28 Abril 2025
"O primado da evangelização foi o guia do seu pontificado, difundindo, com um claro cunho missionário, a alegria do Evangelho, que foi o título da sua primeira Exortação Apostólica Evangelii gaudium. Uma alegria que enche de confiança e esperança os corações de todos aqueles que confiam em Deus", afirmou Giovanni Battista Re, cardeal, na homilia proferida nas exéquias do Papa Francisco, publicada por Settimana News, 26-04-2025.
Segundo ele, "a insistência em trabalhar pelos pobres também era constante. É significativo que a primeira viagem do Papa Francisco tenha sido para Lampedusa, uma ilha que é um símbolo da tragédia da emigração, com milhares de pessoas se afogando no mar. Na mesma linha ocorreu também a viagem a Lesbos, juntamente com o Patriarca Ecumênico e o Arcebispo de Atenas, bem como a celebração de uma missa na fronteira entre o México e os Estados Unidos, por ocasião de sua viagem ao México".
Nesta majestosa Praça São Pedro, onde o Papa Francisco tantas vezes celebrou a Eucaristia e presidiu grandes encontros ao longo destes 12 anos, estamos reunidos em oração ao redor dos seus restos mortais com o coração triste, mas amparados pelas certezas da fé, que nos assegura que a existência humana não termina no túmulo, mas na casa do Pai, numa vida de felicidade que nunca terminará. Em nome do Colégio Cardinalício, agradeço cordialmente a todos pela presença. Com intensidade de sentimento dirijo uma respeitosa saudação e um sentido agradecimento aos Chefes de Estado, aos Chefes de Governo e às delegações oficiais que vieram de numerosos países para expressar afeto, veneração e estima ao Papa que nos deixou.
A demonstração de afeto e participação que vimos nestes dias após sua passagem desta terra para a eternidade nos diz o quanto o intenso pontificado do Papa Francisco tocou mentes e corações. Sua última imagem, que permanecerá em nossos olhos e em nossos corações, é a do último domingo, Solenidade da Páscoa, quando o Papa Francisco, apesar dos graves problemas de saúde, quis nos dar sua bênção da sacada da Basílica de São Pedro e depois desceu a esta praça para saudar a grande multidão reunida para a Missa de Páscoa, do papamóvel aberto. Com a nossa oração, queremos agora confiar a alma do amado Pontífice a Deus, para que lhe conceda a felicidade eterna no horizonte luminoso e glorioso do seu imenso amor. Ilumina-nos e guia-nos a página do Evangelho, na qual ressoou a própria voz de Cristo que interrogou o primeiro dos Apóstolos: "Pedro, tu amas-me mais do que estes?" E a resposta de Pedro foi rápida e sincera: "Senhor, Tu sabes tudo; Tu sabes que eu te amo!" E Jesus lhe confiou a grande missão: "Apascenta as minhas ovelhas". Esta será a tarefa constante de Pedro e dos seus Sucessores, um serviço de amor na esteira do Mestre e Senhor Cristo, que "não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate por todos" (Mc 10,45).
Apesar de sua fragilidade e sofrimento final, o Papa Francisco escolheu seguir esse caminho de doação até o último dia de sua vida terrena. Ele seguiu os passos do seu Senhor, o Bom Pastor, que amou suas ovelhas a ponto de dar a própria vida por elas. E o fez com força e serenidade, próximo do seu rebanho, a Igreja de Deus, recordando a frase de Jesus citada pelo apóstolo Paulo: "Há mais alegria em dar do que em receber" (At 20, 35). Quando o Cardeal Bergoglio foi eleito pelo Conclave para suceder o Papa Bento XVI em 13 de março de 2013, ele tinha anos de vida religiosa na Companhia de Jesus e, acima de tudo, foi enriquecido pela experiência de 21 anos de ministério pastoral na Arquidiocese de Buenos Aires, primeiro como Auxiliar, depois como Coadjutor e, mais tarde, sobretudo, como Arcebispo.
A decisão de adotar o nome Francisco surgiu imediatamente como a escolha de um programa e de um estilo sobre os quais ele queria basear seu pontificado, buscando inspirar-se no espírito de São Francisco de Assis. Conservou o seu temperamento e a sua forma de liderança pastoral, e deixou imediatamente a marca da sua forte personalidade no governo da Igreja, estabelecendo contatos diretos com as pessoas e as populações, desejoso de estar próximo de todos, com particular atenção às pessoas em dificuldade, dedicando-se sem medida, em particular aos últimos da terra, os marginalizados.
Ele era um Papa entre o povo com um coração aberto a todos. Além disso, foi um Papa atento ao que era novo e emergente na sociedade e ao que o Espírito Santo suscitava na Igreja. Com seu vocabulário característico e sua linguagem rica em imagens e metáforas, ele sempre procurou iluminar os problemas do nosso tempo com a sabedoria do Evangelho, oferecendo uma resposta à luz da fé e nos encorajando a viver como cristãos os desafios e as contradições destes anos de mudanças, que ele gostava de chamar de “mudança de época”. Ele tinha grande espontaneidade e um jeito informal de se dirigir a todos, mesmo às pessoas distantes da Igreja.
