14 Outubro 2025
"O Evangelho ensina na Carta aos Gálatas que em Cristo 'não há homem nem mulher; todos somos um'. Essa declaração bíblica estabelece a igualdade radical que deve permear a vida e o ministério da Igreja. Não há justificativa teológica para negar às mulheres a plena participação nos sacramentos e no ministério, porque a dignidade fundamental e a chamada vocação vocacional não conhecem distinção de gênero. A Igreja não pode pregar a igualdade e praticar a exclusão", escreve José Carlos Enríquez Díaz, em artigo publicado por Ataque al poder, 12-10-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Eis o artigo.
O debate sobre o ministério feminino não pode mais continuar a ser um tabu na Igreja. Em tempos de crise vocacional, crescente desigualdade e profunda renovação teológica, excluir metade da humanidade do ministério ordenado não é apenas injusto, mas vai contra a própria essência do Evangelho: a igualdade radical em Cristo. Portanto, este texto convida o Papa Leão XIV a escutar o clamor do Espírito, que também fala por meio de mulheres com vocação, e a abrir o caminho a uma Igreja mais inclusiva e justa.
O fato de Jesus ter nascido homem é um fato histórico; não é um mandamento doutrinário para toda a vida da Igreja. Jesus rompeu com as estruturas patriarcais de seu tempo, dialogando com as mulheres, enviando-as como mensageiras e confiando-lhes a sua missão. Mulheres como Maria Madalena, a "apóstola dos apóstolos", foram as primeiras testemunhas de sua ressurreição e proclamadoras do Evangelho. Se ele confiou sua missão a mulheres, por que a Igreja hoje deveria negar-lhes o acesso ao ministério? A questão não é o gênero, mas a vocação e o serviço. A mediação sacramental inaugurada por Cristo é melhor compreendida como uma ação do Espírito, transcendendo a correspondência biológica entre Cristo e o ministro.
A eleição dos Doze apóstolos homens tem um forte componente simbólico e profético, ligado às doze tribos de Israel. Não se tratou de uma normativa imutável que excluía as mulheres do ministério. A realidade histórica confirma que algumas mulheres exerciam funções litúrgicas e de liderança na comunidade cristã primitiva. Figuras como Febe, Priscila e Júnia são mencionadas nas cartas paulinas, ocupando papéis de autoridade. Elas não podem ser reduzidas a um papel meramente secundário ou privado.
A teologia católica contempla o desenvolvimento doutrinário, sem que isso implique perda de fidelidade ao Evangelho. A Igreja conseguiu reformar profundas questões sociais e morais ao longo do tempo, preservando a unidade na fé. O ministério feminino não é impedido por um dogma irrevogável. Documentos recentes marcam a disciplina atual, mas no cerne da tradição cristã há espaço para a escuta e a interpretação com a orientação do Espírito. Milhares de mulheres em todo o mundo sentem um chamado sincero à vocação sacerdotal.
Negar-lhes essa oportunidade empobrece a Igreja, limita os seus carismas e nega a riqueza do povo de Deus. Em muitas comunidades, as mulheres sustentam o tecido eclesial com a sua dedicação, assumindo responsabilidades sem o correspondente reconhecimento sacramental. Esse desequilíbrio tem sido repetidamente destacado por teólogos e fiéis leigos como uma dívida pendente de justiça e transparência.
Um exemplo contemporâneo notável é o de Sarah Elizabeth Mullally, teóloga, enfermeira e líder anglicana, que fez história ao ser nomeada a primeira mulher Arcebispa de Canterbury, o mais alto cargo da Igreja da Inglaterra e líder espiritual da Comunhão Anglicana mundial. A sua trajetória combina rigor acadêmico e dedicação pastoral, demonstrando que a ordenação das mulheres em diversas igrejas tem sido uma fonte de enriquecimento e fortalecimento eclesial.
O Papa Leão XIV demonstrou sensibilidade para com os pobres, os migrantes e as mulheres marginalizadas, e promoveu estudos sobre o diaconato feminino. Mas a reflexão não deve parar por aí: as mulheres pedem para serem ouvidas com fatos, não apenas com palavras; exigem igualdade sacramental e plena participação.
O Evangelho ensina na Carta aos Gálatas que em Cristo "não há homem nem mulher; todos somos um". Essa declaração bíblica estabelece a igualdade radical que deve permear a vida e o ministério da Igreja. Não há justificativa teológica para negar às mulheres a plena participação nos sacramentos e no ministério, porque a dignidade fundamental e a chamada vocação vocacional não conhecem distinção de gênero. A Igreja não pode pregar a igualdade e praticar a exclusão.
Este tempo exige que a Igreja abra seu coração e sua mente, que não mais perca vitalidade e vozes proféticas, mantendo limitações desprovidas de um sólido fundamento doutrinário. Que as mulheres, formadas teológica e pastoralmente, sejam ouvidas, preparadas para assumir o serviço sacerdotal. Que se reconheça que a fé é dinâmica e que o Espírito continua a soprar com novidade, como no Pentecostes.
O futuro do Evangelho reside numa Igreja que respira com os dois pulmões — o dos homens e o das mulheres —, aberta à igualdade, à justiça e à corresponsabilidade. A renovação eclesial está ligada à coragem de reconhecer que o Reino de Deus é para todos, sem exclusão. O ministério feminino não é uma ameaça, mas uma promessa de vida e de fidelidade ao Evangelho.
Permanece o apelo urgente: que a Igreja ouça e aja de acordo com as razões bíblicas, teológicas e humanas que sustentam essa causa, para que homens e mulheres possam servir juntos o mistério do amor divino com liberdade, dignidade e plenitude.
Assim, no âmbito teológico, numerosos especialistas têm enfatizado que o ministério não é uma questão biológica, mas ministerial e espiritual. Leonardo Boff defende que o ministério feminino não seria uma mera imitação daquele masculino, mas uma expressão nova e autêntica deste, um enriquecimento para toda a Igreja.
María José Arana denuncia que os argumentos contra o ministério feminino são muitas vezes pseudoteológicos ou culturais, e afirma que negar o ministério às mulheres significa negar a riqueza espiritual que elas aportam com vocação genuína.
Juan José Tamayo enfatiza que excluir mulheres do ministério é uma discriminação que contradiz a atitude inclusiva de Jesus e do cristianismo primitivo, e que essa exclusão deriva mais de construções sociais patriarcais do que de um mandato divino irrevogável. Segundo a teóloga feminista Ida Raming, essa exclusão representa uma injustiça que a Igreja não pode justificar em nome do Evangelho e que deve ser reconsiderada urgentemente.
Essas vozes convidam a um discernimento corajoso e transparente, pois a Igreja não deve temer o desenvolvimento doutrinário quando este responde com mais fidelidade à mensagem de Jesus e à dignidade humana. Não se trata de romper com a tradição, mas sim de aprofundá-la, ouvindo a experiência de milhares de mulheres que, por meio de seu ministério e testemunho, carregam a marca viva do Espírito.
O ministério feminino não é uma ameaça à fé, mas uma promessa de renovação e justiça. Negar essa abertura significa renunciar à plenitude do Corpo de Cristo e à missão coletiva de amor e serviço que Deus confiou a toda a sua Igreja.
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