24 Junho 2025
"Trump honra um Deus diferente do verdadeiro Deus, cria um Deus que lhe convém, um Deus feito à sua medida. Na Bíblia, esse processo tem um nome bem conhecido: idolatria", escreve Foucauld Giuliani, professor de filosofia, estuda teologia católica, poeta e membro do coletivo Anástasis, em artigo publicado por Le Monde, 23-06-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
A análise das palavras proferidas por Trump no discurso em que anunciou a operação no Irã revela como sua teologia não só está impregnada de idolatria, mas também é posta a serviço de uma estratégia imperialista.
“E eu quero agradecer a todos e, em particular, a Deus. Quero apenas dizer que te amamos, Deus, e amamos nossas grandes forças armadas. Proteja-as. Deus abençoe o Oriente Médio. Deus abençoe Israel e Deus abençoe a América”. Essas são as palavras que concluem o discurso de Donald Trump em que anuncia e justifica a entrada dos Estados Unidos na guerra contra o Irã.
Palavras cheias de mentiras, palavras a serem desmontadas no plano teológico. Mesmo que isso seja inútil; mesmo que as palavras permaneçam para sempre impotentes e bastante ridículas diante da força que se desencadeia; justamente porque esta nossa época humilha todo desejo de verdade, toda vontade de não ceder ao caminho do puro interesse.
“Agradecer a todos e, em particular, a Deus”. Trump procura aqui envolver “todos” – incluindo “Deus” – em sua empreitada bélica. Agradecendo a todos por tal empreitada, cada um se sente envolvido e comprometido com ela.
Universalização fictícia do ato de guerra e de sua responsabilidade, falsa unanimidade político-militar. O poder ama a linguagem da unidade. Dessa forma, pode dar a ilusão de ser a expressão da sociedade em sua totalidade. Isso também reforça sua legitimidade: se fala em nome de todos, sua força se enriquece simbolicamente com a força de todos.
Essa primeira frase é também um modelo original de blasfêmia. Trump agradece a Deus por um ato político que lhe é totalmente estranho: desencadear uma guerra. O Evangelho nos ensina que a presença de Deus na história não passa por campanhas militares lançadas por Estados sedentos de poder.
Agradecendo a Deus por um evento que ele não quis nem pediu, Trump atribui a Ele um ato que não é seu e substitui Deus pelo “seu” Deus, um Deus que convoca à guerra e a apoia.
De maneira particularmente sorrateira – aparentemente usando a linguagem humilde do agradecimento e da gratidão –, Trump na realidade cobre de glória a si mesmo. O orgulho mais destrutivo assume a máscara da humildade mais inocente, a vontade obstinada de poder assume a aparência de abertura à graça. Trump honra um Deus diferente do verdadeiro Deus, cria um Deus que lhe convém, um Deus feito à sua medida. Na Bíblia, esse processo tem um nome bem conhecido: idolatria.
Deus é um entre outros, é simplesmente agradecido “em particular”. Uma maneira grosseira de estender a todos os protagonistas da guerra a sensação de estarem no seu bom direito, na estrada certa, no caminho desejado para eles por um Deus insidiosamente redefinido. Os militares e os funcionários são agradecidos exatamente como Deus. Há, aqui, portanto, uma obra comum, uma colaboração, uma aliança entre os homens e Deus. Guerra santificada, aliança sagrada entre Deus e os homens. Em outras palavras: a guerra tornou-se sagrada, indiscutível, fora do campo do discernimento moral e da racionalidade democrática.
“Quero apenas dizer que te amamos, Deus, e amamos nossas grandes forças armadas. Proteja-as”.
Amamos o que quer fazer e faz o nosso bem. Sendo a guerra um bem, Deus, que a quis, e o exército, que a conduz, são eminentemente dignos de amor. Chamar o amor como testemunha da fundamentação dos bombardeios e do ato de semear morte? É exatamente esse tipo de absurdo que Trump proclama aqui. “Proteja-as”: cuidamos daquilo que nos ama, o amamos, não queremos sua morte. À manifestação do amor segue-se, assim, a ordem de não o prejudicar e de honrá-lo em suas necessidades e exigências.
“Deus abençoe o Oriente Médio. Deus abençoe Israel e Deus abençoe a América”.
De acordo com essas palavras de Trump, não há interesses conflitantes, não há vontade hegemônica e imperialista, não há hierarquização do valor das vidas – vidas dos israelenses e dos estadunidenses infinitamente mais dignas de serem vividas do que as dos cidadãos de Gaza ou dos iranianos –, não, haveria apenas um grande projeto de amor universal desejado por Deus, Deus que o elegeu como seu tenente! Isso é evidentemente falso.
Esse grande projeto é apresentado de forma maniqueísta e apocalíptica: o campo do bem contra o campo do mal, o campo da “liberdade” contra o campo da “tirania”. Mais uma vez, a imagem da unidade, da totalidade, por trás da qual se esconde uma lógica imperial. A “pax americana” – apresentada positivamente como um bem universal ao qual todos teriam “direito” – passa pelo uso necessário da força, considerada, portanto, libertadora.
Legitimação da guerra, divinização da força, santificação da morte; teologia do poder e da violência; heresia não cristã e antievangélica.