Mais "energia masculina" nas empresas e um governo de machos alfa: Mark Zuckerberg e Elon Musk disputam a liderança da reação 'bro'. Artigo de Ana Requena Aguilar

Foto: Reprodução You Tube

Mais Lidos

  • Alessandra Korap (1985), mais conhecida como Alessandra Munduruku, a mais influente ativista indígena do Brasil, reclama da falta de disposição do presidente brasileiro Lula da Silva em ouvir.

    “O avanço do capitalismo está nos matando”. Entrevista com Alessandra Munduruku, liderança indígena por trás dos protestos na COP30

    LER MAIS
  • Dilexi Te: a crise da autorreferencialidade da Igreja e a opção pelos pobres. Artigo de Jung Mo Sung

    LER MAIS
  • Às leitoras e aos leitores

    LER MAIS

Revista ihu on-line

O veneno automático e infinito do ódio e suas atualizações no século XXI

Edição: 557

Leia mais

Um caleidoscópio chamado Rio Grande do Sul

Edição: 556

Leia mais

Entre códigos e consciência: desafios da IA

Edição: 555

Leia mais

17 Janeiro 2025

O discurso de ZuckerbergMuskTrump ou dos agitadores machistas é que os homens, em si mesmos, parecem estar em perigo e precisam ser resgatados diante de uma onda injusta e perigosa que quer impor suas ideias. Atacam o feminismo por incentivar uma guerra dos sexos, quando são eles que a promovem.

O artigo é de Ana Requena Aguilar, publicado por El Diario, 16-01-2025.

Ana Requena Aguilar (1984) é redatora chefe de Gênero do eldiario.es. 

Eis o artigo.

O discurso de Zuckerberg, Musk, Trump ou dos agitadores machistas é que os homens, em si mesmos, parecem estar em perigo e precisam ser resgatados diante de uma onda injusta e perigosa que quer impor suas ideias. Atacam o feminismo por incentivar uma guerra dos sexos, quando são eles que a promovem.

No mundo 'pós-Me Too', o feminismo foi longe demais. A balança se inclinou tanto para um extremo que é necessário reequilibrar. Focar, novamente, no que é importante. Deixar de lado os complexos e dizer as coisas como são, chega de correção política. Dar aos homens a possibilidade de viver sua masculinidade de sempre, sem tantas bobagens.

Longe de ser uma sátira, esta poderia ser a descrição de um pensamento que percorre as sociedades e que eleva líderes – políticos, sociais, empresariais – que disseminam um relato reacionário e conservador, e que seduzem homens jovens e não tão jovens. Seu objetivo: o poder, no seu sentido mais amplo, e manter o statu quo de sempre, embora talvez com outras palavras. Como exemplo, Donald Trump e sua vitória nos Estados Unidos. Ou o lugar que estão ocupando dois dos homens mais ricos e poderosos do mundo: Elon Musk e Mark Zuckerberg.

O fundador do Facebook se sentiu à vontade esta semana durante uma entrevista no podcast de Joe Rogan, um dos agitadores conservadores e neomachistas mais seguidos do momento. Zuckerberg afirmou que é necessário mais "energia masculina" nas empresas diante do crescimento de companhias "culturalmente castradas": "A cultura empresarial se tornou algo mais enfraquecido, e só percebi isso quando me envolvi mais com artes marciais, que ainda é muito mais masculina." O tópico é quase completo, pois Zuckerberg menciona suas irmãs e filhas para afirmar que a energia masculina é boa e que precisamos de mais disso.

A base de sua reflexão já é um estereótipo de gênero: a ideia de que existem duas energias, duas formas de ser, que correspondem de maneira inerente e natural, aos homens e às mulheres, respectivamente. É o mesmo argumento que historicamente tem sido usado para atribuir papéis de gênero a uns e a outros, para distribuir e negar direitos, liberdades, significados e recursos, para criar hierarquias sociais, só que com um toque de misticismo energético que agora soa até moderno. O fato de que o masculino e o feminino sejam uma construção social – o gênero – pouco importa: o importante é encontrar uma forma de perpetuar um discurso sobre a diferença e a subordinação, aparentemente inocente, mas carregado de intenções.

A ameaça ao ordenamento

A intenção é frear a mudança, porque é a mudança que ameaça a ordem em que esses homens brancos heterossexuais ricos ganham e têm poder em todos os sentidos. Para continuar ganhando, precisam somar outros homens, outros que não são necessariamente brancos ou heterossexuais, e muito menos ricos. Por isso, Mark Zuckerberg ou Elon Musk estão se esforçando para encarnar uma masculinidade que soe familiar e reconfortante para muitos homens: se seus princípios, interesses ou condições de vida estão alinhados com as propostas desses empresários, isso não é tão importante quanto a camaradagem 'bro' (brother).

Os estereótipos que pairam sobre as declarações de Zuckerberg são os mesmos que sustentam as afirmações feitas por Elon Musk, o homem mais rico do mundo e braço direito de Trump, nos últimos tempos. Musk propôs um governo de "homens de alto status".

O feminismo critica e questiona a masculinidade – que não é apenas reproduzida pelos homens, mas que toda a sociedade incentiva com suas expectativas e estereótipos – como uma máscara cultural que se constrói sobre a agressividade, a competição, a repressão emocional ou a dureza, e que também traz prejuízos para os próprios homens. Mas o discurso de Zuckerberg, Musk, Trump ou dos agitadores machistas é que são os homens em si mesmos que parecem estar em perigo e precisam de um resgate frente a uma onda injusta e perigosa que quer impor suas ideias. Eles atacam o feminismo por incentivar uma guerra de sexos (uma ideia nada nova, que já tem séculos) quando são eles próprios quem promovem essa noção de uns contra outros, de batalha e divisão. Segundo eles, nossos direitos são ideologia e o que eles defendem é uma espécie de ordem natural, na qual prevalece uma definição muito concreta de liberdade.

Além de gestos e declarações, há ações. Por exemplo, o fato de que a Meta siga os passos de Donald Trump e Elon Musk em relação aos programas independentes de verificação de dados e fale de "censura" para justificar a disseminação de boatos. Ou que mude as regras de moderação para permitir ataques e insultos ao coletivo LGTBI. “Vamos simplificar nossas políticas de conteúdo e eliminar um monte de restrições sobre temas como imigração e gênero que não estão em consonância com o discurso dominante. O que começou como um movimento para ser mais inclusivo tem sido cada vez mais usado para silenciar opiniões e deixar fora pessoas com ideias diferentes, e isso foi longe demais", afirmou Zuckerberg, que, no entanto, não nos explica por que imagens de um parto ou de mamilos podem ser censuradas, nem por que o conteúdo feminista tem mais dificuldades para alcançar mais usuários em suas redes sociais. A Meta também eliminou suas equipes de diversidade.

Uma coisa está clara. Na segunda-feira, Donald Trump toma posse como presidente dos EUA e nem Elon Musk nem Mark Zuckerberg parecem ter a intenção de romper o pacto de cavalheiros, mas sim o contrário. Em jogo está a proteção do presidente aos seus negócios, a cadeia que possibilita que continuem controlando cada vez mais uma parte do bolo e ganhando mais dinheiro. Embora sempre, claro, com seus 'bro' no coração.

Leia mais