23 Abril 2025
Santiago Vilanova (Olot, Espanha, 1947) conhece bem os mecanismos para proteger o meio ambiente e as estratégias para apenas simulá-la. O jornalista, escritor e político ambientalista se dedicou à questão ao longo de sua carreira, promovendo importantes associações ambientais catalãs, como Una Sola Terra e o partido Els Verds – Alternativa Verda, e acompanhando as minúcias das negociações climáticas internacionais.
No ensaio Els conspiradors del canvi climàtic (Lapislázuli, 2025), Vilanova utiliza mais de cinquenta anos de conhecimento e experiências pessoais para apontar pessoas e instituições que, longe de trabalhar por um mundo melhor, esconderam-se por trás de slogans e ideias vazias com o objetivo que, na realidade, nada mude.
A entrevista é de Lluís Bassa Tomàs, publicada por La Marea-Climática, 18-04-2025. A tradução é do Cepat.
Quem são os conspiradores das mudanças climáticas?
São diplomatas, políticos, empresários, comunicadores, cientistas e, inclusive, membros destacados de associações ambientalistas internacionais que, embora se proclamem a favor da transição energética, fazem um ativismo destinado a atrasá-la e acabam fazendo o jogo dos negacionistas. Querem tornar compatível seguir explorando os recursos fósseis, investindo em energias renováveis com menor intensidade e desenvolvendo soluções “tecnossolucionistas”. Atuam nos principais órgãos de governança global do meio ambiente vinculados à ONU e ao PNUMA (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente).
No livro, explica como as conferências mundiais do meio ambiente e as cúpulas climáticas têm sido historicamente conduzidas por membros ligados ao setor dos combustíveis fósseis e da energia nuclear.
A conspiração da qual falo em meu ensaio começou com a primeira conferência mundial sobre o meio ambiente, conhecida como Conferência de Estocolmo. Aconteceu dois anos após as manifestações de 22 de abril de 1970, o dia da Terra, quando mais de vinte milhões de pessoas se mobilizaram nos Estados Unidos. O presidente Richard Nixon se viu forçado a criar a Agência de Proteção Ambiental, ao mesmo tempo em que ordenava ao FBI que desacreditasse os organizadores como “infiltrados comunistas”. Dois anos depois, a ONU delegou a organização da conhecida Conferência de Estocolmo ao empresário e diplomata canadense Maurice Strong, ligado ao setor de petróleo, gás e energia nuclear.
Por que a figura de Maurice Strong é relevante?
Por três décadas, Strong conseguiu conduzir as cúpulas para que não incidissem sobre a economia das grandes empresas de energia. Gerou um ambientalismo controlado pelo establishment, promovendo estruturas de controle científico e político como o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), o Conselho da Terra e a União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN). Tinha o apoio de personalidades como David Rockefeller (fundador do Chase Manhattan Bank e da poderosa Standard Oil), Henry Kissinger, Robert MacNamara (Banco Mundial), Armand Hammer (Occidental Petroleum) e do próprio secretário-geral da ONU, U Thant, entre outros.
O livro também destaca Stephan Schmidheiny, um empresário suíço do setor de cimento, como pioneiro do greenwashing.
Schmidheiny, que havia sido condenado pela poluição de sua fábrica de amianto na região do Piemonte, promoveu em 1991 a constituição do Conselho Empresarial Mundial para o Desenvolvimento Sustentável (World Business Council for Sustainable Development) e Maurice Strong o nomeou conselheiro para a preparação e realização da Cúpula do Rio, em 1992. É a primeira grande estrutura de greenwashing destinada a grandes multinacionais poluidoras, que ainda hoje exerce uma grande influência na governança global do meio ambiente e é um dos lobbies empresariais mais reconhecidos pelo PNUMA.
Entre os grandes conspiradores atuais, você menciona as empresas de tecnologia GAFAM.
