Por: André/Cepat | 18 Março 2014
A análise da Conjuntura da Semana é uma (re)leitura das Notícias do Dia publicadas diariamente no sítio do IHU. A análise é elaborada, em fina sintonia com o Instituto Humanitas Unisinos – IHU, pelos colegas do Centro de Pesquisa e Apoio aos Trabalhadores – CEPAT, parceiro estratégico do IHU, com sede em Curitiba-PR, e por Cesar Sanson, professor na Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN, parceiro do IHU na elaboração das Notícias do Dia. Para as análises eclesiais conta-se também com a contribuição de André Langer, professor na Faculdade Vicentina - FAVI e que realiza traduções diárias para o sítio do IHU.
Índice
O Papa Francisco, ano 1. Dez traços distintivos
1. O homem Francisco que mudou a cara do papado
2. Combate ao clericalismo
3. A busca do verdadeiro diálogo e da sinodalidade
4. O teste de Francisco: a convocação para o Sínodo Extraordinário das Famílias
5. Francisco é todo comunicação
6. A atuação de Francisco em nível global
7. Enfrentamento da questão econômica
8. A teologia de Bergoglio
9. A espiritualidade inaciana
10. Alguns desafios
Eis a análise.
O Papa Francisco, aquele “que veio do fim do mundo”, já completou, no dia 13 de março, um ano de pontificado. Uma eleição que se tornou uma agradável surpresa para toda a Igreja. Com seu estilo mais leve, espontâneo, evangélico, “do povo”, mas nem por isso menos firme e ousado, cativou amplos setores da Igreja e da sociedade mundial, a ponto de tornar-se uma referência. Abre cenários para se pensar numa “primavera” na Igreja. Mas não está isento de contradições e resistências.
Fonte: http://goo.gl/VPbDTa |
A imprensa mundial está focada nos gestos, palavras e ações de Francisco. Seus movimentos atraem e sensibilizam, fazendo com que haja um enorme volume de informações sobre o seu pontificado. O sítio do Instituto Humanitas Unisinos – IHU tem procurado acompanhar atentamente essa evolução. Já foram feitas três análises sobre aspectos mais circunscritos, tais como: os primeiros dias do seu pontificado (08-04-2013), sua viagem a Lampedusa (15-07) e a Encíclica Evangelii Gaudium (11-12).
Aqui, não se trata de fazer uma análise exaustiva do significado do primeiro ano do pontificado de Francisco, mas antes oferecer um mapa, isto é, algumas referências que podem ajudar a desbravar no mar de informações disponíveis no sítio do IHU. A disposição em pontos enumerados não significa uma classificação por ordem de importância, senão um recurso meramente pedagógico.
Desejamos a todas e todos uma boa leitura.
1. O homem Francisco que mudou a cara do papado
“O papa é um homem que ri, chora, dorme tranquilo e tem amigos, como todos. Uma pessoa normal”, afirmou o papa Francisco em uma entrevista concedida recentemente, após criticar as tentativas de apresentá-lo como “uma espécie de super-homem, uma espécie de estrela”, algo que lhe parece ofensivo. E isso está de acordo com o que já enfatizava o sacerdote jesuíta Antonio Spadaro, ao afirmar que o Papa gosta da normalidade: “As coisas que nos chamam tanto a atenção eram parte da sua vida cotidiana de bispo próximo das pessoas”, quando ainda estava na Argentina.
Francisco não se esforça para ser popular e estar próximo das pessoas, simplesmente age como sempre agiu. Como bem frisou o diretor do Centro Televisivo Vaticano (CTV), padre Dario Viganò: “É seu estilo desde sempre, o seu modo para manter relações com os padres de sua diocese, com as famílias que ele conhecia e com as realidades com as quais ele entrava em comunicação. Algumas pessoas ele chama por telefone, a outras ele manda um pequeno bilhete”.
Fonte: http://goo.gl/w2Cvpw |
Bergoglio levou para o seu ministério petrino o seu jeito próprio de ser. Como bem lembrou o cardeal brasileiro Claudio Hummes, já no dia de sua eleição “foi se vestir como papa na antiga sacristia da Capela Sistina e lá ele começou a relaxar. Logo fez gestos significativos: não vestiu o manto mais solene, não quis a cruz de ouro. Também não colocou os sapatos vermelhos, ficou com os seus. Disse que queria usar a estola apenas para a bênção. Voltou para a capela assim, despojado, vestido com simplicidade, com os sapatos pretos com os quais tinha chegado de Buenos Aires. Havia um trono onde ele devia se sentar para a saudação, como prevê o cerimonial. Mas ele ficou de pé, abraçou os cardeais um por um com uma espontaneidade maravilhosa. Já era Francisco que agia”.
