Sínodo para a Amazônia repercute na Igreja Católica cinco anos depois

Papa Francisco caminha em procissão no início do Sínodo dos Bispos para a Amazônia, no Vaticano, em 7 de outubro de 2019 (Foto: CNS/Paul Haring)

18 Outubro 2024

Cinco anos atrás, em 7 de outubro de 2019, a Basílica de São Pedro, no Vaticano, ecoou com vozes cantando sobre a Amazônia.

A reportagem é de Barbara Fraser, publicada por National Catholic Reporter, 15-10-2024.

Homens e mulheres, alguns em trajes indígenas tradicionais, encheram os transeptos e a cúpula de um dos locais mais sagrados do catolicismo com uma canção de oração ao lado de cardeais e bispos. Em frente ao imponente altar principal, eles levantaram uma pequena canoa escavada enfeitada com redes de pesca e cercaram o Papa Francisco, acompanhando-o em uma procissão até o salão de audiências vizinho, onde o pontífice abriu as deliberações de um mês do Sínodo dos Bispos para a região da Pan-Amazônia.

Essa imagem permanece viva para a Irmã Joaninha Madeira, da Imaculada Conceição, membro de uma equipe missionária itinerante que ministra em comunidades ao longo dos rios amazônicos.

"Foi como dizer: 'Olha, algo novo está começando na Igreja'. Temos que continuar dessa forma, caminhando com as pessoas na sinodalidade", diz ela.

A procissão foi apenas uma das várias maneiras pelas quais o Sínodo para a Amazônia abriu novos caminhos e traçou um caminho para a Igreja Católica que continua a reverberar, tanto no bioma sul-americano quanto além. À medida que a segunda e última sessão do Sínodo sobre a Sinodalidade continua no Vaticano, as raízes daquele encontro remontam ao seu precursor, meia década antes.

Foi o sínodo da Amazônia que primeiro precedeu sua assembleia em Roma com uma série de sessões de escuta nas quais dezenas de milhares de pessoas dos oito países amazônicos (Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela) e do território da Guiana Francesa participaram. O Sínodo para a Amazônia também viu homens e mulheres (leigos, clérigos e religiosos) falarem nas sessões, embora, no fim, apenas os bispos tenham votado no documento final.

Um momento de oração na Basílica de São Pedro dá início à primeira sessão do Sínodo dos Bispos para a Amazônia, em 7 de outubro de 2019 (Foto: CNS/Vatican Media)

No tempo desde o sínodo da Amazônia, seus ecos também são sentidos por toda a vasta região. Enquanto alguns observadores dizem que a Igreja se moveu muito lentamente para implementar suas recomendações, outros dizem que o ritmo deliberado é necessário para garantir que as mudanças feitas não sejam facilmente desfeitas.

Sonhos para uma Igreja amazônica

Ao abrir o sínodo para a Amazônia, Francisco disse que buscava dar à Igreja um "rosto amazônico". E em Querida Amazônia, exortação papal emitida após o encontro, ele falou sobre ter quatro sonhos (social, cultural, ecológico e eclesial) para a região.

"Os sonhos são o horizonte do reino de Deus", diz o cardeal peruano Pedro Barreto Jimeno, um jesuíta próximo de Francisco e que agora lidera a Conferência Eclesial da Amazônia (CEAMA), estrutura eclesiástica surgida do sínodo de 2019.

O sínodo em si surgiu do próprio despertar de Francisco para a importância da bacia amazônica para o mundo, e os desafios particulares da Igreja na região. Como cardeal Jorge Bergoglio de Buenos Aires, ele coordenou a comissão na assembleia dos bispos latino-americanos de 2007 em Aparecida/SP, que escreveu o primeiro documento oficial da Igreja da América Latina a incluir uma seção sobre a Amazônia.

No sínodo da Amazônia, os participantes indígenas descreveram ameaças às suas terras por parte de madeireiros ilegais e especuladores de terras que assediavam e às vezes assassinavam pessoas que se opunham a eles, como mataram a irmã de Notre Dame, Dorothy Stang, em 2005. Agentes pastorais falaram da dificuldade de ministrar em um lugar onde as distâncias são tão grandes e o clero tão pequeno que as comunidades em regiões remotas têm pouca ou nenhuma oportunidade de celebrar a Eucaristia com um padre. Isso levou alguns participantes do sínodo a pedir a ampliação do papel das mulheres no ministério eclesiástico, por meio de mulheres diáconas, e também a ordenação de homens casados.

