vice-presidente, JD Vance, surpreenderam o mundo ao confrontar Zelensky diretamente na Casa Branca. Os Estados Unidos chegaram a interromper sua ajuda militar e de inteligência – fatores cruciais para a Ucrânia. No entanto, após Kiev aceitar a ideia de uma trégua, Washington anunciou a retomada do apoio e pediu a Moscou que assine a proposta de cessar-fogo.