25 Junho 2020
Em meio a um novo pico no número de casos, o general-ministro orgulha-se de gastar pouco e nomeia, como secretário, um médico antiabortista, conhecido por negar a Ciência e as estatísticas. E mais: a pandemia recrudesce no Sul.
A reportagem é de Maíra Mathias e Raquel Torres, publicada por Outras Palavras, 24-06-2020.
Em uma demonstração de que o fundo do poço tem alçapão, o governo Bolsonaro nomeou ontem o médico Raphael Câmara como titular da Secretaria de Atenção Primária do Ministério da Saúde. Poucas reportagens saíram na imprensa sobre o assunto. Na mais completa delas, a Folha informa que ele faz coro à ministra Damares Alves quando o assunto é transformar a defesa da abstinência sexual em política pública, para pretenso combate às infecções sexualmente transmissíveis e gravidez precoce…
Mas o que ninguém parece lembrar (e nós não conseguimos esquecer) é que Câmara fez seu debut na vida pública nacional em 2018, quando o Supremo Tribunal Federal promoveu duas audiências públicas para debater a descriminalização do aborto até a 12ª semana de gestação. No meio de especialistas como a pesquisadora Débora Diniz e o ex-ministro José Gomes Temporão, lá estava ele. O ginecologista carioca representou o Instituto Liberal de São Paulo (ILISP) na rodada do dia 3 de agosto. Sua intervenção pode ser vista no vídeo da audiência, a partir de 1:42.
Nós resumimos pra você. Um tanto esbaforido, Câmara resolveu dar uma “aula” (com direito a PowerPoint), com os objetivos de “mostrar as mentiras” que sustentariam a descriminalização e de argumentar que a adoção do aborto legal, sim, seria “uma questão de saúde pública”. Acusou a mídia de “fake news” por repercutir números presentes em pesquisas científicas. Colocou em questão a seriedade das revistas científicas, e a das suas “mantenedoras” também. “Essas ONGs pró-aborto fazem manual para os jornalistas”, disse, emendando citação a uma matéria do Globo que teria como título ‘Intelectuais defendem lei de aborto na Argentina’. “Alguém acha que é possível eu aparecer como intelectual? Meu sonho é aparecer no Globo como intelectual. Nunca vou aparecer porque a minha causa não me faz (sic.) como intelectual”. Pois é…
A principal bandeira de Câmara é que as estimativas sobre o número de abortos induzidos no Brasil estão erradas. E a de mortes causadas pelo procedimento feito de forma insegura, porque ilegal, também. O primeiro dado, de um milhão por ano, é do Ministério da Saúde e foi informado na própria audiência do Supremo. O segundo varia, com estimativas que vão de 70 a 11 mil por ano. Tudo isso leva em conta a subnotificação. Câmara, na sua “aula”, deu a entender que, em primeiro lugar, não há possibilidade de estimar o número de abortos ilegais – “Porque é ilegal”. E também que gostaria que se levassem em conta apenas as notificações. “O ministro da Saúde inventa”, reclamou, referindo-se a Ricardo Barros. Ligou o aumento da mortalidade materna à atuação das enfermeiras obstétricas, negou que as mulheres negras sofram racismo institucional – “Vocês estão achando que médico é quem?”.
Nesse momento de suspeitas sobre manipulação de números e estatísticas que recai sobre o Ministério da Saúde, a nomeação de Raphael Câmara preocupa… e assusta. Ele vai compor uma equipe recheada de militares – que nos bastidores, são acusados pelos servidores de carreira de rechaçarem explanações técnicas com argumentos tirados do senso comum – e fanáticos, como Mayra Pinheiro e Hélio Angotti Neto. Sobre esses dois, a jornalista Malu Gaspar – que acompanhou uma audiência pública feita pelo Ministério Público – relatou um tanto impressionada que ambos demonstram um pensamento persecutório em relação à ciência mundial, como se as evidências (que eles não têm) sobre a eficácia da cloroquina para o tratamento da covid-19 estivessem sendo negadas devido a um grande complô. E comemoram que o Brasil vá se tornar o maior laboratório do mundo no uso do medicamento. No caso, a população é a cobaia.
