«Anunciar (e ouvir) as maravilhas de Deus»

Foto: Pixabay

Mais Lidos

  • Alessandra Korap (1985), mais conhecida como Alessandra Munduruku, a mais influente ativista indígena do Brasil, reclama da falta de disposição do presidente brasileiro Lula da Silva em ouvir.

    “O avanço do capitalismo está nos matando”. Entrevista com Alessandra Munduruku, liderança indígena por trás dos protestos na COP30

    LER MAIS
  • Dilexi Te: a crise da autorreferencialidade da Igreja e a opção pelos pobres. Artigo de Jung Mo Sung

    LER MAIS
  • Às leitoras e aos leitores

    LER MAIS

Revista ihu on-line

O veneno automático e infinito do ódio e suas atualizações no século XXI

Edição: 557

Leia mais

Um caleidoscópio chamado Rio Grande do Sul

Edição: 556

Leia mais

Entre códigos e consciência: desafios da IA

Edição: 555

Leia mais

07 Junho 2019

O Espírito jamais deixou de desempenhar um papel principal, seja na Criação e em sua renovação, seja na história da salvação. Ele foi quem inspirou os escritores bíblicos todos e, também, quem desatou a língua dos Apóstolos, para que testemunhassem a Ressurreição de Cristo nas línguas de cada um dos seus ouvintes. Com Pentecostes, a Páscoa se completa! Cumpriu-se hoje a promessa de Jesus: os discípulos “ficaram cheios do Espírito Santo e começaram a falar em outras línguas!”


A reflexão é de Marcel Domergue (+1922-2015), sacerdote jesuíta francês, publicada no sítio Croire, comentando as leituras do  Domingo de Pentecostes - Ciclo C (09 de junhio de 2019). A tradução é de Francisco O. Lara, João Bosco Lara e José J. Lara.

Referências bíblicas

Missa da vigília
1ª leitura: «Foi chamada Babel, porque aí o Senhor confundiu a linguagem de todo o mundo» (Gn 11,1-9).
Salmo: Sl. 103(104) - R/ Enviai o vosso Espírito, Senhor, e da terra toda a face renovai.
2ª leitura: «É o próprio Espírito que intercede em nosso favor com gemidos inefáveis» (Romanos 8,22-27).
Evangelho: «Rios de água viva jorrarão do seu interior» (João 7,37-39).

Missa do dia
1ª leitura: «Todos ficaram cheios do Espírito Santo e começaram a falar em outras línguas» (Atos 2,1-11).
Salmo: Sl. 103(104) - R/ Enviai o vosso Espírito, Senhor, e da terra toda a face renovai.
2ª leitura: «A cada um é dada a manifestação do Espírito em vista do bem comum» (1 Cor 12,3-7.12-13).
Sequência: "Espírito de Deus, enviai dos céus um raio de luz!"
Evangelho: «Soprou sobre eles e disse: ‘Recebei o Espírito Santo’» (João 20,19-23).

Ouça a leitura do Evangelho:

O Espírito e nós

O Espírito visto da nossa parte, ou seja, sem que por ora nos preocupemos com o que signifique na Trindade, é o próprio Deus agindo em nossas vidas. Às vezes, as Escrituras O comparam ao óleo, usado para se fazer penetrar os materiais mais duros. Deste modo, também o Espírito Santo pode vir desposar o nosso próprio espírito, conferindo à Aliança a sua forma perfeita. Paulo diz que é Ele que “intercede em nosso favor”; sem dúvida, desde que Lhe demos licença para exprimir-se por nós. Quando Jesus estava conosco, aqui na terra, Deus nos permanecia exterior; já, pelo Espírito, Ele se nos torna interior. Somos, pois, assim, «Templos do Espírito Santo», habitação de Deus (1 Cor 6,19). O divino Espírito tornou-se o dinamismo mesmo que nos põe em movimento, rumo à nossa criação perfeita e acabada. É preciso, pois, corrigirmos a imagem do Templo, estática demais, e substituí-la pelas da respiração, que nos faz viver, e da força, necessária à caminhada. «Todo aquele que nasceu do Espírito» torna-se mobilidade: «não se sabe de onde vem nem para onde vai» (João 3,8).

