08 Abril 2025
Com maracás em punho e corpos pintados de jenipapo e urucum, mais de 6 mil indígenas de 150 povos de todas as regiões do país, desembarcaram na capital federal nesta segunda-feira (7), para a 21ª edição do Acampamento Terra Livre (ATL). Instalado no espaço da Fundação Nacional de Artes (Funarte), no eixo monumental em Brasília (DF), o acampamento vai até a próxima sexta-feira (11).
A reportagem é publicada por Conselho Indigenista Missionário - CIMI, 07-04-2025.
O ATL 2025 é organizado pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) junto com suas sete organizações regionais: Aty Guasu (Centro-Oeste), Apoinme (Nordeste e Leste), ArpinSudeste (Sudeste), ArpinSul (Sul), Coica (Coordenação das Organizações Indígenas da Bacia Amazônica), Coiab (Amazônia brasileira) e Terena (povo Terena, com forte atuação no Mato Grosso do Sul).
Sob o tema “APIB Somos Todos Nós: Em Defesa da Constituição e da Vida”, o movimento indígena busca destacar o empenho dos povos indígenas na garantia dos seus direitos previstos na Constituição Federal. O tema também celebra a união e a resistência do movimento indígena representado pela Apib, que, neste ano, completa 20 anos de lutas e conquistas.
A mobilização está estruturada em cinco eixos: “Apib Somos Todos Nós”, “Resistência e Conquista”, “Desconstitucionalização de Direitos”, “Fortalecendo a Democracia” e “Em Defesa do Futuro – A Resposta Somos Nós”.
Mais de 6mil indígenas se reúnem em Brasília para a 21ª edição do Acampamento Terra Livre. (Foto: Maiara Dourado | Cimi)
A mobilização reforça a posição do movimento indígena pelo fim da mesa de conciliação proposta pelo ministro Gilmar Mendes no Supremo Tribunal Federal (STF) e a revogação da Lei 14.701/2023, chamada de “Lei do Marco Temporal”, tema da conciliação que tem sido usada para barrar a demarcação dos territórios. O acampamento também denuncia os conflitos nos territórios indígenas, além de debater uma transição energética justa e a resistência LGBTQIA+.
“Trazemos aqui, para o Estado brasileiro, aquilo que se faz necessário, que é demarcar os nossos territórios. Não é para criar Câmara de Conciliação, não. Não é para que o Congresso crie leis que vem nos matar, que vem trazer tragédia para o nosso território”, reforça o coordenador executivo da Apib, Alberto TereNa.
A programação do acampamento contempla debates em plenárias e manifestações públicas. Nos dias 8 e 10 de abril, os povos indígenas marcharão pelas ruas da capital federal nos atos “Apib Somos Todos Nós: Nosso Futuro Não Está à Venda” e “A Resposta Somos Nós”. Além disso, será lançado um documentário sobre os 20 anos da Apib e a Comissão Internacional Indígena para a COP30.
A programação completa do ATL 2025 está disponível aqui.
“Trazemos aqui, para o Estado brasileiro, aquilo que se faz necessário, que é demarcar os nossos territórios”
Na tarde do primeiro dia da 21ª edição do Acampamento Terra Livre (ATL), durante a realização da plenária “APIB Somos Todos Nós: Em defesa da Constituição e da Vida”, representantes das coordenações regionais da Apib e anciões indígenas dos mais diversos povos relembraram dos primeiros anos de acampamento. Nesta edição, o movimento indígena celebra os 20 anos da maior mobilização indígena do país e traz a defesa da Constituição e das vidas indígenas como grito de luta.
Durante a plenária, Valéria Paye contou das primeiras mobilizações, quando “não era nem Acampamento Terra Livre, era uma mobilização dos povos indígenas durante o Abril Indígena. Mas lá era ocupação. Muitos de nós chegávamos de madrugada e montava acampamento”.
Foi nesse processo de organização, que as mulheres indígenas assumiram um papel de protagonismo no movimento. “Foram muitas as vezes que tive esse papel como mulher de ser referência na hora que a polícia chegava”, lembrou Valéria.
Hoje, o acampamento conta com uma estrutura importante e reúne milhares de indígenas do país. Mas “começou pequenininho, poucos parentes e sem essa estrutura. Era uma lona de circo”, lembra Paulo Tupiniquim, da Apoinme. Os anciões também frisaram a importância de a juventude conhecer o passado de luta dessa mobilização a fim de pensar os passos futuros.
“Foram lutas, corpos deitados no chão, queimados para que a gente hoje tivesse essa estrutura hoje. Não esqueçam dessa continuidade. É preciso sempre olhar pra trás e refletir para dar o passo seguinte. É muito importante esse espaço que conquistamos”, destacou uma das lideranças da Arpinsudeste.
Durante os 20 anos de ATL, foram muitas as lutas travadas pela mobilização, que hoje enfrenta a ameaça de leis anti-indígenas como a Lei 14.701 e a PEC 48 além de tentativas de conciliação de direitos fundamentais por meio da Câmara de Conciliação, formada por Gilmar Mendes, no STF.
“Durante todo esse tempo a gente tá aqui e com essa Lei 14.701 que tá aí a gente tá perdendo a vida desses companheiros. Por causa dessa lei que a gente tá aqui em 2025 com 8 mil pessoas para defender os nossos direitos”, afirmou Simão Guarani Kaiowá.
Para Luis Ventura, secretário executivo do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), também presente na plenária, o ATL sempre foi uma mobilização de insurgência. “E ele vem este ano num momento que os direitos constitucionais estão sendo ameaçados, reescritos e reformulado para atender interesses econômicos. O ATL hoje celebra a memória, mas continua fazendo história. Que este ATL 2025 seja um marco para acabar com a Lei 14.701, para que as demarcações avancem”, afirmou.