Ontem, o ministro interino (eterno) da Saúde, Eduardo Pazuello, deu explicações à comissão mista do Congresso criada para acompanhar as ações do governo federal no enfrentamento à covid-19. Admitiu que apenas 27% dos recursos liberados para ações contra a pandemia foram gastos pelo Ministério. Em cifras exatas, dos R$ 39,3 bilhões, a pasta usou R$ 10,9 bi. Apesar disso, o general considera que o ritmo das despesas “está bom”. “É bom que tenha algum saldo para que a gente possa manobrar”, disse, emendando: “Isso é um processo lento e técnico”.
As razões apontadas para a lentidão da pasta são as seguintes: dificuldade para aquisição de insumos e equipamentos, para contratação de UTIs e até mesmo fatores administrativos, já que a liberação de dinheiro depende, em alguns casos, da edição de portarias e adesão de municípios.
Sobre a decisão de brecar o acesso público aos dados sobre o novo coronavírus, que teve que ser revertida pelo Supremo Tribunal Federal, um detalhe da explicação de Pazuello dá a dimensão da falta de rumo da pasta. Primeiro, a nova plataforma criada para abrigar os dados recebeu o nome de “SUS Analítico”. Nos próximos dias, deve ser rebatizada para “LocalizaSUS”. Por que perder tempo com disso? Não dá para entender. O principal – disponibilização de dados completos com permissão de download – parece não ser a prioridade. Mas Pazuello prometeu que isso vai mudar e a “transparência vai ser infinita”.
Mas sobre outra forma de transparência – as coletivas de imprensa, antes diárias e reduzidas na sua gestão –, ele disse estavam atrapalhando o trabalho e a produção do “pessoal”.
A boa notícia trazida pelo general tem a ver com a Fiocruz, que sua secretária de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde tanto quer atacar. Uma das fábricas da Fundação, Biomanguinhos, deve entrar no acordo do governo federal em pelo menos três esforços de testes de vacinas contra o novo coronavírus – incluindo o da Universidade de Oxford e AstraZeneca.
Ontem também foi dia de críticas à gestão Pazuello e ao governo Bolsonaro. O ex-ministro Nelson Teich disse à BBC inglesa: “O principal problema hoje é como o Ministério da Saúde é visto pela sociedade e por outras instituições do governo. Se nós enfraquecemos o Ministério da Saúde, não é bom. Porque o Ministério é um líder do sistema de saúde, embora seja necessário trabalhar com os estados e municípios”. E, do seu jeito discreto, que Jair Bolsonaro vai ser julgado “no futuro pelas eleições, ou pela história”.
Já Luiz Henrique Mandetta foi entrevistado pelo canal de TV France24. E foi mais fundo, expondo ao mundo que o Ministério da Saúde está “sob ocupação militar”. “Nós, que somos oriundos da saúde, trabalhamos sobre três pilares: proteção incondicional à vida, proteção ao nosso sistema de saúde, o SUS, e uma defesa intransigente da ciência como método principal de tomada de decisões. Lá no Ministério da Saúde tiraram os técnicos de segundo e terceiro escalão, e colocaram no lugar militares seguindo uma norma militar. Nós não temos hoje um Ministério da Saúde, temos uma ocupação militar do Ministério da Saúde.”
Dos 164,8 mil novos casos de covid-19 registrados no mundo entre segunda e terça-feira, 25% vieram de um único país – o Brasil. O número aqui foi de 40.131 segundo o consórcio de veículos de imprensa, ou 39.436 segundo o Ministério da Saúde, de modo que o total chegou a 1,16 milhão. Foi o segundo maior registro diário de infecções desde a sexta-feira. Naquela ocasião, quando se divulgou o montante de mais de 50 mil novos casos, havia uma justificativa: nos dois dias anteriores, nove secretarias estaduais não haviam conseguido submeter seus dados completos devido a erros na plataforma e-SUS. Como consequência, os registros se acumularam. Agora, não sabemos. Não houve coletiva de imprensa ontem para responder às dúvidas dos repórteres. Tem sido comum uma alta nos registros às terças-feiras por conta da entrada tardia de algumas informações do fim de semana, mas 40 mil é um número extraordinário.
Não se sabe direito quantos testes o país já realizou. Se tivesse aumentado substancialmente a quantidade, isso explicaria em parte a explosão no número de casos, mas não parece ser essa a questão. Na segunda-feira, o diretor-executivo da Organização Mundial da Saúde, Michael Ryan alertou para o fato de que cerca de 31% dos testes no Brasil dão resultado positivo, o que indica uma baixa testagem (quanto mais gente é testada, menos positivos são encontrados). Para se ter uma ideia, nos países que testam em massa essa taxa fica em 5%.