GAFAM é a sigla para as cinco maiores empresas de tecnologia (Google, Amazon, Facebook – agora Meta –, Apple e Microsoft) que detêm uma posição dominante em nível global. Seus líderes (Jeff Bezos, Elon Musk, Mark Zuckerberg, Tim Cook) concordaram em se unir para reavivar o setor nuclear civil e militar, que receberá novas ajudas e subsídios como energia “verde”. Esta é a melhor conspiração para atrasar, até fazer fracassar, o processo de descarbonização da economia mundial, frustrando as perspectivas das COPs.
Como agem?
Bill Gates, por exemplo, está promovendo os reatores SMR (Small Modular Reactors), de 5 a 300 megawatts, destinados a fornecer energia necessária para os data centers. Na Europa, a Inteligência Artificial (IA) disparará em 160% a demanda por energia, em cinco anos, segundo um relatório da organização Beyond Fossils Fuels. A demanda será tão colossal que será impossível substituí-la totalmente pelas energias renováveis.
O mais certo é que a tão reivindicada descarbonização da economia até 2050 acabe em fiasco. A taxonomia da UE considerando a energia nuclear como ‘verde’ facilitará subsídios para os reatores SMR e incentivará a proposta do Fórum Atômico Mundial de estender a vida útil dos reatores atuais para mais de 30 ou 50 anos.
A direção contrária a um sistema energético democrático baseado em energias renováveis.
Com esta iniciativa, as empresas GAFAM iniciam um novo período pós-capitalista baseado no controle da informação e na capacidade de seu processamento. De fato, já monopolizam o comércio da informação. Por outro lado, o potencial de crescimento da indústria de defesa que se espera da IA, com o apoio logístico das empresas GAFAM, é enorme. Esta aliança confere às big techs um domínio que nenhuma ação parlamentar e democrática pode controlar e que já permitiu o acesso ao poder a personagens como Elon Musk (fundador da SpaceX e da montadora Tesla), como administrador do Departamento de Eficiência Governamental da Casa Branca.
O que podemos esperar nos próximos anos?
Tudo indica, e agora mais do que nunca com os negacionistas governando na Casa Branca, que caminhamos para algumas formas de autarquia energética que alguns analistas chamam de “eletrofascismo”, baseadas no controle do setor eletronuclear e tecnológico. Isto fará com que se consolide o centralismo energético e o controle militar sobre as instalações nucleares, como vimos durante o conflito entre a Rússia e a Ucrânia, para evitar o risco de ataques terroristas ou ser alvos bélicos.
No livro, você explica como as infraestruturas de energias renováveis e a implantação de tecnologias de IA exigirão grandes quantidades de minerais estratégicos que atualmente estão presentes sobretudo na América Latina e na Ásia. O que isto pode implicar?
As reservas de minerais estratégicos provocarão uma mudança estrutural no setor energético, ameaçando se tornar a principal fonte de conflitos no planeta, nas próximas décadas. Se o petróleo se concentrou no Ocidente e no Oriente Médio, agora, os produtores de lítio e terras raras se concentrarão na América Latina e na Ásia. Isto é uma oportunidade singular para também redefinir um modelo de desenvolvimento ecológico e sua autonomia frente às ações colonizadoras de potências como a Rússia, os Estados Unidos e a China. É preciso levar em conta que esta última leva muita vantagem na produção e capacidade de processamento desses minerais. Os países que possuem as principais reservas terão uma grande capacidade de influenciar no futuro da humanidade e no desenvolvimento de seus próprios países. A era da mineração está só começando.
Que mecanismos os países produtores desses minerais terão que implementar para evitar essas ações ‘colonizadoras’?
Não tenho a solução, mas está claro que novos acordos comerciais inter-regionais são necessários na América Latina e na África para evitar um crescimento que não cause mais impactos ecológicos e para harmonizar as normas ambientais e a segurança alimentar. Os recursos minerais estratégicos devem permitir autofinanciar a transição para energias renováveis e evitar uma nova colonização, como aconteceu com o cobre no Chile e acontece com o coltan na República Democrática do Congo e o urânio no Níger.
Propõe a criação de uma cúpula de países produtores de lítio.