É essa a forma como tem sido o exercício do seu poder pontifício ao longo desse primeiro ano. Simplicidade, humildade e proximidade. De sua entrevista concedida ao conjunto de revistas jesuítas, realizada pelo padre Antonio Spadaro, o teólogo Juan Masiá sublinhou as principais expressões que demonstram a capacidade de discernimento e abertura do Papa: “acompanhar, buscar, ser criativo, aprender dos outros, aprender com o tempo, consultar, síntese de juventude e velhice, de cultura, fé e vida, caminhar por caminhos novos, sair de si, viver em periferias e fronteiras, animar ao invés de se lamentar, ler os sinais dos tempos, pensar com o pensamento aberto e incompleto, discernir mais do que discutir, narrar mais do que teorizar, levar em consideração as pessoas...”.
Esse é o papa Francisco, cuja vida ratifica o que anuncia: “abandonou parte da parafernália que seus predecessores usavam. Dispensou os espaçosos apartamentos papais no Palácio Apostólico e optou por um pequeno apartamento em uma casa de hóspedes (Casa Santa Marta) e se desloca em um carro normal, ao invés da limusine papal”.
2. Combate ao clericalismo
Francisco mostra-se desde o princípio do Pontificado um ferrenho crítico do clericalismo. Trata-a como uma “tentação muito atual”, no encontro com o comitê de coordenação do Conselho Episcopal Latino-Americano (Celam), em sua passagem pelo Rio, em julho passado, por ocasião da Jornada Mundial da Juventude. Denuncia, paralelamente, a clericalização dos leigos e sua infantilização.
A crítica ao clericalismo aparece também na sua insistência em “ir às periferias geográficas e existenciais”, em que os pastores tenham “cheiro de ovelhas”, em que prefere uma “Igreja acidentada a uma Igreja doente”. Enfim, em que os pastores deixem de ter uma “psicologia de príncipes”, que vivem na corte, que ele caracteriza como “lepra”, na entrevista com Scalfari.
No encontro com cerca de 6.000 seminaristas e noviças que Francisco teve em começo de julho no Vaticano, insiste em que os religiosos devem “evangelizar primeiro com o exemplo e em seguida com as palavras”. O que requer despojamento, e uma Igreja mais simples e mais austera em seus modos de viver. E ele mesmo começou a reforma (espiritual) da Igreja exatamente pelos seus múltiplos exemplos.
Suas críticas dirigem-se, especificamente, ora à cúria, ora aos cardeais, ora aos bispos, ora ainda aos padres. Seu modo de viver e sua pregação são um incômodo permanente. Aos padres da diocese de Roma, Francisco disse que os “padres de laboratório” não ajudam a Igreja. A missão requer misturar-se com o povo, ir às ruas, correr riscos, ser menos calculista e mais próximo do povo, misturar-se com ele, ter “cheiro de povo”. E aconselha aos padres o “sofrimento pastoral”, isto é, “sofrer por e com as pessoas”. Deixar de ser burocrata, para ser pastor. Porque o horizonte último é a missionariedade e não a própria instituição e sua autorreprodução.
Outra grande insistência de Francisco no sentido de ter uma Igreja menos clerical e mais pastoral, missionária diz respeito à escolha dos bispos. Em diversas ocasiões, deixou claro que a Igreja tem necessidade de bispos próximos do povo, compassivos e misericordiosos, que não sejam ambiciosos e cujos nomes tenham sido “pronunciados por Deus”, e não escolhidos segundo simpatias, deixou claro no seu encontro com a Congregação para o Clero, em fevereiro passado.
3. A busca do verdadeiro diálogo e da sinodalidade
O papa Francisco tem trabalhado em prol de uma Igreja aberta ao diálogo com as outras religiões, ao diálogo ecumênico e também que respeite as instâncias de decisão das conferências episcopais espalhadas pelo mundo.
Também na histórica entrevista concedida ao padre Antonio Spadaro, Francisco enfatizou o papel que devem desempenhar os organismos curiais: “Os dicastérios romanos estão a serviço do Papa e dos bispos: têm que ajudar as Igrejas particulares e as conferências episcopais. São instâncias de ajuda. Mas, em alguns casos, quando não são bem entendidos, correm o risco de se converterem em organismos de censura. Impressiona ver as denúncias de falta de ortodoxia que chegam a Roma. Penso que quem deve estudar os casos são as conferências episcopais locais, às quais Roma pode servir de valiosa ajuda. A verdade é que os casos são tratados melhor no próprio local. Os dicastérios romanos são mediadores, não intermediários, nem gestores”.
Na sequência, o papa Francisco demonstra uma enorme capacidade de diálogo e abertura: “Devemos viver a sinodalidade em vários níveis. Talvez seja tempo de mudar a metodologia do sínodo, porque a atual parece-me estática. Isto poderá também ter valor ecumênico, especialmente com os nossos irmãos ortodoxos. Deles se pode aprender mais sobre o sentido da colegialidade episcopal e sobre a tradição da sinodalidade. O esforço de reflexão comum, vendo o modo como se governava a Igreja nos primeiros séculos, antes da ruptura entre Oriente e Ocidente, acabará dando frutos”.