Em Querida Amazônia, Francisco respondeu ao documento final do Sínodo para a Amazônia, expressando quatro sonhos para a Igreja na região:

Cinco anos após o sínodo, esses sonhos estão tomando forma, embora ainda haja muito a ser feito, diz Barreto.

"Acredito que estamos ganhando maior consciência na sociedade de que somos todos irmãos e irmãs", disse o cardeal à EarthBeat, embora os povos indígenas continuem sofrendo discriminação e tentativas de despojá-los de suas terras ou dos recursos em seus territórios.

O Conselho Indigenista Missionário (CIMI), ligado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), relata altos índices de assassinatos, suicídios e mortalidade infantil entre grupos indígenas, além de lentidão no reconhecimento oficial de territórios indígenas, um problema que também ocorre em outros países, incluindo o Peru.

"Tomamos consciência de que definitivamente precisamos aprender a ouvir", diz Barreto. "Isso é fundamental para a sinodalidade, para caminhar juntos com as diferenças que podemos ter, ouvir a diversidade de culturas e cosmovisões e aprender a dialogar para o bem comum".

O sonho ecológico é o que mais o preocupa.

Chamada de o pulmão do planeta, a bacia amazônica está sofrendo uma seca severa este ano, com os níveis de água em alguns rios nos níveis mais baixos já registrados. Em meio à seca, altas temperaturas e ventos fortes têm alimentado uma temporada brutal de incêndios florestais, com as condições secas alimentadas mais por práticas comuns de queima de campos para aumentar sua fertilidade, ou queima de árvores e arbustos de florestas devastadas principalmente para a criação de gado.

Cientistas alertam que o desmatamento e as mudanças climáticas levaram a Amazônia para mais perto de um "ponto de inflexão" — um ponto em que uma corrente de eventos incontroláveis faz com que a outrora exuberante floresta tropical se torne pastagem — do que talvez os modelos climáticos tenham sugerido. Tal mudança teria impactos terríveis para a enorme diversidade de seres vivos da região, bem como para todo o planeta, que depende do enorme pulso de água doce do Rio Amazonas e do papel da floresta na regulação do clima global.

Área desmatada na Amazônia (Foto: Marizilda Cruppe/Greenpeace)

"Esse sonho vai levar muitos anos. Décadas. Talvez — embora eu espere que não — séculos, não apenas para cuidar da natureza, mas para restaurá-la, porque o dano já foi feito", diz Barreto.

Novas estruturas de igrejas se formando

Barreto é mais otimista sobre o sonho eclesial, que tomou forma com o trabalho contínuo da Rede Eclesial Pan-Amazônica (REPAM, por suas iniciais em espanhol) e a criação da CEAMA. A REPAM é geralmente vista como uma plataforma para interconectar jurisdições eclesiásticas em todos os oito países amazônicos, enquanto a CEAMA é um tipo diferente de estrutura eclesiástica.

Os limites da CEAMA não são determinados por fronteiras nacionais, mas pela biogeografia da bacia amazônica. Sua composição é mais diversa do que a da maioria das conferências episcopais. Embora o presidente seja um bispo ou cardeal, as duas atuais vice-presidentes são mulheres indígenas, uma das quais é uma irmã religiosa. O grupo de liderança também inclui um leigo, outra irmã religiosa e um padre afrodescendente.

Cada uma das sete conferências episcopais que incluem parte da bacia amazônica (Guiana, Suriname e Guiana Francesa pertencem à conferência das Antilhas no Caribe) é representada na CEAMA com um bispo, um padre, um leigo e um representante indígena. Como resultado, quando a assembleia completa se reúne, há um grupo diverso de cerca de 50 pessoas de toda a região, explica Barreto.

A organização da CEAMA marca outro passo na direção de modelar a intenção do Sínodo para a Amazônia de modelar uma maneira diferente de ser Igreja. E embora alguns críticos tenham argumentado que isso cria outra camada de hierarquia, o novo modelo está conquistando alguns céticos.

"Quando começou, pensei que fosse outro nome para as mesmas estruturas", diz Florêncio Vaz Filho, irmão franciscano e antropólogo em Santarém, no Pará. "Mas acredito que seja uma pequena porta, uma pequena abertura, onde a Igreja, em um sentido eclesial e não episcopal, pode seguir adiante".

O longo alcance do sínodo

A influência do sínodo amazônico já está sendo sentida em outras partes da Igreja.

