01 Outubro 2024
"O caminho traçado por Francisco não agrada a todos. Por suas palavras em defesa do meio ambiente e contra os lobbies que exploram a terra em nome do lucro, ganhou o apelido, nascido nos círculos conservadores dos EUA, de 'papa comunista'. Ele, no entanto, não se sente assim", escreve Paolo Rodari, jornalista, em artigo publicado por Il Manifesto, de 27-09-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.
Existe uma agricultura “doente”, “instrumentalizada pela lógica do lucro” que a transforma em um meio para “poluir a terra, explorar os trabalhadores e empobrecer a biodiversidade”. Esse é o cerne de uma carta particular que Francisco enviou no último dia 20 de setembro aos participantes da edição 2024 de Terra Madre Salone del Gusto e que ontem a atriz Lella Costa leu em público, na abertura do evento. Desde a encíclica Laudato Si' - a carta “ecológica” do pontificado publicada em 2015 - até hoje, a visão do Papa é clara: a crise climática e a crise social andam juntas. No meio disso, há muitos aproveitadores, aqueles que usam o meio ambiente e suas riquezas para ganhar dinheiro. É por isso que é necessário agir, por meio de uma Weltanschauung que leve a “defender a biodiversidade, interromper o desmatamento, eliminar os desperdícios e transitar rapidamente para recursos renováveis”. O que também significa “perseguir o caminho da paz, a verdadeira urgência deste período histórico”.
O texto do Papa, de fato um documento programático com um viés político bem definido, também ressoou ontem em Luxemburgo, a primeira parada de uma viagem de três dias do bispo de Roma ao coração da Europa. Diante das autoridades reunidas no Cercle Cité, Francisco insistiu - é um leitmotiv que, de fato, mantém unidos todos os conflitos em andamento, incluindo Gaza e Ucrânia - na necessidade de parar as guerras buscando “compromissos honrosos”, caso contrário, haverá apenas “massacres inúteis”. É sempre uma terceira via em relação às polarizações, aquela que Bergoglio pede para adotar, “uma visão sistêmica que poucos políticos têm hoje”, como a definiu o fundador do Slow Food, Carlo Petrini.
Assim o Papa se dirigiu ao Terra Madre: apurados os efeitos desastrosos da crise climática, ou seja, “seca, desertificação, fenômenos atmosféricos cada vez mais violentos, escassez de recursos, mas também conflitos e, portanto, migrações”, é necessário voltar aos “limites impostos pela lentidão natural da evolução biológica”. E mais uma vez: existe uma “biodiversidade cultural que deve ser protegida hoje”.
Foi em 2007 que o então Cardeal Bergoglio, como arcebispo de Buenos Aires, compreendeu plenamente a urgência da salvaguarda do clima e do ambiente. Ele participava como relator do documento final em uma conferência do episcopado latino-americano em Aparecida, Brasil. Surgiram propostas sobre a Amazônia, dedicadas a combater o desmatamento e a salvaguardar o meio ambiente. Ele, no entanto, mal as suportava porque não entendia o que a Amazônia tinha a ver com a evangelização. Depois veio o que ele mesmo definiu como uma “conversão”, ou seja, a consciência, como disse no texto escrito para o Terra Madre, de que é justamente através da defesa do meio ambiente que “passa grande parte do destino deste planeta”. E, mais especificamente, passa também grande parte do destino do atual sistema alimentar, “articulado sobre o lucro”, disse ontem, não por acaso, Barbara Nappini, presidente do Slow Food Itália. Chegou a hora de “abandonar essa abordagem, para abraçar uma abordagem finalmente centrada na vida”, continuou.
Bergoglio se referiu novamente ao Brasil e sua floresta, “o coração biológico do planeta, onde vivem 33 milhões de pessoas, das quais cerca de 2,5 milhões são indígenas”. Esses últimos, escreveu em uma das passagens mais fortes do texto, são frequentemente “forçados a sofrer as decisões daqueles que baseiam seu único credo na tecnocracia e no dinheiro”. Diante disso, é necessário “empreender todos, ninguém excluído, um caminho comum que vise a uma ecologia integral e a uma conversão ecológica segundo a qual tudo está intimamente ligado”. Porque o planeta, “tudo o que nos rodeia, é um dom e todos nós temos o dever de respeitá-lo e preservá-lo”. Todos, é a substância da mensagem do Papa, podem assumir o papel de “guardiões da casa comum”, “estímulos determinados na construção de um mundo melhor”.
O caminho traçado por Francisco não agrada a todos. Por suas palavras em defesa do meio ambiente e contra os lobbies que exploram a terra em nome do lucro, ganhou o apelido, nascido nos círculos conservadores dos EUA, de “papa comunista”. Ele, no entanto, não se sente assim. Sua batalha é simplesmente em defesa dos últimos e contra aqueles que, em nome do “deus dinheiro”, estão dispostos a tudo.
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Uma ecologia integral rumo à paz, o alerta do Papa. Artigo de Paolo Rodari - Instituto Humanitas Unisinos - IHU