Já ouvimos mais de uma vez a promessa do governo brasileiro de expandir a testagem à casa dos 40 milhões. Ontem, o ministro interino Eduardo Pazuello informou que a pasta pretende testar quase um quinto da população, ou 50 milhões de pessoas, sabe-se lá como e quando. Metade desses testes serão do tipo PCR, e a outra metade, sorológicos.
Aliás, vários estados brasileiros estão juntando os resultados dos dois tipos de testes nos seus indicadores, o que cria um caos generalizado, pois o percentual de erro dos sorológicos é muito alto. Mas pode ser que mais um fator de confusão entre na conta brasileira.
De acordo com Pazuello, o diagnóstico clínico também vai passar a compor a base de dados de casos de covid-19. “O diagnóstico médico, o diagnóstico clínico é soberano. Nossos médicos têm, sim, capacidade e direito de diagnosticar os pacientes, dando o protocolo e o tratamento que achar que devam fazer. Então, o diagnóstico clínico passa a ser base de dados também para que possamos compreender a evolução da doença, e não ficar apenas imaginando se aquele teste tem 30% de erro, ou se foi feito na hora errada”. Resta saber se o governo também vai aceitar diagnósticos clínicos para contabilizar as mortes…
O fato é que o Brasil já lidera a média semanal de novos casos desde maio, quando ultrapassou os Estados Unidos. Se o boom dos últimos dias não se dever a atrasos nem a aumento nas testagens, mas sim representar um brusco aumento real das infecções, podemos esperar mortes em disparada dentro em breve. O registro diário divulgado ontem pela imprensa foi de 1.364, elevando o total a 52.771. No Centro-Oeste, os óbitos mais que dobraram desde o início do mês – foram de 568 para 1.308. No mesmo período, eles cresceram 67,2% no Sul, 37,2% no Sudeste, 38,5% no Nordeste e 23% no Norte.
Como vínhamos acompanhando, o novo coronavírus começou a recrudescer em locais que, antes, não pareciam ser tão afetados. Ontem, a prefeitura de Porto Alegre aumentou as restrições, fechando as portas de comércios não essenciais e restaurantes, que só poderão funcionar no sistema delivery. Mas ainda há serviços que não parecem ser nada essenciais com permissão para funcionar em capacidade reduzida: salões de beleza, barbearias, academias de ginástica e templos religiosos. De segunda para terça-feira, foram registrados no estado 1.190 novos casos, num total de 20,8 mil. Outras cidades também editaram decretos restritivos, que incluem até toque de recolher. A região metropolitana também começa a registrar casos em aldeias indígenas.
Pelotas foi a última cidade brasileira com mais de 200 mil habitantes a registrar mortes causadas pelo coronavírus. De sábado para cá, foram dois óbitos, num panorama de 200 casos confirmados. Na cidade, a polícia despejou 63 famílias que moravam em uma ocupação ontem. É bom lembrar que o presidente Jair Bolsonaro vetou este mês trechos do projeto de lei que proibia os despejos durante a pandemia.
Outra capital sulista que vai mal é Curitiba. Desde a reabertura de atividades, em 20 de maio, os casos quintuplicaram. Agora, a capital paranaense tem 3.032 casos confirmados e uma ocupação de leitos de UTI na casa dos 80%. Outras cidades do estado, como Cascavel e Beltrão, atingiram os 95% e 100%, respectivamente. “Como a onda veio tardia, o que é bom porque ganhamos expertise nas nossas equipes e no manejo dos pacientes, a população cansou. Um pouco também é negação e ausência de lideranças na esfera federal. A gente fica falando sozinho” disse ao UOL a secretária municipal da Saúde, Marcia Huçulak, que chegou a falar em lockdown na semana passada – e receber ameaças por conta disso.
E a UFMG calcula que o número real de infecções em Belo Horizonte esteja subestimado pelas estatísticas. Seriam 50 mil contaminações, de acordo com estimativa que levou em conta coleta nos esgotos da capital em 12 de junho. Nessa data, o estado inteiro registrava 20 mil casos – que agora já são quase 30 mil. No estado, 75% das cidades já registram casos. O prefeito da capital voltou a ameaçar lockdown ontem.