Em sua Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, novamente, enfatiza a necessidade de uma “salutar descentralização” e fala em “conversão do papado” para que possa manter fidelidade ao ministério incumbido por Jesus Cristo e às “necessidades atuais da evangelização”. O Papa considera que a abertura do Concílio Vaticano II ao poder de decisão das conferências episcopais ainda não se realizou plenamente e que “uma centralização excessiva, em vez de ajudar, complica a vida da Igreja e a sua dinâmica missionária”.
Na opinião do metropolita de Pérgamo e copresidente da Comissão Internacional de diálogo entre a Igreja católica e a Igreja ortodoxa, Ionnis Zizioulas, “o papa Francisco parece conceber e colocar a si mesmo como e, sobretudo, Bispo de Roma. Caso se caminhe na via que sugerem estas duas coordenadas (compreender-se primeiro como bispo e reconhecer a sinodalidade da Igreja), acredito que será muito fácil que os ortodoxos e os católicos se encontrem na unidade sacramental, como irmãos em Cristo, e não somente como aliados nas estratégias culturais e batalhas éticas”.
Um passo fundamental do Papa em direção à colegialidade foi a efetivação como “oficial e permanente” do Conselho de Cardeais (oito cardeais de diferentes partes do mundo). Esse conselho tem a tarefa de ajudá-lo no governo da Igreja universal e de estudar um projeto de revisão da Constituição Apostólica Pastor Bonus sobre a Cúria Romana. Nas palavras do Papa, o conselho “será uma expressão a mais da comunhão episcopal e do auxílio ao múnus petrinum que o Episcopado espalhado pelo mundo pode oferecer”.
4. O teste de Francisco: a convocação para o Sínodo Extraordinário das Famílias
É no bojo desse esforço por uma Igreja mais colegial que é possível interpretar a convocação para o Sínodo Extraordinário das Famílias, com o lema: “Os desafios pastorais da família no contexto da evangelização”.
O presidente do Conselho dos Cardeais, o cardeal hondurenho Óscar Andrés Rodríguez Maradiaga, já havia apontado que “a prioridade indicada pelo Santo Padre é a reforma do Sínodo dos Bispos, o órgão da Igreja que ajuda o pontífice nas suas decisões”. Concordando com o Papa, Maradiaga considera que “a sinodalidade, a relação de colaboração dos bispos com o pontífice, indicada pelo Concílio Vaticano II, não foi bem desenvolvida”.
Desse modo, as mudanças já aparecem efetivamente na convocação do Sínodo das Famílias. Para o professor e presidente do Centro de Estudos em História da Igreja na América Latina - CEHILA-Brasil, Sérgio Coutinho, “Francisco quer fazer deste Sínodo Extraordinário um forte gesto de “política interna”, um “balão de ensaio” para iniciar uma reforma prevista pelo Vaticano II e que ainda não foi colocado em prática em sua plenitude. Falo de se ultrapassar uma colegialidade meramente “afetiva” para uma colegialidade decididamente “efetiva”.
Para esse Sínodo, o Vaticano enviou para as dioceses um documento preparatório, com 38 questões, cujas respostas deveriam ser devolvidas até o final do último mês de janeiro. Como bem descreveu Coutinho, “os temas vão desde a difusão dos ensinamentos da Igreja e da Bíblia sobre a família, passando pelas relações entre “lei natural e lei civil”, as conquistas da pastoral familiar, as ações tomadas “para enfrentar situações matrimoniais difíceis” (como aquelas em que não crentes desejam se casar na Igreja), “a união de pessoas do mesmo sexo”, a educação dos filhos em “matrimônios irregulares”, a questão do planejamento familiar, a tensão entre a pessoa e a família e “outros desafios”.
A novidade está no fato do Sínodo ser organizado como dois eventos. Um Sínodo Extraordinário em 2014 “para recolher ideias e propostas iniciais, e, em seguida, uma “Sínodo Ordinário” em 2015 para adotar as soluções propostas a serem apresentadas ao Papa.
Nesse último mês de fevereiro, o discurso do cardeal Walter Kasper, no Consistório Extraordinário sobre a Família, deu o tom de como serão enfrentadas uma série de questões que desafiam o trabalho pastoral da Igreja no contexto contemporâneo. Por solicitação do próprio Papa, Kasper não apresentou propostas, mas, sim, questionamentos a respeito dos desafios que envolvem a família hoje, com ênfase na situação dos divorciados e em segunda união.