Rico de calor humano e profundamente sensível às tragédias de hoje, o Papa Francisco compartilhou verdadeiramente as angústias, os sofrimentos e as esperanças do nosso tempo de globalização, e se entregou confortando e encorajando com uma mensagem capaz de alcançar o coração das pessoas de forma direta e imediata. Seu carisma de acolher e escutar, aliado a um modo de agir típico da sensibilidade atual, tocou corações, buscando despertar energias morais e espirituais.
O primado da evangelização foi o guia do seu pontificado, difundindo, com um claro cunho missionário, a alegria do Evangelho, que foi o título da sua primeira Exortação Apostólica Evangelii gaudium. Uma alegria que enche de confiança e esperança os corações de todos aqueles que confiam em Deus.
Um fio condutor de sua missão também foi a crença de que a Igreja é um lar para todos; uma casa com portas que estão sempre abertas. Ele usou repetidamente a imagem da Igreja como um "hospital de campanha" após uma batalha na qual houve muitos feridos; uma Igreja desejosa de cuidar com determinação dos problemas das pessoas e das grandes preocupações que dilaceram o mundo contemporâneo; uma Igreja capaz de se curvar sobre cada homem, além de qualquer credo ou condição, curando suas feridas. Seus gestos e exortações em favor dos refugiados e deslocados são inúmeros.
A insistência em trabalhar pelos pobres também era constante. É significativo que a primeira viagem do Papa Francisco tenha sido para Lampedusa, uma ilha que é um símbolo da tragédia da emigração, com milhares de pessoas se afogando no mar. Na mesma linha ocorreu também a viagem a Lesbos, juntamente com o Patriarca Ecumênico e o Arcebispo de Atenas, bem como a celebração de uma missa na fronteira entre o México e os Estados Unidos, por ocasião de sua viagem ao México.
Das suas 47 árduas viagens apostólicas, a do Iraque, em 2021, ficará particularmente na história, por ter sido realizada desafiando todos os riscos. Aquela difícil Visita Apostólica foi um bálsamo para as feridas abertas da população iraquiana, que tanto sofreu com o trabalho desumano do ISIS. Esta também foi uma jornada importante para o diálogo inter-religioso, outra dimensão importante do seu trabalho pastoral. Com a Visita Apostólica de 2024 a quatro nações da Ásia-Oceania, o Papa alcançou “a periferia mais periférica do mundo”. O Papa Francisco sempre colocou o Evangelho da misericórdia no centro, enfatizando repetidamente que Deus nunca se cansa de nos perdoar: Ele sempre perdoa qualquer que seja a situação daqueles que pedem perdão e retornam ao caminho certo. Ele queria o Jubileu Extraordinário da Misericórdia, destacando que a misericórdia é "o coração do Evangelho".
Misericórdia e alegria do Evangelho são duas palavras-chave do Papa Francisco.
Em contraste com o que ele chamou de "cultura do descartável", ele falou da cultura do encontro e da solidariedade. O tema da fraternidade percorreu todo o seu pontificado com tons vibrantes. Na Carta Encíclica Fratelli tutti ele quis reavivar uma aspiração mundial à fraternidade, porque todos são filhos do mesmo Pai que está nos céus. Ele frequentemente nos lembrava com veemência que todos pertencemos à mesma família humana.
Em 2019, durante sua viagem aos Emirados Árabes Unidos, o Papa Francisco assinou um documento sobre "Fraternidade Humana pela Paz Mundial e pela Convivência Comum", recordando a paternidade comum de Deus. Dirigindo-se a homens e mulheres de todo o mundo, com a Carta Encíclica Laudato si' ele chamou a atenção para os deveres e a corresponsabilidade para com a nossa casa comum. "Ninguém se salva sozinho". Diante da fúria das muitas guerras destes anos, com horrores desumanos e com inúmeras mortes e destruições, o Papa Francisco tem incessantemente levantado a sua voz implorando pela paz e convidando à razoabilidade, à negociação honesta para encontrar soluções possíveis, porque a guerra – disse ele – é apenas a morte de pessoas, a destruição de casas, hospitais e escolas. A guerra sempre deixa o mundo pior do que era antes: para todos é sempre uma derrota dolorosa e trágica.
“Construí pontes e não muros” é uma exortação que ele repetiu muitas vezes e o serviço da fé como Sucessor do Apóstolo Pedro sempre esteve ligado ao serviço do homem em todas as suas dimensões. Em união espiritual com todo o cristianismo, estamos aqui em grande número para rezar pelo Papa Francisco para que Deus o acolha na imensidão do seu amor. O Papa Francisco costumava concluir seus discursos e encontros dizendo: "Não se esqueçam de rezar por mim".
Querido Papa Francisco, agora pedimos que reze por nós e que do céu abençoe a Igreja, abençoe Roma, abençoe o mundo inteiro, como fez no domingo passado da sacada desta Basílica, em um último abraço com todo o povo de Deus, mas idealmente também com a humanidade que busca a verdade com um coração sincero e mantém alta a tocha da esperança.