05 Dezembro 2025
Após 19 anos de missão no Brasil, o padre Luis Miguel Modino retorna à Espanha trazendo consigo histórias, lições aprendidas e um compromisso maduro com a comunicação e com a Igreja na Amazônia.
Luis Miguel Modino, sacerdote espanhol da Arquidiocese de Madri, é uma das vozes mais reconhecidas na comunicação da Igreja na Amazônia na última década. Ordenado sacerdote em sua diocese de origem em 1998, chegou como sacerdote fidei donum à missão no Brasil em 2006, servindo por quase dez anos na Diocese de Rui Barbosa, na Bahia, onde aprofundou sua experiência de vida comunitária e o poder evangelizador das pequenas comunidades.
Em 2016, foi enviado à Amazônia, inicialmente para a Diocese de São Gabriel da Cachoeira, acompanhando comunidades indígenas. Posteriormente, transferiu-se para a Arquidiocese de Manaus, onde ampliou seu trabalho missionário (na Área Missionária de São José do Rio Negro) e assumiu importantes responsabilidades na comunicação da Igreja: trabalhou na comunicação da Rede Eclesial Pan-Amazônica (REPAM), do Conselho Episcopal Latino-Americano e Caribenho (CELAM), como assessor de comunicação do Escritório Regional Norte 1 da CNBB e como correspondente da Religión Digital.
Ao longo dos anos, tornou-se uma figura de destaque na comunicação e cobertura pastoral de importantes processos eclesiais na região, especialmente durante o Sínodo para a Amazônia (2018-2019), a Assembleia Eclesial Latino-Americana e Caribenha (2021) e o Sínodo sobre a Sinodalidade (2021-2024). Seu trabalho combinou missão, presença pastoral e comunicação comprometida com a vida dos povos amazônicos, tornando-o uma ponte entre suas histórias e a Igreja em todo o mundo.
Após quase vinte anos de missão no Brasil, Luis Miguel Modino retorna à sua Arquidiocese de Madri para assumir novas responsabilidades, trazendo consigo a riqueza espiritual, humana e pastoral adquirida no país latino-americano. Nesta entrevista, ele reflete sobre sua trajetória, as lições aprendidas e os desafios enfrentados durante quase duas décadas de missão no Brasil — da Bahia à amada Amazônia —, incluindo um importante trabalho de comunicação da Igreja continental.
A entrevista é de Julio Caldeira, publicada por Religión Digital, 04-12-2025.
Eis a entrevista.
Padre Luís Miguel, quando o senhor chegou ao Brasil? Onde trabalhou e o que fez durante seus muitos anos de missão?
Cheguei ao Brasil em 26 de setembro de 2006 para trabalhar na Diocese de Rui Barbosa, na Bahia. Permanecei lá até fevereiro de 2016, quando fui enviado como missionário para a Amazônia. Na Bahia, valorizo especialmente a descoberta da força das pequenas comunidades. Aprendi que a vida da Igreja se sustenta na comunhão, na partilha e na presença próxima do missionário.
Sempre procurei ser não apenas uma presença sacramental, mas uma presença evangélica que ajuda as pessoas a descobrirem que o Evangelho é fonte de vida e que, na vida comunitária, damos sentido ao nosso batismo e descobrimos as diversas vocações para as quais Deus nos chama.
Depois daquela experiência maravilhosa no Nordeste, o senhor chegou à amada Amazônia. Como foram seus primeiros anos em São Gabriel da Cachoeira?
Ali, onde mais de 90% da população é indígena, acompanhei comunidades nas paróquias de Pari-Cachoeira e Cucuí. Ali aprendi algo essencial: as pessoas esperam mais do que sacramentos; esperam presença. Aprendi a caminhar “sem pressa”, como diziam os membros da comunidade.
A Amazônia tem uma relação diferente com os conceitos de tempo e espaço. “Longe” ou “perto” não significam a mesma coisa que em outros lugares. Ir até a última comunidade, chegar a lugares onde quase ninguém vai, é fundamental.
Tive a mesma experiência em Manaus, especialmente na Área Missionária de São José do Rio Negro, nas comunidades ribeirinhas e indígenas. Os missionários precisam estar com os mais necessitados, com aqueles que estão mais distantes, e ser uma presença que traga alegria à vida das pessoas por meio de suas visitas.
Nos últimos anos, o senhor também se dedicou intensamente ao trabalho de comunicação da Igreja na Amazônia e na América Latina. O que esse serviço significou para você?