Esta cúpula teria vários objetivos. Por um lado, promover o nosso próprio modelo de desenvolvimento ecológico para evitar o impacto ambiental irreversível das extrações; também defender as culturas dos povos afetados e torná-los participantes dos lucros gerados pelo lítio e outros minerais estratégicos; impedir os oligopólios, como os que ocorreram com o petróleo, o gás e o urânio, pois cinco empresas produzem 60% do lítio e 56% do cobalto, enquanto a capacidade de refinamento está nas mãos da China; e, finalmente, evitar o uso do lítio e outros materiais raros no desenvolvimento de energia atômica para fins militares, como é o caso da Índia e da Coreia do Norte.
Vamos falar sobre as cúpulas do clima (COPs). Em Baku, vimos a tensão nas discussões sobre o fundo para financiar a adaptação aos impactos das mudanças climáticas em países do sul global. Existe o risco de rompimento das negociações na próxima cúpula em Belém (Brasil)?
Os 300 bilhões de dólares anuais em ajudas climáticas que a COP29 de Baku concedeu in extremis aos países em desenvolvimento, quando estes reivindicavam ao menos 1 trilhão por ano, ficam classificados como uma quantia “miserável” pelos afetados pelos subsídios. Em 2024, os subsídios aos fósseis em nível mundial significaram o dobro desta quantia.
Os Estados, especialmente os mais poluidores (Rússia, Estados Unidos, China, Brasil, Índia...), não respeitam os acordos das COPs, nem desempenham um papel ativo nas resoluções. Menos de 20% dos países signatários conseguiram implementar a maioria dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), as 169 metas a serem alcançadas até 2030 e apresentaram à ONU as chamadas Nationally Determined Contributions (NDC ou Contribuições Nacionalmente Determinadas) para os efeitos das mudanças climáticas.
Com Donald Trump na presidência dos Estados Unidos, como o cenário da COP30 pode mudar?
As decisões de Trump podem transformar a COP de Belém em um novo fracasso. Está tomando medidas que podem levar ao bloqueio da COP30, suprimindo ajudas e fechando departamentos dedicados às mudanças climáticas, afetando organismos da NASA e da National Oceanic and Atmospheric Administration (NOAA), que fazem parte dos apoios ao IPCC, e retirando os Estados Unidos do Acordo de Paris. Tudo isto pode levar a uma crise no financiamento da Convenção-Quadro sobre Mudanças Climáticas, da qual as COPs dependem.
Caminhamos para um cenário descontrolado?
Eu diria para uma ‘terra ignota’. Tudo pode acontecer, de uma reforma das COPs até a criação de uma Organização Mundial do Meio Ambiente com poderes similares no Conselho de Segurança da ONU e equivalente a organizações como a Organização Mundial do Comércio ou a Organização Internacional do Trabalho.
Quem são as vozes que querem reformar as COPs e para onde apontam?
Prevendo um cenário negativo provocado pelas decisões do governo Trump, há quem defenda uma reforma das COPs, como o Clube de Roma, Christiana Figueres, ex-secretária executiva da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, e Ban Ki-moon, ex-secretário-geral das Nações Unidas. Propõem mudanças no sistema de escolha das sedes das conferências das 197 partes, que não sejam petroestados; uma participação mais eficiente e justa dos países do Sul afetados pelas mudanças climáticas; pedem também a publicação da filiação de todos os participantes; equilibrar a presença de cientistas no IPCC, dominado em 70% por anglo-saxões; evitar a presença dominante de lobistas das corporações de energia; reduzir sensivelmente o número de membros das delegações para tornar os debates e as resoluções mais eficientes; entre outras.
Como a presença de lobbies dos combustíveis fósseis nas COPs poderia ser regulamentada?
Aplicando transparência e tornando pública a identidade e filiação de cada participante; evitando o acesso de lobistas a sessões de negociação, onde documentos finais e compromissos são redigidos. No primeiro relatório do IPCC de 1990, 11 representantes da indústria do petróleo atuaram para as conclusões. Hoje, são mais de 600, segundo Cristophe Bonneuil, historiador de ciências do CNRS francês. Não é possível seguir tolerando que os lobistas que representam o setor de energia dos combustíveis fósseis tenham mais representantes que os cientistas, indígenas e representantes das nações do Sul mais vulneráveis às mudanças climáticas. Da COP29 de Baku, participaram 1.773 lobistas com o objetivo evitar resoluções contrárias aos setores de petróleo e gás natural.