Em seu discurso, Kasper afirmou que “não basta considerar o problema só do ponto de vista e da perspectiva da Igreja como instituição sacramental; precisamos de uma mudança de paradigma e devemos – como fez o bom samaritano (Lc 10, 29-37) – considerar a situação também a partir da perspectiva de quem sofre e pede ajuda”.
5. Francisco é todo comunicação
Francisco se comunica por inteiro. Seus gestos, palavras e expressão corporal estão em sintonia com a mensagem que anuncia. Tem sido assim na utilização dos meios que tem à disposição para levar adiante o seu inovador pontificado.
“Para o papa Francisco não há uma mensagem e um meio. Há uma mensagem que plasma e modela a forma na qual se expressa. A primeira forma é o seu próprio corpo. O papa Francisco administra a própria corporeidade de maneira naturalmente desbalanceada sobre o interlocutor. Não tem uma compostura rígida, mas é uma flexibilidade que o leva a assumir uma profunda concentração absorvida, como acontece quando celebra a missa, por exemplo; ou um impulso no qual poderia dar a impressão de perder o equilíbrio”, considera o jesuíta Antonio Spadaro.
Fonte: http://goo.gl/4vwnW4 |
Como já se destacou na Análise de Conjuntura “O Papa Francisco e o ‘magistério das entrevistas’, o Papa “revoluciona na sua maneira de se comunicar com o mundo ao não se comunicar pelos meios convencionais de comunicação eclesial: a encíclica, a Rádio Vaticano, o jornal da Santa Sé, o L`Osservatore Romano. Ao contrário, fala pelos meios ‘modernos’, ‘laicos’. É por causa disso que suas entrevistas e presença nos jornais Corriere della Sera, La Repubblica, La Stampa e Civiltà Cattolica produzem tanta repercussão.
Francisco preza pelo contato direto com as pessoas. Na visita ao Brasil, durante a Jornada Mundial da Juventude, no ano passado, deu uma grande lição aos políticos, distantes do povo, ao baixar os vidros do carro e desejar o contato com o povo. Segundo Edson Barbosa, dono de uma agência de marketing, “a grande lição do Papa foi mostrar simplicidade: sou assim, minha prática é essa, ando com minha maletinha de mão, vou ao barbeiro, sou amigo do rabino. Ele não é uma imagem, é uma essência”.
A forma autêntica como Francisco se comunica, repleta de conteúdos da vida, parece ser o segredo do Papa que reúne multidões na Praça de São Pedro, abraçando e beijando-as. É essa mesma autenticidade que transformou os espaços das homilias diárias na Casa Santa Marta em notícias para o mundo, com toda a força profética que possuem. Trata-se de um Papa que “não permanece passivo diante dos acontecimentos no mundo. Diante de uma inundação, um drama familiar ou uma catástrofe, telefona, quando não escreve ou tuíta. O Papa, com sua espontaneidade, é um grande comunicador, e foi designado “homem do ano” por várias revistas.
6. A atuação de Francisco em nível global
A atuação do Papa em nível global é perceptível tanto em suas ações internas, como no caso da formação do Conselho dos Cardeais advindos de diferentes continentes do mundo, por exemplo, que demonstra as mudanças desse papa cuja experiência de evangelização se deu em um país periférico, como em suas ações voltadas ao exterior da Igreja. Como disse Pietro Parolin, novo secretário de Estado, “de uma Igreja cercada, com mil problemas, passamos para uma Igreja que se abriu”.
A primeira viagem oficial do papa Francisco foi, justamente, para a ilha italiana de Lampedusa, região próxima da Tunísia e que é, atualmente, uma das principais portas de entrada de refugiados das zonas de conflito no Norte da África e que, na última década, foi cenário de um número incalculável de mortes daqueles que não conseguiram êxito na travessia e que, para a União Europeia (UE) soa como um conflito diplomático. Portanto, trata-se de um Papa atento às questões que afligem o ser humano no mundo todo.
Fonte: http://goo.gl/ERzvR |
Outra visita realizada por Francisco, voltada para os “pobres e às vítimas de violência no mundo", foi ao Centro Astalli, que acolhe aos refugiados em Roma. Foi uma decisão tomada pelo próprio Bergoglio, que quis responder pessoalmente ao convite que lhe foi feito pelo presidente desse Centro.
Sobre a resignação em que vivemos atualmente, Francisco pontuou que nossa cultura do bem-estar nos leva a pensar apenas em nós mesmos, assim como à indiferença, trata-se na verdade de uma globalização da indiferença.
E o Papa continuou a surpreender o mundo quando, em vista da ameaça de intervenção militar externa à guerra vivida na Síria, o Papa convidou toda a Igreja para, no dia 7 de setembro do ano passado, realizar um dia de jejum e de oração pela paz na região. O Papa foi firme, afirmando que "a violência e a guerra nunca são o caminho para a paz!"
