07 Fevereiro 2024
"Diante do pedido de muitos episcopados e de católicos presentes especialmente no Ocidente, o Papa Francisco, que desde o início do seu pontificado mostrou dar à caridade e à misericórdia a primazia absoluta na vida eclesial, concedeu, ou melhor, explicitou, a possibilidade de dar bênção para aqueles que vivem numa situação contraditória com a doutrina católica: divorciados, pessoas conviventes, homossexuais, etc", escreve o monge e teólogo italiano Enzo Bianchi, prior e fundador da Comunidade de Bose, em artigo publicado por Repubblica, 29-01-2024. A tradução é de Luisa Rabolini.
Diante do pedido de muitos episcopados e de católicos presentes especialmente no Ocidente, o Papa Francisco, que desde o início do seu pontificado mostrou dar à caridade e à misericórdia a primazia absoluta na vida eclesial, concedeu, ou melhor, explicitou, a possibilidade de dar bênção para aqueles que vivem numa situação contraditória com a doutrina católica: divorciados, pessoas conviventes, homossexuais, etc. Porque se até agora foram excluídos e julgados pela condenação de Igreja, possam sentir-se em comunhão e reconhecidos pelo bem que sabem viver com os outros. Abençoar algo ou alguém significa louvar e agradecer a Deus pela criação, pela presença dessas realidades ou dessas pessoas. Por essa razão, o Papa certamente não pretende equiparar a bênção de casais homossexuais ao casamento - que é um sacramento - e, portanto, essa bênção nunca pode será litúrgica, nem acontecer numa assembleia eclesial eucarística ou simplesmente de oração.
Quem pede a bênção pode obtê-la: sabendo, porém, que isso não significa uma aprovação. É o conhecimento da realidade cotidiana que impulsiona o cristão que conhece e se relaciona com pessoas que estão nessas situações, consideradas irregulares pela igreja católica, a discernir que, como em todo casal, também nesses há amor, dedicação, cuidado e tolerância mútua: como não agradecer e abençoar a Deus pelos seus dons?
No Antigo Testamento e no apóstolo Paulo há a condenação dessas situações: coabitação, homossexualidade, incesto... e a Igreja, em obediência à palavra de Deus contida nas sagradas Escrituras, deve reler essas tomadas de posição e interpretá-las levando em conta o tempo em que vivemos. Mas hoje Igrejas de continentes inteiros e minorias católicas no Ocidente não estão em condições de interpretar as Escrituras exceto em sentido literal, com uma leitura que não leva em conta os aportes da crítica histórica. Quanto à possibilidade da bênção dos casais irregulares, o cardeal Fridolin Ambongo, que dirige os bispos africanos, declarou: “Isso não interessa ao nosso povo!”, apoiando assim os episcopados africanos que não aceitam a abertura papal. A mesma situação pode ser lida na Europa do Leste e na Ásia. Não é fácil para o Papa Francisco presidir pela unidade de tal igreja: não há risco de formação de igrejas nacionais na catolicidade porque o vírus do soberanismo e do filetismo está ausente, mas é possível que algumas igrejas se refugiem no passado rejeitando o mundo contemporâneo e vendo em cada diálogo da Igreja com a sociedade real, uma tentação ditada pelo anticristo. Uma visão que inspira aqueles que condenam “os costumes decadentes do Ocidente!” com sua obsessiva primazia dos direitos individual. Não é por acaso que as igrejas ortodoxas eslavas já estão se movendo nesse sentido.