No ensaio, explica que há defensores da criação de outros espaços de convergência internacional para abordar os problemas das mudanças climáticas.
É o que propõem outras personalidades como o pensador Edgar Morin, o jurista Michel Prieur e o climatologista Jean Jouzel. São defensores da criação de uma Organização Mundial do Meio Ambiente, liderada por personalidades desvinculadas dos setores econômicos e energéticos dominantes.
Fala também da criação de um Tribunal Penal Internacional do Meio Ambiente.
A criação de um Tribunal Internacional Penal do Meio Ambiente, como propõe um grupo de 16 juristas internacionais, coordenados por Laurent Neyret, professor da Universidade de Versalhes Saint-Quetin, possibilitaria julgar os casos de ecocídios cometidos por empresas de mineração, energia e agroflorestas e suas atividades, tanto de greenwashing quanto de ocultação de dados (greenhushing).
Alguns Estados estão se apressando para introduzir legislações contra o ecoterrorismo para neutralizar e criminalizar os atos dos ativistas climáticos.
Os conspiradores das mudanças climáticas estão interessados em controlar os resultados das COPs e os relatórios do IPCC, mas também muito interessados em conter o radicalismo dos ativistas ambientais. E a maneira de fazer isso é criminalizando-os, ainda que suas ações não sejam violentas. Uma de suas formas de pressão é fazer com que os meios de comunicação conservadores e de extrema direita exijam mão dura contra este novo ativismo situado à margem dos partidos políticos tradicionais. E está surtindo efeito: na França, Alemanha, Áustria, Irlanda e Reino Unido, há muita pressão para que o Estado endureça as leis contra o ativismo ambiental.
Na Dinamarca, os “extremistas climáticos” estão na lista das “ameaças terroristas”. A Itália promulgou uma lei chamada “ecovandalismo”, com penas que variam de cinco anos de prisão a uma multa de 10 mil euros. Extinction Rebellion é considerado pela extrema direita espanhola uma organização ligada ao terrorismo internacional. Nos Estados Unidos, o Greenpeace foi condenado a pagar 650 milhões de dólares por estimular protestos contra o oleoduto Dakota Access. A empresa que denunciou a organização ecopacifista é a Energy Transfer, e a multa pode levar o Greenpeace à falência nos Estados Unidos.
Diante disso, como as ONGs e a população civil reagem?
Na Espanha, no fim de 2024, a Corte Constitucional admitiu a primeira ação climática da história (a primeira denúncia por crime ecológico foi apresentada por Alternativa Verde, em 1984, contra a poluição ácida da usina termelétrica de Cercs, de propriedade da Fecsa). Trata-se de um recurso contra a Espanha por inação diante das mudanças climáticas e foi movido pelo Greenpeace, pelo Ecologists en Acción, pelo Oxfam Intermón, pela Fridays for Future e pela Coordinadora de Organizaciones para el Desarrollo. Veremos como isso evolui. Os protestos ambientais questionam com contundência cada vez maior a eficácia e a utilidade das conferências climáticas, transformadas em instrumentos de desmobilização.
Esses protestos encontram aceitação na sociedade civil?
Reprimindo e criminalizando as ações diretas dessas organizações, são afastadas da sociedade civil e a opinião pública acaba vendo a governança e a atual forma de organizar a luta climática como um mal menor, ficando nas mãos de funcionários da ONU, muito bem remunerados, livres de impostos, e apoiados por suas principais estruturas: o PNUMA, a Convenção-Quadro e as COPs. Trata-se de um gigantismo burocrático, vigiado pelas empresas de energia. É o legado deixado por Maurice Strong. Conspiradores e negacionistas das mudanças climáticas são duas faces da mesma moeda.