12 Janeiro 2024
A reportagem é publicada por Religión Digital, 11-01-2024.
O cardeal Fridolin Ambongo, presidente da Secam e arcebispo de Kinshasa, acaba de enviar uma síntese dos pareceres das conferências africanas sobre 'Fiducia supplicans', publicada pelo Vatican News. O que é notável é que assim se expressa o respeito pelas culturas ancestrais, pelos diferentes tempos eclesiais na recepção dos documentos e pelo discernimento prudencial dos pastores, sempre no pleno respeito pelo Papa e pelo seu Magistério.
Expressa também a vontade dos bispos africanos de continuar a refletir sobre o significado destas bênçãos pastorais (não litúrgicas), que é o tema central do documento, que, ao mesmo tempo, deixa a liberdade que corresponde a cada bispo local no discernimento de questões de práxis pastoral.
O cardeal Fridolin Ambongo Besungu, arcebispo de Kinshasa e presidente do Secam (Simpósio das Conferências Episcopais da África e Madagascar), publicou uma carta na qual dá a conhecer a posição dos bispos africanos sobre as bênçãos “extralitúrgicas” propostas na Declaração de o Dicastério para a Doutrina da Fé, que – publicado em 18 de dezembro – abre a possibilidade de abençoar casais em situação “irregular”, respeitando a moral católica, inclusive os formados por pessoas do mesmo sexo, mas fora de qualquer ritualização e imitação de casamento.
O resultado da consulta é a carta divulgada hoje pelo Arcebispo de Kinshasa: “Uma síntese consolidada” das posições adoptadas pelas diversas Conferências Episcopais nacionais e interterritoriais do continente africano sobre esta Declaração, que, diz ele, gerou “um choque onda, semeou confusão e inquietação nas almas de muitos fiéis leigos, consagrados e até pastores, e provocou fortes reações”.
A mensagem, escreve o cardeal na abertura, recebeu “o consentimento de Sua Santidade o Papa Francisco e de Sua Eminência o Cardeal Víctor Manuel Fernández, Prefeito do Dicastério para a Doutrina da Fé”. Nele, fica imediatamente claro que as Conferências Episcopais de toda a África reafirmam “fortemente” a sua comunhão com o Papa Francisco: “Nas suas diversas mensagens, as Conferências Episcopais da Igreja Família de Deus em África começam por reafirmar a sua adesão inabalável ao Sucessor de Pedro, a sua comunhão com Ele e a sua fidelidade ao Evangelho", escreve o Cardeal Ambongo.
No entanto, os mesmos pastores “acreditam que as bênçãos extralitúrgicas propostas na Declaração Fiducia Supplians não podem ser aplicadas na África sem se exporem ao escândalo”. “Em geral, as conferências episcopais preferem – sendo cada bispo livre na sua diocese – não conceder bênçãos aos casais do mesmo sexo. Esta decisão deve-se à preocupação com uma possível confusão e escândalo dentro da comunidade eclesial”, lê-se num trecho da carta.
Dirigindo-se ao clero, às comunidades religiosas e a todos os crentes, o Cardeal Ambongo, em nome dos bispos, recorda – como sublinha claramente Fiducia Supplians – que “a doutrina da Igreja sobre o casamento e a sexualidade cristã não muda”. E é por isso que os bispos africanos não consideram “apropriado” que a África abençoe uniões ou casais do mesmo sexo “porque”, explica Ambongo, “no nosso contexto, isso causaria confusão e estaria em contradição directa com a ética cultural de comunidades africanas."
“A linguagem de Fiducia Supplians continua a ser demasiado subtil para ser compreendida pelas pessoas comuns. Além disso, continua a ser muito difícil convencer que as pessoas do mesmo sexo que vivem numa união estável não reivindicam a legitimidade do seu estatuto”, continua a carta.
No mesmo documento, porém, é reiterado que “a Igreja na África, como Família de Deus, reafirma o seu compromisso de continuar a cuidar pastoralmente de todos os seus membros”. Com efeito, o clero é encorajado a "oferecer uma pastoral de acolhimento e de apoio, especialmente aos casais em situação irregular". E as Conferências Episcopais Africanas sublinham que “as pessoas com tendências homossexuais devem ser tratadas com respeito e dignidade”, mas recordam “que as uniões homossexuais são contrárias à vontade de Deus e, portanto, não podem receber a bênção da Igreja”.
A este respeito, é citado o Catecismo da Igreja Católica, que define estes atos como “intrinsecamente desordenados” e “contrários à lei natural”, e a grande maioria dos bispos baseia as suas intervenções – assim diz a mensagem de Ambongo – na Palavra de Deus “que condena a homossexualidade”. Além das “razões bíblicas”, o contexto cultural de África, “profundamente enraizado nos valores da lei natural relativos ao casamento e à família”, complica ainda mais a aceitação das uniões homossexuais, pois estas “são consideradas contraditórias com as normas culturais e intrinsecamente más”.
O documento anuncia que a reflexão continua: “Alguns países preferem ter mais tempo para se aprofundar na Declaração, que, de fato, oferece a possibilidade destas bênçãos, mas não as impõe”, afirma Ambongo. E garante que, como pastores, “continuaremos a refletir sobre o valor do tema geral deste documento, para além das bênçãos para os casais em situação irregular, ou seja, sobre a riqueza das bênçãos espontâneas na pastoral popular”.
Para concluir, o convite aos cristãos “a não serem abalados”. “Sua Santidade o Papa Francisco”, escreve o cardeal, “opõe-se firmemente a qualquer forma de colonização cultural em África, abençoa de todo o coração o povo africano e encoraja-o a permanecer fiel, como sempre, à defesa dos valores cristãos”.
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Bispos africanos diante de “Fiducia supplicans”: respeito pelas culturas, pelos tempos diversos e pelo discernimento pastoral - Instituto Humanitas Unisinos - IHU