24 Novembro 2022
"Para Roma, os encontros com os bispos alemães foram uma escola de diálogo que não se deixa domesticar. Será o resultado positivo do sínodo universal que tornará evidente a compatibilidade da universalidade da Igreja com os caminhos de Igrejas locais como a Alemanha", escreve Lorenzo Prezzi, teólogo italiano e padre dehoniano, em artigo publicado por Settimana News, 23-11-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
A enigmática fórmula política com a qual Aldo Moro indicava a possível convergência das duas maiores forças políticas italianas talvez possa servir, por analogia, para descrever a distância que permanece entre o episcopado alemão e a cúria vaticana, mas também a força de atração que impede tanto a simbiose quanto a ruptura.
Os 62 prelados da Alemanha em sua visita ad limina (14-18 de novembro) mantiveram a substância das conclusões, ainda não totalmente definitivas, do Sinodaler Weg. A cúria vaticana e o papa nada esconderam de sua discordância e perplexidades.
Mas não houve nenhum confronto final. "Não me incomoda, e aliás é realmente falso, falar de um chamado Confronto em Roma" (D. Georg Bätzing, presidente da conferência episcopal, coletiva de imprensa final). Sem que por isso diminua na cúria a desconfiança sobre as reformas e o temor de ver uma expansão descontrolada das solicitações alemãs além das fronteiras.
A tensão permanece e as diferenças não acabaram. Novas contraposições são previsíveis. É bom que permaneçam: “O Santo Padre nos mostrou claramente como as tensões são necessárias, a quais tensões ele está submetido e como coragem e paciência são importantes para chegar a uma solução” (Bätzing).
Ambos os lados se reconheceram em um debate aberto e fraterno. Ambos estão ansiosos para que suas argumentações sejam compreendidas e levadas em consideração. “Ficou claro assim a importância e também a urgência de definir e aprofundar algumas das temáticas destacadas, por exemplo aquelas referentes às estruturas da Igreja, ao sagrado ministério e ao acesso a ele, à antropologia cristã, etc. Ao mesmo tempo, manifestou-se em todos a plena consciência de estar a caminho com todo o santo e paciente povo de Deus também no confronto entre posições diversas” (comunicado de imprensa conjunto após a reunião com os dicastérios vaticanos).
Não é desprovido de significado que a visita ad limina seja vivida pelos interessados como uma peregrinação às raízes da fé. A missa inicial diante do túmulo de Pedro nas Grutas do Vaticano e aquelas sucessivas em Santa Maria Maggiore, em San Paolo fuori le mura e em San Giovanni in Laterano constroem uma base sobre a qual se encaixa a maior preocupação tanto dos bispos quanto do papa e seus colaboradores: o anúncio do Evangelho hoje em contextos pós-modernos, como a Alemanha.
Com relação a todos os temas em pauta - disse Bätzing - a questão fundamental é a evangelização em um contexto secular. O acento voltou nos vários encontros: “muitas intervenções indicaram a centralidade da evangelização e da missão como fim último dos processos em curso” (comunicado conjunto). “Com o caminho sinodal queremos renovar a função de falar de Deus em público. A nossa sociedade, por mais secular e em mudança que seja, precisa de religiosidade, precisa de testemunho público da fé cristã e de novos impulsos para colocar em evidência a questão de Deus" (Bätzing, na introdução ao encontro com os dicastérios).
Todas as quatro áreas de pesquisa do sínodo (poder e responsabilidade na Igreja, o papel doe mulheres, os padres e suas vivências, o amor e a sexualidade), como os sete documentos aprovados até agora (teologia do caminho sinodal, exercício dos poderes na Igreja, leigos na nomeação de bispos, exercício da sinodalidade, mulheres nos ministérios e funções eclesiais, homossexualidade, padres), têm como âncora a urgência da evangelização.
Não menos evidentes são os pontos de divergência que surgiram nos encontros: sobre a suspeita de cisma, sobre a hipótese de moratória, sobre a situação em Colônia, etc.