O Espírito e Cristo

Alguns foram tentados a dizer que, no Antigo Testamento, os homens estavam sob o império do Pai; nos tempos evangélicos, sob o império do Filho; e, no tempo da Igreja, estamos sob o império do Espírito. Ora, isto é um pouco simples demais. Porque, na verdade, o Espírito não faz nada que também não façam o Pai e o Filho. Como Espírito do Pai e do Filho, Ele nos dá atitudes ao mesmo tempo paternais (e maternais) e filiais. Ele nos traz de volta ao Cristo e o que Ele forma em nós é a semelhança com o Cristo. Pelo Espírito, tornamo-nos "filhos de Deus", assim como o Cristo. Pois, não é ao Espírito que as Escrituras atribuem a concepção e o nascimento de Jesus (Lucas 1,35)? O Espírito é fecundidade, é Ele que nos faz "dar frutos". Muitos cristãos quase não pensam n’Ele, talvez por Ele ser de tal modo interior a nós, que a sua ação nos escape; assim como nos escapa, por exemplo, o funcionamento de nosso cérebro.

O Espírito e o mundo

O que acabamos de dizer poderia deixar acreditar que a vinda do Espírito é um acontecimento íntimo, referido somente a Deus e a mim. Mas não é nada disto, pois o Espírito é ligação. É passagem de um ao outro (do Pai ao Filho e do Filho ao Pai, na Trindade). Se o Espírito nos dá certezas filiais, só pode fazer isto conferindo-nos atitudes fraternais. Somos todos filhos, conjuntamente. Da mesma forma, o trabalho do Espírito consiste em dar ao Cristo um corpo de comunhão, feito de entendimento entre todos os homens, a começar pelos discípulos. A cena de Pentecostes (1ª leitura) nos mostra isto. Temos aí diversos homens chamados a se compreenderem - a se ouvirem - não somente numa linguagem única, como em Babel, mas conservando as diferenças. Este é o corpo descrito em Coríntios 12. Cada vez que estabelecemos laços verdadeiros, libertadores e criadores, encontramo-nos sob a mobilização do Espírito.

A Palavra e o Sopro

Eis o que sai da boca de Deus: o Sopro, de fato, é que nos sopra a Palavra. «O Espírito vos recordará tudo o que vos tenho dito», anuncia Jesus imediatamente antes de sua Paixão, em Jo 14,26. Em 16,12-15, João insiste em que o Espírito não tem outra Palavra que não seja a do Filho, no qual reside tudo o que há no Pai: «Tudo o que o Pai tem é meu.» O Espírito fala dentro de nós e o que Ele nos diz é o Filho, Palavra do Pai. De onde podem vir algumas dificuldades, porque o Espírito não é o único a falar dentro de nós; também falam a nossa vontade de poder, o medo de nos darmos em demasia ou de termos de nos suportar em demasia. São vozes discordantes que podem encobrir e sufocar a voz sem palavras do Espírito. E pode ser muito difícil identificar quem é que está falando dentro de nós. Muitas vezes, nada se parece mais com o anjo da luz do que o anjo das trevas. No relato das tentações de Jesus, os evangelistas, sem qualquer repugnância, colocam na boca do tentador citações das Escrituras ou a promessa de algo bom no futuro. Ora, o que pode haver de melhor do que defender a fé? Mas, se para isso há de se contar com as cruzadas ou a inquisição, saímos do âmbito de mobilização do Espírito. E como o mal pode facilmente ganhar a aparência do bem, João e Paulo já falavam no discernimento espiritual, tendo em vista identificar a voz que, aqui e agora, está falando dentro de nós. É preciso ter disponibilidade e confiança absolutas no Espírito.

Leia mais: