18 Mai 2024
"A linha fronteiriça primária não passa entre quem crê e quem nega, mas entre quem pensa seriamente e se questiona e quem banaliza tudo e mergulha na neblina cinzenta da indiferença e superficialidade", escreve o cardeal italiano Gianfranco Ravasi, em artigo publicado em Il Sole 24 Ore, 12-05-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.
Deus da vontade,
Deus todo-poderoso, busque
(esforce-se), de tanto insistir
– pelo menos – para existir.
Ele a intitulou Oração de Exortação e Encorajamento e se definia o poeta da “ateologia”. Citei Giorgio Caproni, de Livorno, falecido em Roma em 1990, aos 78 anos, depois de ter deixado uma produção poética muitas vezes provocativa e até sarcástica, mas capaz de rasgar o véu da hipocrisia e provocar um sobressalto contínuo para a busca por um significado para a existência humana. Muitas vezes a sua foi uma espécie de teologia negativa, um abismo do qual se elevava um grito não de invocação de súplica ou louvor, mas de espera que Deus tentasse existir e revelar-se.
Descobrir o sentido do mundo e da nossa própria vida é, de fato, perfurar o “muro da terra”, como diz o título de uma das suas coletâneas poéticas. Aliás, Caproni transformou-se num “franco caçador” – título de outro livro dos seus livros de poesias – que vai justamente à caça de Deus, “aquele que mataram, está aqui / mais vivo e iminente / (mais impiedoso) que nunca".
Nele, como em muitos outros "buscadores" que espiam todo possível sinal de um Deus negado, cumpre-se o que observa outro poeta, o francês Pierre Reverdy (1889-1960): "Existem ateus de uma dureza feroz que, afinal das contas, se interessam por Deus muito mais do que certos crentes frívolos e despreocupados”. Sim, porque a linha fronteiriça primária não passa entre quem crê e quem nega, mas entre quem pensa seriamente e se questiona e quem banaliza tudo e mergulha na neblina cinzenta da indiferença e superficialidade. Deixemos então a voz a outro irmão ideal de Caproni, o russo Aleksandr Zinov'ev (1922-2006): “Rogo-te, meu Deus, tenta existir, pelo menos um pouco, para mim... Viver sem testemunhas, que inferno! Por isso grito: Meu Pai, eu te suplico: existe!”