04 Julho 2024
"Eis o arrepio, termo que em italiano está ligado a um vento fresco noturno que passa da pele quase até os ossos: é o sinal de uma vitalidade que freme e reage. Quando estamos apaixonados, comovidos ou emocionados, vivemos uma experiência que sacode corpo e alma".
O comentário é do cardeal italiano Gianfranco Ravasi, ex-prefeito do Pontifício Conselho para a Cultura, em artigo publicado por “Il sole 24 Ore”, 30-06-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.
Não busco a salvação na indiferença: o arrepio é a melhor parte da humanidade. São os versos 6271-6272 daquela grande obra-prima que é o Fausto, de Goethe. Neles, duas experiências humanas são contrapostas. Por um lado, há a indiferença, aquela calma rasa da alma que não é sinal de paz, mas de quietude vazia. Essa é a doença da sociedade contemporânea que se adapta ao plano da superficialidade, que ama o lugar-comum mesmo que falso, que se alimenta de banalidade e de imediatismo, que se curva, se dobra e declina em direção à baixeza espiritual e à baixeza moral.
Por outro lado, por contraste, eis o arrepio, termo que em italiano está ligado a um vento fresco noturno que passa da pele quase até aos ossos: é o sinal de uma vitalidade que freme e reage. Quando estamos apaixonados, comovidos ou emocionados, vivemos uma experiência que sacode corpo e alma. Goethe continua com este outro verso, o 6274: “O homem, quando está comovido, sente em profundidade a imensidão", ou seja, vê-se conduzido ao infinito, ao eterno e ao divino, protende-se em direção às estrelas.
No italiano, é possível fazer um trocadilho com a palavra latina sidera “estrelas”: “desejar” profunda e calorosamente a verdade e o amor impedem um assiderarsi (congelar-se) no gelo da indiferença e da apatia interior.
Outro grande da literatura como Anton Chekhov concluía num dos seus contos: “Dizem que os filósofos e os verdadeiros sábios são indiferentes. É falso. A indiferença é uma paralisia da alma, é uma morte prematura”.