28 Novembro 2025
O plano, revelado pelo Wall Street Journal, detalha como 800 mil soldados alemães, americanos e de outros países da OTAN seriam transportados para o leste, em direção às linhas de frente.
A informação é de Natasha Caragnano, publicada por La Repubblica, 27-11-2025
Há cerca de dois anos e meio, uma dúzia de oficiais alemães de alta patente se reuniu em um quartel anônimo em Berlim para trabalhar em um plano secreto para lidar com uma potencial guerra com a Rússia. Moscou havia lançado recentemente sua operação contra a Ucrânia, trazendo o conflito de volta à porta da Europa pela primeira vez desde o fim da Segunda Guerra Mundial. Poucos dias depois, o tenente-general André Bodemann recebeu a tarefa de redigir o Oplan Deu (Plano Operacional Alemanha): um documento confidencial de 12 mil páginas detalhando a movimentação de 800 mil soldados da OTAN — incluindo tropas alemãs e americanas — para a Frente Oriental, indicando portos, rios, ferrovias, estradas e métodos de abastecimento e proteção.
O relatório, divulgado pelo Wall Street Journal, prevê a Alemanha não como uma frente direta, mas como o centro logístico da OTAN em caso de guerra. Protegida ao sul pela barreira natural dos Alpes, o país se tornaria o principal corredor de trânsito para as tropas aliadas que se deslocassem para o leste, independentemente da localização de um possível ataque russo.
Segundo as autoridades alemãs, Moscou poderá ser capaz de atingir a OTAN até 2029, mas o aumento acentuado de sabotagens, ciberataques e incursões no espaço aéreo europeu levanta preocupações de que os preparativos russos possam estar mais avançados do que o esperado. Um possível cessar-fogo na Ucrânia poderia liberar recursos e tempo para a Rússia, permitindo que ela concentrasse uma pressão renovada sobre os países membros da Aliança. O objetivo não é alimentar essa escalada, mas sim fortalecer a dissuasão. "Precisamos deixar claro para nossos inimigos que, se nos atacarem, não terão sucesso", explicou ao Wall Street Journal um dos funcionários envolvidos no projeto.
O retorno à lógica da Guerra Fria.
Mas para que a Operação Deu funcione, é necessária a contribuição de todos: forças armadas, órgãos civis, governos locais, infraestrutura pública e setor industrial. Essa mobilização remonta à Guerra Fria, mas foi atualizada para enfrentar as ameaças e os problemas críticos contemporâneos: infraestrutura frequentemente precária, legislação inadequada para necessidades emergenciais e um exército muito menor hoje do que no passado.
No final de setembro, em Hamburgo, tudo isso foi posto à prova com o Red Storm Bravo, um exercício concebido para testar a cooperação entre o exército, a polícia, os bombeiros e a defesa civil. O cenário era uma versão reduzida do Oplan Deu: quinhentos soldados da OTAN desembarcaram no porto da cidade ao pôr do sol e formaram um comboio de 65 veículos em direção ao leste, enfrentando tentativas de bloqueio da área, ataques com drones e protestos. A polícia, no entanto, não dispunha dos recursos necessários para dispersar os manifestantes que se reuniram na estrada para bloquear o comboio. Foram necessárias duas horas para que os veículos voltassem a circular. Todos os erros e falhas foram incorporados ao plano: um ensaio havia destacado a necessidade de semáforos para aliviar os congestionamentos, por exemplo, ou o terreno não ser grande o suficiente para acomodar o acampamento das tropas.
O obstáculo da infraestrutura
Mas o principal obstáculo demonstrado por esses exercícios foi a infraestrutura. Durante a Guerra Fria, rodovias, pontes, estâncias ferroviárias e portos foram projetados para servir como recursos militares, se necessário. As estradas foram construídas para acomodar até mesmo pousos de emergência: os guarda-corpos podiam ser removidos, uma torre de controle móvel podia ser instalada em minutos e tanques de querosene ficavam localizados sob os estacionamentos. Então a Guerra Fria terminou, e com ela a necessidade de infraestrutura de uso duplo. Túneis e pontes construídos posteriormente eram frequentemente estreitos demais ou frágeis demais para acomodar comboios.
Berlim planeja investir € 166 bilhões até 2029, dos quais mais de € 100 bilhões serão destinados a ferrovias negligenciadas e à construção de infraestrutura de uso duplo, civil e militar. Os portos alemães no Mar do Norte e no Mar Báltico necessitam de € 15 bilhões em obras. Não é coincidência que os gargalos no mapa da mobilidade militar estejam entre os segredos mais bem guardados do projeto.
A resposta à sabotagem
Se a Alemanha se tornasse o pilar da OTATN, o objetivo da Rússia passaria a ser a sabotagem de infraestruturas. Essa estratégia já está em curso, como demonstram os danos causados aos trilhos na Polônia, e a legislação alemã dificulta a sua proteção. Drones do exército, por exemplo, estão proibidos de sobrevoar áreas urbanizadas. A lei também exige que sejam equipados com luzes de posição. "Isso faz sentido para uso civil, mas anula o propósito no âmbito militar", afirmou Peter Strobel, chefe de relações públicas da Quantum Systems, fabricante de drones de vigilância apoiada por Peter Thiel que está em negociações com a Bundeswehr para fornecer proteção a comboios e infraestruturas para a Operação Oplan.
A Bundeswehr está otimista com o progresso alcançado, considerando que começaram do zero no início de 2023. Mas, como demonstraram os recentes testes de estresse, ainda há muito trabalho a ser feito para que a Alemanha se torne o centro logístico da OTAN idealizado pelos 12 oficiais. E a maior incerteza para os planejadores é o clima, porque, como nos lembra o chanceler alemão Friedrich Merz, ainda não estamos em guerra, mas já não vivemos em tempos de paz.
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