Em Pernambuco, o governo estadual decretou algo próximo ao bloqueio total em duas cidades: Caruaru e Bezerros. Elas foram responsáveis por 71% dos registros de SRAG (Síndrome Respiratória Aguda Grave) na última semana na região do agreste.
Pulando para São Paulo, a rede privada de laboratórios, contratada pelo governo João Doria (PSDB), está sendo requisitada pelos hospitais do SUS – a despeito de a rede pública criada para realizar exames de covid-19 estar ociosa. O custo extra chega a ser de R$ 203 por exame. As contaminações no interior do estado continuam. Sorocaba chegou a 100% da capacidade de internação em UTIs. Está transferindo pacientes para a capital – que, aliás, tem dados novos sobre a doença. Ontem, foram divulgadas informações sobre a primeira etapa do inquérito sorológico. No mundo oficial, são 118 mil casos. Mas a estimativa é que 1,16 milhão tenham sido infectados – o equivalente a 9,5% da população, muito longe ainda da tal “imunidade de rebanho”. A mortalidade na periferia é três vezes maior do que no resto da cidade de SP.
No Rio, a situação é tétrica. Falamos ontem sobre o pedido de demissão do terceiro secretário estadual de saúde dessa pandemia. Fernando Ferry disse que “o poço era muito mais fundo” do que ele pensava, com falta de tudo. Hoje, de novo a notícia de que nesse “tudo” se incluem salários de profissionais de saúde, atrasados. Nada menos do que três mil trabalhadores estão sendo afetados. São todos contratados via organizações sociais (OSs). Aliás, quando melhorar o caos da pandemia, é preciso que se faça um debate nacional sobre as OSs no Sistema Único, retomando a discussão da flexibilização dos limites de contratação impostos pela Lei de Responsabilidade Fiscal para a saúde que chegou a ser feita na Câmara dos Deputados em 2015.
No mundo das investigações, o MP do Rio entrou com ação civil pública pra responsabilizar o ex-subsecretário de saúde, Gabriell Neves, que está preso. No Pará, o presidente do Conselho Nacional dos Secretários de Saúde (Conass) e titular da pasta no estado, Alberto Beltrame, foi novamente alvo de mandados de busca e apreensão na segunda fase da operação da Polícia Federal que investiga compra de ventiladores pulmonares. “Todo o meu patrimônio é absolutamente compatível com a renda que auferi com meu trabalho”, defendeu-se Beltrame.
Demorou três meses para alunos da rede estadual de educação do Rio receberem das escolas a primeira cesta básica. Depois da longa espera, a surpresa foi negativa: uma quantidade ínfima de itens. “Aqui estamos vivendo só para comer, porque não sabemos como nem quando isso vai acabar. Pensei que a cesta seria uma ajuda por mais tempo. Na escola, não disseram nada sobre uma próxima doação. Onde moro, no bairro Cosmorama, tem pessoas em situação muito pior, que chegam a passar fome”, diz, no Globo, Fábila Silva. Em sua casa, está todo mundo – ela, a mãe e o noivo – desempregado. A irmã é estudante, e a única renda da família é a aposentadoria da avó, de um salário mínimo. Como sabemos, a merenda escolar é muitas vezes a única refeição consistente a que milhões de crianças e adolescentes brasileiros têm acesso.
Essa situação tem se repetido em todo o país, e a reportagem do site da Escola Politécnica da Fiocruz explica que o nó começou muito antes da pandemia, com reduções constantes do Programa Nacional de Merenda Escolar (PNAE) desde 2014. Só entre 2018 e 2019, houve uma queda de R$ 200 milhões nas despesas do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação com o PNAE. Hoje, “o prato de um estudante sai, em média, de acordo com dados no Ministério da Educação, a R$ 0,60 por dia para alunos de creches, escolas indígenas e quilombos; R$ 0,30 para alunos da pré-escola, ensinos fundamental e médio e educação de jovens e adultos; R$ 0,90 para estudantes de ensino integral. Se pegarmos o valor e multiplicarmos por dias letivos, isso deveria garantir cestas básicas nos valores de R$ 13,20, R$ 6,60 e R$ 19,80, respectivamente”, diz a matéria. É impossível. Em vez de cestas, são entregues ‘kits’ compostos basicamente com o que dá para comprar. Muitas escolas acabam fazendo ainda uma triagem das famílias em pior situação – e só elas recebem os parcos alimentos.