Em 2021, o Conselho Episcopal Latino-Americano e Caribenho (CELAM) realizou uma assembleia eclesial em vez de uma conferência episcopal, com uma ampla consulta prévia e participação de leigos e religiosos no plenário. Esse processo em toda a América Latina foi modelado nas consultas realizadas como parte do sínodo amazônico e foi ampliado para o nível global para o Sínodo sobre a Sinodalidade.

"Esta não é uma Igreja Católica que vem de longe para evangelizar, com sua luz e suas sombras", diz Barreto. "Agora é a Igreja da Amazônia, depois de quatro séculos, que quer não só continuar a evangelização na Amazônia, mas também ser uma contribuição para a Igreja universal.

O sínodo amazônico também buscou destacar a bacia como terreno fértil para colocar em prática o princípio da ecologia integral estabelecido na encíclica de Francisco de 2015, Laudato Si': sobre o cuidado da nossa casa comum. O documento final destacou o impacto das indústrias extrativas, como a produção de petróleo, que polui rios e florestas com vazamentos, e a mineração, que está aumentando em alguns países à medida que aumenta a demanda por minerais associados à transição para energia limpa.

Além disso, o documento final denunciou violações de direitos humanos relacionadas a tais indústrias, apoiou campanhas de desinvestimento de empresas que causam danos ambientais ou prejudicam comunidades locais e endossou "uma transição energética radical" para fontes alternativas menos prejudiciais à Amazônia — posturas que refletem o trabalho da Rede Ecumênica de Igrejas e Mineração.

Em pelo menos uma questão, no entanto, o Sínodo para a Amazônia não conseguiu fazer diferença. A proposta de abrir o diaconato às mulheres, que foi amplamente discutida no sínodo, foi omitida em Querida Amazônia. E embora tenha surgido novamente na primeira sessão do Sínodo sobre a Sinodalidade, não está na pauta para a segunda que ocorre neste momento em Roma.

No entanto, outras medidas além do diaconato podem ser tomadas para expandir as opções para as mulheres, diz a irmã da Missão Médica Alemã Birgit Weiler, ecoteóloga que atuou como especialista no Sínodo para a Amazônia e que é consultora da Secretaria-geral do Sínodo dos Bispos.

"O Papa Francisco deu e continua dando um exemplo ao nomear mulheres para cargos de responsabilidade no Vaticano", incluindo aqueles antes ocupados apenas por homens, diz Weiler. "Então, embora eu acredite que o diaconato seja uma questão importante, ela não é a única".

Um passo adiante, sugeriu a teóloga, seria revisar o direito canônico para permitir que homens e mulheres se candidatem a cargos de liderança com base em suas qualificações e "não sejam deixados/as à mercê dos caprichos das autoridades eclesiásticas". Isso garantiria que "mais mulheres sejam incluídas em espaços onde as decisões são preparadas e tomadas", diz ela.

Ministrando ao longo das águas

A CEAMA, que reúne um número significativo de religiosas e leigas, também avança em outras frentes. Um grupo de trabalho que desenvolve uma proposta para um rito litúrgico amazônico espera ter um rascunho pronto para consulta em meados de 2025.

O objetivo é "consolidar na região uma Igreja autóctone, com rosto amazônico, encarnada em suas culturas e povos", disse à EarthBeat por e-mail de Roma, onde participa do sínodo sobre sinodalidade, o padre Agenor Brighenti, teólogo brasileiro coordenador da equipe teológica do CELAM.

Muito mais do que simplesmente adaptar a liturgia para refletir os costumes amazônicos

O rito amazônico se juntaria aos ritos romano, ambrosiano e moçambicano na Igreja latina, de forma análoga aos ritos orientais da Igreja, diz Brighenti. Francisco sugeriu que um modelo poderia ser o rito zairense usado pelas dioceses na República Democrática do Congo. A proposta abordará vários aspectos, incluindo os sacramentos, a iniciação à vida cristã, os ministérios, a Liturgia das Horas, o espaço litúrgico e o ano litúrgico e as estruturas da Igreja.

Para Vaz Filho, membro do povo indígena Maytapu, do Rio Tapajós, no Brasil, e fez parte de um grupo consultivo de antropólogos que trabalhavam com Brighenti, o rito reconhecerá a riqueza das culturas que estavam presentes na bacia amazônica quando os missionários europeus chegaram.

Em um documento de referência sobre o rito amazônico, os antropólogos propuseram "um ano litúrgico com o ritmo da natureza, com o tempo da criação, as estações e toda a sua biodiversidade". Eles também propuseram repensar a estrutura paroquial, especialmente nas áreas urbanas.

