Geopolítica, nova ordem digital, Igreja e resistências: o Congresso de Teologia Latino-Americana analisa o presente

Foto: Bhabin Tamang | Pexels

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24 Outubro 2025

  • Animar o fazer teológico no continente para contribuir com a organização da esperança é o objetivo do IV Congresso de Teologia Latino-Americana e Caribenha.

  • O evento, previsto entre os dias 22 e 24 de outubro na Pontifícia Universidade Católica do Peru, reúne 200 pessoas na capital do país andino.

  • Um grupo diverso, composto por teólogos, agentes de pastoral, jovens e comunidades de base, se reúne para discutir temas de grande impacto na realidade continental a partir de uma perspectiva teológica. “Horizontes de libertação: tecendo esperanças desde baixo” é o lema que fundamenta as atividades que, sem abandonar a construção acadêmica característica do continente, se deixam interpelar pelas realidades que constituem desafios pastorais para a Igreja e para a reflexão teológica.

A informação é de Paola Calderón Gómez, publicado por Religión Digital, 23-10-2025.

Geopolítica, o movimento de Jesus, a tradição latino-americana, o método, além das resistências e movimentos de base, estão entre os conteúdos propostos em uma programação que inclui conferências, painéis, trabalhos em grupo e uma homenagem à memória do teólogo Gustavo Gutiérrez, no primeiro aniversário de sua morte.

Resistir e abrir esperanças

Alejandro Ortiz, coordenador da Amerindia, a religiosa Biryit Weiler, Moema Miranda e o jornalista Raúl Zibechi compartilharam reflexões sobre geopolítica, nova ordem digital, colapso ambiental, a situação atual da Igreja e as resistências que surgem desde as bases.

Ortiz falou sobre geopolítica e o novo ordenamento digital, referindo-se ao conceito de capitalismo de guerra, fenômeno que produziu diferentes expressões da ordem mundial ao longo da história. Segundo ele, se antes o controle se dava pela fabricação de armas e domínio político, hoje vivemos “um sistema digital que controla por meio de algoritmos”. Trata-se, em suas palavras, de “manter as maiorias aprisionadas, não apenas pelo alienamento e pela superficialidade em compreender a realidade, mas também pelo controle de seus gostos e perfis, que podem ser usados a qualquer momento”. Diante dessa situação, afirma, “só resta a resistência: ouvir os povos indígenas, afrodescendentes e comunidades que lutam diariamente não apenas pela sobrevivência, mas por iniciar um caminho diferente, entendendo que resistir é abrir esperanças a um mundo distinto”.

Somos terra

Para Moema Miranda, refletir sobre o colapso ambiental é reconhecer que somos testemunhas de um momento crucial para o planeta — um tempo em que prevalece o risco de devastação provocado pela ação de uma parte da humanidade com poder destrutivo. “Para mim, o mais importante é lembrar que somos terra. Não somos parte dela; não podemos destruir uma parte e continuar vivos. Somos mãe terra. Voltaremos a ela, viemos dela e não podemos existir em outro lugar.” Por isso, considera urgente “criar alianças e caminhos de aprendizado com os povos indígenas, com os povos das águas e da terra, que a cuidam como se fosse sua mãe, porque vivem graças a ela”. Trata-se, diz, “de entrar num caminho de comunhão e de encontrar, no seguimento de Jesus, outra perspectiva — uma consciência de sermos irmãos das pessoas e de todos os seres criados por Deus”. Ela propõe inventar novas formas de luta e resistência socioambiental que nos permitam reconectar com a justiça para as pessoas e para a terra, o que implica uma nova compreensão teológica, religiosa e eclesial do mundo: “Ler a história a partir de outro lugar, com os povos, como sugere Laudate Deum, que convida a iniciar um caminho de reconciliação com o mundo”.

Superar a fragmentação

A missionária Biryit Weiler abordou a realidade atual da Igreja, marcada pelo caminho sinodal e por um desejo de transformação que expressa uma conversão pastoral. Inspirando-se na atitude de Jesus — que usava o poder para gerar vida —, ela observou que os resultados dependem do modo como lidamos com as relações de poder. No caso da Igreja, isso se refere às formas de construção e entrega de dons e carismas que o Espírito faz florescer. Para a religiosa, congressos como este e redes como Amerindia são dons que animam a vida da Igreja, que desde Medellín vem se esforçando para interpretar o Concílio Vaticano II a partir da realidade latino-americana. Com a revalorização da categoria “povo de Deus'”, a Igreja recupera essa memória e descobre a força desse conceito, visível em momentos como o Sínodo para a Amazônia, a criação da Conferência Eclesial da Amazônia (Ceama), a Assembleia Eclesial e o próprio Sínodo da Sinodalidade, que geraram mudanças concretas nas comunidades e nas estruturas eclesiais. Sua proposta foi superar a fragmentação, pois “a realidade precisa de respostas integradas; não se pode amar a Deus sem amar a terra”. A Igreja, acrescenta, “é sinodal se caminha com os povos e se fortalece o protagonismo de quem foi ignorado — como as mulheres e as comunidades de base”.

Novas formas de resistência

Por fim, o jornalista Raúl Zibechi falou sobre as resistências que surgem nas comunidades, como expressão das transformações do mundo. Segundo ele, não é possível continuar interpretando o mundo com as categorias de luta e emancipação das décadas de 1970 e 1980, porque “a trama da vida e da sobrevivência mudou”. “A reconstrução da humanidade está sendo tecida pelos povos — sejam originários, negros, camponeses ou habitantes das periferias urbanas.” Zibechi afirmou que “nossa tarefa é colocar os sentidos — o ouvido, a vista e o coração — no que os povos estão fazendo, para encontrar aí inspirações suficientemente fortes que nos permitam reproduzir experiências semelhantes em nossos territórios, bairros e comunidades”. Para ele, “não se trata de impor uma ideia, um manifesto ou uma encíclica para que o povo compreenda, mas de nos deixar inspirar pelos nossos próprios desejos e corações, colocando-nos em contato com esses povos que estão tecendo vida, resistindo à morte e criando novos mundos. Só assim poderemos trilhar os novos caminhos que já estão sendo abertos pelos povos”.

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