18 Novembro 2025
Organizações indígenas marcharam na manhã desta segunda-feira (17) pedindo homologações de terras e o reconhecimento da demarcação como política climática. Pedido das organizações ocorreu antes da ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, anunciar portarias para reconhecer 10 terras indígenas.
A informação é de Jullie Pereira, publicada por InfoAmazônia, 17-11-2025.
O movimento indígena pediu a demissão do ministro da Casa Civil, Rui Costa, durante a Marcha Global Indígena, realizada nesta segunda-feira (17). As lideranças acusam o ministro de travar novas demarcações de territórios. Após a marcha, a ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, anunciou que o Ministério da Justiça e Segurança Pública assinou a portaria declaratória. As portarias declaratórias são uma das últimas etapas formais do processo de demarcação. Elas reconhecem o perímetro da área e determinam a instalação dos limites físicos do território. Após essa fase, a terra é homologada e registrada como de usufruto exclusivo das populações que nela vivem. para a demarcação de 10 Terras Indígenas (TIs).
A demarcação de uma TI envolve cinco etapas, sendo a passagem pela Casa Civil a fase anterior ao registro final. Nessa fase, a pasta coordena a articulação política entre os órgãos do governo envolvidos e elabora o decreto de homologação, que depois segue para a assinatura do presidente. Dessa forma, o andamento dos 10 processos anunciados por Guajajara ainda devem passar pela pasta comandada por Rui Costa.
O coordenador executivo da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), Kleber Karipuna, afirma que é na Casa Civil que os processos travam. Ele explica que os diálogos ocorrem desde o início do ano com o Ministério dos Povos Indígenas (MPI), com a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e com o Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) e que todos eles apresentam boas respostas, mas quando o processo chega à Casa Civil, cujo ministro é o Rui Costa, eles são interrompidos.
“A gente começou a identificar que essa barreira está sendo na Casa Civil. O ministro Rui Costa não deixa as coisas chegarem para o presidente Lula. Então, a gente, as lideranças, estamos falando aqui, trazendo um protesto para o presidente Lula exonerar o Rui Costa. Ele está atrapalhando o avanço das demarcações”, contou.
Em resposta à InfoAmazonia, a Casa Civil negou que esteja travando o processo. “É importante esclarecer que, uma vez encaminhado à Casa Civil, o processo de homologação de terras indígenas segue o trâmite regimental necessário para ser levado a despacho e, posteriormente, publicado, desde que não haja qualquer óbice do ponto de vista legal. Portanto, não é verdadeira a informação de que a Casa Civil esteja travando a homologação dessas terras”, disse, em nota.
Na Marcha Global Indígena, cerca de 3 mil indígenas saíram, à pé, da Aldeia COP, localizada na Universidade Federal do Pará (UFPA), até o Bosque Rodrigues Alves, onde fica a Secretaria de Meio Ambiente do estado. No caminho, houve gritos de ‘fora, Rui Costa’. “Presidente [Lula], se quer fazer uma coisa boa, demita seu braço direito na Casa Civil. Rui Costa não gosta dos povos originários”, disse a líder Nádia Tupinambá, da Bahia.
A cobrança pelas homologações ocorre desde o início do ano, quando a campanha ‘A resposta somos nós’ foi lançada pela Apib. Agora, com a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30), eles exigem que as assinaturas sejam concretizadas e os anúncios oficializados.
Demarcação como política climática
Em outubro, a Apib lançou uma cartilha mostrando que 107 territórios aguardam a caneta do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, sem nenhum impedimento legal ou jurídico. Em entrevista à InfoAmazonia, a ministra Sonia Guajajara informou que as demarcações ainda não ocorreram na COP30 porque o governo quer ter certeza de que a decisão não será contestada no Supremo Tribunal Federal (STF), como ocorreu outras vezes.
Na marcha, a ministra Sonia Guajajara afirmou reforçou o compromisso para que as regularizações aconteçam. “É isso o que vocês estão fazendo agora: reivindicando a demarcação das terras indígenas e nós estamos lá com essa mesma mensagem. E é por isso que ainda nesta COP o presidente Lula vai fazer mais esse gesto para avançar com a demarcação das terras indígenas”, disse.
O ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República, Guilherme Boulos, também está ajudando nas negociações e esteve na marcha. A reportagem perguntou a ele sobre os entraves com o ministro da Casa Civil, mas Boulos não respondeu.
As portarias declaratórias são uma das últimas etapas formais do processo de demarcação. Elas reconhecem o perímetro da área e determinam a instalação dos limites físicos do território. Após essa fase, a terra é homologada e registrada como de usufruto exclusivo das populações que nela vivem.
Presença indígena
Na marcha os indígenas também comemoram a grande participação na conferência, mas continuam exigindo que essa presença ocorra também nas mesas de negociações. Eles querem fazer parte da delegação oficial como negociadores do Brasil.
Neste ano, eles entraram como ‘party overflow’, ou seja, como participantes da delegação que podem entrar nas reuniões, mas não podem se manifestar, apenas escutar. São 30 pessoas indígenas nessa função, que todos os dias relatam os resultados das conversas para as comunidades e lideranças.
A jovem ativista Txai Suruí, afirma que ainda é necessário mais. “Perguntaram por que se devia fazer a COP na Amazônia. E a resposta está muito clara. A nossa participação vai pressioná-los. A gente tem singelos gestos para os povos indígenas, mas a gente precisa ainda avançar. A própria questão do financiamento sempre é um entrave. Os países mais ricos não querem contribuir para a nossa adaptação. Eu acho que ainda tem muita coisa pra acontecer e os povos indígenas vêm mostrando nessa COP que não tem resposta para as emergências climáticas, a resposta somos nós”, disse.
A líder Alessandra Munduruku também esteve na marcha e pediu as demarcações, além da suspensão do Decreto nº 12.600/2025, que inclui empreendimentos públicos federais do setor hidroviário no Programa Nacional de Desestatização (PND). Com isso, o governo abre caminho para conceder parte das rotas fluviais do rio Madeira, rio Tocantins e rio Tapajós para iniciativa privada.
“Quantas mortes, quantas pessoas, nós, da floresta, vamos morrer pra ter respeitado nossos direitos, ter a nossa demarcação? Quantas vezes nós vamos morrer por causa das mineradoras, do petróleo? São 525 anos. O Estado, até agora, não fez nada para proteger os nossos povos indígena”, disse.
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