13 Dezembro 2025
A Igreja poderá realmente se tornar o "Povo de Deus", como indica a Lumen Gentium, somente por meio de uma conversão sinodal que envolva a todos, clero e leigos, em uma escuta mútua enraizada nas Escrituras.
Para o Cardeal Arrigo Miglio, arcebispo emérito de Cagliari, sem esse estilo compartilhado, não formal, mas espiritual, toda reforma permanece incompleta. Uma reflexão que o cardeal oferece nos dias em que a Igreja celebra o sexagésimo aniversário do encerramento do Concílio Vaticano II. Assembleia que tem uma de suas pedras angulares na Constituição Dogmática sobre a Igreja, Lumen Gentium.
A entrevista é de Roberta Pumpo, publicada por Avvenire, 10-12-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Eis o artigo.
Eminência, o senhor foi ordenado sacerdote para a diocese de Ivrea três anos após a Lumen Gentium. Como vivenciou a transição da Igreja "sociedade hierárquica" pré-conciliar para "Povo de Deus" em caminho em suas paróquias piemontesas, e quais foram os sinais mais evidentes?
Ficamos impressionados com a definição de Igreja como "Povo de Deus", que inclui todos, clero e leigos: uma novidade notável. Eram os tempos da Ação Católica, da colaboração com o apostolado hierárquico. Com dom Luigi Bettazzi, um dos mais jovens Padres Conciliares, identificamos os conselhos pastorais como a maneira mais imediata de implementar a Lumen Gentium, não apenas usando a expressão "Povo de Deus", mas reunindo os leigos, não mais apenas nas associações laicais, mas também envolvendo os representantes das paróquias.
Qual é o nível de consciência que existe hoje entre os batizados sobre o sacerdócio comum dos fiéis e da missão dos leigos?
Creio que apenas uma pequena minoria amadureceu essa consciência. Quando nós, do clero, falamos do Povo de Deus, acabamos nos referindo aos leigos. Não é assim na Lumen Gentium. A linguagem não ajuda, a dimensão do sacerdócio comum dos fiéis precisaria maior precisão. O mesmo vale para a palavra "sacerdotes": para falar do ministério ordenado, precisamos dizer bispos, presbíteros e diáconos.
Enquanto "sacerdócio", na linguagem comum, se referir apenas a presbíteros, será difícil para os leigos amadurecer a consciência do sacerdócio comum. Além disso, seria também necessário retornar, com o entusiasmo dos primeiros anos após o Concílio, à Bíblia e ver como, no Novo Testamento, a palavra "sacerdotes" se refere a Jesus e ao povo dos redimidos.
Ao compreendermos melhor o tipo de sacerdócio que Jesus, por meio do Batismo, comunica a todos os batizados, ficará claro que a celebração eucarística não pode ser reduzida a um mero rito, esquecendo o sacrifício espiritual de que Paulo fala na Carta aos Romanos, que é caridade, partilha do pão com os irmãos e dom da vida.
O papel dos leigos é central para a Lumen Gentium e o Sínodo sobre a Sinodalidade. Após sessenta anos, quais são as razões pelas quais ainda se encontra dificuldade em traduzir esse papel na vida eclesial concreta?
Creio que a diferença reside precisamente na sinodalidade e na reflexão sobre ela desenvolvida nos últimos anos. No final do Concílio, a palavra "sinodalidade" não era comum. As dioceses celebraram sínodos, mas eram aqueles previstos pelas normas canônicas. Vejo duas diferenças importantes entre os primeiros conselhos pastorais e o caminho sinodal que amadureceu nos últimos anos.
Naquela época, o risco era que os conselhos pastorais se transformassem em "miniparlamentos". Faltavam pontos de referência operacionais mais claros. Nas discussões, também aflorava uma tensão entre a dimensão decisória e a dimensão consultiva dos conselhos. A sinodalidade nos ajuda a amadurecer.
No contexto sinodal, a escuta mútua no Espírito, o encontro acompanhado pela oração, o amadurecimento conjunto de decisões e o caminho proposto pelo Papa Francisco nos últimos anos representam a forma de recomeçar de maneira diferente, mais conscientes do papel de todo o Povo de Deus.
À luz do apelo do Papa Leão XIV em Assis sobre a sinodalidade como dimensão essencial da Igreja, como conectá-lo à visão do "Povo de Deus" para revitalizar as dioceses italianas?
Creio ser importante continuar esse caminho e aplicar o método da sinodalidade nos diferentes níveis. É importante dar continuidade a um processo de vida sinodal.
Contra o clericalismo, como promover a colegialidade e a sinodalidade, fiéis à inspiração da Lumen Gentium?
Quando fui nomeado Bispo de Iglesias em 1992, o Concílio Plenário da Sardenha estava em pleno andamento. Foi uma experiência verdadeiramente sinodal. Lembro-me de encontros maravilhosos, uma experiência que fomentou o desejo de diálogo. Isso precisa se tornar uma prática corriqueira.
Nós, do clero, precisamos aprender a escutar mais, a motivar as decisões, a amadurecê-las em conjunto. Assim, podemos superar o clericalismo. Ninguém renuncia ao seu ministério, mas o vive em um caminho compartilhado.
Para um jovem sacerdote que se questiona sobre o legado do Concílio Vaticano II, o que indicaria como bússola para o ministério?
Maior confiança nas Escrituras com a lectio divina, acreditando justamente no poder e na eficácia do diálogo com a Palavra de Deus e de uma oração que se inspira nela. E também um maior contato com as Igrejas de outros continentes. Penso na África, no Brasil e na América Latina, para ver como elas viveram a Lumen Gentium nas últimas décadas e como vivem a liturgia.
Para a Comissão de Estudo sobre o diaconato feminino, os tempos ainda não estão maduros nesse sentido. Na sua opinião, quais poderiam ser hoje novos ministérios a serem confiados às mulheres, sempre à luz da Lumen Gentium?
Creio que o tema precisa amadurecer por meio de discussões sinodais. Alguns pontos requerem crescimento e aprofundamento. Precisamos aprofundar a questão do gênero para melhor compreender a antropologia bíblica: "Homem e mulher os criou" — duas riquezas. A valorização da antropologia que vem da Revelação não deve, contudo, se traduzir, como tem acontecido, em uma disparidade de dignidade e de importância entre homens e mulheres.
Precisamos alcançar um equilíbrio pleno entre homens e mulheres no caminho da Igreja. Não se trata de reivindicacionismo: a antropologia bíblica continua sendo o ponto de partida, com o valor e a igual dignidade de uns e das outras, como também ensina a Lumen Gentium. Devemos valorizar e fazer amadurecer ainda mais os ministérios, tanto masculinos quanto femininos, e talvez até mesmo alguns ministérios especificamente femininos. As Igrejas jovens — penso em alguns sacerdotes fidei donum que atuam na região amazônica — já estão trabalhando nessa direção.
Além disso, precisamos rever o diaconato permanente. Quando o Concílio o introduziu, muitas Igrejas jovens na África e na América Latina não o adotaram, nem para homens casados nem celibatários. Precisamos nos questionar, e isso requer um amadurecimento sinodal, baseado no diálogo, oferecendo motivações claras: bíblicas, extraídas da Revelação e do caminho da Igreja, que é a fonte do conhecimento da vontade e do projeto de Deus.
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