Dessa maneira, o Papa que veio de uma experiência de contato com os pobres, demonstrou ao mundo sua atenção especial aos refugiados e às vítimas da guerra, assim como a todos os que vivem nas periferias geográficas ou existenciais do mundo. Sua opção pelos pobres não é apenas retórica e conceitual e seu anúncio é o da prática afetiva e efetiva.
7. Enfrentamento da questão econômica
A reforma espiritual deve vir acompanhada da reforma das estruturas. O Papa Francisco empreendeu com firmeza uma reforma da cúria – aliás, um dos mandatos do Conclave que o elegeu – e mais especificamente de tudo o que diz respeito às estruturas econômico-financeiras do Vaticano. O Instituto para as Obras de Religião (IOR) está há anos no centro de suspeitas e práticas de malversações e lavagem de dinheiro.
Em vista do estudo e da melhor compreensão do seu funcionamento e de uma transparência maior das finanças da Santa Sé, o Papa Francisco nomeou várias comissões referentes. Além disso, e fundamentalmente, criou a comissão dos oito cardeais, o chamado C8 ou G8, nomeado diretamente por Francisco para auxiliá-lo na reforma da cúria e no assessoramento da Igreja universal, com quem já se reuniu três vezes. Os seus membros foram escolhidos por representação.
Os trabalhos do C8 já estão dando seus primeiros resultados: proposta de formulação de uma nova Constituição Apostólica em substituição à Pastor Bonus; criação de comissões referentes; criação da Secretaria de Economia.
Com o Motu Proprio “Fidelis dispensator et prudens...”, Francisco cria, no dia 24 de fevereiro deste ano, uma “nova estrutura de coordenação para os assuntos econômicos e administrativos da Santa Sé e do Estado da Cidade do Vaticano”. Ela representa um organismo ousado de reorganizar e subordinar a parte econômico-financeira do Vaticano. A nova Secretaria de Economia terá a seguinte estrutura: 1) terá um Conselho para a Economia, composto por 15 membros, dentre os quais haverá oito cardeais e bispos, que reflete a universalidade da Igreja, e sete especialistas leigos de diferentes nacionalidades. Será presidido por um cardeal; 2) abaixo dele e subordinado ao Conselho haverá uma Secretaria de Economia, que terá um prefeito e um secretário-geral; 3) está prevista também a nomeação de um Revisor Geral, que terá o “poder de desempenhar revisões de qualquer agência ou instituição da Santa Sé e do Estado da Cidade do Vaticano”.
Já foram nomeados o prefeito da Secretaria de Economia, que é o cardeal George Pell, de Sidney e que é membro também do C8, e o secretário-geral, que é o padre Alfred Xuareb.
Ao ser uma Secretaria, ela responde diretamente ao Papa e pode inclusive pedir contas à Secretaria de Estado, outra preocupação de Francisco presente na reforma. O Papa estava muito preocupado com os superpoderes que esta secretaria tinha assumido e encontrou uma maneira de acabar com o “número dois” do Vaticano. O Motu Proprio rearranja alguns organismos, mas cala sobre o IOR. Ao mesmo tempo, está em andamento um processo de internacionalização e de profissionalização. Além disso, ganha força o administrador tipo anglo-saxão.
A reforma, porém não para por aí. Ela tem desdobramentos que vão além da cúria e incluem também a administração que diz respeito às congregações religiosas do mundo inteiro. No começo de março, o Papa Francisco convidou os tesoureiros das milhares de ordens religiosas católicas de todo o mundo para um encontro em Roma esta semana a fim de discutir as possibilidades de usar os recursos financeiros no “serviço à humanidade”. Na mensagem que Francisco enviou aos participantes do Simpósio Internacional, que aconteceu nos dias 8 e 9, diz que os “Institutos de Vida Consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica podem e devem ser sujeitos protagonistas e ativos no viver e testemunhar que o princípio de gratuidade e a lógica do dom encontram o seu lugar na atividade econômica”.
8. A teologia de Bergoglio
Uma pergunta que continua a ressoar – e a obter respostas –, diz respeito à teologia de Bergoglio-Francisco. Afinal, qual é a teologia que dá sustentação ao discurso e à prática (gestos, atitudes) do Pontífice que veio do “fim do mundo”? Não se trata, pura e simplesmente, da Teologia da Libertação, mais conhecida na América Latina e no mundo, com a qual tem afinidades e proximidades. Na Argentina, a Teologia da Libertação assume a forma específica da Teologia do Povo. Trata-se de uma perspectiva própria, original.
