08 Novembro 2023
"E por terras tupiniquins, não só 'cristãos', mas também igrejas pedem, em redes sociais, orações por Israel, como se o Estado de Israel fosse o povo judeu bíblico".
O artigo é de Edelberto Behs, jornalista.
A deputada Carla Zambelli (PL-SP), aquela que no ano passado apontou arma para um homem negro em São Paulo, postou, em rede social, na quinta-feira, 2, a imagem de uma águia com as asas coloridas das cores da bandeira estadunidense e no pescoço uma bandeira de Israel. A águia persegue um rato identificado com a bandeira palestina.
Será que a deputada se deu conta do simbolismo da imagem que publicou? O governo nazista retratou os judeus da Europa como ratos, uma praga que tinha que ser exterminada. A mesma imagem aplicada ao povo judeu, que sofreu misérias no holocausto, serve agora para qualificar o povo palestino. Mas Zambelli não ficou só nisso. Abaixo da imagem colocou uma passagem bíblica.
O versículo bíblico foi extraído do livro do profeta Isaías, capítulo 40,31: “Mas os que esperam no Senhor renovarão as forças, subirão com asas como águias; correrão e não se cansarão; caminharão e não se fatigarão”. A imagem, com Gaza ao fundo em chamas, acrescentada de tal expectativa, só serve para atiçar o ódio. Discursos de ódio, acusações mútuas, são aplicadas tanto por Israel como pelo Hamas.
Não se espera, contudo, que “cristãos” recorram a esse artifício numa guerra odiosa, desigual, em que as maiores vítimas são crianças, mulheres, mães, pais, idosos, civis que, se indagados, certamente dirão “não à guerra!” Em recente visita à Terra Santa, Jean Byne, do Reino Unido e integrante do Programa de Acompanhamento Ecumênico do Conselho Mundial de Igrejas (CMI) constatou que “muitos palestinos querem simplesmente viver uma vida pacífica e poder criar seus filhos em segurança”.
O bispo luterano Sani Ibrajim Azar, da Igreja na Jordânia e Terra Santa, frisa que é importante distinguir entre palestinos e o Hamas. “Como cristãos palestinos, estamos aqui há muitos anos. Podemos não ser reconhecidos, mas apelamos à reconciliação”, disse. Como cristãos e como povo – e será que a deputada pistoleira se dá conta que em Gaza e Cisjordânia também vivem cristãos palestinos que ela qualifica como ratos -, “somos contra toda a violência, contra o que está acontecendo em Gaza e contra os ataques do Hamas. Ninguém tem o direito de acabar com a vida de outra pessoa. Contudo, o problema para os palestinos não começou com os ataques do Hamas. Este problema existe desde 1948”, lembrou.
Há judeus, como Noam Chomsky e Breno Altman, que contestam as ações israelenses em Gaza e na Cisjordânia. Grupos ultra ortodoxos questionam a necessidade de ter um Estado de Israel. Alegam: “Se cumprimos a Torá e vivemos uma vida em justiça, Deus nos fará habitar nessa terra”. E por terras tupiniquins, não só “cristãos”, mas também igrejas pedem, em redes sociais, orações por Israel, como se o Estado de Israel fosse o povo judeu bíblico.
Cristãos e igrejas vão ter que deixar a hipocrisia de lado. Ou seguem os ensinamentos de Jesus, como proclamou no Sermão do Monte – “Felizes as pessoas que trabalham pela paz, pois Deus as tratará como seus filhos” – ou se apegam a frases guerreiras. Orações pela paz e justiça, essa é a prece do momento, e não a instigação ao ódio, venha ela do Antigo Testamento ou de propaganda de que lado for.
O Senhor dos Exércitos quer a paz!
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Cristãos ocidentais esquecem o Sermão da Montanha - Instituto Humanitas Unisinos - IHU