30 Junho 2023
O bispo luterano Bedford-Strohm afirma que o projeto de diálogo eclesial com a Ucrânia e a Rússia tem o apoio do papa.
A reportagem é de Giacomo Gambassi, publicada por Avvenire, 29-06-2023. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
“Cada um tem seus próprios canais. Mas o objetivo é o mesmo: contribuir como Igrejas para deter a guerra na Ucrânia.” O bispo Heinrich Bedford-Strohm acompanha com atenção a missão do cardeal Matteo Zuppi, que esteve primeiro em Kiev e agora está em Moscou. É o caminho que também foi feito em maio por uma delegação do Conselho Mundial de Igrejas do qual Bedford-Strohm é moderador. Primeiro na capital ucraniana, depois na russa.
“Para reaproximar as comunidades cristãs que a guerra dividiu. E é um escândalo”, adverte o pastor da Igreja Evangélica Luterana na Baviera. Com o patriarca russo Kirill que abençoou a invasão. E as duas Igrejas ortodoxas na Ucrânia em desacordo, acusando-se mutuamente de proximidade com o inimigo ou de roubo de fiéis. Zuppi propõe uma mediação religiosa e humanitária em nome do papa. Mas a “missão de paz” desejada pelo órgão que reúne mais de 300 denominações cristãs, em sua maioria ortodoxas e protestantes, inclusive as dos dois países em conflito, é de natureza totalmente eclesial. “Estamos convencidos de que um caminho de reconciliação pode partir das Igrejas e depois se irradiar para além dos nossos muros”, afirma o bispo alemão.
Antes da visita “dupla”, Bedford-Strohm e o secretário-geral do Conselho Mundial, o pastor presbiteriano sul-africano Jerry Pillay, foram recebidos em audiência por Francisco. “Apresentamos o projeto ao papa. Ele nos encorajou.
A nossa iniciativa e a do pontífice andam de mãos dadas”, sublinha Bedford-Strohm. E acrescenta: “Olhamos com confiança para o que o cardeal Zuppi está fazendo e lhe desejamos todas as bênçãos. O empenho vaticano e o nosso mostram o esforço das Igrejas para construir pontes”.
Excelência, o Conselho Mundial de Igrejas também se encontrou com o Patriarca Kirill em Moscou. A Igreja de Moscou é a maior comunidade ortodoxa do Conselho. Há aberturas?
Na longa conversa, encontramos disponibilidade para o diálogo. Mas o diálogo entre as Igrejas tem fundamentos diferentes em comparação com o diálogo político. É claro que, como conselho ecumênico, não temos uma posição de neutralidade em relação à guerra. Dissemos claramente que se trata de uma invasão russa, que é imoral e que a religião não deve ser usada para justificar o conflito. No entanto, também queremos lançar sementes para encontrar saídas: também discutimos isso.
Na recente mensagem que Kirill lhes enviou pelo 75º aniversário de fundação, o patriarca pede para evitar uma escalada e pôr fim ao derramamento de sangue. Uma mudança de mentalidade?
Estou convencido de que de nada adiantam posicionamentos ideológicos, mas são necessárias oportunidades de debate. Só então o progresso será possível. Por exemplo, todos queremos contribuir para dirimir questões políticas que são próprias de uma negociação entre os governos. Mas, como Igrejas, podemos reiterar juntos que não é tolerável jogar mísseis sobre a população. E é uma forma de ajudar a silenciar as armas.
Na Ucrânia, as tensões entre as duas Igrejas ortodoxas se traduzem em confrontos em frente aos locais de culto, acusações de colaboracionismo, expulsão de sacerdotes, invasões de templos e mosteiros.
Quando fomos a Kiev, conversamos com os chefes das Igrejas. E os resultados foram promissores. Temos duas Igrejas ortodoxas que estão lidando com a transferência de fiéis e paróquias de uma para a outra. A questão é como isso ocorre: por meio da força? Sob a influência do governo? Com a violação dos locais de culto? O primeiro ponto é dizer “não” à violência. Depois, é preciso encontrar mecanismos compartilhados que regulem as transferências.
Vocês lançaram a ideia de uma cúpula de paz que reúna as lideranças das Igrejas da Ucrânia e da Rússia. Uma negociação eclesial?
Propusemos uma mesa redonda ao Patriarcado de Moscou e às duas Igrejas ortodoxas na Ucrânia. Também a apresentamos ao Papa Francisco durante o nosso encontro e gostaríamos que uma representação vaticana pudesse participar dos trabalhos.
Existe disponibilidade nos dois países em guerra?
Os sinais que surgiram das etapas em Kiev e em Moscou são positivos. Acabei de encontrar uma delegação de Moscou que reafirmou a vontade de dialogar. Escrevemos às Igrejas e aguardamos as respostas após um debate com as respectivas comunidades. A hipótese é que o encontro seja realizado em outubro em Genebra, sede do Conselho e território neutro, mas estamos disponíveis a outras opções. O encontro deverá ocorrer em três dias: o primeiro para o debate com o Patriarcado de Moscou; o segundo, com as Igrejas da Ucrânia; o terceiro, de diálogo conjunto. Se for realizado, será necessário envolver as redes diplomáticas dos diversos Estados e garantir a segurança para o deslocamento dos vários grupos de participantes. Não podemos não tentar. E colocamos tudo nas mãos de Deus.
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Uma cúpula entre as Igrejas em conflito: a proposta do Conselho Mundial de Igrejas. Entrevista com Heinrich Bedford-Strohm - Instituto Humanitas Unisinos - IHU