Segundo o filósofo argentino e um dos formuladores desta teologia, Juan Carlos Scannone, a Teologia do Povo utiliza o método Ver-Julgar-Agir, liga práxis histórica e reflexão teológica, e recorre à mediação das ciências sociais e humanas. Mas, ao contrário da Teologia da Libertação, que privilegia uma “análise sócio-estrutural”, a Teologia do Povo utiliza uma “análise histórico-cultural”. Está, assim, mais propensa a usar a categoria de “povo”, ao invés da de “classe”. E a enfatizar mais a unidade do povo, do que o conflito.
Por este viés, toma como referência a Constituição Gaudium et Spes, especificamente o n. 53, em que se fala da “cultura” como modo de vida de cada povo. “Essa corrente sublinha a importância da cultura, da religiosidade e da mística popular, afirmando ao mesmo tempo que os seus intérpretes mais autênticos e fiéis são os pobres, com a sua espiritualidade tradicional e a sua sensibilidade pela justiça”, explicita o mesmo Scannone em outro momento.
Tendo isto no horizonte, é possível compreender melhor a prática e as insistências de Bergoglio-Francisco. “Trata-se de um ‘despojamento’ interior, uma renúncia de si mesmo, a ponto de colocar Deus e os outros no centro da própria vida. Isso também tem um significado pastoral, porque implica estar mais próximo dos pobres, dos seus limites, da sua condição social, das suas humilhações. Por isso, Bergoglio não gosta dos sacerdotes príncipes ou dos eclesiásticos que amam as férias muito caras, os jantares nos melhores restaurantes, as joias de ouro e de prata ostentadas nas roupas, as contínuas visitas a pessoas poderosas... Tudo o que é mundanismo espiritual que envenena a Igreja”, pondera Victor Manuel Fernandez, reitor da Pontifícia Universidade Católica de Buenos Aires e um dos primeiros bispos nomeados por Francisco.
A Teologia do Povo assumiu também traços do peronismo, porque este “assumiu com força a Doutrina social da Igreja e os seus valores e compreendeu a cultura dos setores mais pobres da sociedade”, sem que com isso tenha sustentado algum poder político.
Entre os expoentes desta teologia está o padre Lucio Gera, líder da Comissão Episcopal de Pastoral (Coepal), constituída pelos bispos argentinos no rescaldo do Concílio Vaticano II. Além de Gera, na Comissão estavam Justino O'Farrell, Gerardo Farrel, Rafael Tello, Alberto Sily, Fernando Boasso, Dom Enrique Angelelli, Dom Manuel Marengo e outros. Sem esquecer do Scannone.
Nesta teologia cabe o Concílio Vaticano II, especialmente a Gaudium et Spes, e a Teologia da Libertação, junto com seu expoente máximo, Gustavo Gutiérrez. Todos eles encontram-se no espectro da modernidade, não da sua contestação. São, pois, modernas.
Um artigo do Massimo Faggioli contextualiza alguns debates teológicos no contexto mais amplo das correntes teológicas. A teologia de Bergoglio-Francisco rejeita a ‘radical orthodoxy, de John Milbank e outros, que é de contestação da modernidade, nem a teologia da pós-modernidade. Os diversos graus de expectativa em torno, por exemplo, da questão dos divorciados recasados e as (quem sabe possíveis) decepções, podem encontrar aqui uma explicação plausível.
9. A espiritualidade inaciana
Francisco, o primeiro Papa jesuíta, teve alguns momentos específicos com sua congregação de origem. No dia 31 de julho de 2013, foi celebrar a Festa de Santo Inácio de Loyola, fundador da Companhia de Jesus, na Igreja do Gesù, junto com os coirmãos jesuítas e colaboradores de Roma. Em seguida, foi visitar os túmulos de Santo Inácio, São Francisco Xavier e Pedro Arrupe, que, aliás, já visitou duas vezes em apenas um ano. É o responsável pela canonização de Pedro Fabro, o primeiro padre jesuíta. Em 2013, teve um encontro com alunos de um Colégio dos jesuítas em Roma. Manteve um encontro com os jesuítas responsáveis pela revista La Civiltà Cattolica e a que concedeu uma longa entrevista, publicada em setembro passado.
Fonte: http://bit.ly/1p5zsan |
Nesta entrevista, Francisco, perguntado pelo aspecto da espiritualidade inaciana que mais o ajuda a viver o ministério petrino, destaca o discernimento. “O discernimento é uma das coisas que Inácio elaborou mais interiormente. Para ele, é um instrumento de luta para conhecer melhor o Senhor e segui-lo mais de perto. (...) Um discernimento deste tipo requer tempo. São muitos, para dar um exemplo, os que acreditam que as mudanças e a reformas podem vir em breve. Eu sou da opinião de que se necessita tempo para assentar as bases de uma mudança verdadeira e eficaz. Trata-se do tempo do discernimento. (...) O discernimento no Senhor me guia no meu modo de governar”.
