01 Dezembro 2023
Em Gana, como em vários outros países africanos, foram aprovadas ou estão em discussão leis que criminalizam a homossexualidade e as pessoas LGBTQ. O cardeal assume uma posição contrastante com os bispos do seu país. Nas últimas semanas, as aberturas da Santa Sé sobre a bênção de casais homossexuais e de pessoas trans como testemunhas de casamento.
A reportagem é de Francisco Peloso, publicada por Domani, 29-11-2023. A tradução é de Luisa Rabolini.
O cardeal Peter Turkson, de Gana, quebrou o tabu sobre a homossexualidade como um mal social a erradicar, amplamente difundido entre os episcopados africanos, incluindo os bispos do seu país de origem.
Turkson, que atualmente é Chanceler da Pontifícia Academia das Ciências e até 2021 dirigiu o dicastério para o desenvolvimento humano integral (recebeu a nomeação a cardeal em 2003 de João Paulo II), entrevistado pela BBC, observou que “as pessoas LGBTQ não podem ser criminalizadas porque não cometeram nenhum crime".
Depois acrescentou: “É hora de começar a educar para ajudar as pessoas a entender o que é essa realidade, esse fenômeno. Precisamos de muita educação para convencer as pessoas a fazerem uma distinção entre o que é crime e o que não é”.
O cardeal referiu-se também ao fato de existir numa das línguas do Gana, o Akan, a expressão “homens que se comportam como mulheres e mulheres que se comportam como homens”. Argumentou então que essa é uma indicação de que a homossexualidade não é uma imposição externa em relação à vida do país, em suma, não foi “importada” do Ocidente.
“Se culturalmente temos determinadas expressões – acrescentou Turkson – significa apenas que não é completamente estranha à sociedade ganesa”.
A posição do cardeal chega num momento delicado: o parlamento de Gana, de fato, está discutindo há algum tempo um projeto de lei que não só criminaliza as relações homossexuais, mas também os defensores dos direitos LGBTQ, com a possibilidade de que a perseguição judicial possa ser estendida também aos jornalistas devido ao que a proposta em discussão chama de “promoção” desses temas.
Além disso, atribui-se aos cidadãos o “dever de denunciar”, incentivando as pessoas a denunciar à polícia ou a outras autoridades pessoas suspeitas de pertencer à comunidade LGBT. Embora o projeto de lei esteja no parlamento há dois anos, o processo legislativo parece agora ter chegado às fases finais, depois de ter sido submetido a uma segunda leitura em julho passado.
Na prática, a identificação como pessoa LGBT é punível com uma pena de prisão de três anos, aqueles que lutam pelos direitos LGBT correm o risco de até 10 anos de prisão e, por fim, a proposta visa deixar de oferecer serviços de saúde à comunidade homossexual, incluindo os medicamentos para o HIV.
Em agosto passado, os bispos católicos do Gana, juntamente com outras igrejas cristãs, tomaram posição a favor do projeto de lei, contestando as declarações da embaixadora dos Estados Unidos em Gana, Virginia Palmer, que havia afirmado que a eventual aprovação da normativa contra os homossexais afastaria os investidores estadunidenses do país africano por se tratar de uma norma altamente discriminatória; pelo contrário, explicava, “o Gana é uma sociedade muito acolhedora e tolerante, com uma forte harmonia inter-religiosa e interétnica, e é isso que torna o Gana forte, estável e atraente para os investimentos", “espero que continue assim em relação à comunidade LGBT", acrescentou.
O Gana é uma nação acolhedora, responderam os líderes cristãos, mas “a nossa tolerância não é ilimitada”. “Assim como os Estados Unidos e outros países chamados desenvolvidos têm os seus valores culturais que informam o que é aceitável e/ou inaceitável dentro das respectivas jurisdições - afirmava o comunicado - Gana, como nação soberana, também possui valores culturais e religiosos que orientam, informam e garantem a sustentação, a harmonia e a coesão das nossas comunidades e não pretendemos comprometer esses valores pelos investidores LGBTQ".
Em fevereiro de 2021, os bispos do Gana posicionaram-se oficialmente contra a homossexualidade, afirmando que se trata "de uma prática abominável", e convidavam governo e parlamento a não aprovar leis favoráveis aos direitos das pessoas LGBT e não "legalizar a homossexualidade em Gana".
O debate em curso interessa de perto a igreja na África e não só; recentemente, de fato, no início de outubro, o Dicastério para a Doutrina da Fé divulgou as respostas dadas pelo Papa aos "dubia" de 5 cardeais conservadores, entre as questões postas estava aquela sobre a licitude das bênçãos de casais homossexuais.
Francisco respondia mantendo inalterada a diferença entre essas uniões e o casamento entre homem e mulher, mas abria a possibilidade das bênçãos “porque não podemos ser juízes que apenas negam, rejeitam, excluem”.
Novamente, no início de novembro, um novo pronunciamento do Dicastério para a Doutrina da Fé afirmava que “Não há nada na vigente legislação canônica universal que proíba uma pessoa transexual de ser testemunha de um casamento”, da mesma forma “não há nada que proíba uma pessoa homoafetiva e que convive de ser testemunha de um casamento”. Os transgêneros, explicava a nota do dicastério, também podem ser padrinhos e madrinhas nos batizados.
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O cardeal africano Turkson quebra um tabu e declara que a homossexualidade não é um crime - Instituto Humanitas Unisinos - IHU