A volta do Brasil ao Mapa da Fome, aliás, parece não ser mais uma ameaça. “O Brasil já está dentro do Mapa da Fome. Vamos ter que fazer todo um esforço de reconstrução”, diz ao Brasil de Fato Francisco Menezes, ex-presidente do Conselho Nacional de Segurança Alimentar (Consea). A crise gerada pela pandemia tem peso inegável nisso, mas não é o único fator para o desastre, como lembra ele. Não foi só a verba para merenda escolar que diminuiu: o enfraquecimento das políticas de segurança alimentar e nutricional, o desmonte do Consea e os cortes no orçamento para a agricultura familiar são anteriores ao coronavírus e amplificam muito os problemas da pandemia.
Se mal dá para comer, imaginem estudar. Segundo uma pesquisa do Conselho Nacional da Juventude divulgada ontem, três em cada dez jovens brasileiros pensam em deixar a escola durante a pandemia, e 49% dos que planejavam fazer o Enem cogitam desistir. E olha que foi uma enquete virtual, de modo que os 33 mil jovens ouvidos são os que têm algum acesso à internet. Entre eles, 70% disseram que seu estado de saúde mental piorou; 50% disseram que as famílias perderam renda; 40% indicaram ter diminuído ou perdido seu sustento mensal, e 33% relataram ter buscado alguma maneira de complementar esse buraco.
Em tempo: já comentamos que escolas e universidades privadas estão enfrentando altos índices de inadimplência e evasão. Pois a Universidade Nove de Julho, em São Paulo, decidiu lidar com isso da pior forma possível. Não apenas demitiu professores, como avisou a eles por meio de uma mensagem automática na plataforma de aulas online. Eles entravam para lecionar e liam o recado.
Trabalhadores que fazem entregas por meio de aplicativos começaram a se organizar nas últimas semanas para reivindicar melhores condições de trabalho e de pagamento e planejam uma paralisação no primeiro dia de julho. A demanda pelos serviços cresceu na pandemia, mas a remuneração deles caiu. O movimento – que começou há três meses em São Paulo mas ganha força em estados como Minas e Pernambuco – pede um aumento dos valores mínimos para corridas e maior transparência das empresas sobre as tarifas.
“Queremos mostrar que as empresas dependem de nós, trabalhadores. Vamos provar para eles que sem nós eles não ganham dinheiro, que não somos apenas números”, explica o motoboy Paulo Lima, de 31 anos, na matéria da BBC Brasil. Uma reivindicação específica é o fim do sistema de pontuação da Rappi. De acordo com ele, para conseguir acesso a mais a corridas e determinadas áreas, cada trabalhador precisa atingir uma pontuação mínima por semana, baseada no número de corridas que faz. Dessa forma, precisa fazer jornadas mais longas, principalmente nos fins de semana; e, caso não alcance a pontuação, a área de trabalho e número de pedidos são restringidos pelo aplicativo nos dias seguintes.
Há mais de 11 milhões de mulheres chefes de família no Brasil lutando na pandemia para dar conta dos filhos, da falta de dinheiro, do trabalho (ou ausência dele) e da sanidade mental. Jornalistas dos sites Gênero e Número e AzMina e da agência ÉNóis publicaram uma longa reportagem sobre a realidade das mães solo na pandemia. “A experiência que definimos hoje de maternidade é desumana, violenta, de solidão e sobrecarga. A questão agora não é nem mais segurar a curva, mas não cair do precipício, porque já estávamos na beirada antes mesmo de chegar o coronavírus”, resume Thaiz Leão, co-coordenadora da Frente Parlamentar de Primeira Infância de São Paulo e diretora-executiva do Instituto Casa Mãe. Os problemas se amontoam. A maior parte das mães solo do país são negras; das casas chefiadas por elas, 63% estão abaixo da linha de pobreza, com uma renda per capita que, em 2018, era de R$ 145 mensais. O auxílio emergencial, que deveria beneficiar mais de seis milhões de mães, ainda não chegou a muitas delas.