O discernimento foi também a segunda palavra que Francisco utilizou no seu encontro com os escritores da revista La Civiltà Cattolica para explicitar o seu compromisso com a Igreja. “Um tesouro dos jesuítas é justamente o discernimento espiritual, que tenta reconhecer a presença do Espírito de Deus na realidade humana e cultural, a semente já plantada da sua presença nos acontecimentos, nas sensibilidades, nos desejos, nas tensões profundas dos corações e dos contextos sociais, culturais e espirituais”, disse.
Outra palavra que utilizou neste encontro foi fronteira. Ou seja, o jesuíta é aquele que precisa estar nas fronteiras culturais: “Acompanhem, com as suas reflexões e os seus aprofundamentos, os processos culturais e sociais, e aqueles que estão vivendo transições difíceis, encarregando-se também dos conflitos. O lugar próprio de vocês são as fronteiras”.
Com insistência, Francisco usa também a expressão “sentir com a Igreja”, característica da espiritualidade inaciana. Ele a entende na perspectiva da Igreja Povo de Deus. “O povo é sujeito. E a Igreja é o povo de Deus a caminho através da história, com alegrias e dores. Sentir com a Igreja, portanto, para mim, quer dizer estar neste povo. E o conjunto de fiéis é infalível quando acredita, e manifesta esta sua infalibilidade ao crer, mediante o sentido sobrenatural da fé de todo o povo que caminha. Esta é a minha maneira de entender o sentir com a Igreja de que fala Santo Inácio. Quando o diálogo entre as pessoas e os bispos e o Papa segue esta linha e é leal, está assistido pelo Espírito Santo. Não se trata, portanto, de um sentir referido aos teólogos”.
Francisco também explicita sua predileção por Pedro Fabro: “O diálogo com todos, mesmo com os mais distantes e com os adversários; sua piedade simples, certa provável ingenuidade, sua disponibilidade imediata, seu atento discernimento interior, o fato de ser um homem de grandes e fortes decisões que compatibilizava com ser doce, doce...”.
No começo de janeiro deste ano, na celebração de ação de graças pela canonização de Pedro Fabro, ocorrida no dia 18 de dezembro, Francisco, reunido com a comunidade jesuíta de Roma, disse: “Ser jesuíta é ser pessoa de pensamento incompleto, pensamento aberto: porque pensa sempre tendo como horizonte a cada vez maior glória de Deus, que nos surpreende incessantemente". Há que viver pois uma santa "inquietação". "Que santa e bela inquietação!" - exclamou o Papa, convidando os jesuítas a interrogar-se se o seu coração continua sempre em tensão.
10. Alguns desafios
Ao completar seu primeiro ano de Pontificado, desenham-se já alguns desafios mais espinhosos com os quais Francisco terá de lidar. Enunciamos alguns, novamente, sem a pretensão de totalidade.
a) A questão dos abusos sexuais
Francisco, na esteira de Bento XVI, não mediu esforços para enfrentar de frente a problemática dos abusos sexuais dentro do clero da Igreja católica. Em abril de 2013, em encontro com o prefeito Gerhard Ludwig Müller, da Congregação para a Doutrina da Fé, o Papa deixou claro que não se deve recuar nos esforços empreendidos para coibir os abusos sexuais. “O Santo Padre recomendou particularmente que a Congregação, continuando na linha desejada por Bento XVI, aja com decisão no que se refere aos casos de abusos sexuais, promovendo acima de tudo as medidas proteção dos menores, a ajuda daqueles que no passado sofreram tais violências, os devidos procedimentos com relação aos culpados, o compromisso das Conferências Episcopais na formulação e implementação das diretrizes necessárias nesse campo tão importante para o testemunho da Igreja e a sua credibilidade”, diz o comunicado feito na época pela Congregação.
Um mês depois, depois da missa celebrada no domingo na Praça São Pedro, em uma referência às vítimas dos abusos sexuais, Francisco pediu “clareza” e “coragem” na “defesa das crianças dos abusos sexuais”. Em julho, o Papa Francisco aprovou uma lei que criminaliza os abusos sexuais na Cidade do Vaticano. Em dezembro, o Papa Francisco anunciou a criação de uma comissão no Vaticano para lutar contra o abuso de crianças na Igreja Católica e para oferecer ajuda às vítimas.
Um novo capítulo se abre com a exigência de um organismo ligado à ONU para que o Vaticano compareça para responder sobre os abusos sexuais do clero. A convocação da Comissão dos Direitos da Criança da ONU e sua insatisfação com o relatório apresentado à organização no ano passado foram recebidas no Vaticano como uma atitude de ignorância diante do que se está fazendo e de intromissão em questões doutrinais. E indignação.
