De Wojtyła ao Papa Leão: a cúpula da paz é aqui, no encontro inter-religioso de Santo Egídio

Foto: Vatican Media

Mais Lidos

  • Dossiê Fim da escala 6x1: Redução da jornada de trabalho e o fim da escala 6x1: Desafios e estratégias sindicais no Brasil contemporâneo

    LER MAIS
  • Celular esquecido, votos mal contados. O que aconteceu no Conclave. Artigo de Mario Trifunovic

    LER MAIS
  • Às leitoras e aos leitores

    LER MAIS

Assine a Newsletter

Receba as notícias e atualizações do Instituto Humanitas Unisinos – IHU em primeira mão. Junte-se a nós!

Conheça nossa Política de Privacidade.

Revista ihu on-line

Natal. A poesia mística do Menino Deus no Brasil profundo

Edição: 558

Leia mais

O veneno automático e infinito do ódio e suas atualizações no século XXI

Edição: 557

Leia mais

Um caleidoscópio chamado Rio Grande do Sul

Edição: 556

Leia mais

29 Outubro 2025

"Ousar a Paz" foi aberto no domingo com Mattarella e se encerra na terça-feira com Prevost. Há 39 anos, as religiões dialogam aqui para evitar serem manipuladas pelo fanatismo e pelo extremismo. A paz não é exceção, e a guerra é inútil.

O artigo é de Mario Giro, professor de Relações Internacionais na Universidade para Estrangeiros de Perúgia, na Itália, publicado por Domani, de 28-10-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.

Eis o artigo. 

É chamada de Cúpula da Paz, há 39 anos reúne os líderes das grandes religiões do mundo a convite de Santo Egídio. Apesar das guerras e tensões, ninguém jamais falta: há também os representantes da Igreja Russa, muçulmanos do Oriente Médio e rabinos de Israel. Há uma delegação do governo sírio, incluindo o imã da Mesquita dos Omíadas em Damasco, em sua primeira visita a um contexto como esse. Há figuras políticas e institucionais: o Presidente italiano, Sergio Mattarella, abriu o evento de três dias "Ousar a Paz" com um discurso contundente contra "a força como medida das relações internacionais" e o rearmamento como única bandeira do nosso tempo. A Rainha da Bélgica deu um testemunho vibrante sobre a convivência.

A intuição para esse caminho de diálogo veio de São João Paulo II: reunir as religiões para formar uma aliança contra manipulações, violências e guerras. Profeticamente, o Papa sentia que as religiões podiam desempenhar um papel na preservação da paz no mundo; mas elas deviam abandonar fanatismos, particularismos e nacionalismos, ajudando-se mutuamente. Quase 40 anos depois, pode-se dizer que, apesar de todos os problemas e suas limitações, os responsáveis religiosos fizeram a sua parte de trabalho. As nações, muito menos. Nas últimas décadas, as religiões se aproximaram e aprenderam a dialogar e conviver; os Estados se distanciaram e se separaram. Multilateralismo e convivência ficaram nos apelos das religiões; as nações hoje preferem a retórica bélica e o isolacionismo. Os líderes religiosos são sensíveis à escolha de muitas pessoas de saírem às ruas para protestar contra a guerra em numerosos países.

De fato, o choque de civilizações (pelo qual as religiões eram consideradas as principais responsáveis) não ocorreu. No máximo, houve rupturas internas dentro das próprias civilizações, como a ortodoxa com a guerra na Ucrânia, a guerra cultural estadunidense ou as divisões internas no mundo muçulmano e naquele israelense. Os responsáveis religiosos lembram que Deus não quer a guerra entre os homens, mas a paz: é isso que está inscrito na profundeza das várias tradições religiosas, apesar de suas diferenças. Deus cobra do próprio homem a responsabilidade sobre sua vida, como cobrou de Caim: "Onde está seu irmão?" Infelizmente, assistimos à morte de tantos Abéis inocentes em nosso tempo; trata-se de um povo exterminado de Abéis sem culpa, cujos nomes sequer são conhecidos. Abel significa sopro: algo que passa quase sem ser percebido.

O Papa Leão XIV encerrará os três dias de reflexões e diálogos sobre muitas questões atuais (22 painéis) para reagir a este "tempo da força", como o definiu Andrea Riccardi. Muitas vezes, não ousamos nos empenhar pela paz porque pensamos que a guerra é a condição natural da história. Quando uma guerra irrompe, engole todos os raciocínios e parece ter sempre existido. Mas ousar a paz é acreditar que a paz é o estado natural do homem e a guerra é uma exceção. Em toda guerra, nada é inevitável ou predeterminado. A paz é certamente difícil: é preciso escutar, compor, mediar, dialogar, ter paciência, entender as diferenças, curar os medos e aceitar compromissos. Mas a paz também se baseia em um instinto muito humano: a sobrevivência. Todos nós temos esse instinto, tão forte que Erasmo de Roterdã disse já em 1517: "Qualquer paz injusta é quase sempre preferível à mais justa das guerras. Avalie primeiro cuidadosamente o que uma guerra requer ou implica." Isso pode soar estranho aos nossos ouvidos, acostumados aos discursos de guerra justa ou paz justa. Alguns poderiam dizer que se trata de um esforço fútil e ingênuo. Mas basta ler os sinais dos tempos para entender que a guerra é que é realmente inútil: que conflito resolveu os problemas pelos quais foi iniciado nas últimas décadas? Só um coração desarmado pode compreender o valor da paz e desarmar os violentos, começando por si mesmo: essa é a mensagem das religiões em diálogo em Roma, conscientes de que a paz pode se tornar contagiosa e atrair a todos.

Leia mais