Para mim, na comunicação da Igreja, devemos entender que comunicar é evangelizar. Quando testemunhamos o que faz parte da vida das pessoas, descobrimos que comunicar as histórias, as dores, as lutas e a fé dos povos amazônicos torna visíveis as sementes da Palavra presentes na vida das pessoas e de suas comunidades. As pessoas passam a entender que, por meio da simplicidade, a Igreja cresce e ajuda as pessoas a encontrarem sentido em suas vidas. Sempre vivenciei a comunicação como parte da missão.
Sou grato às comunidades que servi, que sempre compreenderam que as minhas ausências (devido ao meu trabalho com a REPAM, a CELAM e o Escritório Regional Norte 1 da CNBB) faziam parte da missão, e isso ajudou-me imensamente a servir com liberdade e disponibilidade. Sabiam que eu era o pároco, que acompanhava a vida das comunidades, mas também conheciam a outra missão que eu tinha. Através dessas comunidades, descobri narrativas profundas de fé que pude partilhar com a Igreja no continente e em todo o mundo.
Quais foram os momentos mais significativos nesses anos de comunicação missionária?
Sem dúvida, nossa cobertura dos Sínodos em Roma, o Sínodo sobre a Sinodalidade (2021-2024) e, especialmente, o Sínodo para a Amazônia (2018-2019), foi muito significativa. Ali, como comunicadores, ajudamos o mundo a reconhecer a riqueza dos povos amazônicos e da Igreja na região.
Outro aspecto muito importante foi contar as histórias das pessoas. As pessoas mais simples comunicam o Evangelho sem floreios. É um testemunho muito mais claro e autêntico. Às vezes, aqueles de nós que se aprofundaram em estudos teológicos podem ter um discurso mais teórico. Os muitos homens e mulheres que assumem ministérios nas comunidades e testemunham sobre eles para os outros fazem isso a partir da experiência vivida, da fé em Deus e do coração. Dar visibilidade a essas experiências de pessoas dedicadas por tantos anos ao serviço das comunidades amazônicas é uma tarefa fundamental para qualquer comunicador na Igreja.
Muitas vezes ficamos impressionados ao entrevistar cardeais e bispos, mas vemos que o Evangelho brota com força nas mãos e nos testemunhos dos ministros que servem silenciosamente às suas comunidades de base.
Agora o senhor está retornando à sua arquidiocese de origem em Madri. Quais são as perspectivas para esta nova etapa?
Estamos a serviço da Igreja. Quando comecei a trabalhar na equipe de comunicação da REPAM, consultei o então Arcebispo de Madri, Cardeal Carlos Osoro. Ele me disse: “Peço-lhe, e se não se importar, estou enviando-o para assumir esta missão”. Estou retornando a Madri em obediência ao chamado da Igreja na qual fui ordenado.
Jamais devemos esquecer o que prometemos no dia de nossa ordenação sacerdotal: obediência e respeito ao bispo. Agora, o atual arcebispo, Cardeal Cobo, solicitou minha presença em Madri. Portanto, retorno em paz e com gratidão à Igreja no Brasil, e estou à disposição para atender às necessidades da Arquidiocese de Madri e a tudo o que me for solicitado neste momento.
Em conclusão: o que o senhor guarda com mais carinho dessa experiência de tantos anos no Brasil?
Levo comigo as histórias de vida de muitas pessoas profundamente comprometidas com a vida da Igreja e suas comunidades. Muitas pessoas me vêm à mente enquanto me preparo para uma nova missão. Acima de tudo, levo comigo a experiência de uma Igreja que compreende o batismo como o sacramento fundamental na vida eclesial e que todo ministério brota dele.
Promover o ministério leigo é algo que aprendi aqui no Brasil e que levo comigo para a Igreja na Espanha, que ainda é muito clerical. Precisamos entender o seguinte: o ministério ordenado é importante na vida da Igreja, ninguém nega isso. Mas o ministério leigo é fundamental para que a Igreja tenha o alcance de que tanto precisamos e, assim, realize essa "Igreja em movimento" e Igreja sinodal, pela qual o Papa Francisco tem defendido com tanta veemência e que o Papa Leão XIV vem promovendo em seu Magistério, avançando como uma Igreja onde todos caminhamos juntos, onde todos têm um lugar e onde sentimos a necessidade de progredir juntos.
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