No começo de março, uma declaração do próprio Francisco foi alvo de críticas. Na entrevista que concedeu ao jornal italiano Corriere dela Sera, Francisco diz o seguinte, com referência aos abusos sexuais: “Quero dizer duas coisas. Os casos de abuso são terríveis, porque deixam feridas muito profundas. Bento XVI foi muito corajoso e abriu um caminho. A Igreja, nesse caminho, fez muito. Talvez mais do que todos. As estatísticas sobre o fenômeno da violência contra as crianças são impressionantes, mas também mostram com clareza que a grande maioria dos abusos ocorre no ambiente familiar e na vizinhança. A Igreja Católica talvez seja a única instituição pública que se moveu com transparência e responsabilidade. Ninguém mais fez mais. No entanto, a Igreja é a única a ser atacada”.
Isso provocou uma enxurrada de críticas por parte dos defensores das vítimas e outros que fizeram notar que Francisco não se desculpou pelos abusos, não disciplinou bispos que encobriram abusadores e ainda não se encontrou com nenhuma das vítimas nem nomeou quaisquer membros para uma comissão que ele prometeu há três meses criar.
Como entender estas reações? Uma possível explicação seja a de que Francisco, segundo a sensibilidade anglo-saxã, está indo num ritmo muito lento. "Assim como todos os seus antecessores, o Papa Francisco está agindo tardia, secreta e imprudentemente", disse Barbara Dorris, diretora de divulgação da Rede de Sobreviventes de Abusados por Padres (SNAP, na sigla em inglês). Em outras palavras, alguns críticos acusam que a "revolução de Francisco" – geralmente entendida como uma Igreja mais transparente, responsável e compassiva – ainda não chegou à crise dos abusos. Começa a produzir insatisfações.
Um editorial do National Catholic Reporter expressa de forma igualmente contundente esta insatisfação com o tratamento dado a este tema: “As autoridades eclesiásticas continuam se escondendo, enganando os fiéis e agindo com impunidade”, acusa. E elenca uma série de fatos.
Ou seja, possivelmente já há sinais de que terminou a lua de mel do Papa com determinados setores mais liberais do mundo anglo-saxão. Críticas que não vem, desta vez, de setores posicionados mais à direita do espectro ideológico.
Fonte: http://goo.gl/OMkL4D |
b) Participação mais efetiva das mulheres na Igreja?
Mais de uma vez, Francisco expressou seu desejo de que gostaria de ver a mulher ocupando um lugar mais destacado na Igreja. Na entrevista publicada pela revista La Civiltà Cattolica, explicou: “É necessário ampliar os espaços de uma presença feminina mais incisiva na Igreja. Temo a solução do ‘machismo de saias’, porque, na verdade, a mulher tem uma estrutura diferente do homem. E, pelo contrário, os argumentos que ouço sobre o papel da mulher são muitas vezes inspirados precisamente numa ideologia machista”.
“A Igreja não pode ser ela mesma sem a mulher e o seu papel – explicou. A mulher, para Igreja, é imprescindível. Maria, uma mulher, é mais importante que os bispos. Digo isto, porque não se deve confundir a função com a dignidade.” É como dizer que o indispensável reconhecimento do valor da mulher na Igreja não deve passar por sua “clericalização”.
Em janeiro passado, em um discurso dirigido a um grupo de mulheres italianas, Francisco reiterou esse desejo: “Fico feliz em ver muitas mulheres partilhando certas responsabilidades pastorais no acompanhamento a indivíduos, famílias e grupos, e na reflexão teológica”, disse o Papa. “E eu manifestei esperanças de que espaços para uma presença feminina que seja mais capilar e incisiva na Igreja serão ampliados”. Apesar desta insistência, que se apresenta uma prioridade para Francisco, não oferece nada em específico no tocante a quais papéis poderiam ser.
Há a insistência do cardeal Walter Kasper em que “as mulheres devem assumir posições de plena responsabilidade na Igreja”. Concretamente, defende a participação das mulheres nos Sínodos.
Mas, tal modo de pensar, exclui categoricamente a ordenação de mulheres e sua nomeação para cardeais, por exemplo, proposta mais de uma vez também aventada. E ilude setores que apostavam e continuam apostando na participação efetiva da mulher nas estruturas hierárquicas da Igreja.
c) Riscos de decepção com o próximo Sínodo dos Bispos
A metodologia participativa utilizada na preparação para o próximo Sínodo dos Bispos sobre a família, em duas etapas, criou uma expectativa muito grande em relação aos possíveis resultados, como vimos acima no ponto quatro. Emergem dúvidas e perguntas sobre a eficácia da metodologia utilizada, sobre a compreensão dos objetivos do Sínodo e sobre o papel plebiscitário de intervenção da mídia sobre o Sínodo. Alguns setores do catolicismo podem estar se decepcionando ao não verem contempladas as suas questões. Ou seja, alguns dizem, mudou o maestro, mas a música é a mesma...
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Conjuntura da Semana: Papa Francisco, ano 1. Dez traços distintivos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU