03 Mai 2025
A cada dia, entre agora e o conclave de 7 de maio para eleger o sucessor do Papa Francisco, John Allen oferece um perfil de um papável diferente — termo italiano para designar um homem que poderia se tornar papa. Não há um método científico para identificar esses candidatos; trata-se, basicamente, de pesar reputações, cargos ocupados e influência exercida ao longo dos anos. Também não há garantia alguma de que um desses candidatos sairá de lá vestido de branco; como diz um velho ditado romano: “Quem entra em um conclave como papa, sai de lá cardeal.” Ainda assim, esses são os nomes mais comentados em Roma no momento, garantindo ao menos que terão alguma atenção. Conhecer esses homens também sugere quais questões e qualidades os outros cardeais consideram desejáveis para esta eleição.
A reportagem é de John L. Allen Jr., publicada por Crux, 01-05-2025.
Antigamente, dizia-se que a ideia de um papa americano era impensável. Inicialmente, por razões basicamente logísticas — os navios a vapor vindos do Novo Mundo levavam tanto tempo para chegar a Roma que os cardeais americanos muitas vezes chegavam tarde demais para votar, e, de qualquer forma, nunca faziam parte das negociações políticas antes do início do conclave.
Depois, o veto a um papa americano tornou-se geopolítico. Segundo o pensamento da época, não se poderia ter um “papa superpotência”, pois muita gente ao redor do mundo se perguntaria se as decisões papais estavam realmente sendo tomadas no Vaticano ou na sede da CIA em Langley.
Hoje, no entanto, essa lógica parece ultrapassada. Os Estados Unidos não são mais a única superpotência mundial e, de qualquer forma, a dinâmica dentro do Colégio Cardinalício mudou. A geografia praticamente não conta mais como fator de voto; os cardeais não se importam com o passaporte do candidato, mas sim com o perfil espiritual, político e pessoal que ele representa.
Acontece que desta vez há um americano com boas chances: o cardeal Robert Francis Prevost, de 69 anos, que chefiou o poderosíssimo Dicastério para os Bispos no Vaticano nos últimos dois anos sob o Papa Francisco. Esse cargo o tornou responsável por aconselhar o papa na escolha de novos bispos ao redor do mundo — o que, entre outras coisas, é uma ótima maneira de fazer amigos na hierarquia católica.
À medida que seus colegas prelados foram conhecendo o ex-superior agostiniano, muitos gostaram do que viram: uma figura moderada e equilibrada, conhecida por seu bom julgamento, grande capacidade de escuta e alguém que não precisa bater no peito para ser ouvido.
Nascido em Chicago em 1955, em uma família de origens italiana, francesa e espanhola, Prevost cursou o ensino médio em um seminário menor administrado pela Ordem de Santo Agostinho, os “agostinianos”. Depois, entrou na Villanova University, na Filadélfia, onde se formou em Matemática em 1977. No mesmo ano, ingressou nos Agostinianos e iniciou os estudos na Catholic Theological Union, onde obteve o título de Mestre em Divindade em 1982. (Prevost é, na verdade, o primeiro ex-aluno da CTU a ser nomeado cardeal.)
Depois, foi enviado a Roma, onde obteve o doutorado em Direito Canônico pela Universidade de São Tomás de Aquino, dos dominicanos, conhecida como “Angelicum”.
Em 1985, Prevost ingressou na missão agostiniana no Peru. Suas qualidades de liderança logo foram reconhecidas, e ele foi nomeado chanceler da prelazia territorial de Chulucanas, de 1985 a 1986. Passou alguns anos de volta a Chicago como pároco vocacional de sua província agostiniana, antes de retornar ao Peru, onde passaria a década seguinte dirigindo um seminário agostiniano em Trujillo, além de ensinar direito canônico e atuar como prefeito de estudos no seminário diocesano.
Há uma velha regra na vida clerical: competência é uma maldição — sua carga de trabalho tende a aumentar proporcionalmente à percepção de que você sabe resolver problemas. Assim, além de seus cargos principais, Prevost também atuou como pároco, funcionário da cúria diocesana, diretor de formação em Trujillo e vigário judicial da diocese.
Prevost voltou novamente a Chicago em 1999, desta vez como prior de sua província. Foi nesse período que ele teve um episódio relacionado aos escândalos de abuso sexual clerical, assinando a decisão de permitir que um padre acusado residisse em um priorado próximo a uma escola. Embora a decisão tenha sido posteriormente criticada, ela ocorreu antes de os bispos dos EUA adotarem, em 2002, novos padrões para lidar com tais casos, e sua assinatura foi basicamente uma formalidade para um acordo já definido entre a arquidiocese e o orientador espiritual do padre acusado.
Em 2001, Prevost foi eleito Prior Geral da ordem agostiniana mundial, com sede em Roma no Instituto Patrístico Agostiniano, o “Augustinianum”, vizinho à Praça São Pedro — um ponto estratégico para receber clérigos e bispos visitantes de todo o mundo. Prevost cumpriria dois mandatos no cargo, ganhando reputação como líder e administrador habilidoso, antes de voltar brevemente a Chicago de 2013 a 2014 como diretor de formação da ordem.
Em novembro de 2014, o Papa Francisco nomeou Prevost administrador apostólico da Diocese de Chiclayo, no Peru, e um ano depois ele se tornou bispo diocesano. Historicamente, os bispos peruanos estavam fortemente divididos entre uma ala esquerda próxima à teologia da libertação e uma ala direita próxima ao Opus Dei. Nesse cenário volátil, Prevost passou a ser visto como uma influência moderadora, refletida no fato de que integrou o conselho permanente da conferência episcopal e foi vice-presidente de 2018 a 2023.
Em fevereiro deste ano, o Papa Francisco elevou Prevost à ordem exclusiva dos Cardeais Bispos, um claro sinal de confiança e favor papal — e isso apesar de, segundo observadores, Prevost e o falecido pontífice nem sempre concordarem, mas Francisco via no prelado americano um homem em quem podia confiar.
Basicamente, há três qualidades que os cardeais buscam sempre que precisam avaliar um possível papa: querem um missionário, alguém capaz de mostrar um rosto positivo da fé; um estadista, capaz de se manter firme no cenário global diante de figuras como Donald Trump, Vladimir Putin e Xi Jinping; e um administrador, alguém capaz de controlar o Vaticano e fazê-lo funcionar, inclusive enfrentando sua crise financeira.
Há bons argumentos de que Prevost preenche esses três requisitos.
Ele passou boa parte de sua carreira no Peru como missionário, além de atuar em seminários e na formação, o que lhe deu uma compreensão do que é necessário para manter viva a chama da fé. Sua experiência global seria uma vantagem no campo da diplomacia, e sua personalidade reservada e equilibrada pode ser bem adequada à arte diplomática. Por fim, suas experiências bem-sucedidas como superior religioso, bispo diocesano e prefeito no Vaticano comprovam sua capacidade de governar.
Além disso, Prevost não corresponde ao estereótipo clássico da arrogância americana. Como disseram recentemente o jornal italiano La Repubblica e a rede de TV RAI, ele parece il meno americano tra gli americani, “o menos americano entre os americanos”.
No essencial, um voto em Prevost seria amplamente visto como um voto pela continuidade em relação à substância da agenda de Francisco, mas não necessariamente no estilo, já que ele é mais pragmático, cauteloso e discreto — qualidades que muitos cardeais podem considerar desejáveis.
Prevost também é visto como tendo o perfil etário adequado: fará 70 anos em setembro, portanto um papado seu provavelmente garantiria estabilidade sem ser longo a ponto de evocar a imagem de um “Pai Eterno” em vez de um Santo Padre.
Para começar, Prevost é algo enigmático em relação a muitas questões disputadas na vida católica. Em temas como a ordenação de mulheres diáconas, a bênção de pessoas em uniões homoafetivas ou a missa em latim, ele manteve suas posições muito discretas. Para alguns cardeais, isso pode tornar Prevost uma aposta arriscada demais, especialmente entre os mais conservadores, que querem garantias de maior clareza.
Além disso, Prevost está entre vários cardeais americanos contra os quais foram feitas queixas pelo SNAP (Rede de Sobreviventes de Abusos por Padres), por suposta má gestão de denúncias de abuso. Um caso envolve o padre acusado em Chicago, e outros dois padres em Chiclayo, no Peru. Há, no entanto, um lado forte do outro lado da história: várias partes defenderam a conduta de Prevost, o advogado canônico que inicialmente representou as vítimas peruanas é um ex-padre desacreditado e, enquanto esteve em Chiclayo, Prevost liderou uma comissão diocesana bem-sucedida de proteção a menores. Ainda assim, a mera suspeita de responsabilidade pode preocupar alguns eleitores.
Em nível básico, pode haver dúvidas sobre se Prevost realmente tem o carisma necessário para atuar no palco global, inspirar e entusiasmar. Considerando que boa parte de seu trabalho foi nos bastidores, ele não teve muitas oportunidades de “encantar o mundo com seu sorriso”. Por outro lado, vale lembrar que o cardeal Jorge Mario Bergoglio, da Argentina, tinha fama em Buenos Aires de ser uma figura distante e sem carisma — e todos sabemos o que aconteceu quando ele calçou as “Sandálias do Pescador”.
Em resumo, Prevost satisfaz muitos dos critérios tradicionalmente buscados pelos cardeais, e mesmo sua falta de posicionamento claro em algumas questões controversas pode ser mais um trunfo do que uma desvantagem. Um tributo da CTU em 2023, por ocasião de sua elevação ao Colégio Cardinalício, resume bem seu apelo:
“Prevost traz ao Colégio Cardinalício o coração de um missionário e anos de experiência ministerial, desde salas de aula acadêmicas até bairros pobres, passando pelos altos escalões da administração. Ele encarna o chamado evangélico para estar pronto a servir onde quer que o Espírito conduza”.
Veremos em alguns dias se isso será suficiente para conquistar pelo menos dois terços dos cardeais eleitores como perfil de papa.