Embora a imagem popular da Amazônia seja de povos indígenas em trajes tradicionais vivendo em comunidades rurais cercadas por florestas, a maior parte da população da região agora é urbana, e as cidades continuam a crescer. O documento de fundo sugere a descentralização das paróquias em redes de comunidades de fé. Uma nova visão do ministério urbano deve incluir maneiras de alcançar os jovens e responder ao ritmo mais rápido da vida urbana, acrescenta Vaz Filho.

A migração de comunidades distantes para as cidades também representa novos desafios para o ministério rural. Mesmo antes do Sínodo para a Amazônia, um grupo misto de missionários — leigos, religiosas, padres — formou equipes itinerantes ou viajantes para ministrar às comunidades ao longo dos rios amazônicos.

As equipes estavam entre as primeiras a romper sistematicamente a barreira geográfica das fronteiras nacionais, escolhendo trabalhar ao longo de fronteiras compartilhadas, como o lugar onde Peru, Colômbia e Brasil convergem ao longo do Rio Amazonas, ou onde Peru, Brasil e Bolívia se juntam mais ao sul. Uma equipe agora trabalha no Rio Negro, ao longo de uma fronteira remota compartilhada pela Colômbia, Venezuela e Brasil.

Ministrar ao longo dos rios — as artérias que conectam pessoas e ecossistemas na Amazônia — faz sentido na região e reforça seu sentido como um lugar identificado por seu bioma e não por fronteiras nacionais, diz o padre Fernando López, que fundou a equipe itinerante há cerca de duas décadas, muito antes de a escassez de missionários, tanto padres quanto religiosos, se tornar um tópico-chave para discussão no sínodo amazônico.

As equipes móveis preenchem uma lacuna deixada pelos missionários, tanto homens quanto mulheres, que envelhecem e não são substituídos por colegas mais jovens. Cerca de 15 congregações e institutos religiosos designaram membros para as equipes itinerantes e se comprometeram a dar suporte a essas pessoas.

Após o sínodo amazônico, houve um aumento do interesse pelas equipes itinerantes, que participaram ativamente dos eventos públicos que aconteceram em Roma durante o sínodo, conta Madeira.

Hoje, os membros da equipe viajam ao longo do rio, usando os mesmos barcos de passageiros que as pessoas que vivem nas comunidades e compartilhando atividades cotidianas nas comunidades que visitam. Eles veem seu papel como construção de Igreja ao ajudar a interconectar comunidades.

Uma mulher acena enquanto rema uma canoa em Santarém, no Pará, em 11-04-2019. Na época, um rio na Arquidiocese de Santarém tinha 54 comunidades católicas ao longo de suas margens e apenas um padre para servir a todas essas comunidades (Foto: CNS/Paul Jeffrey)

Trabalhar ao longo das fronteiras amazônicas é mais perigoso agora do que era há uma década ou mais. As áreas da tríplice fronteira, especialmente, são áreas de trânsito importantes para traficantes de drogas, traficantes de pessoas e mineradores ilegais que operam enormes dragas que agitam grandes quantidades de sedimentos e poluem rios com mercúrio.

Grupos do crime organizado e policiais ou políticos corruptos frequentemente dão uma mordida nesses negócios, tornando a Amazônia particularmente perigosa para líderes de base que falam publicamente contra atividades ilegais — em torno de extração de madeira, mineração, caça e pesca, bem como tráfico de drogas e grilagem de terras — em seus territórios. Colômbia e Brasil lideram a lista de países com mais assassinatos de pessoas por defender suas terras e territórios nos últimos doze anos, de acordo com o grupo de vigilância internacional Global Witness.

Esses problemas ressaltam os obstáculos que a Igreja na Amazônia continua enfrentando em seus esforços para concretizar os sonhos de Francisco. Mesmo assim, Barreto, que completou 80 anos este ano, continua otimista.

"Vivo com muita esperança, esperança ativa" de que chegará um momento em que os povos indígenas da região serão respeitados, e as pessoas falarão sobre suas diferenças e buscarão o bem comum, diz ele.

Seu próprio sonho é que a Amazônia seja um lugar "onde possa haver um relacionamento harmonioso entre culturas, onde o meio ambiente seja respeitado e a Igreja esteja profundamente enraizada no coração das pessoas. Essa é a esperança que está crescendo em mim. Não porque eu vou vê-la, mas para as crianças e as gerações que virão".

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