O Ministério da Saúde ainda faz coisas interessantes, apesar do momento crítico que experimenta. Entre 25 de abril e 5 de maio, a pasta realizou um levantamento telefônico com 2.007 pessoas de todas as regiões do país. O assunto era o isolamento social. O resultado aponta que 89% dos brasileiros adultos afirmam ter aderido à medida. Mas o mais interessante vai para a saúde mental das pessoas: quatro em cada dez relataram distúrbios no sono. A falta ou excesso de apetite castigou 38%. E um número parecido, 35%, disse sofrer em achar algum interessa para fazer coisas durante a pandemia. Mais dados: 32% se sentem deprimidos ou “pra baixo”; 30%, cansados; quase 17% não conseguem se concentrar; e 15% estão mal porque acreditam que decepcionam pessoas queridas. O título da matéria do El País Brasil não poderia ser mais certeiro: “Cem dias de solidão”.
Deve começar hoje a aplicação da potencial vacina da Universidade de Oxford em São Paulo. O Centro de Referência para Imunológicos Especiais (Crie) da Unifesp, onde serão conduzidos os testes, já está funcionando, e cerca de 200 voluntários passaram por triagem no final de semana. Na corrida mundial por um imunizante, o desenvolvido por Oxford é o que está mais adiantado, e agora vai ser testado em dezenas de milhares de pessoas. Ao todo, serão dois mil voluntários no Brasil. Na África do Sul, onde mais duas mil pessoas vão passar pelo estudo, a aplicação também começa esta semana.
Um estudo do Instituto Pasteur, na França sugere que crianças de seis a nove anos transmitem pouco a covid-19, tanto para colegas como para adultos. Os cientistas analisaram seis escolas no norte do país, numa comunidade duramente afetada pela pandemia. A amostra da pesquisa foi pequena: 1,3 mil pessoas, sendo 510 crianças, mas não houve nenhum contágio entre as crianças na escola durante três semanas de exposição. O autor principal do estudo, Arnaud Fontanet, reconhece que são necessários mais estudos sobre escolas. E, daqui do Outra Saúde, alertamos que é preciso também conhecer os dados completos dessa pesquisa, que ainda não foi revisada por pares nem publicada em revista científica.
O Senado deve votar hoje o novo marco legal para o saneamento básico. Ele já estava na pauta do governo muito antes da pandemia e, agora que estamos contando mortos aos milhares, continua sendo prioridade de Jair Bolsonaro: é a questão “mais importante no momento“, em suas palavras. Resolver os problemas de saneamento básico no país de fato é urgente, e na crise do coronavírus é inclusive inaceitável que pessoas não tenham acesso à água. Mas, quando se trata deste projeto, o buraco é muito mais embaixo. Se aprovado, ele permite a privatização do setor, e pode transformar o Brasil “no primeiro país do mundo com um monopólio privado dos serviços públicos de água e saneamento básico”, segundo Luiz Roberto Santos Moraes, professor da UFBA e membro do Conselho Diretor Nacional da Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento.
Também no Senado, foi aprovada em dois turnos a PEC que altera as datas das eleições municipais; o primeiro e o segundo turno ficam nos dias 15 e 29 de novembro, respectivamente. Agora o texto precisa passar pela Câmara.
O plenário da Câmara dos Deputados começou a aprovar ontem um texto bem diferente do desejado por Jair Bolsonaro. O tema é muito importante, mas parece tão antigo a essa altura do campeonato: são aquelas mudanças no Código Brasileiro de Trânsito, propostas pelo presidente no ano passado. Até agora, os deputados disseram não para a exclusão da exigência de exame toxicológico para motoristas profissionais e mantiveram o uso da cadeirinha de crianças. A votação continua hoje.
Falando em contrariar Bolsonaro, ontem o juiz Renato Borelli determinou que o presidente use máscara de proteção em todos os espaços e vias públicas do Distrito Federal, onde isso é lei. Caso contrário, será multado em R$ 2 mil. A Advocacia Geral da União (AGU), que parece não ter nada melhor para fazer, vai recorrer da decisão. A justificativa é ótima: “preservar a independência e a harmonia entre os poderes da República”.
O provável futuro ministro da Educação, Ricardo Feder, reuniu-se com Jair Bolsonaro ontem. Segundo ele, nenhum convite foi oficializado, mas já houve conversas sobre seus planos para a pasta. Especialmente sobre a reabertura das escolas. Quanto a Abraham Weintraub, o inquérito aberto no STF para investigá-lo por racismo não vai mais continuar na Corte, já que ele perdeu o foro privilegiado. Mas o ministro Celso de Mello ainda não determinou para que órgão vai o inquérito.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Tudo pode piorar mostra o ministério da Saúde - Instituto Humanitas Unisinos - IHU