14 Abril 2025
Em poucos meses, o presidente Trump abalou as certezas sobre as quais a ordem econômica e política do pós-guerra foi construída. O que acontecerá com o crescimento econômico e as instituições políticas dos EUA? Vamos tentar arriscar algumas respostas.
O artigo é de Guido Enrico Tabellini, economista italiano, reitor da Universidade Bocconi (2008-2012), recebeu seu Laurea em 1980 pela Universidade de Turim, e doutorou-se em 1984 pela Universidade da Califórnia em Los Angeles.
Haverá uma recessão? Será quase impossível para os Estados Unidos evitar. Uma tarifa mínima de 10% já está em vigor. Embora não saibamos como as negociações evoluirão, é provável que, no fim, em média, as tarifas dos EUA fiquem entre 10% e 15%, como no final da década de 1930 e quase quatro vezes mais altas do que alguns meses atrás. Estima-se que isso reduza o crescimento dos EUA em cerca de 1% em um ano. Mas pode ser mais, devido à ruptura nas cadeias de produção com a China.
A esse choque somam-se outros talvez ainda mais importantes. Os indicadores de incerteza dos operadores econômicos superaram os máximos históricos atingidos nos anos da Covid e isso bloqueará os investimentos. A queda da bolsa de valores, que pode continuar, desestimulará o consumo. A crescente aversão ao risco já está reduzindo a oferta de crédito para famílias e empresas.
Depois, há os cortes no consumo de imigrantes ilegais (cerca de onze milhões), de funcionários do governo federal (cerca de dois milhões e meio), afetados pelas políticas de Trump, e o declínio do turismo internacional (em março, as viagens da Europa para os Estados Unidos caíram 17% em comparação ao ano anterior).
A confiança do consumidor americano caiu abaixo dos níveis mais baixos da crise financeira de 2008. Esses efeitos não poderão ser contidos pela expansão monetária, inclusive porque o banco central estará de mãos atadas pelo quase certo aumento da inflação.
E a Europa? Infelizmente, será difícil evitar o contágio. O comércio da União Europeia com os Estados Unidos representa mais de 9% da renda europeia. Mesmo sem quaisquer tarifas adicionais (mas prováveis), uma recessão americana também se espalharia para nós.
O que acontecerá com o dólar? Até agora, os Estados Unidos desfrutaram do privilégio financeiro de ser o país mais estável e poderoso do mundo. O dólar é a moeda de reserva e os Estados Unidos têm atraído poupanças do mundo todo para financiar seus déficits comerciais e fiscais.
Hoje, os investidores internacionais possuem cerca de 20% das ações dos EUA, 30% dos títulos do governo americano e 30% do crédito corporativo do país. Mas agora descobriu-se que as instituições americanas são muito mais frágeis do que se pensava anteriormente. Não apenas pela concentração de poder nas mãos do presidente, mas também pela falta de reação da sociedade civil, das empresas e da liderança política americana.
O país inteiro teme que a força do Estado seja usada contra inimigos políticos, como acontece em muitas autocracias. Isso não pode deixar de ter repercussões na confiança no dólar, que continua amplamente supervalorizado em termos reais. A volatilidade nos mercados financeiros ainda não acabou, e é muito provável que o dólar e os títulos do governo americano sejam as próximas vítimas.
Os Estados Unidos continuarão sendo uma democracia? Esta é talvez a pergunta mais importante. Se, como é provável, a economia americana entrar em recessão, o Partido Republicano poderá perder as eleições legislativas em um ano e meio, permitindo que um Congresso Democrata contenha o presidente.
É um cenário provável, mas não certo. Aqueles que usam o Estado para atacar seus inimigos políticos, enfraquecer o funcionamento da Justiça, influenciar a liberdade de pensamento nas universidades e já demonstraram que não aceitam a derrota eleitoral, não hesitariam em manipular os resultados das eleições legislativas.
A questão é se ele conseguiria. Felizmente, há bons motivos para pensar o contrário: as eleições são administradas pelos estados, não pelo governo federal. Além disso, a democracia americana está entre as mais antigas do mundo, e evidências empíricas mostram que a idade beneficia as democracias: quanto mais velhas, mais resilientes são. Contudo, o bom funcionamento das instituições depende também da cultura política e esta não é insensível ao comportamento dos líderes políticos.
Embora seja improvável que os Estados Unidos se tornem uma autocracia, a deterioração de suas instituições políticas não será um fenômeno de curta duração. Este, e não a guerra comercial, é o principal problema que a Europa e o mundo livre terão de enfrentar.