30 Abril 2025
"A falta de confiança de Francisco em relação aos estudos e uma certa fraqueza de conhecimento canônico ao seu redor o impediram de dar um passo que, para seu sucessor, será a primeira de um novo ciclo de pérolas a serem adquiridas com humilde determinação e mansa audácia", escreve Alberto Melloni, em artigo publicado por Corriere della Sera, 28-04-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Há uma parábola maravilhosa do evangelho que conta que o reino de Deus é como um mercador de pérolas que, tendo encontrado uma pérola infinitamente preciosa, vende tudo o que tem e a compra. A parábola não pretende sugerir que o reino de Deus é uma pérola, mas aponta para a postura dos discípulos de Jesus, que sabem como fazer escolhas ousadas, radicais, irreversíveis e, ao mesmo tempo, cheias de alegria. Poucas coisas como essa parábola expressam melhor um lado da vida e do ministério do Papa Francisco: o “Francisco do púlpito” que proclama o evangelho com um vigor e um frescor capazes de despertar afeto nos cristãos, saudade da fé nos ex-cristãos e respeito nos não cristãos. E com audácia, radicalismo e alegria ele semeou pérolas em seu ministério. Pérolas muitas vezes enterradas pelo outro Francisco, o “do trono”, que governava com atos verticais e ásperos na convicção de que toda humilhação produz humildade e até mesmo decisões injustas eram boas para aqueles que as sofriam em um silêncio edificante.
O que acontecerá com as “pérolas” desse pontificado? A necessidade de compor essa contradição, de fato, é sentida por muitos, se não por todos os cardeais: devolver a Roma uma centralidade mansa e restituir aos bispos a dignidade que lhes cabe por consagração, para que pobres e poderosos possam ver na comunhão das Igrejas a sua força e a sua fortaleza, é um objetivo para o colégio e para o próximo papa; mas existe o risco de que, ao alcançá-lo, nos esqueçamos de guardar as pérolas de Bergoglio. E é bom fazer um rápido inventário delas.
A primeira pérola de Francisco não foi tanto o desejo de uma igreja pobre para os pobres, mas a enunciação crível desse desejo. Não bastava passar dos carrões para o carro utilitário, do Palácio para Santa Marta, da prataria do apartamento para a cantina com bandejas: era preciso que esses gestos carregassem em si uma autenticidade que o Francisco do púlpito tinha, mesmo que nem ele teve o cuidado de compô-lo com o papa-rei que Francisco quis ser.
A segunda pérola é aquela que a linguagem eclesiástica definiria de restauração da misericórdia como linguagem pastoral: o retorno da igreja a ser mãe e não madrasta, hospital e não pelourinho ou forca para aqueles fiéis que conheceram sua face sisuda. Depois de décadas, ele sancionou o cessar-fogo sobre a moral conjugal e entendeu que, na pós-modernidade, não é a ameaça do castigo, mas o anúncio do perdão que produz efeitos pelo menos interiores - mesmo que isso não o tenha impedido de recorrer, por exemplo, em relação ao aborto, a um léxico de infinita crueldade.
Uma pérola foi a clareza com que ele condenou a posse de armas atômicas: pregar a paz, todos os papas dos últimos dois séculos o fizeram. Em vez disso, onde o Vaticano II hesitou em fazer sua a condenação das armas atômicas para não enfraquecer a contenção estadunidense contra a URSS, Francisco foi categórico: isso não lhe evitou passos em falso diplomáticos, mas é um ponto sem retorno.
Em quarto lugar, sua denúncia daquele sistema econômico que ainda chamamos de capitalismo e que não tem mais nenhum parentesco com o ancestral que lhe deu o nome. À riqueza nababesca que se arroga o direito à destruição do planeta e à redução de seus habitantes a escravos que celebram um culto consumista sem freios, ele não opôs as fórmulas de uma doutrina social, mas um não seco e libertador, no qual prevalece o direito da criança que atravessa o mar à noite ou da mãe que cruza o Rio Grande porque se trata de pessoas.
Depois a pérola da sinodalidade: o desafio urgente e decisivo no qual não foi bem-sucedido.
A fisionomia do catolicismo neste século, de fato, não pode ser feita por um poder central altíssimo e solipsista. E Francisco, embora tenha governado com um estilo autoritário às custas de instituições e pessoas que acabaram na mira papal por razões certas ou erradas, tentou encontrar uma maneira de fazer com que a diversidade de sensibilidades funcionasse como uma riqueza para a igreja: o resultado, nos dois sínodos sobre sinodalidade, foi decepcionante. Ele deixou claro, no entanto, que a Igreja não precisa de um Bonifácio VIII bis, mas de um papa capaz de distinguir entre problemas maduros e imaturos e submeter os primeiros (a relação entre ministério e batismo, por exemplo) a instâncias conciliares apropriadas.
Falta a pérola do padre casado, que Francisco parecia querer restaurar também na Igreja latina (as Igrejas católicas do Oriente já o têm): depois o papa hesitou e ninguém explicou que isso já havia sido decidido por Ratzinger. Com uma solene constituição apostólica, ele havia estabelecido que os padres e bispos anglicanos que passam para o catolicismo romano podem ser reordenados não por derrogação, mas por lei, como padres da Igreja latina: bastava remover aquela cláusula de acesso e estender o que já está previsto para os ex-anglicanos pelo artigo VI, parágrafo 2, da constituição apostólica Anglicanorum coetibus a todos os bispos católicos desde sempre, para resolver o dilema. Mas a falta de confiança de Francisco em relação aos estudos e uma certa fraqueza de conhecimento canônico ao seu redor o impediram de dar um passo que, para seu sucessor, será a primeira de um novo ciclo de pérolas a serem adquiridas com humilde determinação e mansa audácia.