O Papa falou: mas será ainda necessária uma investigação para compreender que há um genocídio em Gaza?

Papa Francisco | Foto: Vicenzo Pinto / Agência Pública

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18 Novembro 2024

Testemunho da Faixa: “As palavras do pontífice são marcantes, mas são tardias e insuficientes”.

O relato é de Rita Baroud, jovem palestina de 21 anos, publicado por La Repubblica, 17-11-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.

Em Gaza, onde a vida está entrelaçada com a morte, cada dia surge cheio de novos desafios. Em meio aos escombros de casas destruídas pela guerra e aos sons diários de drones zumbindo no céu, a vida parece uma luta sem fim pela sobrevivência. À medida que navegamos neste vórtice, a declaração do Papa Francisco apelando a uma investigação sobre se o que está a acontecer em Gaza pode ser classificado como genocídio é impressionante, embora tardia.

Quando li a notícia para minha família, a resposta foi unânime: "Agora? Depois de tudo isso?" Poucas palavras que contenham raiva e frustração. A declaração veio demasiado tarde, depois de milhares de vidas terem sido perdidas e de destruição testemunhada. Não foi apenas o momento que foi frustrante, mas a própria natureza da declaração. As palavras do Papa careciam de clareza e não ofereciam soluções concretas. Não houve nenhum pedido de trégua ou ajuda imediata para as vítimas, apenas uma série de perguntas sem resposta.

O aspecto mais desconcertante foi o uso da palavra “investigação” em vez de “reconhecimento”. A palavra “investigação” sugere hesitação, como se o mundo ainda precisasse de mais provas, apesar da verdade flagrante. Os aviões de guerra israelitas atacaram casas, crianças foram soterradas sob os escombros e os corpos foram deixados nas ruas porque ninguém conseguia transportá-los para os hospitais. O que o mundo ainda não viu?

Genocídio em Gaza não é um termo teórico, mas uma realidade vivida por todos os que aqui permanecem. Manifesta-se em assassinatos em massa, tendo como alvo casas, hospitais e áreas residenciais, matando civis impiedosamente; com os danos físicos e psicológicos dos bombardeamentos de crianças nas ruas e o terror diário que causa traumas duradouros; com a fome sistemática, bloqueando o acesso a alimentos, água e eletricidade, criando condições de vida insuportáveis; e com o apagamento do futuro, o assassinato de crianças e a destruição de escolas e infra-estruturas que ameaçam a sobrevivência da sociedade palestiniana.

Se o que está acontecendo em Gaza estivesse acontecendo em qualquer outro lugar do mundo, a resposta seria muito diferente. O mundo levantar-se-ia para pôr fim à tragédia e haveria uma ação internacional imediata. Mas aqui em Gaza, as nossas vidas parecem estar reduzidas a números sem sentido.

A declaração do Papa, embora significativa, levanta outra questão: poderá esta hesitação fazer parte de uma cumplicidade internacional mais ampla? Quando um líder global como o Papa apela a uma “investigação”, dá ao mundo uma desculpa para continuar em silêncio em vez de agir. Gaza não precisa de investigação, precisa de ação. Cada momento de atraso custa vidas e apaga o futuro.

A vida em Gaza não é um slogan, mas sim os rostos de crianças que, enquanto brincam nas ruas, podem tornar-se alvos a qualquer momento. São mães fazendo fila para conseguir pão. São sons de explosões que perfuram o silêncio da noite, lembrando-nos que a segurança é uma ilusão.

A questão que me atormenta é: quanto mais sangue deve ser derramado antes que o mundo entre em ação? E quanto tempo necessitam os líderes para reconhecer a verdade que vivemos todos os dias? Gaza hoje não é apenas um símbolo de sofrimento, mas um teste para o mundo - um teste à sua vontade de enfrentar a injustiça e salvar vidas. Estamos aqui, vivendo, resistindo e gritando até que o mundo nos ouça. Mas não vamos esperar para sempre.

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