“A Igreja na Alemanha não segue um caminho autônomo e não tomará nenhuma decisão que só seria possível no contexto da Igreja universal. Mas a Igreja na Alemanha quer e deve dar respostas às questões colocadas pelos crentes”. "O cisma não é uma opção e nunca foi." “Aqueles que falam de cisma e da Igreja nacional não conhecem nem os católicos nem os bispos alemães. Entristece-me a difusão que obteve essa palavra, com a qual se tenta negar a catolicidade e a vontade de permanecer unidos à Igreja universal”.
E, para não deixar dúvidas, Bätzing continua citando a piada do Papa Francisco: “Infelizmente, isso inclui também a comparação bastante imprecisa com uma 'boa Igreja Protestante'”.
Quando, ainda no encontro com os dicastérios, o card. Marc Ouellet, no final de seu discurso, lançou a hipótese de uma moratória do Caminho Sinodal Alemão, levantou-se um burburinho de dissenso na assembleia e numerosas intervenções, inclusive dos bispos mais prudentes, rejeitaram a proposta. Talvez tenha sido o momento de maior tensão.
A cúria procura colocar o Caminho alemão atrás do sínodo universal, direcionando-o para um desvio para dissolver seus pedidos específicos. Os bispos percebem o impossível consenso de uma solução semelhante na Alemanha. Assim, no comunicado conjunto, aparece: “Nessa perspectiva de partilha aberta e fraterna, foram apresentadas algumas propostas, como a de aplicar uma moratória ao Caminho Sinodal Alemão, que não encontrou espaço, e aquela de favorecer um suplemento de reflexão e de escuta recíproca à luz das perplexidades surgidas".
Outro momento crítico ocorreu durante o encontro com o papa, quando um bispo colocou de maneira direta a questão do card. Woelki, arcebispo muito contestado de Colônia. Sua carta de demissão está na mesa do papa há algum tempo, mas ele se recusa a ser condicionado por pressões imediatas. Uma posição que também reafirmou perante os bispos. Mas o caso continua sendo muito espinhoso. O arcebispo Bätzing, na coletiva de imprensa final, mencionou isso como um pedido amplamente compartilhado.
Outros momentos de tensão ocorreram em relação ao papel dos leigos nas decisões eclesiais (ressoou a acusação de parlamentarismo), sobre a dependência do sínodo do "espírito do tempo" e sobre o condicionamento da cultura ambiental, sobre a antropologia contemporânea que, como aconteceu com Lutero e a antropologia do humanismo, pode levar a fraturas dificilmente superáveis.
As críticas do Vaticano à desatenção constatada em relação à carta do papa aos católicos alemães foram mais eficazes. É verdade que foi apresentada e discutida no âmbito da conferência episcopal e teve uma tiragem de 80.000 cópias, entrando como preâmbulo nos estatutos do Caminho Sinodal. Também é verdade que não foi ouvida e discutida na assembleia.
Os bispos, por sua vez, denunciam uma subestimação romana dos efeitos desastrosos dos abusos sobre a credibilidade eclesial e do atraso em relação ao papel e às funções, inclusive ministeriais, das mulheres. “Em minha opinião pessoal – comenta Bätzing – (é) a questão decisiva para o futuro”.
O Caminho Sinodal Alemão não vai parar – e os textos aprovados e em aprovação não vão ficar no papel. Em particular no que diz respeito ao “conselho sinodal” permanente que deveria apoiar os bispos na elaboração das decisões mais exigentes.
No entanto, o espaço de manobra para os bispos é apertado. Estão falando sobre isso no Conselho Permanente da DBK e voltarão a falar durante o sínodo.
Para Roma, os encontros com os bispos alemães foram uma escola de diálogo que não se deixa domesticar. Será o resultado positivo do sínodo universal que tornará evidente a compatibilidade da universalidade da Igreja com os caminhos de Igrejas locais como a Alemanha.
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Alemães ad limina: convergências paralelas. Artigo de Lorenzo Prezzi - Instituto Humanitas Unisinos - IHU